Da responsabilidade civil da empresa: Concepção objetiva X concepção subjetiva

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A evolução do Direito, como espeque natural de seu desenvolvimento, fez reconhecer ao empregado o direito não tão somente a danos de natureza material, no que concerne à indenização decorrente do destrato reconhecidos na Consolidação, mas também danos de natureza material, de natureza indenizatória (dano iminente e lucros cessantes), assim como danos de natureza moral.


A regra concebida pelo Direito contemporâneo, hoje, é a prevalência da teoria objetiva da responsabilização civil sobre a teoria subjetiva, que prescinde a três elementos: conduta omissiva ou comissiva do agente (culpa), nexo causal e o dano, sendo pautada na conduta culposa do agente como pressuposto para o dever de indenizar. Já a objetivação prescinde a, somente, o fato ocorrido e não na culpa, possuindo como fundamentos as chamadas teorias do risco.


De toda a sorte, na objetivação da culpa também se deve levar em consideração a conduta omissiva ou comissiva, a existência do dano e o nexo, conforme menciona a juíza Monica de Amorim Torres Brandão, no livro “Responsabilidade Civil do Empregador no Acidente do Trabalho”, in verbis: “Para a configuração da teoria objetiva da responsabilidade civil são necessários os seguintes elementos: uma ação ou omissão lícita ou ilícita, dano à esfera juridicamente protegida de outrem e nexo de causalidade entre o comportamento do agente e o dano.”


Assim, podemos asseverar, com escopo na citação da referida autora, que contrariamente do que se pensa, a objetivação da responsabilidade civil não exclui a necessidade da demonstração da culpa, dano e do nexo causal, mas tão somente não põe a culpa como fundamento para a reparação, mas o dano.


Para a demonstração do não cabimento da objetivação da responsabilidade civil in casu, façamos uma análise das teorias do risco.


Na teoria do risco proveito, se sustenta, em síntese, que quem se beneficia da atividade deverá responder pelos danos causados por seu empreendimento. Além da crítica doutrinária no que se refere à palavra “proveito”, por se ligar imediatamente a questão econômica, após a instituição da participação nos lucros e resultados, por meio da Lei 10.101/2000, até mesmo os requisitos da relação de emprego foram alterados, uma vez que relativizou-se o requisito da alteridade e com isso, o empregado também passou a participar dos ganhos da empresa e, portanto possuir proveito econômico da atividade empresarial desenvolvida, o que faz cair por terra a aplicação desta espécie de teoria do risco.


Já na teoria do risco criado, objetivista ao extremo, faz gerar, em verdade, um caos social, argumentando que a indenização advém da simples criação do risco, independente ou não do proveito pelo lesante. Ou seja, bastaria o empregado demonstrar o dano, independente da existência de proveito.


Legalmente, existem normas como as que estipulam a vontade das partes como a livre negociação (inerente aos direito das obrigações); tangencialmente a preceito constitucional quando afirma que ninguém deve fazer ou deixar de fazer nada senão em virtude de lei (a empresa possui regulamentos e estatutos que devem ser seguidos pelos empregados e são fontes diretas do direito); principiologicamente viola os seguintes: Ninguém poderá alegar ignorância do direito (art. 3º da LICC), pacta sunt servanda; sinalagma dos contratos, princípio da autonomia da vontade (art. 444 CLT), entre outros.


Ademais, plagiando os socialistas mais afincos: viver é um risco! Quem se responsabilizaria pelo dano à vida se fosse aplicada esta teoria sem uma percepção subjetivista?


Ulrick Beck, no livro “Society: Towards a New Modernity” solidifica a assertiva quando afirma que vivemos atualmente em sociedades de risco, opinião reforçada pela juíza Monica de Amorim Torres Brandão, no livro “Responsabilidade Civil do Empregador no Acidente do Trabalho”, ao dizer que: “Os acidentes estão presentes na vida de todo ser humano, sendo que o acidente do trabalho está relacionado com o acontecimento imprevisto decorrente do desempenho de uma atividade laboral.”


Nesta mesma esteira Wilson Melo da Silva, no livro “Responsabilidade civil sem culpa”, afirma: “a intensa industrialização, a multiplicação desmensurada das novas práticas tecnológicas, os novos e grandes inventos, as novas descobertas, o fenômeno dos constantes adensamentos populacionais nos grandes centros, a criação de modernas centrais elétricas geradoras de redobradas energias, tudo isso que, em suma, implicasse ou viesse a implicar em constantes melhorias das condições de vida da humanidade, veio arrastando consigo, como contrapartida, uma alarmante multiplicação dos riscos.”


Das citações acima se pode afirmar com veemência que o risco é inerente às instituições sociais devendo, portanto, ser comedidamente aplicada a teoria do risco criado para que não exerça uma força contrária ao que se pretende, ou seja, não vire uma fonte de lucros àqueles que sequer possuem possibilidade de gerir a conduta alheia.É preciso, para isso, circunscrever nas relações sociais qual a área dos danos ressarcíveis.


Muitas atividades cotidianas, devidas a normal ação humana, com freqüência causam prejuízos a terceiros. Por exemplo, uma prática comercial bem sucedida, causará prejuízos àqueles que anteriormente atuavam no segmento; da mesma forma a construção de um edifício pode acarretar o fim de uma vista panorâmica, incidência de luz solar, etc. Ocorrências, como estas, são consideradas danos lícitos, pois nascem da própria necessidade da evolução social.


