A Fidelidade Partidária e o Pluripartidarismo

Resumo: Na política brasileira falta ética e moral perante seus princípios democráticos, enfraquecendo os partidos políticos, não existindo o compromisso de seus representantes com o interesse coletivo partidário e sim com seus próprios interesses, criando a dança das siglas e o entra e sai nos partidos. Forçando a decisão do Supremo Tribunal Eleitoral, reafirmada pelo Supremo Tribunal Federal, disciplinando a fidelidade partidária, uma vez que para a investidura na vida política eleitoral existe o requisito da filiação partidária, criando vários paradoxos referentes à verticalização das coligações, pois os membros do partido devem sua fidelidade, e os diretórios regionais não precisam ser fiéis entre si em seus posicionamentos. Criando uma crise entre o legislativo e o judiciário, uma vez que judiciário usou de sua forma atípica para legislar, deixando varias lacunas em suas resoluções e procedimentos adotados.

Palavras-chave: Política, parlamentar, ética, fidelidade, partido político, direito político, fidelidade partidária

Sumário: 1. Introdução. 2. O Pluripartidarismo. 3. História da Fidelidade Partidária e sua Atualidade. 4. Dos Entendimentos TSE e STF. 5. O Procedimento para Perda de Mandato ou Justificativa de Abandono de Sigla. 6. Considerações Finais. Bibliografia

1 – Introdução

O Instituto da Fidelidade Partidária surgiu em meio à ditadura militar, quando no Brasil apenas poderiam existir dois partidos políticos, situação e oposição, sendo o ARENA ligado ao regime, e o MDB, que era o partido de oposição. O governo procurou meios de não permitir que os parlamentares trocassem de partidos para garantir sempre sua maioria no parlamento, fazendo, em 1969, de forma muito tímida, a inserção na constituição do instituto da fidelidade partidária, o que não ganhou força suficiente para garantir a cassação dos infames desertores partidários que entravam e saíam das legendas da forma que queriam. Depois veio a Emenda Constitucional nº. 25/85, a qual exclui prematuramente este instituto junto à nossa Carta Magna, acarretando graves seqüelas ao sistema partidário brasileiro, permitindo a atual dança das trocas de siglas partidárias, deixando os partidos políticos serem meros acessórios da Democracia e do Estado, a fim de atender interesses torpes e particulares.

Nossa Carta Magna de 1988 deixou passar a oportunidade de regulamentar a fidelidade partidária, deixando a responsabilidade de regulamentar este instituto a cargo dos estatutos dos próprios partidos políticos, trazendo um resultado trágico para democracia na forma das eleições proporcionais em listas abertas, possibilitando o surgimento de partidos de fachada, de aluguel ou de favores, esquecendo o princípio do interesse coletivo partidário e prevalecendo os interesses pessoais de cada parlamentar, criando a vergonhosa política atual que conhecemos das trocas de favores, influências e do quem dá mais leva, em total desrespeito ao eleitorado.

Diante de tantas lacunas e tanta imoralidade feitas pelos políticos brasileiros, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no ano de 2007, se viu forçado pela consulta nº. 1.398, feita pelo Partido da Frente Liberal (PFL), atualmente Democratas (DEM), a prolatar incisivamente em sua decisão a afirmação que o mandato do parlamentar pertence ao partido o qual ele foi eleito e não ao candidato, em face da utilização de vários princípios constitucionais e da própria legislação e resoluções eleitorais, uma vez que o Brasil adota o sistema proporcional de listas abertas para a composição das casas do Poder Legislativo, como a Câmara dos Deputados, Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais, entrando o parlamentar mais votado de seu partido ou coligação quando atingirem o coeficiente mínimo para ocupar uma cadeira ou mais nestas respectivas casas.

No mesmo ano, entendimento proferido pelo Egrégio Tribunal Superior Eleitoral (TSE) foi ratificado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), possibilitando a saída do parlamentar sem a perda do mandato quando houver justa causa, nos casos de perseguição dentro do próprio partido, graves incoerências ideológicas partidárias, ou se o parlamentar sair para constituir fundação de um novo partido.

Mais tarde, foi ampliada a perda do mandato também para os detentores de cargos das eleições majoritárias, através da Consulta do TSE nº. 1407, criando um grave paradoxo no instituto da fidelidade e em seu sistema eleitoral, o qual deixa o vice assumir a vaga, mesmo ele sendo de outro partido.

Também foi criada a Resolução nº. 22.610/07 do TSE, que veio disciplinar e fixar o rito para o procedimento adotado para a perda do mandato eletivo pela infidelidade do parlamentar e para justificativa de abandono de sigla, atuando como um verdadeiro legislador das regras eleitorais e processuais, rasgando o artigo 22, inciso I, da Carta Magna de 1988, e deixando dezenas de lacunas quanto à sua forma dos atos processuais, vacância de suplentes, tipicidade estatutária, entre outras, para serem resolvidas no próprio TSE e nos Tribunais Regionais (TRE), criando ritos administrativos e cíveis-eleitorais.

Estas decisões proferidas pelos Egrégios TSE e STF deixaram grandes questionamentos, uma vez que a fidelidade para os parlamentares perante o partido existiria, e a fidelidade por meio dos diretórios regionais ao diretório nacional do partido através do instituto da verticalização das coligações não existiria, criando dois pesos e duas medidas, ignorando a existência de uma enorme relação jurídica e costumeira destes dois institutos partidários. Com a Emenda Constitucional nº. 52/06, o partido não precisou mais ter sua coerência partidária ideológica, deixando está parte apenas para seus membros, o que foi fortalecido após o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 3685, que deixou a verticalização funcionar apenas nas eleições de 2006, não existindo mais nas eleições de 2010, fortalecendo um ditado popular que está sendo usado por segundo Thales Tácito e Camila Medeiros (2008) no que tange essa questão: “é a velha prostituta pregando castidade”.

2 – O Pluripartidarismo.

