A atuação das organizações não governamentais em prol do Tribunal Penal Internacional

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Resumo: O presente artigo estuda a atuação das organizações não-governamentais em benefício do Tribunal Penal Internacional. Com este propósito, utiliza o método dedutivo em uma pesquisa bibliográfica fundamentada, principalmente, em artigos acadêmicos e documentos internacionais. O texto tem por objetivo identificar a influência das organizações não governamentais e no Estatuto de Roma, bem como indagar sobre os efeitos desta influência para o Direito Internacional. Conclui-se que o relacionamento entre as organizações não governamentais e o Tribunal Penal Internacional pode ser visto como um precursor de uma nova ordem internacional no século XXI.


Palavras-chave: Tribunal Penal Internacional – Estatuto de Roma – Organizações não governamentais


Abstract: This article studies the role of nongovernmental organizations in benefit of the International Criminal Court. For this purpose, uses the deductive method and a bibliographic research which uses a literature based primarily on academic papers and international documents. The text aims to identify the influence of nongovernmental organizations and the Rome Statute as well as looking into the effects of this influence for international law. It concludes that the relationship between nongovernmental organizations and the International Criminal Court can be seen as a precursor of a new international order in the twenty-first century.


Keywords: International Criminal Court – the Rome Statute – Non-governmental


Sumário: 1. Introdução. 2. O Tribunal Penal Internacional. 3. O papel das organizações não-governamentais durante a negociação do Estatuto de Roma. 4. O papel das organizações internacionais na atuação do Tribunal Penal Internacional. 5. Críticas à atuação das organizações não governamentais. 6. Considerações Finais.


1 Introdução


O século XX presenciou o surgimento da figura do Estado criminoso, capaz de aliar uma ideologia perniciosa com a canalização de todos os recursos de uma sociedade na consumação de crimes cuja magnitude ameaçam a própria diversidade do gênero humano. Em geral, a assimetria de poder entre as vítimas e seus algozes inseridos na estrutura estatal é tamanha, que a única esperança de justiça encontra-se na intervenção da comunidade internacional. Mesmo após a ocorrência dos crimes, as cortes nacionais têm se mostrado historicamente incapazes de julgar aqueles que os cometeram, o que propicia a impunidade e a repetição destes mesmos atos em circunstâncias posteriores.[1] Após um longo processo de desenvolvimento do Direito Internacional Penal, o Tribunal Penal Internacional é criado como uma instância jurídica de garantia aos direitos fundamentais reconhecidos internacionalmente. Com a função de julgar os indivíduos acusados dos mais graves crimes no entendimento da comunidade internacional, o Tribunal reflete o comprometimento com o fim da impunidade e com a construção da paz por meio da justiça nas sociedades vitimadas por estes crimes.


O Tribunal Penal Internacional, em sua condição de sujeito de Direito Internacional, contudo, apresenta uma particularidade em relação às outras organizações internacionais, especialmente no tocante a seus predecessores, como os Tribunais de Tóquio, Nurembergue ou os Tribunais da Ex-Iugoslávia e de Ruanda. Esta particularidade consiste no expressivo papel que organizações não-governamentais desempenharam na sua criação e na forma como o Tribunal vem atuando. O Estatuto de Roma, tratado multilateral que prevê e regulamenta o Tribunal Penal Internacional, é apontado como um texto legal fortemente influenciado pelas demandas de organizações não-governamentais. Além disso, os próprios procedimentos de investigação dos crimes sob a competência da instituição, além de importantes áreas de sua atuação como a proteção às vítimas e testemunhas, tem contado com o concurso das organizações não-governamentais, as quais, na qualidade de membros da sociedade civil ou, de forma mais específica, de representantes de movimentos sociais, têm trabalhado de forma complementar à Promotoria e à Secretaria do Tribunal.


