A regularização fundiária no loteamento Praiamar: Mecanismos e possibilidades

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Resumo: A análise da situação do Loteamento Jardim Praiamar, sua judicialização por meio de Ação Civil Pública a partir da sua não implantação por parte da empresa responsável e a perspectiva de resolução dos conflitos fundiários resultantes da ocupação desordenada do mesmo, passaram a exigir do Município de Itapema uma política pública de regularização e urbanização da área, que possui oficialmente 1319 lotes. Para tanto, propõe-se o envolvimento de vários atores sociais, tais como o Poder Público (Poder Executivo, Poder Judiciário, Ministério Público, Poder Legislativo), a sociedade organizada, os moradores, os proprietários e os investidores. Em cima deste problema foram reunidos elementos legais e doutrinários na busca de um método de resolução de conflitos individuais e coletivos e de formalização da área, concebendo um processo de urbanização e de acesso à Cidade sustentável para os moradores e proprietários do referido loteamento.


Palavras chave: loteamento Jardim Praiamar. Município de Itapema. Regularização fundiária. Estatuto das Cidades. Acesso à cidade sustentável.


Sumário: 1. Introdução; 2. O que é Regularização Fundiária; 3. O Objeto da Regularização; 4. As Diretrizes Aplicáveis à Regularização do Loteamento Jardim Praiamar; 5. Os Instrumento Legais: uma proposta concreta para o Loteamento Jardim Praiamar; 6. Conclusão; 7. Referências Bibliográficas.


1. Introdução


O Loteamento Jardim Praiamar no Município de Itapema é mais um de tantos loteamentos[1] realizados pelo Brasil a fora, que foram iniciados, mas que por uma série de fatores não foram concluídos, transformando-se em um passivo para a comunidade e para o Poder Público Local.


A situação específica do Loteamento Jardim Praiamar, no Município de Itapema, representa a ausência de mecanismos de controle efetivos e ágeis na legislação, bem como a incapacidade de municípios pequenos de efetivarem o controle sobre a implantação de loteamentos, parcelamentos e demais formas de ocupação do solo.


No entanto, esta incapacidade técnica não é o único da ausência de controle da implantação de loteamentos. Muitas irregularidades no parcelamento e ocupação do solo urbano também envolvem a prática corrupta de certos gestores (Prefeitos, Secretários e Vereadores) e empresários e proprietários que se beneficiam deste estado de ilegalidade gerado por eles mesmos[2].


Este passivo gerado à sociedade e, geralmente, assumido pelo Poder Público, necessita de mecanismos que possibilitem a regularização da área e que garantam o direito à moradia digna, à segurança da posse[3] e ao acesso à cidade para os moradores que ali residem, todos direitos que estão vinculados à implantação de equipamentos públicos para torná-los possíveis[4].


Assim, a intenção deste texto é efetivar o recorte dos instrumentos legais e doutrinários voltados para a situação atual do Loteamento Jardim Praiamar, demonstrando a realidade existente, sua fragilidade e a angústia da população, observando os problemas a serem enfrentados e propondo os mecanismos legais que deverão ser utilizados para a regularização do loteamento, isso sob o olhar e participação dos moradores e em comum acordo com os órgãos do Ministério Público e do Poder Judiciário da Comarca de Itapema. 


2. O que é Regularização Fundiária


Antes de mais nada, é necessário conceituar-se o que é regularização fundiária e o que se pretende com uma política pública como esta em um Município ou em uma de suas áreas, ou seja, estabelecer quais os objetivos pretendidos com esta política pública e como orientar os esforços para se comungar objetivos na construção de alternativas que buscam solucionar os problemas vivenciados pela Cidade de Itapema, principalmente pela população residente no Loteamento Jardim Praiamar.


Estes elementos devem, inicialmente, ser buscados na legislação vigente. Os parâmetros para a instituição de uma Política de Regularização Fundiária estão basicamente na Lei Federal nº 10.257/01 e na Lei Federal nº 11.997/09. Esta prescreve em seu art. 46:


“Art. 46 A regularização fundiária consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.”[5]


Simone Santos Moretto e Simone Somesi reafirmam este conceito, articulando-o sob o foco do direito de propriedade:


“Denomina-se regularização fundiária o processo de verificação da situação da propriedade e posse de áreas urbanas e rurais, públicas ou privadas. Pressupõe, portanto, uma utilização do território em condições que trazem dúvidas sobre direitos de propriedade e posse do local.”[6]


Por sua vez, o Manual de Regularização Fundiária em Terras da União, produzido pelo Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão e pelo Instituto Polis, prescreve dois aspectos centrais para a política pública de Regularização Fundiária:


“o jurídico – que visa garantir a segurança jurídica da moradia por meio da titulação -, e o urbanístico ambiental – que busca dotar os assentamentos/ocupações da infra-estrutura, garantindo assim, uma moradia digna e a preservação ambiental. Conjugando estes dois aspectos, a regularização fundiária pode ser considerada como ‘o processo de intervenção pública, sob os aspectos jurídicos, físico e social, que objetiva legalizar a permanência de populações moradoras de áreas urbanas ocupadas em desconformidade com a lei para fins de habitação, implicando melhorias no ambiente urbano do assentamento, no resgate da cidadania e da qualidade de vida da população beneficiária’ (AFONSIN, 1997).”[7]


Ainda no mesmo Manual, observa-se como objetivo da regularização fundiária a segurança da posse e a excepcionalidade da remoção dos ocupantes e moradores para outras áreas.


