Controle jurisdicional dos atos adminsitrativos

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Resumo: O presente trabalho visa a analisar o controle dos atos administrativos pelo poder judiciário, cuja evolução, resultado da dinâmica social, levou os doutrinadores e os aplicadores do direito a entendimentos diversos. Para um melhor entendimento desse fenômeno indispensável à verificação dos avanços doutrinários e jurisprudenciais, no sentido de demarcar o tema. As discussões contemporâneas renovam e redimensionam a problemática de ser ou não possível este controle e em quais casos ele é admitido. A monografia objetiva resgatar questões importantes a partir do método hermenêutico, na busca de uma regulamentação que atenda aos reclamos sociais. A leitura deste trabalho se torna importante pr se tratar de um tema muito polêmico e menos compreendido por muitos que não ousaram estudá-lo com afinco. Para a pesquisa foi utilizado o método de compilação, em livros e em consultas à internet.

Palavras-chave: ato administrativo, controle jurisdicional.

Abstract: The following essay intends to analyze the control of the administrative acts made by the judiciary branch, which leads the law instructor to various understandings. In order to a better understanding of this phenomenon, which is essential to the doctrine improvement, intending to define the topic. The contemporary discussions renovate and dimension the question of the possibility of the control and in which cases it is admitted. This essay intents to rescue questions starting from the hermeneutic method, trying to reach a regulation that attends the social needs. The reading of this essay is interesting because it´s about a very polemic theme and less comprehended by many who didn´t dare to study it deeply. For the research, it was used the compilation through books and internet searches.

Key words: administration act, jurisdictional control.

Sumário: Introdução. 1. Ato administrativo. 1.1. Conceito. 1.2. Requisitos do ato administrativo. 1.2.1 Competência. 1.2.2 Finalidade. 1.2.3 Forma. 1.2.4 Motivo. 1.2.5 Objeto. 1.2.6 Perfeição, Validade e Eficácia. 1.3. Atributos do ato administrativo. 1.3.1 Presunção de Legalidade. 1.3.2 Imperatividade. 1.3.3 Auto-Executoriedade. 1.3.4 Tipicidade. 1.4. Histórico da divisão dos atos administrativos. 1.5. Legalidade e mérito do ato administrativo. 1.6. Motivação dos atos administrativos. 1.7 Invalidação dos atos administrativos. 2. Controle do ato administrativo pelo poder judiciário. 2.1. Separação dos Poderes. 2.2. Sistemas de controle jurisdicional. 2.. Alcance do controle jurisdicional. 2.4. Possibilidade deste controle em relação aos atos administrativos. 3. Posições jurisprudenciais acerca controle jurisdicional sobre os atos administrativos.3.1 Posições Doutrinárias. 3.2 Posições Jurisprudenciais. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

A busca por instrumentos que possam impor limites ao exercício do poder, submetendo-o à vontade popular tem por finalidade condicionar a atuação do poder à exigência da busca do interesse público.

Neste contexto, começa a surgir no direito brasileiro forte tendência no sentido de limitar-se ainda mais a discricionariedade administrativa, de modo a ampliar-se o controle judicial. Essa tendência que se observa na doutrina e jurisprudência não implica invasão na discricionariedade administrativa, mas sim visa impedir as arbitrariedades que a Administração Pública pratica sob a pretensão de agir discricionariamente.

Busca-se, a partir deste novo entendimento, impor ao agente público, quando no exercício de suas competências , a observância dos objetivos preconizados em lei. Assim, toda a atuação da Administração está vinculada aos limites da lei.

Assim, embora se entenda que ao juiz não é dado adentrar a esfera administrativa de oportunidade e conveniência, é certo que este entendimento vem a cada dia sendo objeto de flexibilização, porquanto muitas situações fáticas evidenciam que não pode o Poder Judiciário quedar-se de sua função de examinar e resolver lesões a direitos, sob o escudo da intangibilidade do mérito administrativo.

O presente trabalho visa apresentar, através da análise doutrinária e jurisprudencial, o novo entendimento segundo o qual o Poder Judiciário pode rever todos e quaisquer atos administrativos, diante do mandamento constitucional. De que nenhum ato do Poder Público poderá ser extraído do exame judicial. Para isso estudaremos conceito, requisitos e classificação dos atos administrativos e faremos uma profunda análise sobre possibilidade deste controle judicial dos atos administrativos.

1 – ATO ADMINISTATIVO

O ato administrativo surge como uma espécie de ato jurídico. Este último encontra-se disciplinado pelo Código Civil em vigor, em seu artigo 185. Assim, entende-se que ato é todo ato lícito, praticado com o fim imediato de adquirir, transferir, resguardar, modificar ou extinguir direitos. Este ato será um ato jurídico se atingir a órbita legal. Se este acontecimento atinge especificamente o Direito administrativo tratar-se-á um ato administrativo.

Ato administrativo é espécie do gênero ato jurídico. Com efeito. O Estado, a persecução dos seus objetivos, realiza multiplicidade de atos através de seus agentes, que exteriorizando a vontade Estatal, realizam atividades voltadas à produção de efeitos jurídicos diversos.

Segundo MARINELA:

“[…] o ato administrativo é nada mais do que um ato jurídico, tratando-se de uma manifestação de vontade que produz efeitos jurídicos, caracterizando-se como uma espécie do gênero ato jurídico, por ser marcado por peculiaridades que o individualizam, como é o caso das condições para sua válida produção, ou ainda, quanto às regras para sua eficácia, o que será analisado nos tópicos seguintes” (2007, p. 192).

A espécie ato administrativo não se confunde com o gênero atos da Administração Pública, entendido como qualquer ato de manifestação de vontade realizado pela Administração Pública, regido tanto pelo Direito Público quanto pelo Direito Privado.

.Já o ato administrativo é uma manifestação de vontade do Estado ou de quem lhe faça as vezes que cria, modifica ou extingue direitos, mas atingindo especificadamente a órbita do Direito Administrativo, com vistas a atender o interesse público.