O presente artigo busca analisar, nas vésperas da Conferência de Revisão do Estatuto de Roma, qual o significado da atuação destas organizações não-governamentais para o Tribunal Penal Internacional e para o próprio Direito Internacional. Desde o fim da Guerra Fria, no século passado, é corrente a afirmação de que a ordem internacional encontra-se em processo de mudança de sua estrutura, especialmente devido à relativização do atributo da soberania e à corrosão do poder do Estado-Nação, tanto na esfera internacional quanto dentro de suas fronteiras. Busca-se, neste trabalho, analisar em que medida a atuação destas organizações em prol do Tribunal Penal Internacional pode ser considerada um processo pioneiro que antecipa as formas de atuação e os valores de uma nova ordem internacional emergente.


Para tanto, na primeira parte do texto, será realizada uma rápida apresentação do Tribunal Penal Internacional, para, na sequência, serem descritas as ações mais significativas das organizações não-governamentais – atuando enquanto formas institucionalizadas de representação das redes de movimentos sociais – durante a negociação do tratado que prevê e regulamenta o Tribunal Penal Internacional e, atualmente, no tocante à sua atuação no interesse da justiça. Por fim, serão analisadas as críticas que esta atuação tem recebido pela doutrina especializada, bem como as possíveis consequências em longo prazo que o protagonismo das organizações não governamentais pode trazer para a comunidade internacional.


2. O Tribunal Penal Internacional


O Tribunal Penal Internacional é uma instituição permanente com jurisdição penal complementar sobre as pessoas responsáveis pelo cometimento dos mais graves crimes com alcance internacional. É uma entidade independente da Organização das Nações Unidas com sede em Haia, nos Países Baixos, podendo, se entender conveniente, funcionar em outro local. Por fim, possui personalidade e capacidade jurídica internacional, podendo exercer seus poderes e funções no território de qualquer Estado Parte, ou, mediante acordo, no território de qualquer Estado.


Sua jurisdição temporal iniciou-se em 1º de Julho de 2002. Mesmo diante do argumento da imprescritibilidade dos crimes internacionais, o Tribunal não deve ter jurisdição sobre nenhum crime ocorrido antes desta data. Em relação aos Estados Parte, o Tribunal terá jurisdição a partir da ratificação do Estatuto, exceto em acordos realizados com o próprio Estado, quando poderá retroagir a período anterior à ratificação do tratado pelo Estado Parte, nunca, porém para antes de 1º de Julho de 2002.[2]


O Tribunal tem jurisdição sobre os crimes de sua competência cometidos no território de Estado Parte. A primeira observação que se faz é que o conceito de território deve ser estendido não só para o espaço aéreo e as águas territoriais, mas, também, no sentido de alcançar as ações direcionadas ao território, como a incitação ao genocídio realizada por meios de comunicação situados em país vizinho ou a ordem de que não sejam feitos prisioneiros de guerra dada fora do território para destinatários que nele se encontrem.[3] É possível, a partir deste critério, que indivíduos nacionais de Estados que não sejam parte do Tribunal Penal Internacional possam ser submetidos à sua jurisdição, embora, na prática, o exercício desta jurisdição será determinado pelos requisitos de admissibilidade do caso e dependerá da cooperação do Estado aonde o crime ocorreu ou mesmo do Estado de nacionalidade do indivíduo.[4] O segundo critério adotado para o exercício da jurisdição é a nacionalidade do indivíduo: o Tribunal tem jurisdição sobre o indivíduo nacional de Estado Parte que cometa crime sob sua competência, não importa se no território de Estado Parte ou de terceiro Estado. Além disso, o Tribunal também terá jurisdição quando um Estado, mediante acordo em que um Estado aceite sua jurisdição “ad hoc” para determinado crime ocorrido em seu território ou realizado por seu nacional. Finalmente, terá jurisdição quando o Conselho de Segurança notificar o Tribunal sobre a existência de uma situação que pode se constituir em um crime sob sua competência.