 “… a formalização jurídica da posse dos moradores garantindo sua permanência no local onde estabelecem suas residências, relações pessoais, subsistência, etc. O reassentamento deve ser uma medida excepcional a se adotada nos casos de ocupação em área de risco à vida ou à saúde dos moradores.”[8]


Fator relevante também para a política pública de Regularização Fundiária está na condição de a mesma conseguir obter mecanismos que bloqueiem novas irregularidades. Em face disto, tal política deve vir casada com outras, que permitam a leitura da Cidade como um todo.


“A Política de Regularização deve ser capaz de superar o circulo vicioso da irregularidade. Sendo uma política de caráter curativo, ela só terá sentido no planejamento das cidades se estiver combinada com uma política preventiva, capaz de alterar as regras do jogo imobiliário urbano, a exemplo da ocupação dos vazios urbanos para procurar novas moradias de interesse social. No caso da regularização de assentamentos informais, entende-se que os Programas de Regularização Fundiária devem contemplar ações de Regularização Jurídica referente a titulação dos terrenos, de forma articulada ao Plano de Urbanização, no qual se definem, por exemplo, os parâmetros arquitetônicos e de uso e ocupação dos solo compatíveis com as dimensões socioeconômicas e físico-ambientais das áreas de intervenção.”[9]


Assim, conclui-se que a política pública de Regularização Fundiária é um processo fundamentado na necessidade principal de garantir o direito de moradia, conjugando-se a necessidade de segurança jurídica[10] da posse ou da propriedade, para aqueles que não a possuem, objetivando incluir o local objeto da regularização na Cidade formal, permitindo a todos o acesso à Cidade, buscando melhores condições de vida para a população que ali reside.


3. O Objeto da Regularização


O Loteamento Jardim Praiamar está localizado em área urbana, à oeste da Rodovia BR 101, no Bairro Leopoldo Zarling, Município de Itapema, sendo de propriedade da Empresa Empreendimentos Praiamar Ltda.


O referido loteamento foi aprovado em 28 de março de 1979[11], resultando na constituição de 1319 (um mil trezentos e dezenove) lotes, com área total de 544.054,55 m², sendo destas 37.772,33m² de área de reserva. A esta área soma-se 146.508,65 m² de área pública[12].


Ocorre que o loteamento nunca foi totalmente efetivado, tendo uma série de carências, que vão desde vias e ruas projetadas não implantadas, até a não pavimentação de outras, a ausência de drenagem pluvial, de iluminação pública e de rede de água potável e vários lugares[13].


A quase totalidade destes lotes foram vendidos pela Empresa Praiamar Empreendimentos Imobiliários Ltda. a terceiros através de contratos de compromisso de compra e venda, na qual os adquirentes realizavam pagamentos parcelados dos imóveis que adquiriram, não efetivando ao término do pagamento a escrituração e a averbação na matrícula do imóvel.


Devido as ausências de infra-estrutura urbana, a forma de ocupação regular tornou-se prejudicada, o que desvalorizou os imóveis, permanecendo ainda o local com vários espaços vazios e outros espaços ocupados irregular ou indevidamente[14]. São poucas as áreas ocupadas com regularidade.


Neste sentido, para poder-se entender essa dinâmica de ocupações do solo não formais, pode-se absorver de José Afonso da Silva conceituação a respeito dos ditos “loteamentos irregulares”, ou seja, aqueles que não cumprem a legislação federal – Lei nº 6.66/79 – e a legislação local.


Esses loteamentos (sentido amplo) ilegais são de duas espécies: (a) os clandestinos, que são aqueles que não foram aprovados pela Prefeitura Municipal; (b) os irregulares, que são aqueles aprovados pela Prefeitura, mas que não foram inscritos, ou o foram mas são executados em desconformidade com o plano e as planta aprovadas.


O loteamento clandestino constitui, ainda, uma das pragas mais daninhas do urbanismo brasileiro. Loteadores parcelam terrenos de que, não raro, não têm título de domínio, por isso não conseguem aprovação do plano, quando se dignam a apresentá-lo à Prefeitura, pois é que sequer se preocupem com essa providência, que é onerosa, inclusive porque demanda a transferência de áreas dos logradouros públicos e outras ao domínio público. Feito o loteamento nessas condições, põem-se os lotes à venda, geralmente para pessoas de rendas modestas, que, de uma hora para outra, perdem seu terreno e a casa que nele ergueram, também clandestinamente, porque não tinham documentos que lhes permitissem obter a competente licença para edificar no lote. (…)


Os loteamentos irregulares constituem outro mal do sistema de parcelamento do solo, especialmente nas grandes cidades. Os loteadores, nesse caso, providenciam junto à Prefeitura a aprovação do seu loteamento e, depois de consegui-la, abandonam o caminho da legalidade e enveredaram pela ilegalidade, quer executando o loteamento tal como foi aprovado mas sem a inscrição no Registro de Imóveis, quer desrespeitando o plano aprovado e mesmo inscrito, modificando-a à sua conveniência, provocando dificuldades aos compradores de lotes, sob vários aspectos, inclusive quanto à obtenção de licença para edificá-los.”[15]


 Além do mais, o referido loteamento se encontra na área de influência da Bacia do Rio Perequê, sendo cortado aos fundos por um de seus afluentes, o Rio da Fita, tendo sido a referida área, por várias vezes, acometida por alagamentos.


Isso, de certa forma, demonstra que parte da área não deveria ter sido objeto de ocupação humana, muito menos de parcelamento do solo sujeito à venda.


Em função das irregularidades do referido loteamento, sobretudo no que se refere a ausência de infra-estrutura, a que seria obrigado o loteador, nos termos da Lei nº 6766/79, o Ministério Público e o Município de Itapema, no ano de 2004, propuseram em conjunto Ação Civil Pública com a intenção de obrigar o loteador, a Empresa Empreendimentos Praiamar Ltda., a concluir a implantação do loteamento e a efetivar todos os equipamentos públicos exigidos pela legislação.