MARINELA ainda ensina que:

“Pode-se conceituar ato da administração como todo ato praticado pela Administração Pública, mais especificamente pelo Poder Executivo, no exercício da função administrativa, podendo ser regido pelo direito público ou pelo direito público ou pelo direito privado. Note que esse conceito tem sentido mais amplo do que o conceito de ato administrativo, que, necessariamente, deve ser regido pelo direito público” (2007, p. 190).

Não se deve confundir, igualmente, ato administrativo com fato administrativo, pois este se caracteriza como um acontecimento ocorrido na Administração Pública, que embora possa produzir conseqüências jurídicas, não traduz uma manifestação de vontade do Estado. “O que convém fixar é que o ato administrativo não se confunde com o fato administrativo, se bem que estejam intimamente relacionados, por ser este conseqüência daquele (MEIRELLES, 2001, p. 142)”.

Deve-se lembrar que os atos administrativos são praticados em todas as esferas (federal, estadual, distrital e municipal) e pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Estes dois últimos no que se refere às suas atividades atípicas.

1.1. Conceito

Conceituando ato administrativo Diógenes Gasparine nos leciona:

“Ato administrativo é toda prescrição unilateral, juízo de conhecimento, predisposta à produção de efeitos jurídicos, expedida pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, no exercício de suas prerrogativas e como parte interessada numa relação, estabelecida na conformidade da lei, sob o fundamento de cumprir finalidades assinaladas no sistema normativo”. (GASPARINE, 2007, p. 61)

Maria Sylvia Zanella Di Pietro, após completa explanação sobre os elementos do ato administrativo nos traz: Ato administrativo é a declaração do Estado ou de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, co observância da lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário. (2008, p.185).

Na lição sempre precisa de Hely Lopes Meirelles, seguindo a diretriz traçada pelo Código Civil, acha-se compreendido no conceito de ato administrativo:

“[…] toda manifestação unilateral da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria”. (2001, p.141).

Diante de preciosas lições, podemos conceituar ato administrativo como sendo todo ato emanado da administração, com atributos específicos do direito público, cuja prática tenha por fim adquirir, transferir, proteger, modificar, extinguir direitos ou impor obrigações aos administrados ou aos próprios entes estatais.

No entanto, seguindo a advertência de Odete Medauar, a despeito de ser costumeiramente ser encontrado na definição de ato administrativo a locução ¨vontade do Estado¨, em analogia a vontade do agente na formação do ato jurídico entre particulares, no que diz respeito ao ato administrativo o elemento vontade não deve ser compreendido com um fato psíquico de natureza subjetiva, mas sim como um elemento objetivo considerando que a atividade da administração pública deve pautar-se pela impessoalidade e legalidade (2007).

1.2. Requisitos do ato administrativo

Como todo ato jurídico, o ato administrativo forma-se pela conjugação de alguns requisitos, que são os componentes que o ato deve reunir para ser perfeito e válido. Segundo MARINELA: “Quanto à enumeração, a maioria dos doutrinadores elenca cinco elementos ou requisitos, que são: sujeito competente, forma, objeto e finalidade (2007, p. 199)”.

A falta de um destes elementos pode levar â invalidação do ato pela Administração Pública ou pelo próprio Poder Judiciário.

“Sem a convergência desses elementos não se aperfeiçoa o ato e, conseqüentemente, não terá condições para realçar a importância do conhecimento desses componentes do ato administrativo e justificar as considerações que passaremos a tecer sobre os mesmos” (2001, p. 143).

1.2.1 Competência

A competência é o poder legalmente conferido ao agente público para o desempenho de suas funções, da atribuições de seu cargo. Para que se possua competência é necessário que seja este ato seja praticado por agente público, sendo este todo aquele que exerce função pública, ainda que temporariamente e sem remuneração.

“Por esse requisito, torna-se claro que o agente capaz (a que faz alusão o Código Civil de 2002) encontra o seu correspondente na competência, segundo nossa melhor doutrina, de sorte que o ato administrativo, para ser considerado válido, deve ser editado por quem detenha competência para tanto” (SPITZCOVSKY, 2005, p. 103)

O exercício desta competência é obrigatório, irrenunciável, inalienável, imodificável, imprescritível e improrrogável.

Apesar de ser um requisito geral e vinculado à lei, pois na há ato administrativo válido sem que haja a observância do poder legal para editá-lo,a competência é um elemento que delegação e avocação, desde que essas duas formas de mutação excepcional de competência respeitem os parâmetros legais. Assim, não se pode admitir a delegação de funções exclusivas ou que o subordinado não tenha capacidade legal de executar.

1.2.2 Finalidade

A finalidade indica o objetivo mediato de toda a atuação da Administração Pública, que é o atendimento do Interesse Público. É elemento sempre vinculado, que pode estar previsto expressa ou implicitamente na lei.

Este elemento decorre do princípio da impessoalidade na Administração Pública. Se a atuação estatal tem por escopo alcançar os interesses coletivos e não satisfazer pretensões pessoais dos seus agentes, por motivos óbvios, os atos administrativos devem sempre atender a esta finalidade. Isto porque o Estado jamais pode se evadir dos fins públicos, enquanto valores teleológicos que legitimam a sua atividade, assim impostos pela lei para todos os seus atos.

“É o requisito que impõe seja o ato administrativo praticado unicamente para um fim de interesse público, isto é, no interesse da coletividade. Não há ato administrativo sem um fim público a sustentá-lo. O ato administrativo desinformado de um fim público e, por certo, informado por um fim de interesse privado é nulo por desvio de finalidade” (GASPARINI, 2007, p. 64).

A finalidade, estreitamente ligada aos motivos do ato administrativo, determina que a atuação administrativa, além de observar os motivos do ato administrativo, também busque a finalidade da norma jurídica. Por buscar o interesse da coletividade, não se admite ato administrativo que não persiga o interesse público. A finalidade é elemento vinculado de todo ato administrativo, seja ele vinculado ou discricionário.

