Uma mudança de enfoque nas providências judiciais e extrajudiciais do sacado prejudicado por protestos de duplicatas “frias” ou simuladas – os protestos irrelevantes para a proteção do crédito

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1. Introdução

É notório que no mercado duplicatas são sacadas sem a correspondente venda de mercadorias ou prestação de serviços, ou seja, sem lastro fático, no intuito de levantar imediatamente recursos junto às instituições financeiras ou faturizadores, mediante a operação denominada “desconto”. Trata-se da prática conhecida como emissão de duplicatas “frias” ou simuladas, via de regra emitidas por empresas em dificuldades financeiras que objetivam levantar imediatamente algum capital de giro.

Nesses casos, o título de crédito é transferido por endosso translativo para instituição financeira ou faturizador, que pagam antecipadamente ao sacador-endossante (que emitiu a duplicata simulada) percentagem do valor constante no título. De posse da cártula essas empresas que lidam com dinheiro pretendem receber o seu valor no vencimento da obrigação.

Como o sacado não adquiriu a suposta mercadoria nem se utilizou do suposto serviço que teriam aptidão para lastrear a duplicata, é comum que o título não seja pago. Quando isto ocorre, as instituições financeiras ou faturizadores protestam o título, para exercerem seu direito de regresso em face dos coobrigados anteriores. Assim, no caso das duplicatas simuladas, inexistindo o aceite, o protesto é tirado contra o sacado, apesar do mesmo não ter nem mesmo se obrigado cambiariamente (art. 14 e 21, § 4º, VII da Lei 9.492/97).

A praxe não seria tão perversa se os portadores dos títulos se limitassem a protestar por falta de aceite. No entanto, valendo-se da letra do art. 13, § 2º, da Lei 5.474/68 e do art. 21, § 2º, da Lei 9.492/971, protestam o título por falta de pagamento, o que, em razão dos convênios mantidos entre os cartórios de protesto e as entidades de proteção ao crédito, acarreta a negativação do nome do sacado, com todas as suas conhecidas e danosas conseqüências.

Em razão disso, o Poder Judiciário encontra-se entulhado pelas denominadas ações de sustação de protesto, conforme ressalta o saudoso Celso Barbi Filho: “Ocorre que, sendo a duplicata simulada, esse sacado não tem nenhuma obrigação pelo título e será vitimado pelo registro do seu nome no protesto da cártula. Diante disso, é comum em tais casos o sacado sustar, por via judicial, a realização do protesto, movendo a seguir ação para declarar que nada deve ao sacador ou ao endossatário, impedindo-se definitivamente o protesto.” (Protesto de duplicata simulada e procedimentos judiciais do sacado. Revista Forense v. 346. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 36; também acessível no site www.forense.com.br, seção artigos, Dir. Com. e do consumidor).

O desespero do sacado na sustação do protesto é justificado pelo abalo no seu crédito e imagem, decorrente da negativação.

Contudo, no enfoque técnico-jurídico esse reflexo comercial do protesto cambiário não deveria ocorrer. É que o art. 29, § 2º, da Lei 9.492/97 permite que as entidades de proteção ao crédito prestem apenas e tão somente informações restritivas de crédito, ou seja, informações que demonstrem que o inscrito em seu cadastro não honrou dívidas que assumiu. Ora, o protesto por falta de pagamento de duplicata não aceita não ocorre por indisposição ou dificuldade do sacado satisfazer o crédito, mas simplesmente porque ele não o reconhece como devido. Esta informação – não reconhecimento de uma dívida – é irrelevante para a concessão de crédito e portanto não pode ser prestada pelas referidas entidades, sob pena de violação do art. 29, § 2º, da Lei 9.492/97.

A falta de aceite não pode conformar juízo algum a respeito da imagem do sacado, porque deixar de aceitar uma duplicata é prerrogativa que cabe a qualquer um.

“O aceite é facultativo porque se origina de livre manifestação de vontade do sacado, que não pode ser compelido a efetivá-lo, e a sua recusa não lhe gera qualquer efeito cambiário.” (ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio F. da. Títulos de Crédito. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 163).

Contudo, na prática as instituições financeiras ou faturizadores esperam o vencimento da duplicata não aceita para protestá-la por falta de pagamento Já os cartórios de protesto acatam a ordem sem criar empeços, protestando por falta de pagamento em casos nos quais o aceite não foi dado. Por fim, ao recolher as informações fornecidas pelos cartórios sobre protestos, as entidades de proteção ao crédito negativam o nome do sacado que não deu seu aceite na duplicata. Este, por isso mesmo, acaba estigmatizado com o rótulo de “protestado por falta de pagamento”, o que configura fortíssima pressão ao pagamento, como salienta Celso Barbi Filho:

“O ex-Ministro Cláudio Santos, também observando o desvirtuamento do instituto, constatou que o protesto ‘passou a ser usado como cobrança, como ameaça de ruína ao comerciante, honesto ou desonesto, ou como estorvo ao cidadão na obtenção do crédito, através da distribuição de informações pelos serviços de proteção ao crédito.'” (Ob. cit., p. 40-41)

Independentemente da leitura que se faça do art. 13, § 2º, da Lei 5.474/68, os cartórios de protesto devem aferir se cada duplicata recebeu ou não o aceite, e repassar tal informação às entidades de negativação, para infundir sentido e operabilidade ao art. 29, § 2º da Lei 9.492/97. Já as entidades de negativação, devem deixar de divulgar os dados referentes a duplicatas não aceitas e protestadas (seja o protesto por falta de aceite, seja o protesto por falta de pagamento sem o aceite – art. 13, § 2º, da Lei 5.474/68), por se tratarem de protestos irrelevantes para a concessão de crédito.

Tomando-se o cuidado de aplicar o disposto no art. 29, § 2º da Lei 9.492/97 fica garantida a imagem do sacado, haja vista que nos termos deste dispositivo as entidades de negativação não podem divulgar os protestos que não representem, de fato, o inadimplemento, porque lhes é vedado prestar informações que não sejam restritivas de crédito.

Se estancada a publicidade desses dados, que nada trazem de desabono à conduta do sacado, não será necessário ajuizar ações de sustação de protesto. Será uma contribuição de valor para a extinção dos efeitos coercitivos do protesto, que precisa retornar à sua finalidade precípua de servir aos mecanismos jurídicos.

Faz-se mister uma análise mais detida dos dispositivos que regulam o protesto das chamadas “duplicatas frias” ou simuladas para compreensão integral de que a prática vem deturpando a lei.