Esta ação judicial, por sua vez, gerou uma decisão em 03 de junho de 2004 que indisponibilizou o patrimônio da Empresa Empreendimentos Praiamar Ltda., proibindo a realização de novos contratos de compromisso de compra e venda e a transferência de imóveis para terceiros[16].


No entanto, a única parte da decisão judicial proferida liminarmente nos autos nº 125.04.001170-8 que teve, até então, efeitos práticos foi a impossibilidade de transferência de imóveis pertencentes à Empresa Empreendimentos Praiamar Ltda. para os adquirentes e para terceiros, ou seja, todos aqueles que adquiriram imóveis da referida empresa no Loteamento Praiamar ficaram impossibilitados de formalizarem a transferência ou alienarem sua propriedade.


Essa indisponibilidade gerou uma série de outras ações, sobretudo Embargos de Terceiros, propostos pelos particulares adquirentes que sentiam-se prejudicados com a referida situação.


As demais ordens contidas na decisão judicial não puderam ser cumpridas até o presente momento principalmente porque não foi encontrado patrimônio em nome da Empresa loteadora, estando esta inativa, havendo dificuldades inclusive para intimá-la das decisões judiciais e em fazer a Empresa cumpri-la.


4. As Diretrizes Aplicáveis à Regularização do Loteamento Jardim Praiamar


 A Constituição Federal de 1988 apresenta um arcabouço normativo determinante para a atuação de diversos atores sociais na perspectiva de implementação de uma política pública voltada para a Regularização Fundiária. O direto fundamental à moradia (art.6º, caput), a função social da propriedade (art.5º, XXIII e art. 170, III) e a orientação dos arts. 182 e 183 da CF para a constituição das diretrizes gerais da Política Urbana, baseadas no planejamento[17], no bem estar dos habitantes e na função social da Cidade, determinou os marcos necessários para a criação de instrumentos legais que possibilitem a regularização de áreas públicas e privadas e que tenham sido objeto de ocupação desordenada.


Além da Constituição, as diretrizes e os instrumentos legais que estão à disposição das Políticas Públicas de Regularização Fundiária estão basicamente enumerados na Lei nº 10.257/01 (Estatuto da Cidade), na Medida Provisória nº 2.220/01e na Lei nº 11.977/09.


Existem ainda legislações e atos administrativos estaduais e municipais que merecem ser citadas como esforço desse processo de regularização. No Estado de Santa Catarina o Poder Judiciário emitiu o Provimento nº 37/99 da Corregedoria de Justiça e a Resolução 011/08 do Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, ambos instituindo o Projeto “Lar Legal”, objetivando a regularização do parcelamento do solo urbano.


No caso concreto ora sob estudo algumas diretrizes e alguns destes instrumentos legais devem ser enumerados e explicitados, para que sejam melhor analisados e para que se possa chegar a uma adequada proposta para a regularização do Loteamento Jardim Praiamar[18].


É certo que todas as diretrizes previstas na Constituição e, principalmente, no Estatuto das Cidades (art. 2º da Lei n° 10.257/01) devem ser levadas em consideração no processo de regularização do Loteamento Jardim Praiamar. Porém, algumas merecem destaque especial, relacionadas no caput do art. 2º, da Lei nº 10.257/01, e nos incisos I, II, IX e XIV, do referido artigo).


A busca de um método para regularizar o Loteamento Jardim Praiamar precisa incorporar inicialmente a garantia do direito dos moradores e proprietários daquela localidade à cidade sustentável, entendida pelo próprio Estatuto das Cidades como o “… o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações.”[19]


“A cidade, como espaço onde a vida moderna se desenrola, tem suas funções sociais: fornecer às pessoas moradia, trabalho, saúde, educação, cultura, lazer, transporte etc. Mas, como o espaço da cidade é parcelado, sendo objeto de apropriação, tanto privada (terrenos e edificações) como estatal (ruas, praças, equipamentos etc), suas funções tem de ser cumpridas pelas partes, isto é, pelas propriedades urbanas. A política urbana tem, portanto, a missão de viabilizar o pleno desenvolvimento das funções sociais do todo (a cidade) e das partes (cada propriedade em particular).”[20]


 Outra diretriz imprescindível para se permitir o acesso à cidade sustentável, no processo de regularização, é a participação dos cidadãos, principalmente dos moradores da localidade que se está pretendendo regularizar (art. 2º, II, Lei nº 10.257/01).


A gestão democrática é uma forma de os moradores de toda a Cidade, mas principalmente das áreas historicamente excluídas, se inserirem na organização da Cidade sustentável, é uma forma de dar acesso à Cidade a quem não tem e de permitir que problemas antigos sejam realmente resolvidos, já que diagnosticados e analisados por quem de fato os sente.


“… o planejamento urbano não deve ser idealizado em gabinete e posteriormente aplicado à realidade urbana, sendo indispensável a participação da população, seja de maneira individual, seja de maneira coletiva, por meio, por exemplo de organizações não-governamentais. A diretriz envolve a legitimidade do conjunto de decisões políticas que compõe o planejamento urbano e também sua eficiência, pois quando há convergência de vontades para compor o plano também há convergência de interesses para cumpri-lo.”[21]


No processo de gestão democrática da cidade está incluso a necessidade de cooperação entre governos, a iniciativa privadas e os demais setores da sociedade (art.2º, III), bem como a audiência do Poder Público municipal e da população interessada no processo de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos (art. 2º, XIII).


Como complementação da gestão democrática, na busca da cidade sustentável de acesso à todos, está a “… justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização” (art. 2º, IX). Essa justiça só ocorrerá se houver a real participação de todos os interessados na vida da cidade.