O pluripartidarismo constituiu-se na mais importante manifestação da diversidade de opinião, garantida por um regime político de Estado de Direito Democrático. Pressupondo que a organização de um partido político deve ser de um grupo de pessoas, divididas em variadas regiões de uma mesma nação, partilhando dos mesmos interesses e ideologias, prevalecendo o caráter de âmbito nacional, ou até mesmo internacional, como o caso do Partido Comunista e o Partido Verde, que têm representações em todas as partes do mundo. No sistema pluripartidarista, pessoas comuns podem se organizar para formar seus partidos, desde que respeitando fundamentos constitucionais de um Estado de Direito. Nascendo em pequenos núcleos de reuniões, como células que juntas criam seus órgãos, em busca da discussão de opiniões e interesses, e divulgação de suas diretrizes ideológicas.

Em alguns Estados a organização política é composta pelos sistemas unipartidário ou bipartidário; nesses sistemas, as opiniões e diretrizes políticas contrárias ao Estado não possuem direito de participação, sendo reprimida a liberdade de expressão das ideologias políticas, como ocorreu no Brasil na época da ditadura.

Como exemplo do unipartidarismo, podemos citar o regime comunista da antiga União Soviética, pois seu governo não aceitava a existência de outros partidos políticos a não ser o próprio Partido Comunista, ocorrendo atualmente ainda em Cuba e na China. Já como exemplo do bipartidarismo, podemos citar a própria República Federativa do Brasil, que em boa parte do regime militar, sustentou-se pela criação de uma estrutura política fundada em apenas dois partidos políticos, ARENA e MDB.

Historicamente o Brasil teve várias fases de regimes partidários, o qual, de acordo com o publicado no site do TSE (2009), começou em 1837 com a monarquia que, com tantas rebeliões provincianas da regência, fomentou a formação de dois partidos o Partido Conservador e o Partido Liberal, dominando a vida política até o final do Império. Mais tarde apareceram o Partido Progressista e o Partido Republicano, completando os quadros partidários da época.

De 1889 a 1930, na República Velha, surgiram os partidos estaduais, pois eram sempre frustradas as tentativas de organização de partidos com caráter nacional. Podemos citar os partidos Republicano Federal e Republicano Conservador.

Com a formação do Estado Novo, surgiram agremiações de caráter nacional com profunda conotação ideológica, prevalecendo a Aliança Nacional Libertadora e o Integralismo, e uma legislação eleitoral fazendo referências à possibilidade de apresentação de candidatos por partidos ou por coligações.

Após o golpe de 1937, houve uma breve interrupção na trajetória partidária, com a eminência do golpe comunista frustrado por Vargas. Porém, logo em 1945, ocorreu uma explosão no multipartidarismo com 13 legendas e a exclusividade da apresentação dos candidatos pelos partidos políticos.

Com o triste golpe militar em 1964, iniciou-se a pior fase partidária, pois a incoerência do regime era tanta que, em 15 de julho de 1965, foi aprovada a Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei nº 4.740), e logo depois, em 27 de outubro, o Ato Institucional nº. 2 extinguiu os mesmos partidos políticos. Ainda no mesmo ano, o Ato Complementar nº 4 determinou ao Congresso Nacional a criação de organizações com atribuições de partidos políticos, pelo bipartidarismo, com apenas duas legendas como mecanismo para acomodar as diferenças internas dentro do regime, dando origem à ARENA (Aliança Renovadora Nacional) e ao MDB (Movimento Democrático Brasileiro), copiando o modelo uruguaio.

Segundo o próprio site do TSE (2009), para os contrários ao regime teria sido “uma admiração ingênua do Presidente Castello Branco pelo modelo britânico” ou uma “mexicanização do Brasil”.

Em 1978, através da Emenda Constitucional nº 11/78 foram revogados os desastrosos atos institucionais impostos pelo regime militar, modificando as regras para organização das agremiações partidárias. Em dezembro de 1979, numa tentativa de imitar o sistema político alemão, a aprovação da Lei nº 6.767 extinguiu o Arena e o MDB, restabelecendo o pluripartidarismo em seu regime jurídico, sinalizando o início da abertura política também pela anistia. Em 1980 a Emenda Constitucional nº 15 restabeleceu as eleições diretas para governador e senador, eliminando a figura do senador biônico, o que possibilitou em 1985, através da Emenda Constitucional nº 25, o alargamento do pluripartidarismo e a primeira eleição de um presidente da República civil durante esse regime de exceção, porém de forma indireta, por meio de um colégio eleitoral, levando à Presidência Tancredo Neves, que faleceu antes de tomar posse, vindo a assumir o cargo seu vice, José Sarney, em 1985.

As normas eleitorais, entre 1964 e 1985, período este entre os mandatos dos presidentes João Goulart e Tancredo Neves, foram marcadas por diversas sucessões de leis, decretos, atos institucionais e emendas constitucionais, nos quais o Regime Militar se permitia conduzir todo processo eleitoral, atendendo sempre a seus interesses, visando a obtenção da maioria favorável ao regime no parlamento. Desta forma o regime cassou direitos políticos, decretou eleições indiretas para presidente, governadores e prefeitos, alterando a duração dos mandatos e o cálculo do número de deputados na Câmara, alegando muitas vezes base no número populacional, e outras vezes com base no número do eleitorado, sempre afirmando estar assegurando o interesse da segurança nacional.  Isto veio a ser mudado em 1989, quando o Brasil teve pela primeira vez, e após anos de batalhas, as tão sonhadas eleições diretas, elegendo Fernando Collor como presidente, numa eleição histórica e muito concorrida.

De acordo com os artigos 17, §2o, da Constituição Federal, 7o, caput, da Lei no 9.096/95, e art. 7o da Resolução 19.406/95 do TSE, a natureza dos Partidos Políticos é de pessoa jurídica de direito privado, onde a legislação dispõe sobre a liberdade de fundação, fusão ou incorporação dos partidos políticos, revelando ser um direito subjetivo da cidadania. Deve o partido aglutinar as classes sociais e tendências ideológicas da sociedade, valendo-se da vontade popular na participação de órgãos representativos e possuindo qualidade jurídica constitucional.