2. A proibição de divulgação de protestos irrelevantes para a proteção do crédito: art. 29, § 2º da Lei 9.492/97

A solução para o fim da avalanche de ações de sustação de protesto de duplicatas simuladas está na lei, mais especificamente no art. 29, § 2º da Lei 9.492/97, in verbis:

“Art. 29. Os cartórios fornecerão às entidades representativas da indústria e do comércio ou àquelas vinculadas à proteção do crédito, quando solicitada, certidão diária, em forma de relação, dos protestos tirados e dos cancelamentos efetuados, com a nota de se cuidar de informação reservada, da qual não se poderá dar publicidade pela imprensa, nem mesmo parcialmente.

(…)

§ 2º Dos cadastros ou bancos de dados das entidades referidas no caput somente serão prestadas informações restritivas de crédito oriundas de títulos ou documentos de dívidas regularmente protestados cujos registros não foram cancelados. (Redação dada pela Lei nº 9.841, de 5.10.1999) “

Como se pode perceber, o art. 29, §2º, da Lei 9.492/97 determina “às entidades representativas da indústria e do comércio ou àquelas vinculadas à proteção do crédito” a regra segundo a qual “somente serão prestadas informações restritivas de crédito”. Criou-se, então, no ordenamento jurídico, a dicotomia protestos relevantes e protestos irrelevantes para a proteção do crédito.

O dispositivo é de extrema importância, pois demonstra a preocupação do legislador em evitar a manipulação de dados irrelevantes para o mercado, a fim de resguardar a imagem daqueles que não representam potencialidade de prejuízo aos mutuantes.

Está afastada das atividades dessas entidades, portanto, a divulgação de dados sem importância para a concessão do crédito, incluindo os protestos tirados por falta de aceite, dentre outros que são destituídos de relevância creditícia, como se verá adiante.

Mesmo que a lei não determinasse que “somente serão prestadas informações restritivas de crédito”, as entidades de negativação não poderiam divulgar dados diversos, sob pena de ultrapassarem a finalidade para a qual foram criadas. A função dessas entidades não é a de atuar como vitrine, mas sim de servir à centralização das informações pertinentes à proteção do crédito.

Está claro, pelo Código de Defesa do Consumidor, que a atividade dessas entidades está restrita à proteção do crédito – art. 43, §§ 4º e 5º, o que é reforçado pela Resolução 2.724/2000 do Banco Central, que dispõe sobre a proteção de informações para o Sistema Central de Risco de Crédito, delimitando o objeto de tais entidades: prestar informações sobre débitos e responsabilidades por garantias, referentes aos clientes das empresas ali especificadas (art. 1º). Ana Paula Gambogi Carvalho comunga do mesmo entendimento:

“O Código de Defesa do Consumidor considera arquiváveis, independentemente da vontade de seu titular, tão-somente os dados não sensíveis, que estão resguardados pela garantia constitucional da privacidade e que não se relacionam com o funcionamento da sociedade de consumo, como os dados relevantes para a caracterização da idoneidade financeira do consumidor, que interessam à proteção da universalidade do crédito e à higidez dos negócios. Isto porque o intuito dos arquivos de consumo é o auxílio ao bom andamento das relações de consumo, de modo que informações que sejam irrelevantes a este propósito e não tragam qualquer benefício não devem ser objeto de arquivamento sem a expressa autorização do titular.

(…)

Para que o cadastro de restrição ao crédito se situe, no entanto, dentro de uma esfera de legalidade, é necessário que ele seja utilizado com o fim único de proteção da universalidade do crédito, isto é, de alertar credores potenciais sobre os riscos envolvidos ao negociarem com um determinado consumidor. O desvio desta finalidade, como, por exemplo, o seu uso como instrumento de cobrança da dívida ou de punição do devedor, faz com que ele resvale para a antijuridicidade.” (CARVALHO, Ana Paula Gambogi. O Consumidor e o Direito à Autodeterminação Informacional – consideração sobre os bancos de dados eletrônicos. Revista de Direito do Consumidor, vol. 46. São Paulo: RT, 2003, ps. 93,94 e 98)

As entidades de proteção ao crédito, quando não atuam dentro dos seus limites, violam o art. 187 do Código Civil de 2002.

Diante dessa conclusão jurídica cabe perquirir sobre quais os protestos relevantes para a proteção do crédito, para se determinar quais poderão ser divulgados.

3. Protestos irrelevantes para a concessão do crédito

Para aplicação do art. 29, § 2º da Lei 9.492/97 cumpre assinalar que é irrelevante para a concessão do crédito todo protesto que não represente inadimplemento.

Já foi abordado que o protesto por falta de aceite “não significa necessariamente desabono creditício do obrigado principal da duplicata, contra o qual, se não aceito o título e não provada a entrega da mercadoria, nada se pode fazer.” (FILHO, Celso Barbi. Ob. cit, p.35). O aceite é uma declaração unilateral e facultativa. Tratando-se de prerrogativa do sacado, o protesto por falta de aceite não indica ma-fé, insolvência ou má conduta do que deixou de aceitar.

O mesmo se pode dizer com relação ao protesto tirado com base no art. 13, §2º da Lei 5.474/68. Nos termos desse dispositivo é possível tirar o protesto por falta de pagamento, mesmo que o sacado nunca tenha aposto seu aceite no título ou reconhecido a dívida de qualquer forma. Segundo a letra deste dispositivo, a existência ou não do vínculo obrigacional-cambial não tem correlação com o tipo do protesto. Tanto é que nesses casos o protesto é tirado por falta de pagamento sendo que o sacado não se obrigou a pagamento algum. A doutrina, aliás, elucida que o protesto é tirado em face do título, e não em face do sacado, salientando que nessa fase não tem relevância o fato do sacado ter-se obrigado ao pagamento (FILHO, Celso Barbi. Ob. cit., p. 35).

Por outro lado, para fins de aplicação do art. 29, § 2º da Lei 9.492/97 pouco importa o rótulo atribuído ao protesto. Os pressupostos de incidência deste dispositivo são diferentes daqueles que embasam o art. 13, § 2º da Lei de Duplicatas. Para o art. 29, § 2º da Lei 9.492/97 é juridicamente relevante a existência do vínculo  obrigacionalcambial por parte do sacado. Afinal, já se demonstrou que o protesto terá importância para concessão do crédito somente se representar uma obrigação não cumprida. Então, mesmo que tenha sido tirado por falta de pagamento, sem aceite (art. 13, § 2º da Lei de Duplicatas), não poderá ser divulgado pelas entidades de proteção ao crédito, por se tratar de informação que representa uma realidade totalmente irrelevante para concessão de crédito. Independentemente do nomen juris, aquele ato cartorário está representando uma realidade específica. O art. 13, §2º, ao alterar o nome do protesto, não lhe atribui relevância creditícia. O que importa é o que está ocorrendo de fato. Não prestaria à finalidade alguma a divulgação do protesto por falta de pagamento da duplicata sem prévio aceite, por se tratar de informação sem conexão com os cuidados no fornecimento do crédito, informação verdadeiramente nula para o mercado, recaindo na proibição constante no art. 29, § 2º da Lei 9.492/97.