O artigo 13 do Estatuto descreve os mecanismos de exercício da jurisdição do Tribunal. O Tribunal poderá exercer sua jurisdição se um Estado Parte denunciar ao Procurador uma situação em que existam indícios da ocorrência de um crime sob sua competência. Se o Conselho de Segurança da ONU, agindo nos termos do Capítulo VII da Carta da ONU – preservação da paz e segurança coletiva – denunciar uma situação nos moldes expostos acima ou se o Procurador tiver dado início a um inquérito sob tal crime, estando a iniciativa a proprio motu do Procurador sujeita ao Controle da Seção de Instrução do Tribunal, nos termos do artigo 15 do Estatuto de Roma.[5]


Em qualquer dos casos acima, o Conselho de Segurança da ONU pode adiar a abertura do inquérito ou do próprio procedimento por um prazo de doze meses, renováveis por meio de Resolução embasada no Capítulo VII da Carta da ONU, ou seja, no interesse da manutenção da paz e segurança internacionais. O artigo 16 do Estatuto de Roma é condenado pela doutrina como a previsão da possibilidade de uma intervenção política em uma instituição judicial independente.[6]


Durante a Conferência de Plenipotenciários realizada em Roma com o fito de se instituir o Tribunal Penal Internacional o debate sobre a natureza de sua jurisdição foi concentrado na dicotomia entre os Estados que defendiam uma jurisdição “automática” para o Tribunal Penal Internacional e os Estados que defendiam o sistema do “duplo consentimento” no qual o Tribunal, verificando a ocorrência de um crime de sua competência ocorrido sob os termos de sua jurisdição, deveria consultar o Estado onde o crime ocorreu buscando sua concordância antes de iniciar sua atuação. Embora muitas delegações tenham afirmado durante a Conferência que a jurisdição automática – que sujeita o Estado à atuação do Tribunal quando este ratifica o Estatuto de Roma – seja atentatória às prerrogativas soberanas do Estado, este foi o entendimento que prevaleceu, graças ao argumento de que o sistema do “duplo consentimento” na prática retiraria toda a eficácia do Tribunal.[7]


A proposta do “duplo consentimento” foi substituída pelo conceito de jurisdição complementar, implementado pelas regras de admissibilidade de um caso perante o Tribunal, disposto nos artigos 17 e 18 do Estatuto de Roma. O conceito de admissibilidade fornece ao Tribunal um grau de discricionariedade em sua decisão, isto é, se irá ou não atuar em uma situação na qual estejam presentes os termos para o exercício de sua jurisdição.[8] Esta discricionariedade pode ser exercida considerando que uma situação não é suficientemente grave para ser objeto de um procedimento por parte do Tribunal Penal Internacional ou que o exercício da jurisdição por parte do Estado dispensa a atuação do Tribunal, devido à sua natureza complementar.


Nos termos do artigo 17, o Tribunal Penal Internacional admitirá que uma situação torne-se um caso quando a Seção de Instrução entender que o Estado não pode ou não quer exercer sua jurisdição nacional para investigar e processar o acusado de um crime sob a competência do Tribunal Penal Internacional. A Seção de Instrução entenderá que o Estado não pode exercer sua jurisdição quando seu Poder Judiciário entrou em colapso ou não tem poder suficiente para trazer o acusado à justiça. Por outro lado, a Seção de Instrução entenderá que o Estado não quer exercer sua jurisdição quando existam investigações – ou mesmo um processo –, mas estas constituem uma fraude ou, ainda que os procedimentos não estejam sendo conduzidos de forma independente ou imparcial, ou, finalmente, quando existe demora injustificada na condução deste procedimento. Nestes casos, mesmo que o indivíduo já tenha sido julgado e absolvido pelo Estado, o Tribunal poderá ter jurisdição sobre ele.


