Considerações jurídicas e psicossociais sobre o abuso sexual contra crianças e adolescentes

 Resumo: O presente artigo tem por objetivo discutir o abuso sexual sob a égide de dois campos do conhecimento científico: o jurídico e o psicológico. Para tanto, partiu-se da premissa que o Abuso Sexual contra crianças e adolescentes é um crime perverso que pode afetar de forma significativa a vida e o desenvolvimento psicossocial de crianças, adolescentes e famílias. Além disso, se fez necessário refletir sobre o caminho após a denúncia que pode ser tão ou mais árduo que o precedente a ela. Ressalta-se a necessidade do conhecimento do tema pelos profissionais envolvidos e a prioridade no atendimento à vítima, questões primordiais para que o número de danos e traumas não seja ainda maior.


Palavras chaves: Abuso Sexual; crime; atendimento social; traumas; criança/adolescente.


Abstract: The present article aims to discuss sexual abuse under the scope of two areas of scientific knowledge: judicial and psychological. For such, we started from the point that children and adolescents Sexual Abuse is a perverse crime that can affect significantly the lives and the psychosocial development of children, adolescents and families. Beyond that, it was necessary to think over the way after the disclosure, which can be equally or more difficult than what precedes it. It is emphasized the need of knowledge by the involved professionals and the priority in attending the victim, principal questions to prevent the higher number of traumas..


Key words: Sexual Abuse; crime; social work; traumas; children/adolescent.


(…)

Lembranças de minha infância

Que eu não queria lembrar!

Lamentos já tão distantes,

Qu’eu não posso suforcar!

 (…)

Quem disse que a meninice é tempo de se cantar?

Correr, pular, sonhar e brincar? …  (ALBERTON, 2005, pg. 122).

Delimitação do fenômeno do abuso sexual e suas definições legais


As pesquisadoras Azevedo & Guerra (1989) conceituam violência sexual como “todo o ato ou jogo sexual, relação heterossexual ou homossexual entre um ou mais adultos e uma criança menor de 18 anos, tendo por finalidade estimular sexualmente esta criança ou utilizá-la para obter estimulação sexual sobre sua pessoa ou de outra pessoa”[1] (AZEVEDO & GUERRA, 1989, p. 42). Esta definição denota a complexidade de um tema que envolve uma diversidade de questões, desde as sexuais, genéticas, intelectuais, sociais, éticas e legais entre outras. Parece óbvio pensar que uma criança não pode consentir com algo que ela não está física nem psicologicamente preparada para decidir. Tampouco, está cognitivamente preparada para compreender a natureza de certas formas de contato e opor resistência. Menos compreensível ainda a situação se torna, quando o abuso sexual é praticado por uma pessoa muito próxima e de quem ela é afetivamente dependente.


As modalidades de abuso sexual cometidas contra crianças e adolescente têm diversas formas de expressão que vão além da agressão física e psicológica. A depender dos elementos que integram as singularidades de cada situação, temos formas de abuso sexual que podem ser tão ou mais nocivas do que a relação sexual em si. São as seguintes: a exploração sexual: a produção e comercialização de materiais pornográficos com exposição de crianças e ou adolescentes (revistas, fotos, filmes e vídeos, etc.), a troca e venda de material publicitário de conotação sexual na Internet, o tráfico de crianças ou adolescentes para outras cidades ou países com propósitos sexuais e as práticas sexuais mediante formas de pagamento; o voyeurismo que versa na observação de atos ou de órgãos sexuais de outra pessoa; o exibicionismo que é a exposição intencional a uma criança de seus genitais com a intenção de chocar a vítima; os telefonemas obscenos que podem ocorrer quando um adulto gera ansiedade em crianças ou adolescentes com discursos sexualizados através de comunicação pelo telefone; o abuso sexual verbal que se refere às conversas abertas sobre atividades sexuais incompatíveis com o desenvolvimento cognitivo e sexuais de crianças e adolescentes. Podem ocorrer ainda: a exposição de vídeos pornográficos; o assédio sexual que são propostas de contato sexual numa posição de poder em relação a vitima, que é chantageada com ameaças, tentativas de relações sexuais, carícias nos órgãos genitais, masturbação, sexo oral e anal e o sadismo ou abuso sexual incluindo flagelação, torturas e surras.


No que se refere aos aspectos e definições legais, existem os tipos penais definidos como: estupro, atentado violento ao pudor, corrupção de menores, tortura e maus tratos. O estupro e o atentado violento ao pudor são considerados crimes hediondos, sejam na forma simples ou qualificada pelo resultado, e ainda nos casos de violência presumida, conforme decisão recente do Pretório Excelso (NUCCI, 2006).