Vale atentar para o fato de que, prevalecendo a possibilidade de divulgação do protesto por falta de pagamento sem prévio aceite, por parte das entidades de negativação, estar-se-ia prescrevendo uma transmutação da posição do sacado, de “não-aceitante” para “inadimplente”. E no sistema da Lei 9.492/97 essa alteração implicaria desprezo à própria imagem deste terceiro, protegida no art. 29, § 2º, zeloso e restritivo com a divulgação de informações relativas à proteção do crédito. Enfim, a negativação sem correspondência com a realidade teria o condão de alterar a posição jurídica do sacado e espelhar uma inadmissível mentira de alcance nacional.

4. O sacado é consumidor equiparado – disposição expressa dos arts. 17 e 29 do Código de Defesa do Consumidor

Para prosseguirmos na esteira deste raciocínio, cumpre reconhecer como o Código de Defesa do Consumidor enfoca o sacado na duplicata simulada, pois que os dispositivos deste diploma corroboram para a conclusão pretendida neste trabalho.

Assim, tenha-se que nem só quem trava contratos no mercado pode ser considerado, para fins de incidência da Lei 8.078/90, como consumidor. De fato, este diploma normativo prevê textualmente, sem margem a dúvidas, a figura do consumidor equiparado, nos seus arts. 17 e 29, in verbis:

“Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.

(…)

Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.”

Conforme o art. 17 do CDC são estendidas as regras dos seus arts. 12 a 16 para todos aqueles que sofrem danos, sejam materiais ou morais (arts. 6º, VI e VII do mesmo diploma legal) decorrentes de defeitos de inadequação do serviço (art. 14).

Já nos termos do art. 29 do CDC, todas as pessoas expostas às práticas comerciais previstas nos seus capítulos V e VI deverão obediência às normas ali descritas.

A respeito dessas normas, vale destacar os apontamentos da melhor doutrina:

“No Capítulo V, que trata das práticas comerciais, o legislador inseriu o art. 29, para equiparar ao consumidor todas as pessoas, mesmo as que não puderem ser identificadas, que estão expostas às práticas comerciais.

A leitura adequada do art. 29 permite, inclusive, uma afirmação muito simples e clara: não se trata de equiparação eventual a consumidor das pessoas que foram expostas às práticas. É mais do que isso. O que a lei diz é que, uma vez existindo qualquer prática comercial, toda a coletividade de pessoas já está exposta a ela, ainda que em nenhum momento se possa identificar um único consumidor real que pretenda insurgir-se contra tal prática.“ (NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 89)

“No campo extracontratual, o CDC considera suas normas aplicáveis a ‘todas as vítimas do evento danoso’ causado por um produto ou serviço, segundo dispõe o seu art. 17. As vítimas não são, ou não necessitam ser consumidores stricto sensu, mas a elas é aplicada a tutela especial do CDC por determinação legal do art. 17, que as equipara a consumidores.

(…)

Mesmo não sendo destinatário final (fático ou econômico) do produto ou serviço, pode o agente econômico ou profissional liberal vir a ser beneficiado das normas tutelares do CDC enquanto consumidor equiparado. Isto porque, concentrado talvez nesta vulnerabilidade fática, instituiu o legislador brasileiro três normas de extensão do campo de aplicação pessoal do CDC, três disposições legais conceituando os agentes que considera equiparados a consumidores (parágrafo único do art. 2º, arts. 17 e 29).” (MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: RT, 1999, p. 146 e 155).

Especificamente para os cartórios de protesto e para as empresas de proteção ao crédito, pertinentes as seguintes colocações de Antônio Carlos Efing:

“todas as pessoas que tenham seus dados arquivados, ou ainda aquelas que tenham prejuízo em face deste arquivamento, independente do teor da informação, devem ser consideradas consumidores para efeito da aplicação das disposições do CDC acerca dos bancos de dados e cadastros de consumidores, por força do art. 29, recebendo tratamento idêntico ao destinado aos chamados consumidores padrão (destinatários finais)”. (apud, CARVALHO, Ana Paula Gambogi. O Consumidor e o Direito à Autodeterminação Informacional – consideração sobre os bancos de dados eletrônicos. Revista de Direito do Consumidor, vol. 46. São Paulo: RT, 2003, p. 92)

O sacado na duplicata simulada está exposto aos serviços das entidades de proteção ao crédito e aos serviços dos cartórios, podendo ser enquadrado nos dois artigos supra. Destarte, podem ser estendidas aos sacados nas duplicatas simuladas as disposições dos artigos 14, 39, VII, 42 e 43 do CDC.

5. Os titulares dos cartórios de protesto estão submetidos ao Código de Defesa do Consumidor

Os serviços dos cartórios de protesto são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público (art. 236 da CF). Assim como qualquer concessionário de serviço público, os serviços cartoriais estão submetidos ao CDC. Essa afirmativa é confirmada pelos arts. 6º, X e 22 do CDC. É o que está expressamente previsto no seu art. 22, o qual engloba todas as concessionárias e os que prestam serviços de interesse público “sob qualquer outra forma de empreendimento”.

6. Os deveres dos cartórios de protesto perante o sacado

Os cartórios de protesto devem proceder à verificação da existência ou inexistência do aceite no título para constatar a existência do vínculo obrigacional do sacado, em razão do art. 29, § 2º da Lei 9.492/97. É que os cartórios de protesto, por integrarem o iter que conduz as informações até as entidades de proteção ao crédito, deverão contribuir para infundir operabilidade e eficácia ao art. 29, § 2º da Lei 9.492/97. A participação dos cartórios de protesto é uma das maneiras pelas quais as entidades de negativação poderão analisar as informações que recebem, para aplicação do art. 29, § 2º da Lei 9.492/97.

A verificação do aceite é dever dos cartórios na medida em que lhes cabe realizar a verificação dos caracteres formais do título (art. 9º, caput e parágrafo único da Lei 9.492/97). Cabe ao cartório a simples tarefa de checar a existência ou não do aceite, e repassar essa informação às entidades de negativação. Cuida-se de diligência singela, que não inviabiliza os procedimentos cotidianos e não agrega custos extras ao serviço. Anote-se que a verificação da existência ou não do aceite já é providência corriqueira nos serviços dos cartórios, para que seja possível a averiguação do tipo de protesto a ser tirado (art. 21 da Lei 9.492/97). Não é por outro motivo que o art. 23 desse diploma dispõe que os termos de protestos conterão “as anotações do tipo e do motivo do protesto”.

Tal dever também decorre do Código de Defesa do Consumidor, integralmente aplicável aos cartórios de protesto. Vejamos um a um os deveres cogentes descritos em seus artigos:

a) O art. 6º, X determina que a prestação de serviço público, em geral, deve ser adequada e eficaz. Esse serviço somente poderá ser considerado adequado e eficaz na medida em que cumpra o art. 29, § 2º da Lei 9.492/97. Caso contrário não estará sendo eficiente para implementação dessa regra, que de forma alguma pode se tornar letra morta.