Decorrente do princípio da isonomia, esta justa distribuição possui o intuito de fazer com que todos os moradores da Cidade tenham acesso aos benefícios que a mesma possa oferecer, mas que também arquem com os ônus que esses benefícios podem acarrear. Esta regra se completa com as diretrizes previstas no inc. IV, V, VI, “c”, “d” e “e”, XV e XVI, do art. 2º da Lei nº 10.257/01.


Por fim, na constituição da Cidade sustentável e do acesso de todos a mesma e aos seus benefícios, está a regra que propõe como diretriz a regularização e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda.


Essa norma específica, também decorrência da isonomia e da busca da função social da cidade, é proveniente de um passivo gigantesco existentes na maioria dos Municípios brasileiros e que decorre do processo de urbanização desordenada dos mesmos[22].


A análise destas diretrizes é imprescindível para que se possa compreender que o processo de regularização de uma área não se resume apenas à titulação desta à seus possuidores, com o objetivo de garantir a segurança jurídica e a segurança da posse. Ela envolve vários outros fatores que complementam o direito de todos à Cidade e que estão presentes no Estatuto das Cidades.


5. Os Instrumento Legais: uma proposta concreta para o Loteamento Jardim Praiamar


Como mencionado no tópico anterior, os instrumentos legais que estão à disposição das Políticas Públicas de Regularização Fundiária estão basicamente enumerados na Lei nº 10.257/01 (Estatuto das Cidades), na Medida Provisória nº 2.220/01e na Lei nº 11.977/09 e.


A Lei nº 11.997/09 além de conceituar a política pública de regularização fundiária, cria mecanismos para implementá-la, além de conceituar outros instrumentos para seu alcance.


Os instrumentos presentes nesta lei estão enumerados em seu art. 47, devendo-se dar ênfase, diante da realidade do Loteamento Jardim Praiamar à “demarcação urbanística”[23], à “legitimação de posse”[24] e à “Zona Especial de Interesse Social”[25].


A perspectiva de regularização envolve o encadeamento destes instrumentos, com outros previstos no Estatuto das Cidades e na Medida Provisória 2.220/01, quais sejam o “usucapião especial individual”[26], “o usucapião especial coletivo”[27], a “concessão de uso especial para fins de moradia”[28] e a “concessão de direito real de uso”[29].


Outro instrumento que fatalmente será utilizado e que merece uma análise pormenorizada é a “operação urbana consorciada”[30]. O fato de o Loteamento Jardim Praiamar não está totalmente ocupado e necessitar de implantação de vários equipamentos públicos, bem como o fato de se observar que existem proprietários de vários lotes no referido loteamento, permite que se pense na possibilidade de constituir um consórcio entre a Administração Pública, os proprietários, investidores e moradores da área. 


Desta forma, em razão da judicialização do problema e em função da responsabilidade legal, a atuação inicial deve ser do Poder Público que deverá constituir uma equipe técnico-política que fique responsável pela organização dos trabalhos desencadeados no que se refere à regularização fundiária.


Esta equipe terá a responsabilidade de coordenar os debates com a sociedade e com os moradores[31], proprietários e investidores, além de articular as demais equipes técnicas do Município e órgãos envolvidos.


 Constituída a organização da equipe que conduzirá os trabalhos, o primeiro ato desta é a realização da demarcação urbanística da área, através da constituição de um levantamento planialtimétrico do local físico do Jardim Praiamar, com a divisão da área de acordo com sua atual ocupação. Isso poderá ser feito pelo poder público ou em consórcio com os moradores, proprietários e investidores.


Junto a isto, é necessário que haja no âmbito municipal legislação municipal específica que institua no âmbito do Município alguns destes institutos legais abordados neste trabalho e a forma como serão concretizados, com o próprio Estatuto das Cidades o exige.


Nessa realidade legislativa municipal, imprescindível também a alteração e flexibilização dos padrões de ocupação do solo previstos na regra geram da Cidade, criando mecanismos específicos aplicáveis ao local, que permitam também a regularização das obras já construídas, o que deverá ocorrer através da transformação de todo o Loteamento Jardim Praiamar em uma Zona Especial de Interesse Social (ZEIS).


Por sua vez, em função da judicialização da questão, toda esta composição inicial e suas derivações deverão estar previstos em um acordo homologado judicialmente na Ação Civil Pública (autos nº 125.04.001170-8), acordo este que deverá ser realizado entre o Município e o Ministério Público.


Deverá estar presente como cláusula do acordo judicial a constituição do aparato legal municipal, a realização da demarcação urbanísticas e algumas ações de reconhecimento de titularidade definitivas e provisórias do espaço urbano, tais como:


1ª) a permissão do registro dos contratos particulares ou escrituras públicas de todos os adquirentes de imóveis diretamente da Empresa Loteadora;


2ª) a atribuição de títulos de legitimação de posse para todos aqueles que possuírem contratos particulares de compra e venda ou similares de lotes da área, de acordo com a demarcação anteriormente realizada[32];


3ª) a atribuição de títulos de concessão de direito real de uso ou de concessão especial de uso para fins de moradia para os ocupantes de áreas públicas que se enquadrarem nos critérios prescritos na legislação municipal.


Outras duas circunstâncias podem ocorrer que não estão relacionadas na regra construída anteriormente, ou seja, os conflitos individuais entre possuidores ou entre estes e os promitentes compradores e o abandono de imóveis pelos proprietários, constatado na ausência de promitentes compradores em reivindicar a titularidade de áreas sem qualquer ocupação.


No primeiro caso, pouco pode ser feito na realidade da regra gera, senão prever a garantia dos direitos individuais de promitentes compradores e de possuidores, que deverão ser resolvidos no caso concreto.