O doutrinador Paulo Bonavides (2000), em seu livro Ciência Política, afirma que o partido político é uma organização de pessoas inspiradas por idéias ou movidas por interesses que buscam tomar o poder, normalmente pelo emprego de meios legais, e nele conservar-se para realização dos fins propugnados.

José Afonso da Silva (2005) acredita que o partido político se trata de grupo social caracterizado por uma agremiação, propondo-se a “organizar, coordenar e instrumentar a vontade popular com o fim de assumir o poder para realizar seu programa de governo”.

Ainda o autor destaca que uma das funções primordiais dos partidos políticos é a organização da vontade popular, de maneira que exprimidas através da aplicação de seu programa de governo, afirmando que “todo partido político deveria estruturar-se à vista de uma ideologia definida e com um programa de ação destinado à satisfação dos interesses do povo”.

Ensina ainda que a institucionalização dos partidos possibilita a existência de três tipos de controle, sendo o de caráter externo, de caráter ideológico programático e de caráter interno dos partidos, visualizando por quais elementos estes devem se guiar, bem como em que a agremiação justifica suas atitudes nas relações entre eleitor e o candidato, partido e o candidato e partido e a Justiça Eleitoral.

O controle de caráter externo vale-se da observância das leis penais e do controle de polícia, referindo a regulamentação que o ordenamento jurídico se limita a exigir, e a qual atividade desenvolvida pelos partidos deve atender. Enquanto o controle de caráter ideológico-programático, o autor afirma, é aquele que incide sobre as idéias, programas e atividades políticas empregadas, tendo como objetivo o impedimento dos partidos de agirem de forma subversiva ou revolucionária. Já o controle cujo caráter é interno faz com que haja exigibilidade de aplicação dos princípios democráticos na organização dos partidos políticos.

Os partidos ainda poderão se aliar a fim de seu fortalecimento para determinadas eleições com as chamadas coligações, que são uma forma de partidos políticos temporários, referidas no art. 6o da Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997. A coligação partidária deverá ter denominação própria e um representante com atribuições idênticas ao presidente de um partido, especialmente perante a justiça eleitoral. Pois uma coligação é considerada uma grande legenda, retratando uma aliança de partidos para um determinado pleito eleitoral, sendo uma junção de forças a fim de alcançar o poder, ou instrumentos de sobrevivência das minorias políticas, para ampliar o tempo de propaganda gratuita na televisão e no rádio.

É importante frisar que as alianças ou coligações nascem através de alianças feitas por deliberações nas convenções nacionais, estaduais e municipais, dependendo da dimensão e da forma do pleito eleitoral, podendo ser quanto à forma, nos casos de coligações proporcionais ou majoritárias, e quanto à sua dimensão podendo ser eleições municipais, estaduais ou nacionais.

O TSE entende que a formação da coligação é uma faculdade constituída e atribuída aos partidos políticos para a disputa do pleito, e sua existência tem caráter temporário e restrito apenas aquele processo eleitoral.

Hoje no Brasil encontramos diversas siglas partidárias: até a presente data, temos 27 partidos aptos a disputar as eleições em 2010 no TSE e mais de 10 partidos em processo de formação, na corrida pelo numero mínimo necessário de assinaturas em apoio a sua fundação, sendo 0,5% do total de votos obtidos para deputados federais nacionalmente, desprezando os brancos e nulos. São aproximadamente 470 mil assinaturas, sendo distribuídas em no mínimo nove Estados, para garantir o caráter nacional do partido. Sendo essa uma tarefa árdua e demorada, que muitos partidos demoram anos, como foi o caso do PSOL, que demorou mais de dois anos para conseguir o numero mínimo de assinaturas em seu apoiamento.

Como exemplos de partidos em formação que até a presente data não estão aptos a participarem da eleição em 2010, temos o Partido Pátria Livre (PPL), que é dissidência do gigante PMDB e PT, com militantes do lendário Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR8), que enfrentaram o regime militar na época da ditadura; temos também o Partido da Transformação Social (PTS), Partido Ecológico Nacional (PEN), Partido Federalista (PF), Partido Social (PS), Partido Socialista Estudantil (PSE) Partido Nacionalista Democrático (PND), Partido Cristão (PC), entre outros.

3 – História da Fidelidade Partidária e sua Atualidade

O Instituto da Fidelidade Partidária ganhou destaque somente após a polêmica Emenda Constitucional nº. 01 de 17 de outubro de 1969, que introduziu este instituto no ordenamento jurídico brasileiro por imposição do Regime Militar, objetivando manter a unidade de sua bancada no Congresso Nacional, com a finalidade de que fossem decretadas a perda dos mandatos dos que se opusessem ao Regime, seja pelas atitudes, pelo voto, ou às diretrizes do partido pelo qual se elegeram. Passando a fidelidade partidária a compor o ordenamento jurídico dos partidos políticos, perdurou até a chegada da Emenda Constitucional nº. 25, de 15 de maio de 1985, que a retirou do texto constitucional.

Na verdade, o debate em torno do tema começou em 1968, por conta de a Polícia Militar ter invadido a Universidade de Brasília (UNB) espancando diversos estudantes e pelo fechamento da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), forçando na época o então deputado Márcio Moreira Alves, pertencente ao MDB, a proferir um discurso em protesto por tal ato, pedindo que o povo se unisse pela democracia, não compactuando com um regime de violência, clamando a nação a um boicote à ditadura, através da não participação nos tradicionais desfiles de 07 de setembro.

Tal pronunciamento feriu a dignidade das Forças Armadas, razão esta pela qual os militares indicaram como sanção por este ato praticado, a sua cassação, tendo caráter repressivo. Prevalecendo o instituto da imunidade parlamentar pela sua liberdade de palavras e atos, conhecida como imunidade material, sendo as opiniões por ele emitidas permanecendo invioláveis.

Desta forma, o governo respondeu esta derrota implementando o conhecido Ato lnstitucional nº 5 e posteriormente a Emenda Constitucional nº 1, que trouxe o Instituto da Fidelidade Partidária, a fim de manter a unidade de sua bancada no Congresso Nacional, representada pelo partido ARENA.