O serviço público só é eficiente se for seguro aos consumidores diretos ou equiparados. É o que elucida Luiz Antônio Rizzatto Nunes, Juiz de Direito do Primeiro Tribunal de Alçada do Estado de São Paulo:

“Para uma classificação dos serviços públicos pelo aspecto da qualidade regulados pelo CDC, ter-se-ia, então, de dizer que no gênero eficiência estão os tipos adequado, seguro e contínuo.” (Ob. cit., p. 305).

Não é por menos que a Lei 8.987/95, em seu art. 6º, § 1º conceitua serviço adequado da seguinte forma:

“§ 1º Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.”

Quando os cartórios de protesto repassam para as entidades de negativação a informação de que há um protesto por falta de pagamento, sem a correspondente divulgação da inexistência do aceite, estão prestando um serviço sem segurança, pois contribuem para que um sacado sem vínculo jurídico com o sacador seja taxado no mercado como inadimplente, em total desprezo ao art. 29, § 2º da Lei 9.492/97.

b) Falando em segurança, também é violado o art. 8º do CDC, o qual dispõe expressamente que os serviços prestados no mercado não acarretarão riscos à segurança dos consumidores.

Aqui o legislador criou regra geral que diz muito. Cuida-se de um dever imposto a qualquer fornecedor no sentido de envidar esforços para que terceiros não sejam prejudicados pelos serviços que prestam. Esta regra, repita-se, é geral, acolhe a todos e, portanto, dispensa normas específicas e minuciosas que ditem ao fornecedor condutas de fazer e de não-fazer. A frenética evolução dos fatos, aliás, não comportaria tamanho casuísmo.2

Assim, nos termos do art. 8º em destaque deve o fornecedor envidar esforços para preservar a integridade de qualquer consumidor, direto ou equiparado, “(…) para que no momento de sua atuação ou ao organizar a atuação, ou mesmo a cobrar a sua dívida, não cause danos morais ou patrimoniais (…)” (MARQUES, Cláudia Lima. Ob. cit., p. 115).

Dentro da cláusula de segurança, assegurada por lei a qualquer produto ou serviço prestado no mercado, estão incluídos os deveres de prezar pela incolumidade físico-psíquica e financeira dos consumidores. Ou seja, há um dever de isentar de perigo (= incolumidade) a integridade física, psíquica e financeira por parte de qualquer fornecedor de serviços. Conforme salientado pelo Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Sérgio Cavalieri Filho, “O consumidor tem o direito à segurança – segurança física, patrimonial, psíquica e jurídica.” (Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 424).

Portanto, o fornecedor que não organizar a sua atuação de modo a prezar pela incolumidade físico-psíquica e financeira dos que estiverem sujeitos aos seus serviços estará violando a regra do art. 8º do CDC. Observe-se que o art. 29, § 2º da Lei 9.492/97, ao estampar preocupação com a divulgação somente dos dados que representem relevância creditícia, está reforçando a regra do art. 8º do CDC, conforme permite o art. 7º do mesmo diploma.

c) O art. 14, § 1º, I do CDC determina que o modo de fornecimento do serviço pode torná-lo causador de dano, para fins de responsabilização.

A responsabilidade dos cartórios estende-se também à fase que sucede à lavratura do protesto. Afinal, todos os dados que estes repassarão às entidades de proteção ao crédito (art. 29, § 2º da Lei 9.492/97) também integram os serviços que prestam. Portanto, deverão responder objetivamente por condutas que representam causa de danos. Assim, o art. 13, § 2º da Lei de Duplicatas não exime os cartórios de adequarem seus serviços aos patamares de segurança previstos no Código de Defesa do Consumidor e na Lei 9.492/97.

A responsabilidade prevista neste dispositivo é de natureza objetiva e afasta, pois, toda sorte de ponderações acerca da culpa, o que prejudica toda a escusa a respeito do que cabe ou não ao cartório efetuar até a lavratura do protesto.

O Código do Consumidor foi além da simples tarefa de ordenar que os fornecedores reparassem os danos causados. Em verdade, o objetivo desta lei foi de prevenir a ocorrência do dano, o que está descrito com todas as letras no art. 6º, VI do CDC, o qual erige como direito básico do consumidor a efetiva prevenção de danos patrimoniais e morais, sejam individuais, coletivos ou difusos. Essa disposição reforça o disposto no art. 8º do mesmo diploma, para compreensão de que no ordenamento jurídico brasileiro é vedada a prestação de serviços cujo modus operandi seja causa de danos. Cabe ao Poder Judiciário atuar na garantia destes preceitos (art. 6º, VII).

d) O CDC determinou a responsabilidade solidária de todos os participantes da cadeia de fornecimento do produto ou de prestação do serviço que decorre, portanto, da lei.

Merecem ser trazidos à baila os esclarecimentos de Rizzatto, que indica qual a fonte legal dessa solidariedade:

“A regra da responsabilidade estabelecida no parágrafo único do artigo 7º aparece novamente de forma expressa no caput do art. 18, no caput do art. 19, nos §§ 1º e 2º do art. 25, no § 3º do art. 28 e no art. 34. Dessa forma, está claro no sistema do CDC que a responsabilidade, quer por defeitos, quer por vícios é sempre solidária.” (Ob. cit., p. 131).

A aplicação dos arts. 7º, parágrafo único e 25, § 1º do CDC conduz à inafastável regra da responsabilização solidária dos cartórios de protesto e das entidades de negativação como participantes da cadeia de fornecimento. Os serviços prestados pelas entidades de proteção ao crédito são apenas a ponta de uma cadeia de serviços, incluída nessa rede as atividades dos cartórios de protesto. Estes podem ser comparados, para fins de responsabilidade civil, às montadoras de veículos e empresas de revendas, que respondem em pé de igualdade perante o consumidor.

Por isso que, ao comentar o art. 7º, parágrafo único do CDC, um dos pilares da responsabilidade solidária em foco, José Geraldo Brito Filomeno pondera:

“Como a responsabilidade é objetiva, decorre da simples colocação no mercado de deteminado produto ou prestação de dado serviço, ao consumidor é conferido o direito de intentar as medidas contra todos os que estiverem na cadeia de responsabilidade que propiciou a colocação do mesmo produto no mercado ou então a prestação do serviço.” (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 139).

Não pairam dúvidas de que os cartórios de protesto vinculam-se aos serviços das entidades de negativação no que toca às informações transferidas às mesmas. Ambos devem respeito aos arts. 6º, VI e X, 8º e 14 do CDC, respondendo solidariamente por danos causados em desacordo com essas regras, nos termos dos arts. 7º, parágrafo único e 25, § 1º do mesmo diploma.

e) Mesmo que o art. 29, § 2º da Lei 9.492/97 vinculasse apenas as entidades de proteção ao crédito, o art. 39, VII do CDC veda a todo e qualquer subordinado a tal diploma – inclusive os cartórios de protesto – “repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício dos seus direitos”.