O estupro seria “constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça” (art: 213 do CPB). É um crime cujo sujeito ativo – aquele que pratica o fato descrito na norma penal incriminadora – só pode ser o homem e aqui devemos incluir até o marido, namorado ou companheiro, uma vez que a mulher não constitui objeto sexual e pode opor-se aos desejos de outros para relações sexuais. Segundo NUCCI “não é crível que no atual estágio da sociedade, inexistindo naturalidade no relacionamento sexual de um casal, tenha o homem o direito de subjugar a mulher à conjunção carnal, com o emprego de violência ou grave ameaça, somente porque o direito civil assegura a ambos o débito conjugal” (NUCCI, 2006,  p. 816). Nestes termos deve prevalecer o direitos à incolumidade física e à liberdade sexual de todo ser humano.


O atentado violento ao pudor segundo a norma penal, constitui em “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal” (art. 214 do CPB). Entende-se o ato libidinoso como todo ou qualquer ato que satisfaça a lascívia, ou seja, que dê prazer sexual e que seja diverso da relação sexual entre um homem e uma mulher: sexo oral, sexo anal, toques, masturbação, etc. Pode ter como sujeito ativo qualquer pessoa.


Estes crimes constituem tipos penais que possuem como elemento subjetivo o dolo e exigem prova de materialidade e autoria. No caso de haver o envolvimento de crianças nestas práticas sexuais e existindo a prova legal e evidência médica, a criança pode ser protegida de imediato, conforme apresenta Furniss (1993):


“Evidências médicas e forenses inequívocas são não apenas úteis ao processo legal e de proteção à criança, mas também possuem um grande valor terapêutico. Poder confrontar o abusador com provas inequívocas de abuso sexual e com evidências factuais, poupa a criança de testemunhar e de fazer declarações legalmente conclusivas. Também faz com seja impossível que o abusador, a criança ou qualquer outro membro da família retire novamente a acusação sob a pressão psicológica que segue a revelação inicial.” (FURNISS, 1993, p. 205).


Porém, tanto os casos de estupro quanto de atentado violento ao pudor quando ocorridos no recôndito do lar e com continuidade, apresentam dificuldades na produção de provas. Geralmente não há testemunhas e muitas vezes a única prova existente é a palavra da vítima. Neste caso, “existe a possibilidade de condenação, mas devem ser considerados todos os aspectos que constituem a personalidade da(o) ofendida(o), seus hábitos, seu relacionamento anterior com o agente”. (NUCCI, 2006, p. 819) o que torna o fenômeno ainda mais complexo na sua compreensão. O tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul já manifestou este entendimento:


“EMENTA: PROVA. CRIME CONTRA OS COSTUMES. PALAVRA DA VÍTIMA. ADOLESCENTE. VALOR. Como se tem decidido, nos crimes contra os costumes, cometidos às escondidas, a palavra da vítima assume especial relevo, pois, via de regra, é a única. O fato dela (vítima) ser uma adolescente, quase criança na época do delito, não impede o reconhecimento do valor de seu depoimento. Se suas palavras se mostram consistentes, despidas de senões, servem elas como prova bastante para a condenação do agente. No caso, as declarações da menor informam e convencem sobre o abuso sexual do qual foi vítima. Seus depoimentos se mostraram seguros a respeito, imputando ao recorrente a prática de estupros. DECISÃO: Apelo defensivo desprovido. Unânime.” (APELAÇÃO CRIME Nº 70008468563, OITAVA CÂMARA CRIMINAL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: SYLVIO BAPTISTA NETO, JULGADO EM 16/06/2004).


O Código Penal Brasileiro apresenta a presunção de violência no intuito de proteger aqueles que não possuem capacidade de discernir entre concordar ou não com a prática de um ato sexual.  São casos em que não se leva em conta à concordância ou não da vítima, constituindo em um ato violento contra a vontade da vítima (Art. 224 do CPB).


A corrupção de menores também está situada no campo sexual (“art. 218: Corromper ou facilitar a corrupção de pessoa maior de 14 (catorze) e menor de 18 (dezoito) anos, com ela praticando ato de libidinagem, ou induzindo-a a praticá-lo ou presenciá-lo”). Neste caso, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, porém o passivo deve ter entre 14 e 18 anos, pois se for uma criança ou adolescente menor de 14 anos será configurado como estupro ou atentado violento ao pudor, pois a violência é presumida. A corrupção de menores compreende todos os atos que podem levar a criança ou o adolescente à depravação sexual através da realização ou fazer com que o mesmo pratique atos libidinosos. (NUCCI, 2006).