1.2.3 Forma

A forma é o elemento exteriorizador do ato administrativo, é vinculado e imprescindível para a validade do ato. (princípio da solenidade). Ao contrário da regra vigente no direito privado, a liberdade de forma, salvo quando a lei determiná-la de modo específico, no direito Administrativo, as formas são obrigatórias e vinculadas. Segundo GASPARINI forma é:

“[…] o revestimento do ato administrativo. É o modo pelo qual o ato aparece, revela sua existência. É necessária à validade do ato. A inexistência de forma leva à inexistência do ato, enquanto a sua inobservância leva à nulidade, consoante prescreve o art. 2º da Lei da Ação Popular. O usual é a forma escrita” (2007, p. 64-65).

Apesar desta posição doutrinária, é necessário lembrar que o artigo 22 da Lei 9784/99 diz que, não havendo previsão legal de forma específica, será ela livre e, portanto, caberá à Administração Pública, de acordo com o critério da conveniência e oportunidade, adotar a forma mais adequada para a necessidade do caso concreto. Por outro lado, se a lei prevê expressamente a forma, o sei desrespeito configura vício insanável do ato administrativo.

1.2.4 Motivo

Motivo é a circunstância fática e de direito que determina ou autoriza a prática do ato. O motivo pode estar expresso (ato vinculado) ou não (ato discricionário) na lei. DI PIETRO ensina que:

Motivo é o pressuposto de fato e de direito que serve de fundamento ao ato administrativo.

Pressuposto de direito é o dispositivo legal em que se baseia o ato.

Pressuposto de fato, com o próprio nome indica, corresponde ao conjunto de circunstância, de acontecimentos, de situações que levam a Administração a praticar o ato” (2008, p. 199).

O motivo e a motivação não se confundem. A motivação é a exposição do motivos, a sua exteriorização, a declaração escrita do motivos que determinaram a realização de um determinado ato administrativo. Todo ato administrativo possui, portanto, motivos.

Todos os atos administrativos se sujeitam à regra da motivação, até mesmo os atos discricionários. Ou seja, a flexibilidade de atuação admitida pela lei não contempla a prerrogativa incondicionada do administrador fazer o que bem lhe aprouver, o que seria uma nítida arbitrariedade. E mais, motivar não significa somente citar o dispositivo legal que autoriza a medida tomada pelo administrador, mas também, expor a razão fática que levou o agente público a dar concretude à norma jurídica, mediante à materialização do ato administrativo.

Em função da normatividade dos princípios constitucionais, o dever de motivação passa a incidir como regra em todos os atos administrativos, e segundo a teoria dos motivos determinantes, a validade de tais atos, quando motivados, fica condicionada à existência real das razões alegadas para a sua prática.

“Segundo a Teoria dos Motivos Determinantes, quando a Administração declara o motivo que determinou a prática de um ato discricionário que, em princípio, prescindiria de motivação expressa, fica vinculada à existência do motivo por ela, Administração, declarado”. (ALEXANDRINO; PAULO, 2007, p.321).

1.2.5 Objeto

No pensamento de ALEXANDRINO; PAULO o objeto ou conteúdo do ato administrativo corresponde ao efeito jurídico pretendido e decorre de expressa previsão legal. É o elemento que significa o próprio conteúdo ou substância do ato. Para ser válido, o ato deve possuir objeto lícito e moralmente admitido (2007).

De forma diversa da competência, o objeto dos atos administrativos pode ser vinculado ou discricionário. Nos atos discricionários, o objeto dependerá da análise da conveniência e oportunidade, haja vista que depende da escolha da Administração Pública.

1.3. Atributos do ato administrativo

Traduz a característica inerente aos atos praticados em prol do interesses público. São encontráveis nos atos praticados pela Administração Pública regidos pelo direito público.

“Os atos administrativos, como emanação do Poder Público, trazem em si certos atributos que os distinguem doa atos jurídicos privados e lhes emprestam características próprias e condições peculiares de atuação. Referimo-nos à presunção de legitimidade, à impessoalidade e à auto-executoriedade, que veremos a seguir” (MEIRELLES, 2001, p.151).

1.3.1 Presunção de Legitimidade

A presunção de legitimidade ou veracidade está presente em todo ato administrativo e decorre de uma necessidade da Administração Pública, uma vez que suas atividades seriam inviáveis caso ela fosse obrigada a recorrer ao Poder Judiciário para validar seus atos.

A presunção de legitimidade é reativa, ou seja, o vício porventura existente no ato poderá ser alegado e questionado pela parte prejudicada.

Outra característica é a de que, mesmo quando o ato apresente alguma nulidade absoluta, em função da presunção de legitimidade, não poderá ser alegada de ofício pelo Poder Judiciário.

1.3.2 Imperatividade

A imperatividade se refere à qualidade de determinados atos que podem ser exigidos coercitivamente pelo Estado. Certos atos administrativos têm para constituir situações de observância em relação aos seus destinatários, independentemente da respectiva concordância. São chamados de poder extroverso do ato administrativo. Segundo SPITZCOVSKY: “[…] o primeiro atributo é denominado presunção de legitimidade, segundo o qual os atos administrativos se pressupõem legítimos até prova em contrário (2005, p. 111)”.

Por outro lado, é importante lembrar que determinados atos, como licenças e autorizações, não possuem força coercitiva, uma vez que dispensam este atributo.

1.3.3 Auto-executoriedade

A auto-executoriedade informa ao poder que a Administração Pública possui de, direta e indiretamente, executar seus atos administrativos, sem a participação do Poder Judiciário. “A auto-executoriedade consiste na possibilidade que certos atos administrativos ensejam de imediata e direta execução pela própria Administração, independentemente de ordem judicial (MEIRELLES, 2001, p. 153)”.

De outro lado, vale registrar que alguns atos administrativos não são auto-executáveis como por exemplo, a cobrança de multas, quando o particular resiste ao seu pagamento espontâneo.