Quando o sacado numa duplicata deixa de apor o aceite, seja por que motivo for, está praticando ato “no exercício de seus direitos”. O protesto poderá ser lavrado por falta de pagamento, nos casos previstos no art. 13, § 2º, da Lei 5.474/68, mas em momento algum poderá ser repassada a informação nestes termos, porque não espelha a realidade (29, § 2º da Lei 9.492/97), sob pena de configurar “informação depreciativa”.

Fácil perceber que o art. 39, VII do CDC reflete, para os cartórios de protesto, a regra do art. 29, § 2º da Lei 9.492/97, mormente quando considerado o art. 7º do CDC.

f) É plenamente aplicável aos cartórios de protesto, igualmente, o art. 43, §§ 1º e 3º do CDC.

Nos termos do art. 43, § 1º do CDC qualquer espécie de cadastro, fichas e registros em que figurem dados pessoais do consumidor (direto ou equiparado), devem ser verdadeiros, ou seja, devem conter informações que reflitam com precisão a realidade.

Caso o sacado não tenha se vinculado de qualquer forma ao título, mesmo que tirado (lavrado) o protesto por falta de pagamento, consoante previsto no art. 13, § 2º, da Lei 5.474/68, devem ser consignadas também outras informações como a existência ou não do aceite, para fins de satisfação desse requisito da veracidade dos dados arquivados, como prevê o art. 43, § 1º do CDC. Em suma, a prerrogativa do art. 13, § 2º da Lei 5.474/68 não afasta a necessária verificação da veracidade dos dados arquivados.

Essas mesmas conseqüências derivam autonomamente do § 3º do mesmo art. 43 do CDC. É que o sacado, na condição de consumidor equiparado, poderá requerer a averbação de qualquer correção referente aos seus dados arquivados junto aos cartórios de protesto.

Principalmente nas hipóteses dos arts. 7º, 8º e 21, c/c art. 15, II da Lei 5.474/68, que especificam os casos em que o sacado poderá deixar de aceitar a duplicata, será de inequívoca aplicação o citado art. 43. Em razão do disposto nestas regras, havendo justificativa, poderá o sacado anotar no próprio título a razão pela qual recusa o aceite, como explica Wille Duarte Costa:

“No entanto, se extraída a duplicata, esta deve ser remetida ao sacado para o aceite. Isto é não só obrigação do sacador, mas também direito do sacado que, com a duplicata em suas mãos, poderá aceitá-la ou devolvê-la com uma declaração, por escrito, contendo as razões da falta de aceite.” (Títulos de Crédito. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 401)

Essas anotações deverão constar dos registros efetuados nos cartórios de protesto, em obediência ao art. 43, § 3º do CDC e ao art. 29, § 2º da Lei 9.492/97.

E mesmo que fosse inaplicável de todo o art. 43 do CDC, ainda assim a mesma providência poderá ser tomada, por disposição expressa do art. 22, IV da Lei 9.492/97, já que esta norma prevê o direito de responder às intimações efetuadas pelos cartórios de protesto. Exatamente sobre esta previsão legal comenta Celso Barbi Filho:

“Dessa forma, inexistindo comprovante de entrega da mercadoria ou da prestação do serviço, pois a duplicata é simulada, nada impede que o sacado, intimado da iminente realização do protesto, simplesmente compareça ao cartório respectivo e justifique por que não aceita nem paga o título. Tal justificativa constará da certidão de protesto, a teor do art. 22, IV, da Lei nº 9.492/97, e o credor não poderá executar ou pedir a falência do sacado, mesmo que lavrado o protesto.” (Ob. cit., p. 41)

Evidentemente as justificativas permitidas pelos arts. 7º, 8º e 21, c/c art. 15, II da Lei 5.474/68, consignadas no título ou averbadas no registro cartorário por força do art. 22, IV da Lei 9.492/97, devem ser repassadas pelos cartórios às entidades de proteção ao crédito, para fins de obediência ao art. 29, § 2º da Lei 9.492/97. Isso sem levar em conta a ampla disposição do art. 43 do CDC, o qual permite a anotação para correção e manutenção da veracidade dos dados arquivados.

Resta patenteado, mais uma vez, que os cartórios de protesto integram o iter essencial dos dados que serão divulgados pelas entidades de proteção ao crédito.

No Código Civil de 2002 também podem ser apontadas normas que conduzem à conclusão de que os deveres dos cartórios de protesto, perante o sacado, vão muito além de bater um carimbo e repassar uma informação deficiente às entidades de proteção ao crédito.

Assim é que, em seu art. 927, parágrafo único, está estampado que se a atividade de qualquer prestador de serviços implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem, haverá a obrigação de reparação do dano. Aqui o ordenamento jurídico positivou o dever de indenizar pelos riscos criados no mercado. Cuida-se de norma aberta, que traz em seu âmago o dever de não causar dano de qualquer espécie, na prestação do serviço, sob pena de responsabilização civil. Com esta criação do Código Civil, daqui em diante todo o agente do mercado deverá pugnar pela elaboração de serviços ou de produtos que não causem danos, sob pena de adequá-los (art. 84 do CDC e 461 do CPC) ou de indenizar. Esta regra, ao impor a responsabilização quando a atividade implicar riscos para direitos de outrem, erige-se em cláusula geral, no sentido de determinar a adequação da atividade ao patamar de segurança, afastando-se discussões acerca da culpa (responsabilidade objetiva).

Caio Mário da Silva Pereira, comentando o seu Anteprojeto do Código de Obrigações, de 1965, destaca o art. 972 que consiste na fonte do art. 927, parágrafo único do Código Civil de 2002, oportunidade em que elucida a razão e a finalidade da teoria do risco criado:

“Com o desenvolvimento dos equipamentos técnicos, multiplicaram-se os danos atribuíveis a pessoas jurídicas de direito privado. Conseguintemente, o princípio da responsabilidade das pessoas jurídicas evoluiu para a doutrina do risco criado. Provado o dano e o nexo causal entre este e o fato do agente, a pessoa moral é obrigada à reparação.

Ao elaborar o Anteprojeto do Código de Obrigações, de 1965, fiz consignar no art. 972 do Projeto: aquele que, em razão de sua atividade ou profissão, cria um perigo para terceiros, está sujeito a reparar o dano que causar.

Com este dispositivo, procurei inserir em nosso direito, com visos de generalidade, a responsabilidade civil fundada na teoria do risco criado, com a aprovação de Aguiar Dias.” (Direito Civil. Alguns aspectos da sua evolução. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 134 e 135).