A Mediação para servir a lascícia de outrem, art. 227 do Código Penal Brasileiro constitui em “induzir alguém a satisfazer a lascívia de outrem”, e ainda o Crime de Favorecimento a prostituição, art. 228, “Induzir ou atrair alguém à prostituição, facilita-la ou impedir que alguém a abadone”. Estes dois tipos penais que tendo por vítima menor de 18 e maior de 14 anos tem a pena aplicada mais severamente. Sendo a vítima menor de 14 anos, “induzida à satisfação da lascívia de outrem, por não apresentar concentimento válido, configura-se a situação de violência presumida (§ 2º. deste artigo) quando o agente é ascendente, descendente, conjugê ou companheiro (a), irmão, tutor ou curador ou pessoa que cuide da educação, tratamento ou guarda da vítima, torna-se mais grave a punição, uma vez que não se admitiria tal postura justamente daqueles que deveriam zelar pela integridade moral da pessoa sob sua proteção.


A literatura desconsidera a existência da ainda intitulada prostituição infantil, partindo do entendimento de que a criança e o adolescente são explorados sexualmente não tendo condições psicológicas de decidir em ser ou não uma prostituta ou um garoto de programa. (DAVIDSON; TAYLOR, 2008). Para Davidson & Taylor “supondo que as crianças passivas, dependentes, vulneráveis e incapazes de escolher o caminho da prostituição, as crianças que vendem sexo devem ter sido diretamente forçadas a faze-lo por um ou mais adultos” (p. 121). Assim, o uso desta nomenclatura “prostituição infantil” coloca a vítima num  papel responsável pelo crime e isso é inaceitável.


A Tortura também deve ser destacada no campo legal por ser mais uma das formas de segregação e violência contra a criança e o adolescente. Possui uma legislação própria que disciplina as suas diversas formas (Lei 9455/1997) e também constitui um crime hediondo. O crime de maus tratos refere-se à por em risco a pessoa que está sob sua autoridade e que inspira cuidados físicos, mentais e morais (Art. 136 do CPB): “Aumenta-se à pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (catorze) anos”.  Denúncias de crimes de maus tratos podem inclusive, estar anunciando vítimas de Abuso Sexual.


A lei nº 10.764, de 12/11/2003 acrescenta o artigo 240 ao Estatuto da Criança e do Adolescente que dispõe: “Produzir ou dirigir representação teatral, televisiva, cinematográfica, atividade fotográfica ou de qualquer outro meio visual, utilizando-se de criança ou adolescente em cena pornográfica, de sexo explícito ou vexatória” e ainda no § primeiro “Incorre na mesma pena quem, nas condições referidas neste artigo, contracena com criança ou adolescente”. A Pena para este crime pode variar de dois a seis anos de reclusão e multa. Esta lei acrescenta ao ECA o artigo 241 que dispõe: “Apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer meio de comunicação, inclusive rede mundial de computadores ou Internet, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente”. A pena neste crime é de reclusão de dois a seis anos e multa.


Apesar de termos todos estes crimes acima tipificados por nosso ordenamento jurídico a Pedofilia ainda não possui uma tipificação penal o que dificulta a sua punição pelos operadores do direito. Segundo entendimento de profissionais da área médica a pedofilia: “é um transtorno parafílico, onde a pessoa apresenta fantasia e excitação sexual intensa com crianças pré-púberes, efetivando na prática tais urgências, com sentimentos de angústia e sofrimento. O abusador tem no mínimo 16 anos de idade e é pelo menos 5 anos mais velho que a vítima”. (http://www.abcdasaude.com.br/artigo.php?5. Acesso em: 5/10/2008)


É importante destacar que a Internet através das comunidades de relacionamento acaba facilitando este tipo de crime que vem sendo muito discutido atualmente na Comissão Parlamentar de Inquérito da Pedofilia que vislumbra uma tipificação do crime de pedofilia. O Projeto de Lei 250/08 foi aprovado pelo senado federal no dia 10/07/2008, projeto este proposto pela CPI, este propõe modificações no Estatuto da criança e do Adolescente criminalizando novas condutas e atualizando penas para crimes já previstos pelo ECA. Incluindo ainda a prática deste crime pela Internet punindo inclusive os provedores de Internet que garantem os serviços para armazenamento de imagens e o acesso as informações. Enfim, cumpre salientar o quanto nossa sociedade abomina e não suporta mais ver suas crianças e adolescentes vítimas de um crime perverso e cruel.


A seguir apresentar-se-ão algumas considerações teóricas, características e especificidades do fenômeno do abuso sexual no âmbito familiar e em outros contextos.   


O Abuso sexual intra e extrafamiliar e suas implicações psicológicas


O abuso sexual pode ser classificado em duas categorias: intrafamiliar e extrafamiliar. O abuso sexual intrafamiliar define-se por ocorrer no ambiente de convívio familiar e é praticado por um membro da família: pai, mãe, irmão, avô, avó, tio, tia, padrasto e madrasta. Santos (1998) afirma que o abuso sexual intrafamiliar, na maioria das vezes, não é um fato isolado que envolve somente o abusador e a criança ou adolescente violado. De forma direta ou indireta inclui todos os outros membros da família, seja pelo ‘silêncio’ compactuado, seja pela participação ativa no abuso ou na organização dos papéis sexuais no contexto familiar. O abuso sexual extrafamiliar ocorre fora do âmbito familiar e é geralmente praticado por pessoas que possuem algum vinculo com a criança: vizinho, amigo mais velho, professor, médico, babá, entre outros. Pode inclusive acontecer no mesmo endereço social da vítima. Nestas situações, a denúncia é muitas vezes realizada pelo próprio pai ou mãe da criança ou adolescente.