Essa percepção do alargamento da noção de dano ressarcível, é abordada de forma interessante, pela professora universitária, Maria Celina Bondim de Morais, em seu livro “A constitucionalização do direito. Fundamentos teóricos e aplicações específicas”, que demonstra que tal questão vem ocorrendo de maneira avassaladora, pois, hoje, já se fala-se em dano ao projeto de vida, quando do nascimento de um filho indesejado, dano hedonístico, dano de mobbing, dano de mass media, dano de férias arruinadas, dano de morte em agonia, dano de brincadeiras cruéis, dano de descumprimento de deveres conjugais, dano por abandono efetivo e assim por diante.


Esse crescimento desordenado, de novas espécies de dano, faz surgir o temor de que a multiplicação de novas figuras de dano venha a ter como únicos limites a fantasia do intérprete e a flexibilidade da jurisprudência! Trata-se, portanto, de uma situação total de insegurança nas relações contratuais a objetivação maciça destas relações sociais, ante o alargamento das noções de dano ressarcível. 


A escritora Martha Medeiros, no artigo “A loteria dos espertos, apud Ramon von Berg. Dano moral”, elucida, quanto a este alargamento desmedido, que se ninguém quer ter a sua dignidade colocada em dúvida, então é preciso parar com esse truque de ir dormir ofendido para acordar milionário.


Não há dúvida que a configuração atual do dano extrapatrimonial tem ensejado substancioso incentivo à malícia, à má-fé, ao lucro fácil. O dano moral, por exemplo. É possível que a dor, a tristeza, o constrangimento, a perplexidade, o vexame ou humilhação configurem elementos concretos suficientes para a conceituação jurídica do dano moral? Em verdade, todas as relações humanas ensejam sofrimento e tristeza cuja causa normalmente atribuímos a outrem.


A questão cinge-se à possibilidade. Se há possibilidade de se ver reparado aciona-se o judiciário, do contrário não. O que teria de digno nesta conduta? Nada.


Pondo uma pá de cal sobre esta questão, emana Rodolfo Pamplona Filho:


“Como já percebemos, a inexistência de parâmetro legal seguro para se compreender a “atividade de risco” remete-nos a várias complexas questões.


Como se dará, pois, o enquadramento jurídico do acidente de trabalho no que tange à ação indenizatória de direito comum? Vale dizer, a latere o benefício previdenciário, para o qual não se exige a indagação de culpa, o que dizer da ação civil (ação acidentária de direito comum), prevista no art. 7º, XXVIII, da Carta Magna, que o empregado pode ajuizar contra o empregador, caso este haja atuado com “dolo ou culpa”?


Imagine que o empregado exerça atividade de risco. Neste caso, o empregador, que explora esta atividade, passará a responder pelo dano causado pelo empregado independentemente da comprovação de culpa?


Trata-se de intrincada questão.


Aplicando-se a teoria do risco como se pretende que seja, sem limites, nenhuma empresa funcionará, pois os riscos são inerentes a qualquer atividade econômica, assim como nenhum empregado se contrataria com a inexistência de fidúcia.


Neste espeque, o juiz não se encontra vinculado à objetivação da responsabilidade civil somente porque o autor deduziu nesta esfera a sua pretensão subjetiva. No sentido aclara, a professora universitária, Maria Celina Bodin de Moraes, no livro “A constitucionalização do direito. Fundamentos teóricos e aplicações específicas”, dizendo: “Quanto ao aumento das hipóteses de ressarcimento, sabe-se que a responsabilidade civil é um dos instrumentos jurídicos mais flexíveis, dotado de extrema simplicidade […]


Também por essa razão se diz que o direito da responsabilidade civil é antes de tudo jurisprudencial. Os magistrados, com efeito, são os primeiros a sentirem as mudanças sociais e, bem antes de se poder colocar em movimento qualquer alteração legislativa, estão aptos a atribuir-lhes, através de suas decisões, respostas normativas. “Mas isso somente ocorre porque o mecanismo da responsabilidade civil é composto em sua maioria por cláusulas gerais e por conceitos vagos e indeterminados, carecendo de preenchimento pelo juiz a partir do exame do caso concreto.”


De qualquer forma, ainda que objetiva a responsabilidade, há necessidade também da comprovação do nexo de causalidade, assim como a culpa, somente não incidindo, como escopo para a indenização como acontece na teoria subjetivista da responsabilidade civil.


Neste diapasão a professora Maria Celina Bodin de Moraes, ainda no livro “A constitucionalização do direito. Fundamentos teóricos e aplicações específicas”, diz: “Diante disso, é possível concluir que a regra prevista no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil está em consonância com a teoria do risco. Entretanto, o exercício de uma atividade de risco, por si só, não é capaz de gerar o dever jurídico de indenizar. Este surgirá quando, entre a atividade desenvolvida e o dano, houver nexo de causalidade. Em outras palavras: a reparação será devida quando, a partir da violação do dever de segurança, impostos aos que desenvolvem a atividade de risco, ocorrer o dano.”


Em conclusão, é evidente e cristalina a posição tanto da jurisprudência quanto da doutrina em aplicar a teoria objetivista para a análise do mérito nos processos cujo pedido seja indenização e reparação por responsabilidade civil.


Todavia, é imprescindível ao julgador analisar caso a caso, e entender que o risco é inerente às relações sociais, medindo e adequando o caso que lhe é posto a julgamento, com a responsabilidade aristotélica de, efetivamente, dar a cada um, o que é seu.



Informações Sobre o Autor

Luiz Calixto Sandes

Mestre em Direito e Economia pela Universidade Iguaçu. Pós-graduado em Direito Civil pela Universidade Gama Filho. Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho. Pós-graduado em Direito do Trabalho e Legislação Social pela UNESA. Docente em Direito Processual em cursos de graduação e Pós-Graduação no Rio de Janeiro e demais Estados. Ex-Docente substituto da Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ex-Docente substituto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Membro da Ordem dos Advogados do Brasil nas seccionais Rio de Janeiro e São Paulo.


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