Assim, o art. 927, parágrafo único do Código Civil de 2002 vem em reforço da constatação de que os cartórios de protesto devem obediência ao art. 29, § 2º da Lei 9.492/97, pois se não repassam às entidades de proteção ao crédito todos os dados objetivos que possuem acerca do título de crédito protestado (v.g, inexistência de aceite), acrescidos de todos os apontamentos realizados em razão dos arts. 7º, 8º e 21, c/c art. 15, II da Lei 5.474/68, combinados com o art. 22, IV da Lei 9.492/97, estão criando “risco para os direitos de outrem”. Tais riscos consistem exatamente no fato de que o protesto poderá ser divulgado mesmo quando não represente “informações restritivas de crédito” (art. 29, § 2º da Lei 9.492/97).

Está na raiz da norma do art. 927, parágrafo único do Código Civil de 2002 a diretriz da solidariedade social, em manifesta consagração da responsabilidade solidária dos participantes da cadeia de fornecimento do produto ou serviço do Código de Defesa do Consumidor. Assim se posiciona Judith Martins-Costa:

“Acerca dessa cláusula geral, seja-nos lícito reproduzir o que observamos em outra ocasião: ‘No seu parágrafo único (do art. 927), o Código institui espécie de cláusula geral de responsabilidade objetiva ao determinar o nascimento do dever de indenizar, independentemente de culpa, não apenas nos casos especificados em lei, mas também ‘quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem’. No substrato dessa norma está a noção de estrutura social, tão cara a Miguel Reale, entendendo-se por esta ‘um todo de valorações, determinado pela polarização de uma valoração-matriz’, incompreensível ‘em termos de mera causalidade, ou de puras relações formais’. Assim é que, transposta ao plano da dogmática da responsabilidade civil, esta noção permite afirmar: ‘Se aquele que atua na vida jurídica desencadeia uma estrutura social que, por sua própria natureza, é capaz de pôr em risco os interesses e os direitos alheios, a sua responsabilidade passa a ser objetiva e não mais apenas subjetiva’. Em outras palavras, é a noção metajurídica de ‘atividade normalmente exercida pelo autor do dano, que implique risco’, a ser necessariamente concretizada pelo intérprete, que definirá qual o regime aplicável à responsabilidade, constituindo essa norma, ao meu ver, a projeção, neste domínio, da diretriz da solidariedade social.” (Comentários ao Novo Código Civil. Volume V. Tomo I. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 74 a 76).

A significação prática da norma em foco, portanto, está na responsabilização daquele que “desencadeia uma estrutura social que, por sua própria natureza, é capaz de pôr em risco os interesses e os direitos alheios”.

7. Os deveres das entidades de proteção ao crédito perante o sacado

As entidades de proteção ao crédito são destinatárias das informações prescritas no art. 29 da Lei 9.492/97. Nos termos do § 2º do mesmo artigo as entidades referidas no seu caput só poderão prestar “informações restritivas de crédito”. No que se refere a informações não restritivas de crédito estas nunca poderão ser divulgadas.

A necessidade dessas entidades responderem perante o sacado decorre não só deste dispositivo, mas também de todos aqueles destacados no item 6 deste trabalho: arts.  6º, X, 8º, 14, § 1º, 39, VII, 43 e parágrafos do CDC e 927, parágrafo único do CC/2002. Todas as razões da aplicação dessas normas destacadas cabem para o caso das entidades de negativação.

Vale ressaltar que tais entidades devem também prestar no mercado um serviço seguro e manter cadastros verdadeiros (art. 43, §1º do CDC). Se as entidades de negativação quiserem estar seguras de que as informações que divulgam representam a mais lídima realidade, deverão exigir a comprovação do aceite no caso de protestos originários de duplicatas, ou qualquer outra comprovação de que o sacado vinculou-se ao título. Caso contrário não se pode defender que há prestação de um serviço seguro. O ordenamento jurídico repudia a prestação de qualquer serviço que opere qual “rolo compressor”.

Mas, como observa Celso Barbi Filho, o que se constata é a

“atitude abusiva e inconseqüente dos órgãos de cadastro de crédito, que coletam e divulgam informações parciais a seus consulentes, deixando de noticiar adequadamente os registros apurados, diferenciando bem a motivação e as implicações jurídicas dos protestos que divulgam.” (Ob. cit., p. 41).

É poderosa a combinação do art. 43, § 3º do CDC com o art. 29, § 2º da Lei 9.492/97, já que a retificação do dado incorreto realizada pelo consumidor, fazendo uso do seu direito previsto no art. 43, § 3º do CDC, trará como reflexo a proibição da divulgação da informação não restritiva de crédito.

Caso se entenda que no art. 29, § 2º da Lei 9.492/97 não existe a proibição de divulgação da informação não restritiva de crédito, deve-se compreender que a referida vedação decorreria da própria natureza dessas entidades: proteger o crédito. Essa delimitação está presente no art. 43, §§ 4º e 5º do CDC, ao se referir aos “Sistemas de Proteção ao Crédito”.

Ontologicamente essas entidades foram criadas para proteger o crédito, e não poderão extrapolar essa finalidade. A tarefa dessas entidades não é a de proceder como vitrine qualquer exposta para o país, mas sim prestar um serviço de centralização das informações pertinentes à proteção do crédito.

Se excedem as finalidades às quais estão afetas, essas entidades incorrem em evidente abuso de direito. Claríssima a redação do art. 187 do CC/2002:

“Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercêlo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”

Assim, se o papel dessas empresas é proteger o crédito, não podem divulgar dados irrelevantes para esta finalidade.

8. Medidas extrajudiciais

O enfoque jurídico apresentado neste trabalho tem como efeito prático a compreensão de que as denominadas ações de sustação de protesto não consistem na única via legal para proteger o sacado dos efeitos coercitivos do protesto de duplicata simulada, o que abre um leque para outras medidas extrajudiciais e judiciais.

Primeiramente, é importante relembrar algumas medidas extrajudiciais já relatadas linhas atrás e que são constantemente destacadas pela melhor doutrina. Dessa forma, caso o sacado tenha acesso ao título e justificadamente decida não aceitá-lo, deverá fazer constar na própria cártula as razões desta decisão. Oportunas, nesse sentido, as colocações de Celso Barbi Filho:

“O mesmo se diga quando o título não for simulado, mas houver vícios ou diferenças quantitativas ou qualitativas na mercadoria. Para tal hipótese, contudo, o comprador tem que devolver a duplicata recebida para aceite e pagamento no prazo de 10 dias de sua apresentação com a justificativa de por que não o aceitou, na forma do art. 7º, da Lei nº 5.484/68. No entanto, intimado do protesto, pode simplesmente responder ao tabelião por que não aceita nem paga o título, e o credor não poderá executá-lo ou pedir sua falência, tendo em vista a previsão do art. 15, II, c da Lei de Duplicatas.