Fala-se que a auto-executoriedade afasta a necessidade de observância, para a edição e efeitos do ato, dos princípios do contraditório e da ampla defesa, haja vista a idéia de prevalência do interesse público. Porém o que ocorre não é o abandono do devido processo legal, mas sim a postergação do contraditório e da ampla defesa.

Segundo Hely Lopes Meirelles:

“Ao particular que se sentir ameaçado ou lesado pela execução do aot administrativo é que caberá pedir proteção judicial para obstar à atividade da Administração contrária aos seus interesses, ou para haver da Fazenda Pública os eventuais prejuízos que tenha injustamente suportado” (2001, p. 154-155).

1.4. Legalidade e mérito do ato administrativo

No estudo do ato administrativo devem ser mencionados os aspectos da legalidade e mérito. Nos ensinamentos de Odete Medauar:

A legalidade do ato administrativo diz respeito a sua conformação às normas do ordenamento jurídico. A margem de liberdade que incide sobre a escolha inerente ao discricionário corresponde ao mérito do ato administrativo, tal aspecto expressa o juízo de conveniência e oportunidade da escolha, no atendimento do interesse público, juízo este efetuado pela autoridade à qual se conferiu o poder discricionário (2007, p 148).

Nascido com o Estado Democrático de Direito, o princípio da legalidade representa a passagem de um Estado regido por homens para um Estado em que as leis, expressão da vontade popular ditam os rumos da nação.

A Constituição da República em seu artigo 1º, caput, demonstra claramente a opção da República Federativa do Brasil pelo primado da lei, ao preceituar que o Estado Brasileiro constitui-se em um Estado Democrático de Direito onde o poder emana do povo, ou seja, sagra-se a tese da soberania popular, do primado da lei.

Segundo MEDAUAR “o contraponto entre os aspectos de legalidade e mérito do ato administrativo aparece, sobretudo no tema controle judicial dos atos administrativos, ao discutir o alcance deste controle (2007, p. 148)”.

1.5. Invalidação dos atos administrativos

A invalidação dos atos administrativos cabe tanto à Administração Pública quanto ao Poder Judiciário, dependendo das circunstâncias que revelem inadequados aos fins visados ou contrários às normas legais que os regem. Se, por erro, culpa, dolo ou interesses escusos de seus agentes a atividade do Poder Público desgarra-se da lei, é dever da Administração invalidade o próprio ato, contrário à finalidade, por ilegal.

O controle dos atos administrativos abre-se em duas oportunidades: uma, facultada à própria Administração, que é a mais ampla que a concedida à Justiça, enseja o desfazimento de seus próprios atos por razões de mérito e de oportunidade, a outra, deferida ao Judiciário que só os pode invalidar quando ilegais. Daí a Administração controla seus próprios atos em toda a plenitude, enquanto que o judiciário se restringe ao exame da legalidade. Confirma esta afirmação a lição de MEDAUAR: “A anulação consiste no desfazimento do ato administrativo, por motivo de ilegalidade, efetuada pelo próprio Poder que o editou ou determinada pelo poder Judiciário (2007, p. 155)”.

A anulação consiste na declaração de invalidade do ato administrativo ilegítimo e ilegal, feita pela própria Administração ou pelo Poder Judiciário. A Administração, reconhecendo que praticou ato contrário ao direito vigente, deve anulá-lo de ofício, o quanto antes, para restaurar a legalidade administrativa. Se não o fizer, caberá ao Judiciário faze-lo, mediante provocação de quem tiver legitimidade ativa para tal. Assim, os atos administrativos nulos ficam sujeitos a invalidação não só pela própria Administração como, também, pelo Poder Judiciário, desde que levados à sua apreciação pelos meios processuais

“Os efeitos da anulação são ex tunc, ou seja, retroagem até a origem do ato, tendo em vista que o vício de ilegalidade apresentado se verifica desde o momento em que foi editado, surgindo, como desdobramento lógico, a necessidade de eliminação de todos os efeitos até então gerados por ele” (SPITZCOVSKY, 2005, p.121).

Isso, no entanto, não é tudo, pois os atos administrativos também estão sujeitos a exames do Poder Legislativo e do Tribunal de Contas competentes.

2 – CONTROLE DO ATO ADMINSTRATIVO PELO PODER JUDICIÁRIO

2.1 Separação dos Poderes

A história nos demonstra que o relacionamento entre governantes e governados atravessou diversas mutações com o passar dos anos. E em meio aos influxos dessas mutações surgiu a Teoria da Separação dos Poderes que, sob a influência das concepções trazidas pelo liberalismo político do século XVIII, buscou uma reinterpretação desta tumultuada relação.

A pedra de toque da teoria da separação dos poderes reside na advertência no sentido de que a concentração de poderes em uma única pessoa poderá ensejar situações de arbitrariedade.

As primeiras articulações em torno da divisão de poderes pode ser encontrada em Aristóteles, em sua obra ¨A Política¨, onde o pensador grego desenvolveu as primeiras lições a respeito da Estrutura Estatal, demarcando e classificando as diferentes atividades do governo e definindo as atribuições dos poderes legislativo, executivo e judiciário.

Já em 1690, Jonh Locke publicou seus dois tratados sobre o governo em que, partindo de uma análise a respeito de importantes eventos verificados na história inglesa, deixou mais nítida a idéia em torno de uma demarcação sobre os poderes do Estado.

No entanto, foi a partir de 1748, que Montesquieu, analisando as diferentes formas de governo ao longo da história, utilizando-se da mesma constituição inglesa que inspirou Jonh Locke, idealizou a teoria da separação dos poderes cujos os princípios norteadores são adotados na atualidade, inclusive em nosso país.

A teoria idealizada por Montesquieu está assentada na presença de poderes distintos e especializados, confiados a diferentes órgãos que se contrabalancem no seio do Estado como forma de evitar abusos decorrentes da concentração do poder.

