Breves reflexões acerca do papel do magistrado no processo civil contemporâneo

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Com um tema de maneira nenhuma inédito, entretanto, ainda em comento, em razão de dois conceitos que se busca hodiernamente com fervor aplicar ao Processo Civil Brasileiro de uma maneira geral, quais sejam, a efetividade e a celeridade, pretende este modesto texto buscar qual seria a posição do Juiz de uma forma genérica nesse contexto.

Diante dos Princípios já consagrados como o da Imparcialidade e do Dispositivo, poderia o “presidente” do processo interferir de maneira ativa na busca da verdade real e da efetivação da prestação jurisdicional em concreto, ou estaria em razão dos ditos princípios, engessado, restando ao mesmo uma posição inerte limitada ao impulso oficial?

A idéia básica é buscar despretensiosamente soluções e verificar meios que já vêm sendo utilizados pelos Juízes, a fim de que estes restem mais participantes e ativos na descoberta da verdade real, da celeridade e da efetivação do trabalho prestado.

É sabido que em todas as fases do processo civil o papel do Juiz é fundamental, não se resumindo a sua atuação ao atos decisórios apenas. Ademais, é sabido também que o Processo Civil é alicerce de muitos outros ramos processuais do Direito, sendo, inclusive, utilizado como fonte subsidiária.

Desta feita, indubitável a relevância do assunto em comento, certo de que a pretensão maior não é meramente formal, mas sim a de analisar o problema da morosidade judicial de uma maneira mais séria, crítica e aprofundada.

Sistemas outros existem, onde o Juiz ou Órgão Julgador têm postura totalmente diferente da adotada em nosso país, sem, contudo, prejudicado restar o princípio da Imparcialidade. Tudo justificado por um outro e importante Princípio Processual, qual seja, o Princípio da Cooperação Intersubjetiva.

Certo da existência do supracitado princípio e da sua importância na cognição processual, percebera-se que a efetiva celeridade e prestação jurisdicional extrapolam as meras alterações legislativas com o fito de aumentar ou reduzir mais uma espécie recursal, ou ainda, a modificação, inclusão ou supressão de qualquer procedimento.

Inobstante serem de grande valia muitas das modificações feitas nos últimos anos, percebemos ao lançar um olhar mais atencioso e “apurado” que, muitas questões rotuladas por atravancarem a justiça brasileira pouco progrediram, e por vezes até regrediram.

A despeito das implicações e polêmicas filosóficas quanto à existência ou não da imparcialidade do Julgador, fato é que tradicionalmente o Juiz brasileiro tem se mantido inerte no Processo Civil, atribuindo em alguns casos a responsabilidade exclusivamente às partes, o que vem a ser incoerente, visto que, também tem ele, o Juiz, enquanto representante estatal, mesmo no Processo Civil, o legítimo interesse numa prestação jurisdicional autêntica.

Com o advento da Pós-modernidade, da globalização, do desenvolvimento da comunicação, um fenômeno consagrou-se no meio da sociedade humana, a saber, a velocidade.

Nos dias hodiernos é muito rápido comunicar-se, negociar, alimentar-se, ir ao banco, etc. Apesar de toda essa rapidez nas condutas humanas, ainda há algo intrigante!

A solução de litígios e conflitos, com o passar dos anos, “andou” em direção contrária, tornando-se cada dia mais lenta, e por vezes, quando rápida, ineficaz.

Obviamente que o ser humano comum, habituado que está com a rapidez até das relações humanas, não pode conceber a morosidade e imprestabilidade de algo tão essencial nesse mundo corrido, qual seja, a prestação jurisdicional.

A necessidade de respostas rápidas, de soluções a tempo e de modo digno e justo tem sido excrescente.

Toda essa cobrança do cidadão se dá legitimada pelo fato de não poder mais ele defender seus interesses, certo de que tolhido está da autotutela, sob pena de incorrer no cometimento até do crime de “exercício arbitrário das próprias razões”.

A resposta aos conflitos deriva, como é sabido de todos, do Juiz, sujeito participante da relação processual que, segundo lecionado na obra Teoria Geral do Processo deve ter a qualidade de terceiro estranho ao conflito, essencialmente. [1]

Essa figura estranha responsável pelo fim do litígio tem que obedecer alguns deveres estipulados pela Legislação Processual, e ainda detém certos poderes que se caracterizam predominantemente em “poderes-deveres”, vez que mais que mera faculdade resultam em verdadeira obrigação.

Sua atividade não se limita à decisões e sentenças, mas também deve conduzir o processo com integridade, buscando o fim maior da lei, qual seja, a justiça.

Acerca dessa interligação entre lei e justiça, ambas intrinsecamente ligadas, veja-se:

“Pode ser enfatizado que a idéia de lei sempre esteve associada à idéia de justiça, e se se concordar que isso representa o objetivo supremo que a lei deve esforçar-se por atingir, então poderemos chegar mais diretamente à finalidade da lei, sem nos vermos emaranhados nos valores de certas sociedades, com todos os seus conflitos e incertezas. Pois, no fim de contas, não são esses mesmos valores, na medida em que procuram ser consubstanciados nas leis da comunidade, meramente uma expressão individual do esforço geral no sentido da própria justiça?” [2]

Visando agir de forma justa e coerente, visto que presta um serviço à comunidade, o Magistrado deverá não apenas sentenciar, mas propiciar às partes todas as oportunidades de participação a que têm direito e dialogando amplamente com elas.[3]

Apesar de correta a posição acima referida, deveres outros têm os Magistrados em face do novo paradigma de Processo Civil apresentado.