Com relação aos fatores desencadeadores da violência sexual, temos que o primeiro deles é o abuso de poder: um adulto mais desenvolvido física e psicológicamente têm mais recursos para dominar uma criança ou adolescente. Um segundo fator diz respeito aos traços de personalidade do agressor. Neste sentido, Santos (1998) afirma: “[…] estados psicóticos ou perversos, depressão, baixo controle dos impulsos, problemas neurológicos, baixa tolerância ao stress, bem como o uso de álcool e outras drogas são fatores relevantes para a compreensão desse problema” (SANTOS, 1998, p. 21). Em muitos casos, o abusador sabe que está fazendo algo errado com a criança e que isso constitui um crime.  Pode inclusive, saber que o abuso prejudica a criança, mas mesmo assim não consegue parar essa nociva prática (FURNISS, 1993). Para o agressor o abuso constitui um alívio de tensão que o conduz à compulsão à repetição fazendo-o dependente. De acordo com Furniss (1993), as tentativas de parar com a violência podem levar a sintomas de abstinência tais como: agitação, irritabilidade e ansiedade. 


Alguns fatores sociais como miséria e desemprego têm sido apontados como responsáveis pela ocorrência do abuso sexual. Estes, no entanto, não podem ser considerados determinantes, pois se pode constatar abuso sexual em famílias onde não existem estes problemas. Assim, a violência sexual, no Brasil (e em outros lugares do mundo), não é um fenômeno restrito às camadas populares, mas envolve pessoas de todas as classes sociais, de diversos credos e áreas profissionais (MARTINS, 1998). Há quem diga que é um dos “fenômenos humanos mais democráticos” (depoimento no filme Canto de Cicatriz – Chaffe, 2005), pois atravessa todas as camadas sociais, etnias, crenças e culturas.


O que mais preocupa nos casos de abuso sexual é que em geral as vítimas convivem muito freqüentemente com o risco. A situação de risco, neste caso, é compreendida pelo conjunto de eventos negativos presentes na vida da pessoa em desenvolvimento e que aumentam a probabilidade de surgirem problemas físicos, sociais e emocionais (YUNES & SZYMANSKI, 2005; YUNES, MIRANDA & CUELLO, 2004). No caso da violência intrafamiliar, as pessoas não precisam sair de casa, pois “elas presenciam diariamente, em seu ambiente familiar, os atos violentos e hostis que, certamente, agem contra a sua natureza e têm influência deletéria em seu desenvolvimento” (KOLLER & DI ANTONI, 2004, p. 294). Para contrapor-se aos mecanismos de risco que esta grave questão suscita, é preciso gerar fatores de proteção que transformem esta situação. Se a família é responsável por expor a criança à violência, cabe aos demais microssistemas que formam a rede de atendimento social, por exemplo, a escola, atuar de forma protetiva para impedir que o abuso perdure.


A ABRAPIA    – Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e Adolescência, através do número telefônico (0800)990500, monitorou e tratou estatisticamente denúncias de abuso e exploração sexual contra crianças e adolescentes em todo o país, atingindo as 27 unidades federativas do país. O último relatório, disponível via Internet, apresenta um perfil das vítimas de abuso sexual, no período de fevereiro de 1997 a janeiro de 2003 (última atualização) e foram quantificadas 1565 denúncias. No que tange ao sexo das vítimas: 17,06% são do sexo masculino, 76, 17% são do sexo feminino, 6,26% são denunciadas como feminino e masculino e 0,51% não informaram. E ainda, tanto meninas quanto meninos abusados na mesma denúncia são 6,27%. As meninas são as vítimas mais freqüentes, sendo  mais  comum  o  incesto  pai/filha que tem analogia com o próprio padrão cultural da sociedade patriarcal, na qual a mulher, a despeito das conquistas femininas ainda é vista como objeto sexual. No item faixa etária: de 12 a 18 anos 47,80%, de 8 a 11 anos 18,47%, diversas idades 14,57%, menor de 8 anos 18,21%, e não informado 0,96%. A gravidade desta realidade se vê acrescida se for considerada a idade da criança/adolescente. É possível observar que os adolescentes são as maiores vítimas, porém em muitos casos o abuso pode ter tido início na infância o que gera uma grande preocupação onde quase 20% das crianças são menores de 8 anos.