A distribuição dos poderes, em uma perspectiva atual, deverá ser compreendida como forma de distribuição orgânica das funções, ou seja, o Poder Legislativo legisla, o Executivo aplica as leis e o Judiciário cuida do exercício da atividade jurisdicional.

Essa divisão especializada dessas funções tem por objetivo, em especial, a salvaguarda dos cidadãos frente à possível prepotência do Poder público e ao capricho dos governantes, na medida que permite o equilíbrio decorrente da interação entre as funções estatais, restringindo, a partir de um controle recíproco, possíveis abusos de parte dos agentes administrativos.

A submissão do Poder Executivo à lei só se realizou com o surgimento do Estado de Direito, que tem como um de seus objetivos básicos o principio da legalidade. Ou seja, a atuação do Estado ou de qualquer de seus órgãos há de pautar-se pelo direito.

Depois da separação do poderes, a sujeição da Administração à lei vai conferir novos moldes às ações do Estado, inserindo entre a vontade da autoridade e o indivíduo um conjunto de preceitos destinados a disciplinar essa atuação e seus efeitos.

A partir daí, a Administração não mais atua tendo em vista à vontade pessoal do governante, as decisões passam a ter parâmetros fixados em lei e visam assegurar os direitos dos particulares. Esse modo de expressão das decisões adquire interesse jurídico relevante, e o ato administrativo constitui, assim, um dos principais meios pelos quais atuam e se expressam as autoridades e órgãos administrativos, obedecendo sempre à legalidade e fundamentalmente à separação dos poderes.

2.2 Sistemas de controle jurisdicional

O controle jurisdicional da Administração se organiza em dois sistemas: O contencioso administrativo ou sistema de jurisdição dupla, e o sistema de jurisdição uma ou unidade de jurisdição.

Confirma esta afirmação a lição de MEDAUAR: “O sistema de jurisdição dupla de origem francesa, caracteriza-se pela existência paralela de duas ordens de jurisdição: a jurisdição comum e a jurisdição administrativa, destinada a julgar litígios que envolvem a Administração Pública. Neste sistema os atos praticados pela Administração só podem ser revistos pela própria Administração. No sistema de jurisdição una, o julgamento dos litígios em que a Administração Pública é parte compete aos juízes e aos tribunais comuns, ou seja, integrantes da Justiça comum. Admitem-se varas especializadas, mas inseridas entre os órgãos de uma única ordem de jurisdição. O Brasil adota este sistema. Já neste sistema quem vai rever os atos praticados pela Administração é o Poder Judiciário. “ (2007, p. 393)”.

2.3 Alcance do controle jurisdicional

Uma das questões mais importantes no que diz respeito ao tema do controle jurisdicional dos atos administrativos diz respeito ao alcance da atuação do Judiciário.. Nos ensinamentos de Odete Medauar:

“Há um poA legalidade do ato administrativo diz respeito a sua conformação às normas do ordenamento jurídico. A margem de liberdade que incide sobre a escolha inerente ao discricionário corresponde ao mérito do ato administrativo, tal aspecto expressa o juízo de conveniência e oportunidade da escolha, no atendimento do interesse público, juízo este efetuado pela autoridade à qual se conferiu o poder discricionário” (2007, p 148).

Há um posicionamento favorável a um controle restrito, para que se circunscreva à legalidade entendida também de modo restrito. Em geral, os argumentos desta linha são a impossibilidade de ingerência do Judiciário em atividades típicas do Executivo, ante o princípio da separação dos poderes, daí o âmbito do Judiciário ser a legalidade em sentido estrito. (…) Outro entendimento inclina-se por um controle amplo, ante os seguintes fundamentos: pelo princípio da separação dos poderes, o poder detém o poder, cabendo ao Judiciário a jurisdição e, portanto, o controle jurisdicional da Administração, sem que se possa cogitar de ingerência indevida; por outro lado onde existe controle de constitucionalidade da lei, a invocação de poderes para limitar a apreciação jurisdicional perde grande parte de sua força.

No direito pátrio, a tendência de ampliação do controle jurisdicional da Administração se acentuou a partir da Carta Magna de 1988, onde encontramos um priorização de direitos e garantias ante ao Poder Público, exigindo-se do Estado, dentre outros, os princípios da moralidade, da impessoalidade e da publicidade, que por sua vez impõe transparência na atuação administrativa, o que enseja um controle maiôs sobre seus atos.

Hoje encontramos o princípio da legalidade assentado em bases mais amplas e encontramos ainda um respaldo constitucional para um controle jurisdicional mais amplo sobre a atividade da Administração. Óbvio é que, a ampliação deste controle não leva a uma substituição do administrador pelo juiz, encontrando limites.

Questão importante em matéria de alcance do controle jurisdicional diz respeito ao motivo, um dos requisitos do ato administrativo. A exigência de nexo entre o ato administrativo e o fatos que levaram a realização do mesmo tornam o motivo um vínculo a mais no exercício do poder discricionário. Como decorrência, veio a possibilidade do controle jurisdicional dos fatos e fundamentos jurídicos relevaram aos administrador optarem por decidir em um determinado sentido, ou seja, o controle do motivo. Hoje a orientação majoritária é no sentido de que o Poder Judiciário possui plena possibilidade de averiguação e exame de fatos e provas relativos à atividade da Administração Pública.

Outra questão importante na fixação de parâmetros do poder discricionário se realizou ao se admitir o controle fim, criando-se a figura do desvio de poder. A alegação de desvio de poder ou de desvio de finalidade, encontra muitos obstáculos em relação à prova da intenção da autoridade, que passa a ser um interesse pessoal e não o interesse público. Por isso, entendemos ser importante admitir a possibilidade do controle jurisdicional dos atos administrativos de maneira ampla e em relação também aos fatos e fundamentos jurídicos, para que a partir daí se possa identificar de forma clara e precisa a ilegalidade ou não do ato praticado.

2.4 Possibilidade deste controle em relação aos atos administrativos

Tendo em vista que o direito administrativo é norteado pelo princípio constitucional da legalidade e que os atos administrativos devem ser sempre motivados, dando legitimidade e transparência à atividade administrativa, permite-se um auto controle pela própria Administração.