Embora seja uma continuação lógica do pressuposto que o Estado deve “extraditar ou julgar” os acusados por crimes internacionais, o princípio da complementaridade é um marco para o estabelecimento de um novo paradigma nas relações internacionais ao sacramentar a obsolescência da doutrina da soberania absoluta e do domínio reservado dos Estados sobre a proteção aos direitos humanos de seus cidadãos.[9] Com a jurisdição complementar, o Estado que ratificou o Estatuto de Roma possui, além da obrigação internacional de tomar as medidas necessárias para a prevenção e a repressão das infrações nele previstas, a possibilidade de ser responsabilizado pelo seu descumprimento.[10] Ao participar da comunidade internacional como Parte do Estatuto de Roma, os Estados expressam sua soberania que consiste na cooperação internacional no sentido de se alcançarem finalidades comuns.[11]


Nos termos do preâmbulo de seu Estatuto, o Tribunal Penal Internacional deverá exercer sua jurisdição somente nos mais graves crimes no entendimento da comunidade internacional. A tipificação dos crimes sob a competência do Tribunal baseou-se no Projeto do Código de Crimes contra a Paz e a Segurança Internacionais da Comissão de Direito Internacional, especialmente seus artigos 16, 17, 18 e 20, tidos como os principais crimes para o direito consuetudinário – core crimes under customary law. No Projeto do Estatuto discutido durante a Conferência, foi anexada uma lista sugerindo a inclusão dos crimes previstos nas Convenções de Genebra sobre Direito Humanitário e na Convenção contra a Tortura da ONU na competência do Tribunal.[12]


Os crimes da competência do Tribunal encontram-se no artigo 5º do Estatuto, onde são citados, além do crime de genocídio, os crimes contra a humanidade, os crimes de guerra e o crime de agressão, cuja deliberação sobre sua tipificação está prevista para a Primeira Conferência de Revisão do Estatuto, a ser realizada entre 31 de Maio e 11 de Junho de 2010. Em vista disso, o Tribunal só poderá exercer a sua competência em relação a este último depois que seja aprovada uma disposição definindo o crime, nos termos dos artigos 121 e 123.


No momento em que este trabalho é escrito, o Escritório do Procurador encontra-se oficialmente investigando crimes em quatro países: República Centro-Africana, Sudão, República Democrática do Congo e Uganda. Além disso, quatro continentes encontram-se em fase de investigações preliminares ou de análise de um pedido de investigação de situações ocorridas ou em curso. Nos termos do artigo 15, para que o Procurador possa propor uma investigação, é necessário que se reúnam provas suficientes sobre a ocorrência de crime sob a competência do Tribunal e que a situação possa atender os requisitos de admissibilidade de um caso nos termos do artigo 17.


Na América do Sul, o Procurador já fez duas viagens à Colômbia e encontra-se monitorando a situação na Venezuela, em resposta a denúncias formuladas a respeito da ocorrência de crimes nesses países. No extremo leste da Europa, o conflito ocorrido na região separatista da Ossétia do Sul, em Agosto de 2008, gerou denúncias da Geórgia e da Rússia acerca da prática de graves crimes, que estão em fase de investigação. Na Ásia, o Afeganistão e o Iraque ocupados são objetos de monitoramento por parte do Escritório da Procuradoria. Na África, o Chad encontra-se em investigação preliminar devido a eventos relacionados ao grande fluxo de refugiados da vizinha região de Darfur. A Costa do Marfim acedeu ao Estatuto de Roma, aceitando sua jurisdição, a partir de 19 de Setembro de 2002, no sentido de a Procuradoria conhecer possíveis crimes sob a competência do Tribunal ocorridos naquele país em 2002 e em 2003, estando pendente, contudo, uma visita do Procurador ao país. Por fim, no Quênia, uma comissão internacional de direitos humanos da ONU apresentou relatório sobre a onda de violência que ali ocorreu entre dezembro de 2007 e fevereiro de 2008. O país ratificou o Estatuto de Roma em fevereiro de 2005, mas não apresentou nenhum pedido de investigação. A Procuradoria encontra-se em investigações preliminares no Estado.[13]