Quanto ao perfil dos abusadores temos que das 1565 denúncias, 90,10% são do sexo masculino, 4,47% do sexo feminino, tanto homens quanto mulheres conjuntamente 4,92% e não informado 0,51%. No que diz respeito ao vínculo do agressor com a vítima de abuso sexual, os dados revelam que nos casos de violência intrafamiliar, o pai e o padrasto aparecem em primeiro lugar: Namorado(a)  da  vítima  3,25%;  Namorado  da   mãe   2,56%; Namorada do pai 0,10%;  Irmão 4,64%; Irmã 0,10%; Avó 0,59%; Avô 3,16%; Mãe 6,60%; Padrasto 23,37%; Madrasta 0,49%;  Pai 36,39%; Primo 2,76%; Prima 0,10%; Companheiro(a) 1,08%; Tio 9,07%; Tia 0,59%; Tio-avô 0,49%; Outros 4,24%; Não informado 0,10%.


A partir do ano de 2003, a responsabilidade do Disque Denúncia Nacional, Disque 100, passou a ser de responsabilidade do Poder Executivo, reafirmando o compromisso do Governo Federal ao combate à Violência e a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. Atualmente é coordenado e executado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH), em parceria com a Petróleo Brasileiro S.A (Petrobras) e o Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes (Cecria).


A Coordenadora do Laboratório de Estudos da Criança (LACRI – USP), Dra. Maria Amélia de Azevedo, supervisiona uma coleta de dados de Equipes de Telealunos do Telelacri, que pesquisam a violência doméstica contra crianças e adolescentes desde 1996, no Brasil. Segundo a pesquisa nos anos de 1996 a 2003 foram notificados cerca de 8665 casos; destes 6.496 das vítimas eram do  sexo  feminino  e  somente 1536 eram do sexo masculino e 633 não informaram, o que confirma as tendências do Disque Denúncia.


Membros   do   CEP-RUA-UFRGS  (Centro   de   Estudos   Psicológicos   de


 Meninos e Meninas de rua da UFRGS) realizaram uma análise em processos de casos denunciados de violência sexual ajuizados pelas Promotorias Especializadas na Infância e na Juventude de Porto Alegre, entre os anos de 1992 e 1998, contando com 94 vítimas. Destas, 80,9% eram do sexo feminino, enquanto que apenas 19,1% do sexo masculino. Quanto à idade de início dos abusos foram encontradas três faixas etárias:  10,6% das crianças apresentavam idade entre 2 e 5 anos, 36,2% destas tinham entre 5 e 10 anos e 19,1% tinham entre 10 e 12 anos. A maioria das crianças (26,6%) freqüentava o ensino fundamental no início das agressões (HABIGZANG, KOLLER, AZEVEDO & MACHADO, 2005).


Apesar da expressão numérica dos dados serem preocupantes, temos que levar em conta que as taxas de ocorrência reais são ainda maiores do que as apresentadas, já que grande parte das crianças/adolescentes vítimas de abuso sexual não são reconhecidas ou denunciadas. A UNICEF (2002), estima que 75 a 80% dos casos de abuso sexual não são denunciados. Isto se dá em virtude dos sentimentos de culpa, vergonha, medo e tolerância da vítima e daqueles que são conhecedores de casos de abuso (Faleiros, 2003). No tocante a denúncia Faleiros (2003) alega que: “A denúncia é uma das questões cruciais para o enfrentamento das situações de abuso sexual contra crianças e adolescentes, bem como para elucidação de todo e qualquer crime. Implica em pessoas dispostas a correr riscos e romper com o pacto de silêncio que alimenta a impunidade e desprotege as vítimas” (p. 138). Assim, podemos dizer que a proteção da criança/adolescente depende do conhecimento da violência pelos órgãos competentes através da denúncia: o Conselho Tutelar, Ministério Público, Judiciário e a Delegacia de Polícia.


O trabalho e o atendimento dos profissionais após a denúncia


Popularmente, denunciar é vulgarmente usado a partir de termos pejorativos como, “dedar”, “caguetar”, “entregar” alguém. Entretanto, em casos de quaisquer modalidades de violência entre pessoas, em que persista ameaça de agressão ou risco de morte, o ato de denunciar pode salvaguardar as vítimas de várias formas de brutalidade, e tem, portanto, o sentido absoluto de proteção e preservação  da  vida  e  da integridade dos envolvidos.


A denúncia ou notificação de uma situação de abuso sexual em qualquer contexto requer ações e intervenções interdisciplinares que não dependem em sua eficácia, de atitudes isoladas. É preciso haver comunicação e colaboração entre um conjunto de segmentos que compõe a rede de apoio social de crianças, adolescentes e famílias. Entretanto, há que se considerar uma etapa prioritária neste processo que envolve a participação de pessoas-chave, que devem estar preparadas para identificar, reconhecer e compreender os indícios da existência de uma situação abusiva. Isso pressupõe um conhecimento específico que raramente é tratado nos cursos de graduação das diferentes áreas das ciências humanas e sociais nas Universidades (ALMEIDA, 1998) e tampouco integra a formação de professores nos cursos de magistério.