No entanto, a despeito de não subsistir dúvidas quanto à possibilidade da própria Administração Pública revogar ou anular seus atos, esta certeza não aparece quando trata-se de intervenção jurisdicional sobre a atividade administrativa.

Segundo uma tradição sedimentada ao longo da história, inspirada no modelo do Estado liberal, difundiu-se a teoria de que a intervenção jurisdicional limitava-se ao aspecto formal do ato administrativo, de forma que toda intervenção que ia além dos limites de formalidade do ato estaria desrespeitando a separação dos poderes.

Todavia, a evolução do tratamento do individuo em relação ao Estado trouxe-nos um novo paradigma a ser observado. Hoje, a intervenção do Estado na vida social deve sempre respeitar o interesse público, os direitos e garantias individuais e principalmente o Estado Democrático de Direito. Para melhor entendermos o tema é necessário fazermos uma breve recordação quanto à discricionariedade e vinculação dos atos administrativos.

A atividade administrativa está vinculada à lei, mas pode fazer sentir-se por duas formas: atividade vinculada e atividade discricionária. Diz-se vinculada quando a lei estabelece a única solução possível diante de determinada situação de fato. Já na atuação discricionária cabe somente ao administrador apreciar os motivos de oportunidade e conveniência da prática de certos atos.

A atuação discricionária da Administração encontra justificativa na impossibilidade de o legislador catalogar na lei todos os atos que a prática administrativa exige, dada a multiplicidade de fatos e situações que pedem a solução do Poder Público. Diante desta realidade, considera-se imprescindível a margem de discricionariedade do ato administrativo com instrumento de otimização da realização do direito no caso concreto, obtendo-se, por conseguinte, maior eficácia a atuação administrativa.

Entretanto é importante observar que nenhum ato administrativo pode ser considerado discricionário em sua integralidade. A discricionariedade significa condição de liberdade, mas não liberdade ilimitada. Diz-se discricionário quando a lei faz remanescer em proveito e cargo do administrador uma certa esfera de liberdade, perante o que caber-lhe-á preencher com seu juízo subjetivo e pessoal, o campo de indeterminação normativa, a fim de satisfazer no caso concreto a finalidade da lei.

Esta discricionariedade limita-se a lei e também a uma rede de princípios que asseguram o interesse público e impedem seu abuso. Em outros termos: a autoridade administrativa está autorizada a atuar discricionariamente apenas, única e exclusivamente, quando norma jurídica válida expressamente a ela atribuir essa livre atuação.

Ao longo de vários anos, a doutrina e jurisprudência havia firmado o entendimento de que os atos discricionários eram insusceptíveis de apreciação e controle pelo Poder Judiciário.

Tratava-se de aceitar a intangibilidade do mérito do ato administrativo, em que se afirmava, pelo fato de ser a discricionariedade competência tipicamente administrativa, que o controle jurisdicional implicaria ofensa ao princípio da Separação dos Poderes.

Não obstante, a necessidade de motivação e controle de todos os atos administrativos, de forma indiscriminada, principalmente em relação aos atos discricionários, é matéria que se encontra, atualmente, pacificada pela imensa maioria da doutrina e, fortuitamente, aos poucos acolhida na jurisprudência de maior vanguarda.

Assim, quando o Judiciário exerce o controle “a posteriori” de determinado ato administrativo não se pode olvidar que é o Estado controlando o próprio Estado. E mais, a competência jurisdicional de controle dos atos administrativos não incide, tão somente, sobre a legalidade, pois, como se sabe, discricionariedade não é liberdade plena, mas, sim, liberdade de ação para a Administração Pública, dentro dos limites previstos em lei, pelo legislador. E é a própria lei que impõe ao administrador público o dever de motivação.

A doutrina moderna tem convergido no entendimento de que é necessária e salutar a ampliação da área de atuação do Judiciário, tanto para coibir arbitrariedades em regra praticadas sob o escudo da assim chamada discricionariedade.

Como a atividade da Administração é infralegal, administrar é aplicar a lei à autoridade administrativa está vinculada pelo dever de motivar os seus atos. Assim, a análise e ponderação da motivação do ato administrativo informam o controle, pelo Poder Judiciário, da sua correção.

Ademais, é óbvio, o Poder Judiciário não pode substituir-se à Administração, enquanto personificada no Poder Executivo. Nesse sentido, o Poder Judiciário vai à análise do mérito do ato administrativo, inclusive fazendo atuar as pautas da proporcionalidade e da razoabilidade, que não são princípios, mas sim critérios de aplicação do direito, ponderados no momento das normas de decisão. O Poder Judiciário não apenas examina a proporção que marca a relação entre meios e fins do ato, mas também aquela que se manifesta na relação entre o ato e seus motivos, tal e qual declarados na motivação.

O motivo, um dos elementos do ato administrativo, contém os pressupostos de fato e de direito que fundamentam sua prática pela Administração.

A conveniência e oportunidade da Administração não podem ser substituídas pela conveniência e oportunidade do juiz. Mas é certo que o controle jurisdicional pode e deve incidir sobre os elementos do ato, à luz dos princípios que regem a atuação da Administração. Daí porque o controle jurisdicional pode incidir sobre os motivos determinantes do ato administrativo.

Assim o entendimento moderno é que caberá o controle judicial dos atos administrativos, acerca da legalidade, da constitucionalidade e mais, sua conformidade com os princípios relativos à Administração Pública.

3 – ASPECTOS CONFLITANTES SOBRE A EXTENSÃO DO CONTROLE JURISDICIONAL SOBRE OS ATOS ADMINISTRATIVOS

3.1 Posições Doutrinárias

Discorrendo sobre o controle jurisdicional do ato administrativo, a doutrina brasileira pouco diverge em relação ao controle de legalidade, o que se torna contraditório e divergente são as opiniões acerca do limite deste controle.