Com o fim da ditadura militar e o processo de democratização, a Emenda Constitucional nº. 25 do ano de 1985 retirou do ordenamento constitucional a possibilidade de perda do mandato pela prática de infidelidade partidária, gerando um grande enfraquecimento das instituições partidárias, causado pelos interesses pessoais dos parlamentares brasileiros. Prosperou o troca-troca de partidos no Brasil, fator que contribuiu para a diminuição do grau da representatividade do regime democrático no país, em desrespeito à vontade do eleitor, fazendo com que o voto dado a um partido fosse transferido para outro. Gerou-se o que segundo o douto jurista Paulo Vilhena (1986) é:

“A total falta de compromisso com os princípios doutrinários e com o programa do partido sob cuja legenda o candidato se elegeu gera o enfraquecimento ou até mesmo a desmoralização dos partidos, a ponto de se afirmar, que, no Brasil, os programas dos partidos são peças meramente formais, na grande maioria desconhecidos até dos próprios filiados, destinados apenas a atender as exigências da legislação eleitoral, por ocasião do registro do partido político perante o Tribunal Superior Eleitoral, ou para formação do quociente eleitoral.”

Lembramos que no Brasil não existe o instituto da candidatura avulsa, tornando os partidos políticos vetores na construção da sociedade, sendo a base na democracia representativa, uma vez que não pode haver desvinculação entre o partido e o candidato filiado, tendo a Carta Magna de 1988 trazido novamente o instituto da fidelidade partidária em seu corpo, deixando o instituto a cargo e responsabilidade dos estatutos partidários.

Na atualidade a fidelidade partidária foi estabelecida pelo Tribunal Superior Eleitoral em março de 2007, que se aproveitando da inércia do poder legislativo, usou de sua forma atípica para afirmar que o mandato do parlamentar pertence ao partido pelo qual ele foi eleito e não ao candidato, tanto nas eleições proporcionais, quanto nas eleições majoritárias, uma vez que é indispensável à filiação partidária para o ingresso na vida política eleitoral brasileira. Posteriormente este entendimento proferido pelo TSE foi ratificado pelo Supremo Tribunal Federal, possibilitando a saída do parlamentar sem a perda do mandato quando houver justa causa, em casos de perseguição dentro do próprio partido, incoerência ideológica partidária, ou se o parlamentar sair para constituir fundação de um novo partido.

O ato do Judiciário perante a inércia do Poder Legislativo fez gerar uma grande polêmica no mundo jurídico e partidário brasileiro, uma vez que ficaram inúmeras lacunas sobre a constitucionalidade de feito e da maneira, competência e jurisdição do julgamento dos infiéis, bem como retaliações da classe política e do Poder Legislativo, que muitas vezes se nega a cumprir a ordenação judicial, sob a garantia constitucional da não interferência entre os poderes.

Não poderíamos tratar da história da fidelidade partidária sem tocar no polêmico Instituto da Verticalização, pois a mesma é considerada por alguns doutrinadores uma forma de fidelidade partidária. Destacamos que a diferença entre fidelidade partidária e a verticalização das coligações é que o primeiro instituto refere-se à conduta do parlamentar ou filiado com os posicionamentos do partido em si, e o segundo instituto refere-se à fidelidade entre os diretórios regionais com o nacional, obrigando os partidos que participarem de uma determinada chapa nas eleições presidenciais a manter a mesma coligação nas disputas das eleições estaduais ou distrital, bem como suas coligações proporcionais.

A verticalização surgiu no Brasil em fevereiro de 2002, da interpretação do Tribunal Superior Eleitoral sobre a Lei nº. 9504/97, que disciplina as eleições, considerando inconstitucional artigo da lei que tratava do tema, sendo ratificado pelo Supremo Tribunal Federal que não admitiu uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), apresentada na época por vários partidos políticos contra a interpretação do Tribunal.

Porém a verticalização teve vida curta, pois no início de 2006 o Congresso Nacional, em resposta ao Poder Judiciário, aprovou a Emenda à Constituição 548/02, a qual deu aos partidos políticos autonomia para estabelecerem critérios de escolha do regime de suas coligações sem a obrigatoriedade de vincular as alianças feitas nas candidaturas em nível nacional.

Isto deixou um grave paradoxo no sistema eleitoral, o qual prevê fidelidade a um membro do partido, enquanto o próprio partido não precisa ter coerência e fidelidade na formação de suas coligações.

4 – Dos Entendimentos do TSE e STF.

O artigo 17, § 1º, da Constituição Federal, trata da fidelidade partidária com um pouco de timidez, deixando a cargo dos estatutos partidários a regulação deste instituto, também regulada pela legislação referente aos partidos políticos na Lei 9.096/95, mais precisamente em seu Capítulo V. No artigo 23 da Lei 9.096/95, defende-se a apuração das violações dos deveres partidários, com responsabilização e punição feita pela Justiça Eleitoral, enquanto o artigo 25 da Lei 9.096/95 imputa aos parlamentares nas respectivas Casas Legislativas uma subordinação aos seus princípios doutrinários e programáticos estabelecidas pelas agremiações partidárias, imposta por seu estatuto, que também é enxergada no artigo 26 da referida lei, que se baseia na proporção partidária e indica a perda automática da função ou cargo que o parlamentar exerça se abandonar o partido sob cuja legenda tenha sido eleito.

É possível sancionar penalidade ao parlamentar que se opuser, pela atitude ou pelo voto, às diretrizes legitimamente estabelecidas pelos órgãos partidários, acarretando o desligamento temporário do parlamentar, a suspensão do direito de voto nas reuniões internas, perda dos cargos e funções que o filiado exerça.