É necessário apontar que o abuso sexual é uma modalidade de violência que pode deixar marcas profundas no desenvolvimento da criança e do(a) adolescente vitimizado (a) e por isso exige urgência na sua intervenção. Não se pode deixar para depois, para mais tarde, pois pode ser tarde demais.


No que se refere às responsabilidades sociais neste tema, existem artigos e definições no campo legal que visam dar proteção à infância e à juventude. A Magna Carta de 1988 dispõe no art. 227 caput e art. 227 § 4º:


“ART. 227 CF: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”


“ART. 227, § 4º CF: A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.” (BRASIL, 2000, p. 107-108)


Estes preceitos se   reforçam  no  Estatuto   da  Criança  e  do   Adolescente (BRASIL, 2003) cujo artigo 5º preconiza: “Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”. Para os casos de transgressão, o ECA (BRASIL, 2003) é explícito em legislar a obrigatoriedade de notificação dos casos, independentemente de certeza ou confirmação dos fatos. Assim sendo, a suspeita de violência contra uma criança ou adolescente deve ser anunciada, conforme dispõe o artigo 13: “Os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais” (BRASIL, 2003).


Porém, a falta de conhecimento dos trabalhadores sociais – professores, atendentes de creche, cuidadores, advogados, juízes, promotores, delegados, etc. – leva muitas vezes à revitimização da criança e do adolescente. Aliado a esta, constata-se a  falta de prioridade no atendimento institucional em rede às vítimas,  abusadores  e  familiares, o que  contribui de forma negativa nestas relações.


Quanto aos profissionais da área legal, o desconhecimento somado aos inúmeros interrogatórios, que obrigam a criança a repetir várias vezes o que aconteceu com ela – para os policiais, para o Conselheiro Tutelar, para o Juiz, etc. – constituem fatores negativos e propulsores de revitimização para a criança. Conforme visto acima, quando se tratou dos tipos penais, é preciso que existam provas inequívocas de materialidade e autoria, para que uma pessoa possa ser condenada. Muitas vezes a palavra da vítima é a única prova. Percebemos então, a necessidade de priorizar a proteção da criança/adolescente na produção destas provas.


Com este sentido Dobke (2001) estudou a dificuldade dos operadores do direito em compreenderem a dinâmica do abuso sexual e a linguagem das vítimas, o que requer a presença de um “interprete” com capacitação e com formação em psicologia.  Segundo a autora:


“A inquirição da criança, através de profissional habilitado, poderia ainda, ser efetuada com a utilização da câmara de Gesel, sala com uma das paredes de vidro espelhado – unidirecional – que permite aos operadores do direito, do lado externo, observarem a criança e o “interprete”, sem serem percebidos, com a possibilidade de se comunicarem através de intercomunicadores”. (DOBKE, 2001, p. 92).


A autora complementa que este modelo é usado nas comarcas da Argentina. Com a sua colaboração, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul elaborou um documentário apresentando uma prática que tem sido usada na 2ª Vara da Infância e da Juventude de Porto Alegre a qual foi denominada: “Depoimento sem Dano”, semelhante ao modelo Argentino. A diferença é que a criança fica com a “intérprete” numa sala reservada interligada com som e imagem com a sala de audiência onde estão presentes: o juiz, o promotor, os servidores e envolvidos, em momento real, sendo possível à interação com a profissional e a testemunha. Esta prática  apresenta-se como uma alternativa, para que a produção da prova,  pelo  depoimento  da  vítima não seja tão penoso e ainda mais cruel.


Um outro obstáculo à aplicação legal é a conivência ou o silêncio das famílias onde existe um “acordo” entre seus membros de que tudo deve permanecer oculto. Este “acordo” consiste e é mantido através de ameaças à criança ou a família ou ainda através de promessas de benefícios para a criança/adolescente (SCOBERNATTI, 2005). Aliado a isso, as dificuldades da criança ou adolescente em compreender e relatar a situação é pelo fato do abuso sexual ser mascarado com cenas de carinho e sedução.


Nestes percalços temos que levar em consideração duas situações: a culpa e a acusação. Para falar de culpa temos que levar em conta o aspecto legal e o psicológico. O aspecto legal diz respeito à responsabilidade do abusador como figura parental. E o aspecto psicológico refere-se ao aspecto relacional da participação da criança/adolescente de sentir-se culpada do abuso. A distinção dos dois aspectos está no fato de que o culpado legal é sempre o abusador, porém os dois podem se sentir igualmente culpados no aspecto psicológico.