Quanto aos imóveis abandonados, sugere-se que o Município de Itapema os arrecade[33] para seu patrimônio com a perspectiva de manter a implantação do loteamento, de renegociá-los e de garantir, com isso, recursos para a urbanização da área.


Esta arrecadação deverá ocorrer em prazo certo, com a possibilidade de todos os proprietários e adquirentes de apresentarem anteriormente seus títulos de os terem reconhecidos pelos novos responsáveis pela implantação do loteamento.


As operações consorciadas e os planos de urbanização específicos de cada área deverão instituir formas de contribuição de moradores, proprietários e investidores, de acordo com seus padrões econômico-sociais. O intuito destas contribuições deverá ser exclusivamente a realização da urbanização da área.


Assim, após o assentamento e titulação de todos os moradores da área e dos proprietários, deverá o Município, através da administração direta, indireta, ou através de dos concessionários de serviços públicos ou ainda de operações urbanas consorciadas, estabelecer um Plano de Urbanização, com as respectivas metas de realização, para garantir a diretriz prevista no art. 2º, I, da Lei nº 10.257/01.


6. Conclusão


A realidade do Loteamento Jardim Praiamar não é diferente daquela de milhares de outros loteamentos não concluídos, áreas ocupadas clandestinamente, invasões, etc, existentes pelo Brasil a fora.


A demanda habitacional e a concentração de terra no Brasil fizeram com que um grande número de pessoas, sobretudo de baixa renda, tivessem que “optar” por moradias em locais de risco ou sem estrutura, diante do custo da terra e da própria habitação.


Na cidade de Itapema esse problema se agrava em muito, já que se trata de uma cidade com pequena área de terra, localizada no litoral de Santa Catarina, na qual o valor da terra é relativamente alto e a especulação imobiliária é muito forte.


Além do mais, este fato se agrava quando se observa que a habitação na cidade de Itapema é concebida como mercadoria e não como direito fundamental à moradia, o que encarece mais ainda o custo da moradia.


Isso acarreta um passivo enorme para o Poder Público local, em relação aos serviços e equipamentos públicos que devem estar à disposição da comunidade residente e da população flutuante, que varia de aproximadamente 40.000 (quarenta mil) pessoas em baixa temporada, para mais de 400.000 (quatrocentas mil) nos momentos de pico da alta temporada.   


Somado a estes fatores conjunturais, segue-se um crescente fluxo migratório que gerou um aumento populacional de cerca de 200% nos últimos 10 (dez) anos.


Como se não bastasse todas estas variáveis, o Município de Itapema sofreu de inúmeros desgovernos e de uma casta política extremamente inoperante e corrupta, que permitiu as mais variadas barbáries contra os cidadãos e contra a Cidade.


Casada a esta dinâmica própria local, está o novo perfilhamento das cidades modernas, que se apresentam como “único” âmbito das relações humanas, como constituintes do direito à vida em sociedade e como local de solução de todos os problemas individuais e coletivos[34].


Desta forma, qualquer instrumento de regularização que se implante, deverá acarretar esforços conjuntos de todos os órgãos públicos envolvidos, em conjunto com a sociedade civil e com os reais interessados, os moradores que sofrem diariamente com problemas dos mais variados, que vão desde a insegurança constante de suas moradias, até a impossibilidade de realizarem simples ligações de água e luz.


 


Referência bibliográficas

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Notas:

[1] “Considera-se loteamento a subdivisão da gleba em lotes destinados à edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes.” (BRASIL, Lei nº 6.766/79. Art. 2º, §1º pesquisado em HTTP://www.presidencia.gov.br em 12.03.2010, às 15:00). MORETTO, Simone Santos e SOMENSI, Simoni em artigo intitulado “Loteamentos irregulares e clandestinos: sua regularização no Município de Porto Alegre” publicado na Revista de Interesse Público n°45, set./out. de 2007, pela Editora Fórum, esclarece que loteamento “é uma das formas de parcelamento do solo urbano, com desmembramento da área em lotes e abertura de nova vias de circulação. Pela Lei Federal nº 6.766/79, o loteador é obrigado a elaborar projeto de loteamento, aprová-lo perante os órgãos municipais e depois registrá-lo no cartório imobiliário, além de ser obrigado a realizar as obras de infraestrutura. Somente após o cumprimento destas etapas é possível iniciar a comercialização dos lotes. A Lei Federal nº 6.766/79 define lote como terreno servido de infraestrutura básica cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos pelo plano diretor. Infraestrutura básica, por sua vez, são os equipamentos urbanos de escoamento de águas pluviais, redes de esgoto sanitário e abastecimento de água potável, energia elétrica pública e domiciliar e vias de circulação.” (p.228)

[2] Geralmente estes locais ficam vulneráveis a práticas clientelistas por parte de lideranças políticas, constituindo currais eleitorais. Muitos destes espaços urbanos, constituídos de areas públicas e privadas, são ocupados indevidamente, com a chancela de autoridades constituídas.

[3] “A segurança da posse é um ponto central do direito à moradia e à terra pois sem ela – independentemente se formal ou informal – o direito à moradia vai estar em permanente ameaça, e o risco de despejo ou deslocamento forçado será sempre iminente. A segurança da posse, por se tratar de elemento central do direito humano à moradia, deve ser assegurada a todos, com igualdade e sem discriminação, abrangendo todos os indivíduos e famílias independentemente de idade, status econômico, grupo ou outra filiação e status.” (AFONSIN, Betânia de Moraes; FERNANDES, Edésio. Direito à moradia e segurança da posse no Estatuto da Cidade: diretrizes, instrumentos e processos de gestão. Belo Horizonte: Fórum, 2006. p.35)

[4] “Art. 2º A política urbana tem por objeto ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais: I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como direito à terra urbanizada, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações.” BRASIL, Lei nº 10.257 de 10 de julho de 2001 pesquisada em 17.03.2010 em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10257.htm às 15:45.