Ora, a despeito da imparcialidade, a qual, Humberto Theodoro Júnior citando José Frederico Marques bem se refere como “É imprescindível à lisura e prestígio das decisões judiciais a inexistência da menor dúvida sobre motivos de ordem pessoal que possam influir no ânimo do julgador” [4], atribuições outras devem ser cometidas aos Magistrados, uma vez que representam o interesse coletivo de presteza.

O Princípio da Cooperação Intersubjetiva permite que o Juiz ou o Órgão Julgador possa incitar, auxiliar, esclarecer, questionar, advertir as partes, sem colocar em prejuízo a imparcialidade acima tratada.

Isso só é possível de ser observado se entendemos o Juiz como sujeito ativo no processo e não mais alguém engessado, limitado apenas àquilo que é trazido pelas partes espontaneamente. Tal entendimento e ainda mais, tais atitudes só vêm a contribuir no processo de cognição e encontro da verdade real; entendimento este defendido sabiamente pelo Prof. Dr. Lúcio Grassi de Gouveia, com o qual coadunamos.

Não se pode aceitar um juiz retrógrado, absolutamente inerte, mais preocupado com a subsunção pura, como se estivesse em frente a uma equação matemática, do que com a efetividade e justiça da solução encontrada.

Tal conduta seria inconcebível com os conceitos já citados e que vêm sendo perseguidos com fervor. Entretanto, importante não olvidar que não interessa às partes um processo célere, mas vazio em seu conteúdo, afastado da justiça, da presteza, eivado de vícios e de um exame precipitado e precário do mérito.

É, sem sombra de dúvidas, o papel do Juiz, o mais relevante na relação processual, não havendo problema em lhe permitir, graças à sua necessidade de elementos para a formação da convicção e sua posição neutra, esclarecer, questionar, incitar, etc. as partes.

Tal ampliação não prejudica os princípios basilares do processo, no que tange à imparcialidade e o dispositivo, a contrario sensu, viabiliza a conquista do novo perfil almejado para a justiça.

Nesse mesmo diapasão, veja-se posição doutrinária:

“O Juiz indiferente, impotente perante a vontade das partes, é inconcebível ante os novos anseios da sociedade. Além dos novos tipos de conflitos que brotam constantemente nas diversas regiões desse grande país, é preciso tutelar adequadamente os conflitos antigos e hoje potencializados pela rapidez com que se desenvolvem as relações pessoais, seja no campo das relações entre pessoas físicas, seja entre grandes empresas nacionais ou multinacionais. O que importa é que o processo civil da forma como está não permite que o Estado, por meio de seus juízes, cumpra com sua função pacificadora (talvez fosse melhor solucionadora).”[5]

Muitos são os entraves e as dificuldades, mas numa busca da verdade real também em sede de Processo Civil, permitir ao magistrado uma maior liberdade, desde que somada com bom senso e coerência, razão não há para temer prejuízos à imparcialidade e à provocação, mas ao contrário, razões muitas ter-se-ão para o alcance de tudo o que se tem buscado nos dias atuais com reformas superficiais, apressadas e inconsistentes.

 

Referências bibliográficas:
ALVIM, José Eduardo Carreira. Alterações do código de processo civil. 2.ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2006.
CARNEIRO, Athos Gusmão. Jurisdição e Competência. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 19 ed. São Paulo: Malheiros. 2003.
CRUZ JR, Edmilson; MENEZES, Iuri Pedroza; COSTA DE SANTANA, Luiz Antônio da. Comentários às reformas do Código de Processo Civil. Recife: Nossa Livraria, 2006.
GOUVEIA, Lúcio Grassi. Cognição processual civil: Atividade dialética e cooperação intersubjetiva na busca da verdade. In: Fredie Didier Jr. Leituras complementares de processo civil. 5. ed. Salvador: Jus Podivm, 2007.
LLOYD, Dennis. A idéia da lei. Tradução: Álvaro Cabral. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
PINTO, Antônio Luiz de Toledo; WINDT, Márcia Cristina Vaz dos Santos; CÉSPEDES, Lívia. Vade Mecum Saraiva.  São Paulo: Saraiva, 2006.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 40 ed. Rio de Janeiro:Forense, 2003. v.1.
VECHIATO JÚNIOR, Walter. Processo Civil- reformas e atualidades. 1. ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira.
VICENZI, Brunela Vieira de. A boa-fé no processo civil. São Paulo: Atlas,2003.
Notas:
1. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo;  GRINOVER, Ada Pellegrini;  DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 19 ed. São Paulo: Malheiros. 2003. p. 294.
2. LLOYD, Dennis. A idéia da lei. Tradução: Álvaro Cabral. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000. pp. 137/138.
3. CINTRA, Op. Cit. p.  294.
4. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 40 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. v.1.p 186.
5. VICENZI, Brunela Vieira de. A Boa-Fé no Processo Civil. São Paulo: Atlas, 2003. p. 54

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Viviane Soares Wanderley

 

Advogada em Recife/PE e Assessora Parlamentar da Câmara de Vereadores do Recife/PE
Pós-graduada em Direito Processual Civil pelo Instituto dos Magistrados de Pernambuco- UCAM – Universidade Cândido Mendes.

 


 

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