“O sentimento de culpa da criança origina-se de seu senso equivocado de responsabilidade, que ela deriva do fato de ter sido uma participante no abuso. Essa confusão muitas vezes é reforçada pelas ameaças da pessoa que cometeu o abuso, de que a criança será responsável pelas conseqüências se revelar o abuso. A persistente experiência psicológica de participação e culpa também explica a baixa autoestima e o posterior comportamento de vítima dos adultos que sofreram abuso sexual quando crianças.” (FURNISS, 1993, p. 17)


Para a criança/adolescente as conseqüências de se sentir culpada são mais graves, ela passa a acreditar que não possui nada de valor, pois os pais passam a ela esta mensagem. E estes pais são as pessoas mais importantes de suas vidas, principalmente quando pequenas. Quando adolescentes na maioria dos casos, a rua  é a solução para esta situação de culpa.


A acusação está relacionada à condenação moral, colocar a responsabilidade em alguém. Isso provavelmente conduzirá a um culpado ou a um “sentir-se culpado”.


“O esteriótipo da ‘criança sedutora’, que seduz o pai e aprecia o abuso tem pouco a ver com a realidade do abuso sexual da criança. Tem sua origem principalmente nas projeções dos adultos de seu próprio pensamento sexual nas crianças. Isso faz com que se confunda a experiência sexual aparentemente adulta da criança que sofreu o abuso com o verdadeiro nível de desenvolvimento psicossexual da criança, que geralmente deixa a desejar. As crianças que sofreram abuso sexual freqüentemente são bem mais imaturas emocionalmente do que as suas iguais.” (FURNISS, 1993, p.21).


Anna Freud afirma que “no abuso sexual da criança, esta não pode evitar ficar sexualmente estimulada e essa experiência rompe desastrosamente a seqüência normal da sua organização sexual. Ela é forçada a um desenvolvimento fálico ou genital prematuro, enquanto as necessidades desenvolvimentais legítimas e as correspondentes expressões mentais são ignoradas e deixadas de lado” (FREUD, 1981, p. 33-34). Segundo ela, o abuso sexual esta relacionado: às descrições dos fatores psicossocial e psicossexual da criança, e suas conseqüências nos processos de desenvolvimento. Culpa ou acusação, jamais podem ser imputadas à criança/adolescente. É normal que esta apresente uma conduta sexualizada, pois foi motivada prematuramente, o que não justifica a violência sexual. Percebe-se então, a complexidade do tema em loco e a necessidade de um maior preparo dos profissionais que trabalham na rede de atendimento a crianças e adolescentes vitimas de violência sexual.


Nos casos de violência sexual doméstica (AZEVEDO & GUERRA,1994): “Recomenda-se proteção imediata à vítima quando a estrutura e o funcionamento da família incestogênica indicarem a inexistência de condições capazes de barrar a reiteração do abuso com a mesma vítima ou sua extensão a outras no mesmo lar” (p. 104) . A “mera” suspeita de abuso deve ser investigada, pois o que se prioriza é o bem estar da criança/adolescente, que pode estar sob o mesmo teto que o seu agressor. Surge, então, a necessidade de uma equipe técnica e uma rede de apoio preparada para lidar com estes casos.


Existem duas possibilidades nos casos de violência sexual contra crianças/adolescentes: a primeira enseja a constância da criança na família. E a segunda a sua retirada por um  tempo  “determinado”,  pois  em  muitos casos a criança/adolescente fica afastada por muitos anos. Sobre o primeiro caso, o Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe no seu artigo 130: “Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do agressor da moradia comum”.


Para Azevedo & Guerra (1994, p.105), neste caso, são necessárias algumas medidas: a) a vítima e a família devem ser encaminhadas a um tratamento compulsório na comunidade, por no mínimo 2 anos; b) um planejamento dos recursos materiais, provendo os recursos que estas famílias necessitem, por um prazo determinado, até a organização da independência familiar; c) orientação para que a família busque recursos na rede de apoio social existente na sua comunidade.


O tratamento compulsório é criticado por Furniss (1993, p.25), pois a família tende a negar o tratamento. O abusador deve ser comparado e tratado como um alcoólatra, onde o primeiro passo para o tratamento é a admissão, pois independentemente de ameaças legais, o abusador tende a negar esta dependência. 


Por outro lado, prover recursos materiais só resolveria as necessidades imediatas destas famílias que em muitos casos perderam o provedor. Mas, a existência de uma rede de apoio social comprometida pode servir de base para esta família buscar recursos dentro da sua própria rede de apoio familiar.


A segunda situação corresponde à remoção da criança/adolescente da família. Esta retirada pode ensejar na colocação da criança numa instituição, num lar ou família substituta e em último caso ser encaminhada para adoção, esta ocorre nos casos de Destituição do Poder Familiar (MIRANDA, 2004).