Destaquem-se ainda as hipóteses de erro de procedimento do portador quanto ao protesto. São casos como o de protesto por falta de aceite de título já vencido, agora vedado pelo art. 21, § 1º, da Lei nº 9.492/97; título enviado pelo emitente para aceite mais de 30 (trinta) dias após a emissão, ou enviado pela instituição financeira mais de 10 (dez) dias após o recebimento da cártula, situações que violam o art. 6º, da Lei nº 5.474/68. Em tais hipóteses, o sacado pode legitimamente recusar a declaração cambial em face do erro procedimental do emitente ou do portador, prejudicial aos direitos do sacado.”(Ob. cit, ps. 41 e 42).

Especificamente no que diz respeito à impossibilidade de divulgação de protestos irrelevantes para a proteção do crédito, cabem providências extrajudiciais perante os cartórios de protesto e perante as entidades de proteção ao crédito. No que tange ao primeiro caso, por previsão expressa do art. 22, IV da Lei 9.492/97, pode o sacado, após intimado da iminente lavratura do protesto, comparecer ao cartório e justificar por qual motivo não aceita nem paga o título, justificativa essa que deve ser consignada na certidão de protesto. Todo o teor da certidão do protesto, inclusive esta justificativa averbada, deve ser repassada às entidades de negativação, em virtude do art. 29 da Lei 9.492/97. As entidades de proteção ao crédito, tomando ciência de todo este teor, não poderão divulgar o protesto tirado, por ser totalmente irrelevante para a proteção do crédito.

Perante as entidades de negativação, ainda extrajudicialmente, poderá o sacado fazer uso do seu direito de retificação do dado inexato, com base no art. 43 do CDC. Esclarecido juntamente a essas entidades que o protesto é irrelevante para a proteção do crédito, elas não mais poderão divulgá-lo, ex vi do art. 29 da Lei 9.492/97 e dos demais dispositivos amplamente analisados nos itens acima.

Atente-se, ainda, que fazendo uso do art. 43 do CDC, o sacado pode retificar dados, preenchendo omissões e aclarando os contornos do protesto lavrado.

Contudo, é cediço que os canais de consulta aos bancos de dados das entidades de proteção ao crédito, muitas das vezes, não possibilitam o acesso a informações mais completas. Ou seja, os aparelhos que possibilitam o acesso a tais bancos de dados são de capacidade limitada. As consequências disso são graves, pois a limitação dos aparelhos de consulta pode resultar numa informação limitada e deturpada àquele que pretende conceder o crédito. Como exemplo pode ser citado um fornecedor que consulta uma fonte de dados onde consta a explicação que determinado título nunca recebeu aceite e, apesar disso, em razão da limitada capacidade da máquina de acesso, ele toma conhecimento apenas da existência de um protesto, sem maiores especificações sobre o tipo e razões. Assim, na impossibilidade de divulgação integral dos dados relativos ao protesto, ter-se-ia como conclusão indeclinável a insustentabilidade de qualquer divulgação. Defender o contrário é pugnar pela prestação de um serviço inseguro, causador de dano, recaindo em todas as vedações legais trabalhadas nos Itens 6 e 7. Portanto, mesmo que se entenda pela ineficácia do art. 29 da Lei 9.492/97 em obstar a divulgação de protestos irrelevantes para a proteção do crédito, a correção da inexatidão do dado permitida pelo art. 43 do CDC traria como conseqüência prática a impossibilidade de divulgação do dado, pois existem no mercado inúmeros aparelhos de acesso aos bancos de dados das entidades de proteção ao crédito que não possibilitam ao consulente a ciência integral de tudo quanto nestes contido.

A averbação permitida pelo art. 43 do CDC perante as entidades de proteção ao crédito também é cabível perante os cartórios de protesto, já que o caput deste dispositivo não se restringe às entidades de negativação, abrangendo quaisquer cadastros, fichas e registros, o que se pode confirmar no § 4º do mesmo dispositivo, que se refere antes a “bancos de dados” e “cadastros” para somente depois mencionar os “serviços de proteção ao crédito”. Essa prerrogativa do sacado está no CDC, motivo pelo qual não pode ser prejudicada por qualquer eventual leitura distorcida que se faça do art. 22, IV da Lei 9.492/97.

9. Medidas judiciais

O meio mais utilizado para por fim aos efeitos do protesto de duplicata simulada tem sido a ação cautelar de sustação de protesto. Celso Barbi filho orienta, acertadamente, que seria o caso de requerer a tutela antecipada:

“Com o advento do instituto da tutela antecipada, previsto no art. 273, do CPC, parece-me que a sustação do protesto pode ser judicialmente deferida por antecipação de tutela. Com efeito, a sustação é um provimento que antecipa os efeitos do pleito principal de impedimento definitivo do protesto. Ao mesmo tempo, é um provimento tipicamente reversível. Assim, sempre que o julgador convencer-se da versossimilhança do direito invocado na ação e, trazendo o protesto, pelo menos no plano comercial, fundado receio de dano de difícil reparação, infere-se ser perfeitamente cabível a sustação de protesto por antecipação de tutela.

A tal respeito, oportuno citar algumas palavras de Luiz Guilherme Marinoni, processualista paranaense que tem se destacado no estudo da antecipação de tutela. Anota ele que ‘a tutela de sustação de protesto, em caso de inexistência de relação jurídica, é tutela antecipatória preventiva. A tutela visa a impedir que seja praticado um ato enquanto pende a demanda que irá deixar clara a sua ilegitimidade. A tutela de sustação de protesto, no caso de demanda desconstitutiva, também é antecipatória, já que impede a prática de um ato que não poderia ser efetivado se já houvesse sido pronunciada a desconstituição.’

Vale destacar pelo efeito prático que, com a sustação do protesto por antecipação de tutela na ação em que se formula o pleito declaratório ou desconstitutivo da cobrança ilegítima, já fica previamente resolvida a questão da necessidade de propositura tempestiva (30 dias) da ação principal, quando a sustação se dá por via de medida cautelar preparatória” (Ob cit., p. 43).

Na prática, contudo, muitos julgadores, por motivos que certamente fogem à técnica jurídica, não aceitam o cabimento da tutela antecipada. Tal relutância é lamentável, pois demonstra a continuação da velha tendência de imaginar que as fórmulas do Direito existem para proporcionar a comodidade intelectual, mas a técnica jurídica não pode ser encarada como um “passa figuras”, brinquedo pedagógico de encaixar blocos geométricos.

Porém essa discussão deve ser transposta para trabalho específico. Nesta oportunidade importa verificar que o foco do provimento jurisdicional almejado, nos termos ora propostos, é outro. A ação de sustação de protesto ataca o protesto em si. Já segundo a dicotomia protestos relevantes/irrelevantes para a proteção do crédito, na ótica do art. 29, § 2º da Lei 9.492/97 e dos demais dispositivos legais já comentados, a solução legal é vedar a divulgação do protesto. Em outras palavras, o protesto aqui fica intocado, proibindo-se apenas a sua divulgação.