Como a Constituição de 1988 e a lei 9.096/95 deixaram algumas lacunas quando regulamentou o Instituto da Fidelidade Partidária, deixando especificamente a cargo dos estatutos dos próprios partidos políticos a responsabilidade em regulamentar o tema, trazendo um resultado trágico para democracia e a forma das eleições proporcionais em listas abertas, sendo este problema resolvido após a consulta nº 1.398, ocorrida no dia 29 de março de 2007, que posteriormente transformou-se na Resolução 22.526/07, feita pelo Partido da Frente Liberal (PFL), atualmente conhecido com Democratas (DEM), os ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por maioria de 6 votos a 1, afirmaram que os mandatos obtidos nas eleições pelo sistema proporcional (deputados federais, distritais, estaduais e vereadores) pertencem aos seus respectivos partidos políticos ou coligações e não aos seus candidatos eleitos.

Desta forma, o candidato que, após o pleito, mudasse de partido ficará sujeito a perder sua cadeira, mediante a representação do partido ou coligação perante a Justiça Eleitoral, com direito a ampla defesa de acordo com a legislação. Pois cadeira pertence ao partido ou coligação, e não mais ao candidato, uma vez que este participou do pleito pelo sistema proporcional, sendo que a única exceção da perda do mandato pelo parlamentar que mudasse de legenda estaria numa plausível e eventual justificativa pelo candidato, sendo analisado junto ao contraditório.

Pelo entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, é analisado que o parlamentar não tem como perder o mandato, uma vez que o mesmo não o pertence, não se enquadrando a infidelidade no que é disposto no artigo 55 da Constituição Federal. Isso porque o mandato continuará existindo e sendo exercido pelo seu respectivo suplente, uma vez que o mandado foi outorgado pelo eleitor ao partido e não a uma pessoa em especifico, e o suplente é chamado porque ele disputou o pleito pelo mesmo partido daquele que perdeu o direito de exercer o mandato. Sendo assim, uma renuncia tácita de mandato, gerando uma imensa duvida na questão da competência, que deveria ser o caso julgado pela Justiça Comum, sendo contradito mais tarde pelo STF no Mandado de Segurança nº. 26.603, através do voto do Ministro Celso de Melo, que afirmou que caso de perda do mandato sim, porém não entrando no disposto do artigo 55 da Constituição Federal, chegando à conclusão que a Justiça Eleitoral tem a competência para julgar os casos de fidelidade partidária, já os outros casos de perda de mandato será competência da Justiça Comum.

Pois em conseqüência do entendimento do TSE sobre a consulta nº. 1.398, que gerou a chamada fidelidade partidária para os cargos de eleições proporcionais, fez com que a Presidência da Câmara dos Deputados recebesse inúmeros requerimentos de declaração de vacância do cargo eletivo por renúncia presumida de mandatos exercidos por deputados que migraram para outra legenda. Tais solicitações foram indeferidas, resultando no dia 4 de Maio de 2007 na impetração no STF de três mandados de segurança respectivamente pelos partidos; PPS (26.602), PSDB (26.603) e DEM (26.604) contra o ato da Presidência da Câmara dos Deputados, que arquivou os seus pedidos de que fossem empossados os suplentes de determinados deputados federais, em função de estes estarem desfilados das legendas que os elegeram. Em acordo com o entendimento do TSE, os parlamentares perderam automaticamente seus mandatos.

Desta forma, o raciocínio do Supremo Tribunal Federal (STF) ratificou o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), entendendo que o instituto da fidelidade partidária deveria ser aplicado aos casos ocorridos a partir do dia 27 de março de 2007, data da sentença da Consulta nº. 1398 do TSE.

Com isso, o Tribunal Superior Eleitoral, através do artigo 23, inciso XVIII, do Código Eleitoral e base nas decisões proferidas nos Mandados de Segurança pelo Supremo Tribunal Federal, no dia 31 de outubro de 2007 aprovou a Resolução TSE nº. 22.610/07, destinada a disciplinar o processo de perda e justificação de abandono de sigla.

A resolução possibilita a saída do parlamentar sem a perda do mandato quando houver justa causa, em casos de perseguições dentro do próprio partido, incoerências ideológicas partidárias graves, ou se o parlamentar sair para constituir fundação de um novo partido. Admite também a mudança de partido sem a perda do mandato, quando ocorre incorporação ou fusão do partido, nos casos de criação de nova legenda partidária, desvio reiterado ou mudança substancial do programa partidário e a grave discriminação pessoal. E nos casos de fusão de partidos, situação que é admitido pela legislação eleitoral, os parlamentares que não concordaram com a fusão ou incorporação de uma agremiação partidária passam a ter a liberdade do direito subjetivo de buscar abrigo em outra legenda.

As decisões destes Tribunais Superiores foram muito questionadas pelos doutrinadores eleitorais, uma vez que acabou criando o procedimento Cível-Eleitoral para perda do mandato por infidelidade partidária, sendo criado conforme a decisão do Mandado de Segurança 26603/07 do STF e a Resolução 22.610/07 do TSE, que, segundo Thales Tácito e Camila Medeiros (2008), foi denominado erroneamente pelo STF e TSE como “Administrativo Eleitoral”, provocando situações jurídicas distintas em seu rito, deixando grandes lacunas para os Tribunais Regionais e o próprio TSE resolverem, uma vez que a competência da União é legislar sobre os ritos processuais, forçando-os a usarem o Código de Processo Civil subsidiariamente. Saliente-se que, se dois ou mais Tribunais Regionais divergirem sobre o tema, acontecerá o famoso “Dissídio Pretoriano”, cabendo Recurso Especial Eleitoral.

Logo após a publicação da referida Resolução do TSE, chegaram diversos pedidos aos Tribunais Regionais Eleitorais e ao Tribunal Superior Eleitoral para perda de mandato pela infidelidade partidária. Sendo posteriormente ampliada a perda do mandato do infiel para os ocupantes de cargos do Executivo, através da Consulta do TSE nº. 1407/2007, aumentando a perda do mandato também para os detentores de cargos das eleições majoritárias, criando, segundo Thales Tácito (2008), “um curto circuito no instituto da fidelidade e em seu sistema eleitoral”, o qual deixa o vice assumir a vaga, mesmo ele não sendo de outro partido.