Para parte da doutrina o controle somente será feita levando-se em conta a legalidade, já para os administrativistas modernos este controle se estende aos preceitos constitucionais e a todos os princípios que regem a Administração Pública, não se admitindo que a discricionariedade administrativas sirva de pretexto para abuso de poder e possíveis desvios.

Discorrendo sobre a extensão deste controle jurisdicional Diógenes Gasparine nos leciona:

“Limita-se o controle jurisdicional, nos casos concretos, ao exame de legalidade do ato ou da atividade administrativa. Escapa-lhe, por conseguinte, o exame do mérito do ato ou da atividade administrativa. Assim, os aspectos de conveniência e oportunidade não podem ser objeto deste controle. A Autoridade jurisdicional pode dizer o que é legal ou ilegal, ma não o que é oportuno ou conveniente e o que é inoportuno ou inconveniente”. (GASPARINE, 2007, P. 914)

Já Maria Sylvia Zanella Di Pietro de forma mais completa e precisa nos explicita que:

“O Poder Judiciário pode examinar os atos da Administração Pública, de qualquer natureza, sejam gerias ou individuais, unilaterais ou bilaterais, vinculados ou discricionários, mas sempre sob o aspecto da legalidade e, agora, pela Constituição, também sob o aspecto da moralidade. Quanto aos atos discricionários, sujeitam-se à apreciação judicial, desde que não se invadam os aspectos reservados à apreciação subjetiva da Administração Pública , conhecidos sob a denominação de mérito. Não há invasão de mérito quando o Judiciário aprecia os motivos, ou seja os fatos que precedem a elaboração do ato; a ausência ou falsidade do motivo caracteriza ilegalidade, suscetível de invalidação pelo Poder Judiciário”.(DI PIETRO, 2008, p.709)

Pertencente ao direito administrativo moderno a doutrinadora Odete Medauar nos traça:

“Hoje, no ordenamento pátrio, sem dúvida, a legalidade assenta em bases mais amplas e, por conseguinte, há respaldo constitucional para um controle jurisdicional mais amplo sobre a atividade da Administração, como coroamento de uma evolução já verificada na doutrina e jurisprudência antes de outubro de 1988”. (MEDAUAR, 2007, p.397):

Ainda sobre a extensão deste controle jurisdicional Hely Lopes Meirelles nos ensina:

“Todo ato administrativo, de qualquer ou Poder, para ser legítimo e operante, há que ser praticado em conformidade com a norma legal pertinente (princípio da legalidade), com a moral da instituição (princípio da moralidade), com a destinação pública própria (princípio da finalidade), com a divulgação oficial necessária (princípio da publicidade) e com presteza e rendimento funcional (princípio da eficiência). Faltando, contrariando ou desviando-se destes princípios básicos, a Administração Pública vicia o ato, expondo-o a anulação por ela mesma ou pelo Poder Judiciário, se requerida pelo interessado”. (MEIRELLES, 2002, p.665)

Diante de preciosos ensinamentos, podemos concluir que, mesmo com a unanimidade em relação a possibilidade de controle jurisdicional dos atos administrativos quanto à legalidade, o mesmo não podemos falar sobre a sua extensão. Divergente é a doutrina, divergente também a jurisprudência, mas o que vemos hoje é uma mudança paulatina, que nos trás uma elasticidade maior quanto à extensão deste controle, o que nos protege de eventuais abusos e ilegalidades, escondidas sob o manto do mérito administrativo.

3.2 Posições Jurisprudenciais

De acordo com tudo que vimos no presente trabalho, é grande a discussão sobre a possibilidade ou não do controle judicial dos atos administrativos. Diferente não seria na jurisprudência pátria.

Durante muito tempo, afirmou-se que o Judiciário não poderia efetuar qualquer controle de mérito sobre os atos administrativos, especialmente os atos administrativos discricionários, vez que competiria exclusivamente à Administração Publica a formulação de juízos de conveniência e oportunidade dentro da esfera liberdade a ela conferida pela lei. Nesse sentido, ponderava o Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CONCESSÃO DE HORÁRIO ESPECIAL. ATO DISCRICIONÁRIO. ILEGALIDADE OU ABUSO. INEXISTÊNCIA. Foge ao limite do controle jurisdicional o juízo de valoração sobre a oportunidade e conveniência do ato administrativo, porque ao Judiciário cabe unicamente analisar a legalidade do ato, sendo-lhe vedado substituir o Administrador Público. Recurso ordinário desprovido.” (STJ, SEXTA TURMA, RMS 14967/SP, Rel. Min. VICENTE LEAL, DJ 22.04.2003 p. 272)

Atento à tendência doutrinária moderna, conforme delineado durante todo o presente trabalho, o STJ vem mudando o entendimento sobre a matéria:

ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – OBRAS DE RECUPERAÇÃO EM PROL DO MEIO AMBIENTE – ATO ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO. 1. Na atualidade, a Administração pública está submetida ao império da lei, inclusive quanto à conveniência e oportunidade do ato administrativo. 2. Comprovado tecnicamente ser imprescindível, para o meio ambiente, a realização de obras de recuperação do solo, tem o Ministério Público legitimidade para exigi-la. 3. O Poder Judiciário não mais se limita a examinar os aspectos extrínsecos da administração, pois pode analisar, ainda, as razões de conveniência e oportunidade, uma vez que essas razões devem observar critérios de moralidade e razoabilidade. 4. Outorga de tutela específica para que a Administração destine do orçamento verba própria para cumpri-la. 5. Recurso especial provido.” (STJ, SEGUNDA TURMA, REsp 429570 / GO ; Rel. Min. ELIANA CALMON, DJ 22.03.2004 p. 277 RSTJ vol. 187 p. 219) – grifamos

De acordo com elucidações anteriormente feitas neste trabalho, a motivação, é parâmetro para o controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário. A ausência da necessária motivação, tanto quanto o vício de finalidade ou causa determinante, configura ilegalidade, passível de controle jurisdicional, e assim têm se posicionado nossos tribunais:

ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO – REMOÇÃO – ATO NÃO MOTIVADO – NULIDADE – ART. 8º, INCISO I DA LEI ESTADUAL Nº 5.360/91 – PRERROGATIVA DE INAMOVIBILIDADE – INEXISTÊNCIA – PRECEDENTES – RECURSO PROVIDO. I – O princípio da motivação possui natureza garantidora quando os atos levados a efeito pela Administração Pública atingem a seara individual dos servidores. Assim, a remoção só pode ser efetuada se motivada em razão de interesse do serviço. Precedentes. II – O art. 8º, inciso I da Lei Estadual nº 5.360/91 não impede que o servidor por ela regido seja removido. Não se cogita de inconstitucionalidade da expressão “fundamentada em razão do interesse do serviço” nele contida. III – No caso dos autos, o ato que ordenou as remoções encontra-se desacompanhado do seu motivo justificador. Conseqüentemente, trata-se de ato eivado de nulidade por ausência de motivação, que desatende àquela regra específica que rege os Agentes Fiscais da Fazenda Estadual. IV – Recurso provido.” (STJ, QUINTA TURMA, RMS 12856/PB, Rel. Min. Gilson Dipp, J. 08.06.2004, DJ 01.07.2004, p. 214) – grifamos

Esboça-se, assim, a mudança do entendimento jurisprudencial que costumava ser tradicionalmente seguido por aquela Corte, em caminho oposto:

“RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. CESSÃO. REVOGAÇÃO. ATO DISCRICIONÁRIO. MOTIVAÇÃO. DESNECESSIDADE. A cessão de servidor público, sendo ato precário, confere à Administração, a qualquer momento, por motivos de conveniência e oportunidade, a sua revogação, sem necessidade de motivação, cujo controle escapa ao Poder Judiciário, adstrito unicamente a questões de ilegalidade. Precedente. Recurso ordinário desprovido.” (STJ, SEXTA TURMA, RMS 12312 / RJ, Rel. Min. VICENTE LEAL, DJ 09.12.2002 p. 390)

No Supremo Tribunal Federal, outro não é o entendimento senão aquele que caberá controle judicial dos atos administrativos, nada justificando que a Administração Pública, sob o manto da discricionariedade, pratique excesso e desvios considerados ilegais :

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PRESSUPOSTO ESPECÍFICO DE RECORRIBILIDADE. A parte sequiosa de ver o recurso extraordinário admitido e conhecido deve atentar não só para a observância aos pressupostos gerais de recorribilidade como também para um dos específicos do permissivo constitucional. Longe fica de vulnerar o artigo 6º, parágrafo único, da Constituição de 1969, acórdão em que afastado ato administrativo praticado com abuso de poder, no que revelou remoção de funcionário sem a indicação dos motivos que estariam a respaldá-la. Na dicção sempre oportuna de Celso Antonio Bandeira de Mello, mesmo nos atos discricionários não há margem para que a administração atue com excessos ou desvios ao decidir, competindo ao Judiciário a glosa cabível” (Discricionariedade e Controle judicial). (STF, Segunda Turma, RE 131661 / ES, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Publicação: DJ 17-11-1995 PP-39209 EMENT VOL-01809-06 PP-01393) – grifamos

O que se observa finalmente, é que, nos últimos anos, tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o Superior Tribunal de Justiça, vêm admitindo que o controle jurisdicional dos atos emanados da Administração Pública.

E este controle não se restringe à verificação dos pressupostos objetivos de legalidade, reconhecendo-se então a possibilidade de analisar-se também o mérito destas decisões, extirpando assim, os atos administrativos praticados com abuso de poder ou desvio de finalidade. Ou seja, a finalidade legal da norma que instituiu o ato administrativo deve estar presente também quando o administrador possui liberdade de escolha para praticá-lo.

CONCLUSÃO

A partir da análise exposta, pode-se concluir que, em função do princípio da legalidade, a autoridade pública está submissa aos ditames da lei, não podendo agir sem que haja comando legal autorizando.

Assim, diante de tudo que foi escrito sobre o tema em análise, resta incontroverso que o agente público, embora exercitando poder discricionário e agindo em conformidade com as formalidades externas da lei, pode estar agindo em desconformidade com a mesma ao buscar uma finalidade que não a do interesse público.

Cabe assim, ao Poder Judiciário, analisar e controlar este desvio de conduta, a fim de coibir essa ilegalidade. É necessário, então, que o judiciário observe a lei não apenas formalmente, mas também substancialmente. Assim, a razoabilidade e proporcionalidade podem ser vistas como desdobramentos da legalidade e são mecanismos de controle da atuação do Estado e de seus agentes Assim, mesmo sob aparente legalidade, estes atos serão ilegais se não respeitarem os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Na atualidade, o império da lei e seu controle, a cargo do Poder Judiciário, autoriza que se examinem todos os atos administrativos emanados do poder público. Verifica-se que diante deste novo panorama, a ampliação da intervenção jurisdicional, ultrapassando os limites da legalidade, para infiltra-se na análise da compatibilidade do ato administrativo, mesmo discricionário, com o princípios constitucionais.

 

Referências
ALEXANDRINO, Marcelo, PAULO, Vicente e. Direito Administrativo. 13.ed. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2007.
ARAUJO, Luiz Alberto David, JÚNIOR, Vidal Serrano Nunes e. Curso de Direito Constitucional. 6.ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2002.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 13.ed. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2005.
CHIMENTE, Ricardo Cunha e outros. Curso de Direito Constitucional. 3.ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2004.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2008.
GASPARINE, Diógenes. Direito Administrativo. 12.ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2007.
MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo.v.1.3.ed. Salvador: Edições Juspodivm, 2007.
MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 11.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 28.ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2001.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 18.ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2005.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional Administrativo. 1.ed. São Paulo: Editora Atlas, 2002.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Cibelle Alves de Morais Steckelberg

 

Advogada, especialista em direito público, mestranda em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento, professora de Direito Administrativo.

 


 

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