Esse desiderato seria alcançado por via da tutela específica, delineada nos arts. 84 do CDC e 461 do CPC, com a imposição de um dever de abstenção por parte das entidades de negativação no que se refere à divulgação de protestos irrelevantes para a proteção do crédito. Mais especificamente serviria ao sacado a denominada tutela inibitória, com fulcro nestas mesmas normas, para impedir a prática ou a continuação deste ilícito. (MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Específica- arts. 461, CPC e 84, CDC. São Paulo: RT, 2001, ps; 83 e 136).

Tal medida judicial deverá ser tomada contra todas as entidades de negativação que puderem ter ou efetivamente tiveram acesso aos dados transmitidos pelos cartórios de protesto, contendo outro pedido, igualmente fundamentado nos arts. 84 do CDC e 461 do CPC, no sentido de absterem-se aquelas de retransmitir a outras entidades de proteção ao crédito os protestos irrelevantes para a proteção do crédito.

A ação deverá ser instruída com todos os documentos, caso existentes, que comprovem as medidas extrajudiciais tomadas perante os cartórios de protesto e perante as entidades de proteção do crédito, a exemplo de protocolos e notificações.

Nesse aspecto, aliás, cabe perquirir sobre as providências do sacado na hipótese dos cartórios ou das entidades de negativação não aceitarem, no primeiro caso, a averbação do direito de resposta do sacado (art. 22, IV da Lei 9.492/97), e em ambos os casos, recusarem a averbação permitida pelo art. 43 do CDC. A resposta não é única.

Diante da relutância dos cartórios de protesto, é plenamente cabível o mandado de segurança. Outrossim, é possível o requerimento da tutela específica (arts. 84 do CDC e 461 do CPC) em ação ordinária com requerimento de medida liminar, para o fim de procederem à averbação da retificação ou aclaramento dos dados referentes ao sacado. Vale esclarecer que estas ações deverão ser ajuizadas em face dos titulares dos cartórios de protesto, uma vez que os cartórios não têm personalidade jurídica nem judiciária. Durante esta exposição foram feitas várias referências aos cartórios de protesto somente no intuito de facilitar a compreensão do tema. Contudo, responde em juízo o titular do cartório de protesto.

Na hipótese de recusa ao cumprimento da lei por parte das entidades de negativação, mais especificamente com relação ao direito de retificação e aclaramento do dado referente ao sacado, cabe cumular outro aos pedidos apontados no início deste item, respeitante ao acréscimo (averbação) dos esclarecimentos trazidos pelo consumidor equiparado. Cuida-se de pedido autônomo e distinto dos demais, pois a proibição da divulgação dos protestos irrelevantes para a proteção do crédito não implica supressão no banco de dados, e o consumidor tem direito ao esclarecimento mesmo diante da entidade responsável pelo dado arquivado. Ainda assim, o pedido em análise cabe na forma subsidiária. Neste último caso com a conseqüência da entidade de proteção ao crédito ter que transmitir o dado integralmente, incluindo os esclarecimentos aduzidos pelo sacado, sob pena de resposabilização civil.

Todos os pedidos retro podem ser cumulados com o de indenização por danos morais e materiais. Até agora os cartórios de protesto e as entidades de negativação não vêm respondendo maciçamente pelos protestos de duplicatas simuladas, exatamente em virtude do desconhecimento e da não aplicação dos dispositivos legais comentados no decorrer deste trabalho. Aqui reside uma das vantagens em se reconhecer o tratamento jurídico diferenciado dos protestos irrelevantes para a proteção do crédito, pois a responsabilização civil ora preconizada, somada à proibição da divulgação do protesto irrelevante para a proteção do crédito, contribuirá para uma considerável redução dos contratos de desconto de duplicatas simuladas. Com o fim da coerção encetada pelo protesto das duplicatas simuladas, as instituições financeiras acabarão recusando o desconto desses títulos sem lastro na realidade. Explique-se: as instituições financeiras efetuam a operação de desconto de duplicatas simuladas, sem maiores averiguações, porque na grande maioria das vezes os sacados, pressionados pelo protesto, acabam pagando o título, mesmo que nele nunca tenham se obrigado. Vedada a divulgação de tais protestos, o pagamento forçado indevido provavelmente deixará de ser generalizado.

A mudança de enfoque ora proposta, para o impedimento da divulgação do protesto, também traz como vantagem o fato de desobrigar o sacado de atuar judicialmente dentro do prazo em que o oficial do cartório deve registrar o protesto, previsto no art. 12 da Lei 9.492/97. De acordo esta lei, o exíguo prazo de três dias para a lavratura do protesto deve ser contado com a exclusão do dia da protocolização e com a inclusão do dia do vencimento, podendo o protesto ser tirado, excepcionalmente, no primeiro dia útil seguinte quando a intimação for efetivada no último dia do prazo ou além dele (art. 13). Considerando que a ação de sustação de protesto deve ser ajuizada antes da lavratura do protesto, ou seja, antes da consumação deste prazo comentado, não é exagero afirmar que esta solução judicial para afastar os efeitos do protesto na duplicata simulada é de causar danos cardíacos em qualquer advogado. Como a medida de impedimento da divulgação dos protestos irrelevantes para a proteção do crédito não ataca o protesto em si, poupa-se o coração do advogado e a tão conhecida maratona dos oficiais de justiça que se esmeram, entre outros serviços, para fazer o mandado judicial de sustação de protesto chegar aos cartórios antes de consumado o prazo do art. 12 da Lei 9.492/97.

Uma análise mais profunda da recente Lei 9.492/97, do CDC e do Código Civil de 2002, diplomas ainda pouco explorados, conduz à conclusão de que o ordenamento jurídico dispõe de outros parâmetros técnicos para o tratamento dos protestos de duplicatas simuladas, cujas aplicações em juízo certamente renderão bons resultados.

 

Notas:
1 Uma interpretação adequada dos referidos dispositivos não conduziria a esta conseqüência, tanto sob o ponto  de vista infraconstitucional quanto sob o constitucional, uma vez que tal interpretação ofende o princípio da proporcionalidade inerente ao devido processo legal. No entanto, não é objetivo deste artigo desenvolver tais argumentos, que ficam para outra oportunidade.
2 Conforme elucida Gustavo Tepedino, “a técnica das cláusulas gerais é um reconhecimento de que ao Direito tem-se tornado árdua a tarefa de acompanhar a evolução social, apresentando-se infrutífera a tentativa de tipificar a totalidade das situações jurídicas, para não dizer ingênua.” (Problemas de Direito Civil-Constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 15.)

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Marco Paulo Denucci Di Spirito

 

Advogado em Belo Horizonte/MG

 


 

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