Para o ministro do STF Gilmar Mendes (2007), a troca de legenda representa uma evidente violação à vontade dos eleitores, sendo um falseamento do modelo de representação popular da democracia partidária, lembrando que os estatutos dos partidários de acordo com o artigo 17, §1º, de nossa Constituição Federal, diz que o próprio estatuto partidário é quem deve estabelecer e disciplinar as regras sobre a fidelidade de seus filiados. Assim, para Gilmar Mendes, o abandono de legenda deverá ser punido com a perda do mandato do infiel.

Explicando ainda que, “embora haja participação especial do candidato na obtenção de votos com o objetivo de posicionar-se na lista dos eleitos, tem-se que a eleição proporcional se realiza em razão de votação atribuída à legenda”.

O Brasil adota o sistema proporcional de listas abertas, e os partidos e coligações têm o direito de preservar a vaga obtida pelo sistema eleitoral proporcional quando houver pedido de cancelamento de filiação ou de transferência do candidato eleito por um partido para outra legenda.

Temos que considerar o teor do artigo 108 do Código Eleitoral, que estabelece que a eleição dos candidatos a cargos proporcionais é resultado do quociente eleitoral apurado entre os diversos partidos e coligações envolvidas no Sufrágio Universal. Observe-se que é condição constitucional da elegibilidade a filiação partidária e também saber que o cálculo das médias de uma eleição é decorrente do resultado dos votos válidos atribuídos aos partidos e coligações.

O Ministro do STF Gilmar Mendes (2007) afirma que na realidade política brasileira, a mudança de legenda por aqueles que obtiveram o mandato no sistema proporcional constitui uma clara violação à vontade do eleitor e um falseamento do modelo de representação popular da democracia partidária. Afirmando ainda o troca-troca partidário, contamina o processo democrático, corrompendo o funcionamento parlamentar dos partidos.

5 – Procedimento para Perda de Mandato ou Justificativa de Abandono de Sigla.

O procedimento para perda do mandato por infidelidade partidária foi criado conforme a decisão do Mandado de Segurança 26603/2007 do STF e a Resolução 22.610/07 do TSE, denominado erroneamente pelo STF e TSE como “Administrativo Eleitoral”, provocando situações jurídicas distintas em seu rito, da quais dissertamos abaixo, baseado no entendimento das obras dos autores Fernando Pimenta em seu livro “Guia Prático da Fidelidade Partidária à luz da Resolução TSE 22.610/07” (2008) e Thales Tácito com sua esposa Camila Medeiros com o livro “Fidelidade Partidária & Perda do Mandato no Brasil” (2008).

Segundo Thales Tácito e Camila Medeiros (2008), os Tribunais Superiores criaram um procedimento inexistente para uma justiça incompetente, legislando sobre processo civil e eleitoral, estipulando como foro competente a Justiça Eleitoral, e não a justiça comum como ocorria quando a perda de mandato extrapolava o prazo de 15 dias da diplomação. Prevaleceu a nomenclatura do STF como de cunho “administrativo”, sem haver previsões de recursos, exceto o “pedido de reconsideração”, ferindo de forma clara o artigo 121, § 3º e 4º da Carta Magna, não fazendo coisa julgada material por ter cunho administrativo, cabendo ainda mandado de segurança.

A Resolução 22.610/07 do TSE foi elaborada em cumprimento a decisão proferida pelo STF sobre o Mandado de Segurança 26603/07, estabelecendo o rito processual e o prazo de 60 dias para o procedimento, a contar do recebimento da denúncia, para que a Justiça Eleitoral cobre as devidas explicações, ouça os acusados e faça o julgamento.

Segundo Thales Tácito e Camila Medeiros (2008), parte da Resolução 22.610/07 do TSE é inconstitucional, não permitindo recurso da decisão do Tribunal, e apenas um mero pedido de reconsideração, ferindo o artigo 121, § 3º e 4º da Constituição Federal, que permite recurso do TRE para o TSE, no caso de perda de mandato eletivo federal e estadual, ou por ofensa a Constituição, e recurso do TSE para o STF, nos casos que ocorram ofensas a Constituição Federal. Fica claro que a Justiça Eleitoral não faz coisa julgada, podendo o interessado entrar com mandado de segurança ou mesmo Recurso Extraordinário no prazo de três dias para o STF.

Tratando dos princípios da “Tipicidade Eleitoral” ou “Reserva Eleitoral” do estatuto partidário, evitando a figura dos tribunais de exceções, um instrumento jurídico administrativo cabível é que o regimento interno da respectiva casa legislativa, que poderá prever as hipóteses de perda de mandato eletivo dentro de seu regimento interno, em conjunto necessário com as regras do estatuto partidário, nos termos do artigo 17 da Constituição de 1988, sob pena de somente ser possível a perda do cargo pela infidelidade pela Justiça Eleitoral.

Sobre a capacidade postulatória entendida pela tal resolução, a posição que reina no STF e no TSE é que, por ser procedimento administrativo não há necessidade de um advogado. Porem o primeiro cassado por infidelidade partidária, o vereador Lourival de Oliveira, de Buritis – RO, após um mês teve anulado o processo, no próprio TRE de Rondônia, após um mês, por não observar meros pressupostos processuais, pois quem impetrou a ação não tinha capacidade postulatória, fazendo o processo existir sem constituir um advogado, causando desta forma a nulidade processual.

Ainda segundo os autores Thales Tácito e Camila Medeiros, existem três correntes sobre o assunto três correntes dentro da justiça eleitoral, que estão descritas abaixo.

A primeira corrente afirma que não existe necessidade de advogado, pois esta fase não é judicial, não podendo aplicar subsidiariamente o Código de Processo Civil, uma vez que o artigo 5º, XXXIV, “a” da Constituição Federal assegura o direito de petição ao cidadão, bem como o Pacto de São José assegura ao cidadão o direito de autodefesa judicial e administrativo, desde que assim o queira, descartando a necessidade do advogado. Pode assim a ampla defesa ser feita sem a necessidade de terceiros.

Já a segunda corrente afirma a necessidade do advogado no procedimento, pois a Constituição de 1988 permite o contraditório e ampla defesa nos procedimentos administrativos, pressupondo a necessidade de uma defesa técnica e não simbólica. Muitos TREs vêm exigindo a capacidade postulatória nos recursos, pois o STF entende que a Constituição prevalece sobre os tratados, no caso o Tratado de São José, que tem a mesma força de lei ordinária em nosso ordenamento jurídico.