3.  O papel das organizações não-governamentais durante a negociação do Estatuto de Roma


Olhando em retrospecto, pode-se dizer que o Tribunal Penal Internacional é o resultado de uma “janela de oportunidade” aberta entre o fim da Guerra Fria e o 11 de Setembro, pela qual o processo de internacionalização dos direitos humanos alcançou objetivos que estavam congelados há cinquenta anos. Ao otimismo inicial com a nova interpretação do Conselho de Segurança, que incluiu graves violações aos direitos humanos como uma violação do Paradigma da Segurança Coletiva – presente no Capítulo VII da Carta da ONU –, seguiu-se o horror da guerra civil na Iugoslávia e do genocídio em Ruanda, potencializado com a clara sensação de que a comunidade internacional estava falhando ao lidar com estes crimes. Foi sob este contexto que o Estatuto de Roma foi negociado e que muitas delegações nacionais o apoiaram, mesmo a despeito de alguns interesses nacionais específicos.[14]


A trajetória da luta por um Tribunal Penal Internacional remonta ao século XIX, mas recomeça de forma definitiva em 1989 quando, em uma Sessão Especial da Assembleia Geral da ONU sobre o Tráfico Internacional de Drogas, o representante de Trinidad e Tobago sugeriu que fosse criado um tribunal especializado para a matéria. A Assembleia Geral então, mais uma vez, solicitou à Comissão de Direito Internacional que analisasse a possibilidade e conveniência de uma instituição nestes moldes. Com o parecer favorável da Comissão não apenas restrito ao tráfico de drogas, mas abrangendo outros crimes internacionais, a Assembleia Geral sugeriu àquela entidade que produzisse um texto neste sentido, o qual foi redigido e assumiu sua forma final em 1994.[15] Durante este período, o Conselho de Segurança havia estabelecido os tribunais “ad hoc” para a Ex-Iugoslávia e para Ruanda. Com os tribunais penais internacionais já estabelecidos pelo Conselho de Segurança da ONU, a preocupação da Comissão de Direito Internacional foi preparar um estatuto de um tribunal cuja jurisdição o permitisse julgar crimes internacionais ocorridos em qualquer local. Assim, ao contrário dos Tribunais para Ruanda e para a Ex-Iugoslávia, o novo Tribunal não deveria ser uma corte ad hoc estabelecida pelo Conselho de Segurança nos termos do Capítulo VII da Carta da ONU para auxiliar na manutenção e restauração da paz e segurança internacionais no tocante a uma situação específica. O seu método de criação deveria assegurar que o Tribunal teria um maior grau de independência do que aqueles estabelecidos pelo Conselho de Segurança, evitando assim a seletividade na escolha dos crimes, do território e do período de tempo abrangido por sua jurisdição. Em 1996 a Assembleia Geral da ONU estabeleceu um Comitê Preparatório para o Estabelecimento do Tribunal Penal Internacional – PrepCom. Este, após várias sessões, redigiu um Projeto de Estatuto – Draft Statute – para ser submetido a uma Conferência de Plenipotenciários.[16]


Durante as negociações, organizações não-governamentais iniciam sua mobilização, articulando como forma de participar da construção do novo Tribunal. Em 1995 é fundada a Coalizão pelo Tribunal Penal Internacional cujo objetivo era o estabelecimento de um Tribunal Internacional justo, efetivo e independente. Presidida por William Pace, Diretor Executivo do Movimento Federalista Mundial, a Coalização atualmente engloba duas mil e quinhentas organizações não governamentais ao redor do mundo, trabalhando em parceria na consecução de seus objetivos perante o Tribunal.[17]


Outra importante organização não-governamental surgida neste período foi a No Peace Without Justice, fundada em 1993 por Emma Bonino a partir de uma campanha do Partido Radical Transnacional, com o objetivo de fornecer peritos e assistir negociações de normas internacionais relativas a três áreas: Justiça Penal Internacional, Mutilação Genital Feminina e Democratização do Oriente Médio e do Norte da África.[18] Em 1994 a organização cria o Programa de Parceria em Direito Internacional Penal com o objetivo de assistir a Justiça Internacional – por meio dos Tribunais “Ad Hoc” e, posteriormente, também do Tribunal Penal Internacional – na construção de um Estado de Direito Global com a punição de crimes internacionais e a reparação às vítimas.[19]