[5] BRASIL, Lei nº 11.997 de 7 de julho de 2009 pesquisada em  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11977.htm às 19:06.

[6] MORETTO, Simone Santos e SOMENSI, Simone. Loteamentos irregulares e clandestinos: sua regularização no Município de Porto Alegre. Revista de Interesse Público, n°45, set./out. de 2007. Fórum, 2007. p.225.

[7] BRASIL, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e Instituto Polis. Manual de Regularização Fundiária em Terras da União.. p.D:62.

[8] Idem.

[9] BRASIL. Ministério das Cidades. Plano diretor participativo: guia para elaboração pelos Municípios e cidadãos. 3ª Ed. Coordenação Geral de Raquel Rolnik e Otilie Macedo Pinheiro. Brasília: Ministério das Cidades: Confea, 2008. p.84

[10] “A segurança jurídica é um cânone presente em qualquer ordenamento jurídico de veia democrática, sendo possível visualizá-lo a partir de certos institutos presentes no sistema, tais como, o direito adquirido, a coisa julgada, o contraditório, o devido processo legal, o direito de propriedade, entre vários outros.” (COSTA, José Marcelo Ferrerio. Licenças urbanísticas. Belo Horizonte: Fórum, 2004. p.28)

[11] Trata-se de data informada pela Secretaria de Gestão Urbana do Município de Itapema. No entanto, deve-se ressaltar que existem outros documentos com outras datas, o que permite concluir a hipótese de o loteamento ter sido aprovada com data retroativa ao momento em que de fato foi iniciado, com intuito de burlar as exigências nascidas com a Lei Federal nº 6.766/79, publicada em 20 de dezembro de 1979.  

[12] BRASIL, Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Poder Judiciário da Comarca de Balneário Camboriú: 2º Ofício de Registro de Imóveis. Livro2, f.1, Matrícula 2482.

[13] “Los asentamientos informales son particularmente vulnerables a los desastres naturales debido a su locación (áreas de inundación, laderas inclinadas que puden derrumbarse) y bajos estándares de infraestructura, comodidades y servicios básicos. Más allá de esto, los habitantes de asentamientos informales tienden a pertenecer a grupos de bajos ingresos y tienen menos oportunidades de reducir el impacto de desastres. Para mejorar la calidad de vida de las áreas urbanas, los esfuerzos deben enfocarse a reducir la pobreza y los problemas medioambientales de los sectores más vulnerables de la sociedad.” (NAÇÕES UNIDAS, Antecedentes 7: Asentamientos humanos y desarrollo sostenible. In http://www.un.org/Pubs/CyberSchoolBus/spanish/cities/ebg7.htm acessado em 7.1.2010 às 22:29).

[14] Para fins deste estudo serão divididas as formas de ocupação irregular do loteamento Praiamar em duas: as “ocupações irregulares estrito sensu” e as “ocupações indevidas”. As primeiras provenientes de proprietários adquirentes de lotes da Empresa Empreendimentos Praiamar Ltda., que não conseguiram realizar a transferência e o registro dos mesmos, devido ao embargo judicial proveniente de decisão liminarmante proferida nos autos da Ação Civil Pública n° 125.04.001170-8. As segundas, denominadas “ocupações indevidas”, serão consideradas aquelas que foram realizadas pura e simplesmente por invasões ou que foram resultado de aquisição, por contrato de compra e venda, de possuidores não proprietários.

[15] SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileiro. 4ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p.344.