Por fim a terceira corrente, à qual o TSE está se inclinando, é uma teoria intermediária das outras, podendo até falar em mista; na qual se entende que aonde não houver conflitos de interesse não existe a necessidade postulatória do advogado, enquanto aonde ocorrer tal conflito, existe a necessidade postulatória do advogado, pois necessita de defesa técnica, assegurada pela Constituição.

Quanto à natureza deste procedimento se é “Administrativo” ou “Cível-Eleitoral”, poderemos falar de procedimento administrativo, se não exigir capacidade postulatória ou custas, sem cabimento de recurso, podendo apenas acontecer um “pedido de reconsideração”, nunca fazendo coisa julgada material, e sim formal, ainda podendo ser rediscutido na esfera cível através de Mandado de Segurança. E poderemos considerar o procedimento “cível-eleitoral”, quando existir a necessidade da capacidade postulatória, havendo preparo (custas), fazendo coisa julgada material, ainda cabendo os recursos eleitorais, sejam extraordinários ou especiais.

Ainda segundo os autores, o STF e o TSE deixaram grandes lacunas, aos Tribunais Regionais e ao próprio TSE resolverem, uma vez que é competência da União legislar sobre os ritos processuais, forçando-os a usarem o Código de Processo Civil subsidiariamente. Salientando que se dois ou mais Tribunais Regionais divergirem sobre o tema, acontecerá o famoso Dissídio Pretoriano, cabendo Recurso Especial Eleitoral.

Quando os documentos apresentados pelas partes se mostrarem aptos ao julgamento antecipado, podem os Tribunais Eleitorais usar o Princípio da Causa Madura para fazê-los, como enxerga-se nos artigos 6º e 12 da Resolução 22.610/2007 do TSE para a razoabilidade da duração do processo, apenas não podendo afastamento provisório ou cautelar, uma vez que se trata de norma restritiva, não podendo ampliar seu alcance.

Ressalte-se que compete a Justiça Eleitoral rejeitar aberrações processuais, tais como pedido de indenização por danos morais e materiais por causa da infidelidade, de acordo com o Principio da Exclusão do Excesso, sendo da competência da Justiça Comum a análise de tais danos.

Poderá qualquer esfera de diretórios partidário representar, ajuizando ação contra o parlamentar infiel, seja os diretórios municipais, estaduais ou nacional dentro do prazo previsto, e uma vez o partido ausente, visando coibir o acordo entre o parlamentar e o partindo burlando a Resolução do TSE, na chamada “compra de fidelidade”, os Ministros deram a legitimidade para entra com a ação para os suplentes nos casos de eleição proporcional ou para senadores, ou vice nos casos de eleições majoritárias, e ainda para o Ministério Público Eleitoral.

Sobre o assunto, o então presidente do TSE, Marco Aurélio de Mello avaliou que “a legitimação do Ministério Público na resolução foi acertada, porque prevíamos que poderia haver acertos entre os partidos e os eleitos. Foi uma medida muito importante”.

A resolução 22.610/07 do TSE dá trinta dias para os partidos ajuizarem a ação por infidelidade e mais trinta dias para os eventuais interessados e ao Ministério Público Eleitoral, na figura que o Procurador Geral Eleitoral representa dentro dos mandatos federais para o TSE, e o Procurador Regional Eleitoral na figura dos mandatos estaduais aos Tribunais Regionais, cabendo ainda a delegação para os Promotores Eleitoral representar na comarca dos fatos a representação de mandatos municipais.

Quando o partido político ingressar com a ação, haverá litisconsórcio necessário entre o parlamentar e o partido ao qual ele veio a se filiar; quando for o suplente ou vice o litisconsórcio necessário será entre o parlamentar e seu partido pioneiro, e por fim, quando for o Ministério Público Eleitoral o autor da ação, haverá litisconsórcio passivo necessário, onde o pólo passivo será composto pelo partido de origem, o partido atual e mandatário infiel. Pode também o Tribunal Eleitoral de ofício, pela força do artigo 47 do Código de Processo Civil, chamar estes interessados.

O interessante é que no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3686 o STF indeferiu a legitimidade do Ministério Público para atuar nos assuntos da verticalização, alegando ser “matéria interna corporis”, e agora o TSE contrariando esta diretriz imposta pelo STF, possibilitou o Ministério Público Eleitoral atuar como parte autora.

Em relação à Justificação de Abandono de Sigla, sua natureza é meramente declaratória e preventiva, visando declarar ou reconhecer justa causa pelo Tribunal Eleitoral, tendo sua legitimidade exclusiva do mandatário que pretenda desfiliar-se ou já se desfiliou de seu partido. Existe neste caso o litisconsórcio passivo necessário, pois deve o parlamentar ou chefe do executivo trazer à lide não somente o seu partido pioneiro, mas também seu atual partido, podendo pela força do artigo 47 do Código de Processo Civil de ofício o Tribunal chamar estes interessados.

Não havendo prazo para este procedimento, podem, caso o partido peça a cadeira e o mandatário sua justificação, os processos ser julgados no mesmo Acórdão através do Principio da Segurança Jurídica, evitando decisões contraditórias.

A competência no Procedimento Administrativo de Justificação de Abandono de Sigla, quanto no Procedimento Administrativo de Decretação da Perda de Cargo Eletivo por Desfiliação Partidária sem Justa Causa, se dará pela natureza de seu mandato, e não pelo local onde foi diplomado.

Quando for mandato de nível municipal, como de vereadores e prefeitos, ou nível estadual, como de deputados estaduais, distritais e governadores, a competência é do Tribunal Regional Eleitoral (TRE).  Já quando o mandato for de nível federal, como os de Senadores, deputados federais e Presidente, a competência será do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Julgando procedente o infiel, o Tribunal decreta a perda do cargo comunicando o presidente do Legislativo para que emposse seu respectivo suplente ou vice no prazo de 10 dias.