Em muitos casos esta retirada é medida indispensável para a salvaguarda da criança/adolescente, porém deve ser realizada de forma cautelosa, visando sempre a possibilidade de se manterem os laços familiares.  Nos casos em que se torna impossível a manutenção na família deve-se considerar a ruptura definitiva e os processos de adoções. Num primeiro momento desta separação a criança vitimizada pode: ir para uma família substituta ou para um abrigo. No que tange à ida para uma família substituta vai ser levado em consideração o grau de parentesco e a relação de afinidade ou de afetividade da criança/adolescente. Além disso, deve ser verificado se esta família apresenta ou apresentou quadros de violência doméstica (GONÇALVES, 2002) para não se correr risco de revitimização que incorreriam em agravar o quadro de sofrimento da criança.


O Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe na sua Secção III, sobre os casos de família substituta: Guarda, Tutela e Adoção. O art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente, nos diz: “A guarda obriga à prestação de assistência material, moral educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.” São estes poderes fundados no poder familiar. O art. 36, parágrafo único, afirma: “O deferimento da tutela pressupõe a prévia decretação da perda ou suspensão do pátrio poder e implica necessariamente o dever de guarda”. A adoção possui como requisito indispensável a destituição do poder familiar, e nos casos de abuso sexual, ela deve ser precedida de um estudo cuidadoso do caso (GONÇALVES, 2002).


O dirigente do abrigo mantém a guarda da criança/adolescente para todos os efeitos legais. O abrigo é uma casa de passagem, ou seja, um lugar onde a criança/adolescente permanece até que sua situação legal se resolva. Porém, o que ocorre é a constância de crianças por longos anos de suas vidas. São motivos: a falta de um trabalho de reinserção familiar eficaz e de um maior incentivo para adoção (YUNES, MIRANDA & CUELLO, 2004).


O parágrafo único do art. 101 do Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe: “O abrigo é medida provisória e excepcional, utilizável como forma de transição para a colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade.” Furniss (1993), assim, se refere ao fato da criança ser removida da família:


“A remoção da criança da família dá aos pais a oportunidade de encobrir e negar seus próprios problemas conjugais, emociossexuais. As crianças ficam duplamente vitimizadas. Elas são castigadas e acusadas pelo abuso ao serem separadas da família e de outros relevantes contatos sociais, e impedidas de conseguirem resolver sua confusão primária originada do abuso, através do tratamento no contexto familiar. Quando levadas a pais adotivos ou a lares de crianças, as crianças que sofreram abuso sexual podem também ser observadas com desconfiança, sob a noção de proteção especial. Podem ser tratadas de modo discriminatório por insegurança dos pais adotivos e do pessoal dos lares, que têm dificuldade para lidar com problemas muitas vezes graves de atuação sexualizada.” (p. 65).


Qualquer destas medidas, quando aplicadas, devem levar em consideração desenvolvimento físico, emocional e cognitivo da criança/adolescente.


Considerações finais


Percebe-se que o caminho após a denúncia pode ser tanto quanto ou mais árduo que o precedente a ela. Por este motivo, o conhecimento do tema pelos profissionais envolvidos e a precocidade e prioridade no atendimento à vítima, devem ser questões primordiais para que o número de danos e de traumas não seja ainda maior. O que se vê, na maioria dos casos, é uma preocupação em provar os “verdadeiros culpados”, o que faz com que tal prioridade exponha ainda mais a criança ou o adolescente a condições de risco. Algumas vezes, os riscos vividos no ambiente familiar se repetem na situação pós-denuncia e seus encaminhamentos. Tendo em vista que uma vez realizada a denúncia e iniciado o inquérito quem deve proteger a criança e o adolescente é a Sociedade/Estado, os desdobramentos dos atendimentos devem ser realizados  de forma realmente efetiva, com a absoluta garantia dos direitos fundamentais das pessoas implicadas.


De todas as considerações apresentadas neste texto, fica transparente a necessidade de preparo, formação, capacitação e empoderamento de uma rede intersetorial que fale a mesma “linguagem”, e que tenha claro os seus objetivos comuns de proteção e de desenvolvimento das pessoas envolvidas em casos de abuso sexual. O funcionamento e o atendimento tecido por uma rede de profissionais habilitados é a solução mais exeqüível e justa para prevenir que crianças e adolescentes sejam revitimizados e banidos de seus direitos de amar, brincar e aprender em todo e qualquer contexto.


 


Referências Bibliográficas

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Nota:

[1] Conforme dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente no seu art. 2º “Considera-se criança para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade”.


Informações Sobre os Autores

Angela Torma Pietro

Advogada e Mestre em Educação Ambiental. Professora Assistente do Instituto de Direito da Universidade Federal do Rio Grande – FURG

Maria Ângela Mattar Yunes

Psicóloga e Doutora em Educação: Psicologia da Educação. Professora Adjunta do Instituto de Ciências Humanas e da Informação da Universidade Federal do Rio Grande


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