[16] BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarian, Ação Civil Pública nº 125.04.001170-8, Comarca de Itapema, disponível em http://itapema.tj.sc.gov.br/cpopg/pcpoResultadoPG.jsp in 10.03.2010 às 16:00. Ìntegra da decisão: “O MINISTÉRIO PÚBLICO e o MUNICÍPIO DE ITAPEMA, ajuizaram a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA contra PRAIAMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁIROS LTDA., em síntese, sob os seguintes argumentos:A requerida promoveu o desmembramento de área de terra de 759.706,04 m., o qual designou DESMEMBRAMENTO PRAIAMAR ITAPEMA, e promoveu a venda de inúmeros lotes, sem infra-estrutura no local. Informa que o representante legal da ré é de paradeiro ignorado, e a área está em absoluto abandono, o que gera inúmeras invasões de terra criando bolsões de pobreza, com ocupação desordenada do solo, edificação de barracos, instalação de ‘gatos’ para puxar energia elétrica, com fiação ao alcance de crianças; e, ainda, ocasionando degradação ao meio-ambiente pela falta de rede de água e esgoto. O loteamento, assim como se apresenta, ainda impede que a Administração Muncipal efetive o traçado urbano, e paralelamente os ocupantes estão construindo casas em lotes ilegais, perfuram poços para a captação de água nas proximidades de fossas negras, formando focos de sujidade próprios à proliferação de transmissores de doenças, mau cheiro e poluição, infiltração de chorume no solo, comprometendo o lençol frático.Os ocupantes dos lotes veem de outras cidades, atraidos pela propaganda informal e os adquirem a preço módico sem preocupação com a regularidade do loteamento, que, aduz a inicial, é uma fraude, pois utilizado expediente visando mascarar a implantação do loteamento, sob a pecha de ‘desmembramento’. A preocupação do Ministério Público e do Município procede e os problemas levantados na inicial com a consequencias nefastas para o meio-ambiente e para a comunidade, estão demosntrados pela prova documental de forma escorreita, e ademais, a problemática deste loteamento não passa desapercebida na comunidade e também à esse Juízo, e portanto, é evidente a necessidade de que as requeridas providências devem ser tomadas de plano, haja vista a periculosidade e o agravamento da situação a cada dia que passa, e ainda, diante da noticia de que a ré e seus representantes evadiram-se da cidade.A situação do loteamento Praiamar é crítica, tanto para os moradores que estão habitanto em local sem qualquer condição de salubridade, quanto para todos os munícipes e frequentadores deste pólo turístico, pois o foco de insalubridade está impactando o meio ambiente, notadamente o lençol freático, colocando em risco prinncipalmente a água da nossa comunidade Destarte, os pedidos liminares devem de deferidos de plano: 1. Intimar a ré para que se abstenha de efetuar qualquer retomade de imóvel, a não ser por ordem judicial 2. Intimar para a ré se abster de realizar novos contratos, e doravante receber quaisquer valores , até o julgamento da presente.3. Fixo o prazo de 60 dias para a ré regularizar o loteamento, apresentanto em juízo projeto completo com memorial para apreciação do Poder Público..4. Fixar em 30 dias a desocupação dos lotes que cercam o Rio da Fita, promovendo a imediata limpeza do rio com a autorização e planejamento do órgão ambiental responsável.5. Ultrapassado o prazo de 60 dias, sem o cumprimento do item 3, fica a Administração Municipal autorizada a promover as obras urgentes de infra-estrutura, sob as expensas da ré.6. Face a extensão do dano já ocorrido, presumível à olho nú, e os que ainda correm risco potencial, todos a serem futuramente objeto de perícias, defiro o pedido para decretar a indisponibilidade dos bens da ré e dos seus sócios, visando garantir o ressarcimento dos danos que serão apurados e tornando útil a demanda.7. Sob os mesmos argumentos, defiro a quebra de sigilo bancário da empresa ré, oficiando-se as casas bancárias da Comarca e ao Banco Central, estribando a decisão, também no fato de que há noticias de que o endereço da ré é ignorado, tudo na forma requerida no item 1, de fls. 29 da inicial. 8.Defiro a quebra do sigilo fiscal, devendo ser oficiada a Receita Federal requisitando-se cópias das declarações de renda dos últimos cinco anos, bem como de seus sócios.9. Defiro o pedido para determinar a arrecadação de todos os bens pertencentes à demandada, para a garantia de futuras indenizações aos consumidores lesados e ao erário público, na forma do art. 12 da Lei 7347 de 1985.10. Oficie-se a Junta Comercial do Estado para requisitando-se cópias do contrato social da ré. 11. Oficiem-se: os Cartórios Imobiliários de Itapema e Bal. Camboriú e ao DETRAN, empresas de telefonia, para que informem a existência de bens ou ações em nome da ré e seus sócios, bem como sejam vedadas quaisquer transferências de bens ou cessões de direitos à terceiros.12. Oficie-se à Corregedoria Geral de Justiça comunicando a indisponibilidades de bens da ré e seus sócios, para que todos os Registros de Imóveis sejam comunicados. 13. Defiro o item 6, fls. 30, para determinar a suspensão das atividades da ré no Município, tudo com fulcro no art. 84 parágrafo 5 do Código do Consumidor, e desta forma impedir a atividade nociva da empresa na Comarca.14.Publique-se via Diário Oficial a presente decisão a fim de que chegue ao conhecimento de todos a indisponibilidade de bens da ré e a suspensão provisória das atividades da ré.

[17] “O instrumento previsto constitucionalmente para planejar e implantar o conteúdo das funções sociais da cidade é o plano diretor, instrumento básico da política de desenvolvimento urbano. Esse instrumento é essencial à política urbana, na medida em que deve especificar as exigências fundamentais a seres atendidas pelas cidades, determinando qual o papel que cada cidade deve desempenhar para que se torne eficiente aos seus cidadãos.” (SANT’ANNA, Mariana Senna. Estudo de impacto de vizinhança: instrumento de garantia de qualidade de vida dos cidadãos urbanos. Belo Horizonte: Fórum, 2007.p.84)

[18] É importante citar que uma das diretrizes do Estatuto das Cidades e que está prescrita no inc. XIV, art. 2º, da Lei nº 10.257/01 é a matriz permissiva e ordenadora de qualquer política pública de regularização fundiária.

[19] BRASIL, Lei nº 10.257 de 10 de julho de 2001 pesquisada em 17.03.2010 em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10257.htm às 15:45.

[20] DALLARI, Adilson Abreu e FERRAZ, Sérgio. Estatuto da Cidade: comentários à Lei Federal 10.257/2001. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 54)

[21] DEXHEIMER, Marcus Alexsander. Estatuto da Cidade e Democracia Participativa. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2006. p.150-151.

[22] “A falta de acesso à moradia digna na América Latina está associada ao padrão de urbanização e desenvolvimento das cidades, cujo crescimento, desordenado e excludente, intensificou-se na partir da metade do século XX, impulsionado pelo processo migratório do campo pelo início da industrialização. O surgimento e o desenvolvimento dos assentamentos informais na América Latina se deve a uma série de causas de naturezas distintas, mas que se relacionam diretamente com o problema da desigualdade social, econômica e política.” (AFONSIN, Betânia de Moraes; FERNANDES, Edésio. Direito à moradia e segurança da posse no Estatuto da Cidade: diretrizes, instrumentos e processos de gestão. Belo Horizonte: Fórum, 2006. p.27)

[23] “Art. 47 (…) III – demarcação urbanística: procedimento administrativo pelo qual o poder público, no âmbito da regularização fundiária de interesse social, demarca imóvel de domínio público ou privado, definindo seus limites, área, localização e confrontantes, com a finalidade de identificar seus ocupantes e qualificar a natureza e o tempo das respectivas posses;” in BRASIL, Lei nº 11.997 de 7 de julho de 2009 pesquisada em  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11977.htm às 19:06.