Na questão do rito processual no Procedimento Administrativo de Decretação da Perda de Cargo Eletivo por Desfiliação Partidária sem Justa Causa, quanto no Procedimento Administrativo de Justificação de Abandono de Sigla, o TSE não poderia inventar um novo rito, pois estaria entrando na esfera do Poder Legislativo, tornando a resolução inconstitucional.

O rito estabelecido pela Resolução 22.610/07 do TSE foi uma mistura da Lei nº 9.099/95 no tocante ao pedido de reconsideração, com a Lei Complementar nº 69/90 em relação aos artigos 3º a 7º, ainda fazendo uma criação judicial, com relação à ausência recursal, ferindo o artigo 121 de nossa Carta Magna. Incumbindo ainda aos requeridos o ônus da prova dos fatos.

Quando houver ausência de suplentes, no caso em que o partido perdeu todos os suplentes por mudarem para outras legendas, e o partido vencer a representação pela infidelidade, não poderá assumir quem não tenha concorrido a eleição, ficando o mandato com o infiel. Porém, em outra hipótese, o partido poderia invocar o artigo 56, § 2º, da Constituição e a vaga seria dada como vacante; se ocorresse 15 meses antes da eleição seriam feitas novas eleições, e acontecendo 15 meses para a eleição, o Poder Legislativo ficaria sem a sua vaga. Por isso na inicial deverá constar os nomes dos respectivos suplentes.

Por fim, para a restauração no caso de perda de mandato por infidelidade decretada pelo TRE ou TSE, o instrumento adequado é o Mandado de Segurança, com base nos artigos 22, inciso I, 55 e 121, § 3º e 4º, todos da Constituição Federal. Pode-se ainda entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, porque o Mandado de Segurança 26603 tem efeito “intra partem, e não tendo efeito “erga omnes”, valendo apenas como referência pela relevância e importância do caso.

6 – Considerações Finais

Analisando o contesto histórico observa-se que representação e a titularidade do mandato foram sendo modificados ao longo do tempo, uma vez que o Legislativo brasileiro não vinha cumprindo seu papel na tripartição dos poderes, não justificou ao Judiciário rever os conceitos estabelecidos pelo grande pensador Montesquieu, agindo de forma atípica ao ficar criando ordenamentos jurídicos, rasgando a Carta Magna a seu bel prazer, principalmente quando se verificam lacunas ao extremo, gerando conflitos de normas e procedimentos.

Fazendo necessária a atuação do Supremo Tribunal Eleitoral para manter o equilíbrio da ética e da moral nas eleições brasileiras, uma vez que a cultura política atual é a do interesse pessoal, e nunca do partido ou da coletividade.

Sendo a fidelidade partidária e a verticalização necessárias a manutenção da democracia, garantindo a participação das maiorias e minorias ideológicas.

Deixando livres os infiéis que consigam provar que sofreram grave discriminação pessoal ou que tenha havido mudança substancial ou desvio do programa partidário, bem como situações de incorporação e fusão de partidos ou criação de novo partido, podendo manter seus mandatos.

Desde que o Tribunal Superior Eleitoral regulamentou o procedimento para decretação de perda de mandato e justificativa de abandono de sigla pela fidelidade partidária, com base no entendimento consagrado pelo Supremo Tribunal Federal de que, em nosso sistema constitucional o mandato pertence ao partido e não ao candidato, começou uma grande moda de cassações de mandatos no país.

Deve existir a consciência este instituto não trará a solução para a falta de ética e moral perante o eleitor, sendo ele apenas um dos vários componentes da política que devem ser levados em conta e ser regulamentado, uma vez que o sistema eleitoral atual do Brasil necessita urgente de uma reforma política, para que haja o fortalecimento dos partidos políticos e aperfeiçoamento do sistema eleitoral.

Por esses motivos foi incoerente a atitudes dos parlamentares em fazer uma emenda à constituição a fim de acabar com o Instituto da Verticalização, que zelava pela coerência ideológica do partido nas eleições garantindo o seu caráter nacional.

A fidelidade partidária deveria prever não somente a fidelidade do parlamentar ou de seus filiados, mais também de seus diretórios e coligações na sua verticalização, pois poderá ser justa causa para saída de um parlamentar caso seu partido venha se coligar com outro de ideologia contrária, pois, na ausência dos cargos proporcionais, quem assume a vaga é o suplente da coligação e não outro membro de seu partido, o que criou um paradoxo com o instituto adotado pela fidelidade, que se o parlamentar perder o mandato por infidelidade, quem assumirá a vaga é outro suplente do partido e não mais o suplente da coligação, ofendendo diversos dispositivos constitucionais e fazendo, segundo Thales Tácito e Camila Medeiros (2008); “uma nota promissória de sangue”, favorecendo esses jogos e disputas pelo poder que ocorrem nos bastidores da República, ferindo o princípio da segurança jurídica, comprometendo seriamente a Democracia.

Grande parte dos parlamentares brasileiros é torpe, uma vez que pensam mais em seus interesses individuais, do que na ideologia e interesses do partido, bem com na opinião dos eleitores que os colocaram em seus cargos. Embora os infiéis não sejam os únicos vilões, pois muitos deixam seu partido por não encontrarem espaço dentro dele, sendo excluídos de suas decisões e posicionamentos, tendo muitas vezes suas candidaturas à reeleição inviabilizadas. Muitos diretórios são apropriados por famílias de políticos, não deixando os filiados opinarem sobre as decisões daquela instância partidária, muitas vezes deixando se filiar apenas funcionários para que possam ter total controle dos posicionamentos políticos.

Sendo desta forma, o Instituto da Fidelidade Partidária extremamente necessária para a manutenção da democracia e funcionamento dos partidos, garantindo participação das diversas correntes ideológicas existentes, sejam maioria ou minorias.

 

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Informações Sobre o Autor

 

Lucio Augusto Villela da Costa

 

Advogado, Mestrando em Direito Ambiental (UEA), Presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB/RR, ex-diretor da União Nacional dos Estudantes (UNE).

 


 

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