[24] “Art. 47 (…) IV – legitimação de posse: ato do poder público destinado a conferir título de reconhecimento de posse de imóvel objeto de demarcação urbanística, com a identificação do ocupante e do tempo e natureza da posse;” in BRASIL, Lei nº 11.997 de 7 de julho de 2009 pesquisada em  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11977.htm às 19:06.

[25] “Art. 47 (…)V – Zona Especial de Interesse Social – ZEIS: parcela de área urbana instituída pelo Plano Diretor ou definida por outra lei municipal, destinada predominantemente à moradia de população de baixa renda e sujeita a regras específicas de parcelamento, uso e ocupação do solo;” in BRASIL, Lei nº 11.997 de 7 de julho de 2009 pesquisada em 16.03.2010, em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11977.htm às 19:06.

[26] “Art. 9o Aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.” In BRASIL, Lei nº 10.257 de 10 de julho de 2001 pesquisada em 17.03.2010 em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10257.htm às 15:45.

[27] “Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.” In BRASIL, Lei nº 10.257 de 10 de julho de 2001 pesquisada em 17.03.2010 em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10257.htm às 15:45.

[28] “Art. 1o  Aquele que, até 30 de junho de 2001, possuiu como seu, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinqüenta metros quadrados de imóvel público situado em área urbana, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, tem o direito à concessão de uso especial para fins de moradia em relação ao bem objeto da posse, desde que não seja proprietário ou concessionário, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural.”

“Art. 2o  Nos imóveis de que trata o art. 1o, com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados, que, até 30 de junho de 2001, estavam ocupados por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por possuidor, a concessão de uso especial para fins de moradia será conferida de forma coletiva, desde que os possuidores não sejam proprietários ou concessionários, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural.” In BRASIL, Medida Provisória nº 2.220 de 4 de setembro de 2001 pesquisado em 17.03.2010 em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/2220.htm às 16:00.

[29] “A concessão de direito real de uso, outro instrumento de utilização de bem público dominical por particular, foi instituída pelos artigos 7º e 8º do Decreto lei nº 271, de 28-2-67, que, com as alterações introduzidas pela Lei 11.481/07, dispões sobre loteamento urbano, responsabilidade do loteador, concessão de uso do espaço aéreo e dá outras providências.(…)

Caracteriza-se por ser direito real resolúvel, que se constitui por instrumento público ou particular; ou por simples termo administrativo, sendo inscrito e cancelado em livro especial (art. 7º, §1º); pode ser remunerada ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado; a sua finalidade só pode ser a que vem expressa no art.7º, caput (com redação dada pela Lei nº 11.481/07), a saber: regularização fundiária de interesse social, urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras modalidades de interesse social em área urbanas.” (DI PIETRO, Maria Silvia Zanella. Direito Administrativo. 21.ed. São Paulo: Atlas, 2008. p.664)

[30] “Art. 32 (…) §1º Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, como o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental.” In BRASIL, Lei nº 10.257 de 10 de julho de 2001 pesquisada em 17.03.2010 em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10257.htm às 15:45.

[31] “A plena realização da gestão democrática é, na verdade, a única garantia de que os instrumentos de política urbana introduzidos, regulamentados ou sistematizados pelo Estatuto da Cidade (tais como o direito a preempeção, o direito de construir, as operações consorciadas etc.) não serão meras ferramentas a serviço das concepções técnicas, mas, ao contrário, verdadeiros instrumentos de promoção do direito à cidade para todos, sem exclusões.” (DALLARI, Adilson Abreu e FERRAZ, Sérgio. op. cit. p.337)

[32] Na hipótese vinculada às relações possessórias poderá haver ainda, à escolha dos possuidores, a resolução dos problemas de insegurança e moradia, mediante ações de usucapião individual ou coletivo. Para tanto, poder-se-ía promover, como forma de contribuição para a regularização fundiária, um convênio entre o Município de Itapema, a Ordem dos Advogados do Brasil e o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura para assessorar os moradores nesta empreitada.

[33] O Código Civil, na visão privatista, institui o instrumento da arrecadação. Art. 1.276. O imóvel urbano que o proprietário abandonar, com a intenção de não mais o conservar em seu patrimônio, e que se não encontrar na posse de outrem, poderá ser arrecadado, como bem vago, e passar, três anos depois, à propriedade do Município ou à do Distrito Federal, se se achar nas respectivas circunscrições.” BRASIL. Código Civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002 pesquisado em 22.03.2010 em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm às 17:30. No entanto, a concepção urbanística não se coaduna com a dinâmica instituída por esta regra do Código Civil. Assim, é necessário implantar-se dinâmica que respeite a especificidades da lei de parcelamento do solo urbano e do Estatuto das Cidades.

[34] “… a cidade ganha uma nova dimensão e um novo papel, mediante uma vida de relações também renovada, cuja densidade inclui as tarefas ligadas à produção globalizada. Por isso, a cidade se torna o lugar onde melhor se esclarecem as relações das pessoas, das empresas, das atividades e dos ‘fragmentos’ do território com o país e com o ‘mundo’.” (SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 5.ed. Rio de Janeiro: Record, 2001. p.95)


Informações Sobre o Autor

Evaldo José Guerreiro Filho

Advogado, Especialista em Direito Público pelo Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina (CESUSC), Bacharel em Dirieto pela Universidade Federal de Santa Catarina, Secretário de Governo e Planejamento Estratégico do Município de Itapema/SC


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