Como visto, as negociações em Nova York e posteriormente em Roma duraram anos, e criaram uma espécie de comunidade entre os negociadores das delegações dos Estados, representantes das organizações não-governamentais e membros da Academia – professores especialistas na área, geralmente trazidos pelas organizações não governamentais. Durante este período, membros dos dois grupos citados foram incluídos em algumas delegações nacionais, especialmente a do Canadá. Por outro lado, diplomatas cujo serviço estatal perante as negociações havia findado, foram absorvidos pelas delegações oficiosas das organizações não-governamentais, participando das negociações, agora, na qualidade de seus membros.[20]


A Conferência Diplomática, convocada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, realizou-se entre os dias 15 de junho e 17 de julho de 1998, nas instalações da FAO, Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, na cidade de Roma. Estiveram presentes delegações de cento e sessenta Estados e representações de quatorze agências especializadas da ONU, vinte outras organizações intergovernamentais, além de mais de duzentas organizações não-governamentais.[21] Estas atuaram de forma coordenada e elaboraram uma estratégia que as tornaram indispensáveis para as delegações nacionais: forneciam o material e o apoio técnico necessário para que as delegações nacionais pudessem atuar em todos os treze grupos de trabalho constituídos durante a Conferência – muitas delegações foram com pessoal diplomático insuficiente para a complexidade das negociações – e processavam as informações sobre o andamento das negociações em todos os grupos de trabalho, compartilhando-as de forma que estas pudessem ter uma visão de conjunto sobre o que ocorria.[22]


Obviamente, o preço desta assistência era o lobby realizado perante os membros das delegações de forma combinada com campanhas de esclarecimento e mobilizações de protesto do lado de fora da Conferência. Os membros das organizações não-governamentais aguardavam os diplomatas do lado de fora dos recintos de negociações – realizadas em portas fechadas -, ocupando todos os espaços não restritos da Conferência de forma a pressioná-los a tomar determinadas posições e a obter informações sobre o estado das discussões.[23] O resultado desta tática foi uma pressão efetiva que se desdobrava em manifestações de protesto em Roma durante a Conferência.[24] Outro resultado foi o constrangimento de muitos Estados perante sua própria opinião pública pela divulgação, sobre certos posicionamentos, a respeito de assuntos tratados na Conferência, que muitos Estados prefeririam manter secretas.[25]


Assim, as organizações não-governamentais rotularam os Estados participantes em grupos com opiniões divergentes sobre a natureza e os poderes do futuro Tribunal Penal Internacional. O chamado grupo dos Like Minded States, liderado por Canadá e Austrália, advogava por um Tribunal forte com jurisdição automática, uma Promotoria independente com poderes para iniciar procedimentos e uma ampla definição de crimes de guerra, incluindo aqueles ocorridos em conflitos armados internos. Um segundo grupo era composto pelos membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU – com exceção do Reino Unido – e se opunha que o Tribunal tivesse jurisdição automática e a Promotoria tivesse o poder de iniciar procedimentos sem autorização prévia daquele órgão. Defendia que o Conselho de Segurança deveria ter o poder de decidir se uma situação seria ou não objeto de uma investigação pelo Tribunal e era contrário à competência da Corte sobre o crime de agressão. O terceiro grupo era formado por Estados pertencentes ao Movimento dos Países Não-Alinhados e pressionavam pela jurisdição do Tribunal sobre o crime de agressão, bem como sobre o crime de terrorismo e tráfico internacional de drogas. Opunha-se à proposição do Tribunal ter jurisdição sobre crimes de guerra ocorridos em conflitos armados internos, bem como a qualquer influência do Conselho de Segurança na instituição. Por fim, defendiam a previsão de pena de morte no Estatuto do Tribunal.[26]


Para fins de estratégia e pressão, as organizações não-governamentais trabalhavam com outras classificações, de acordo com a abertura do Estado às demandas da sociedade civil ou de sua situação geopolítica. Assim, o primeiro alvo eram os países com regimes desestruturados ou Estados fracos, cujas delegações na Conferência muitas vezes contavam com um único diplomata, mas cujos votos nas decisões contavam exatamente com o mesmo valor das outras delegações. Esses países ofereceram pouca resistência às demandas das organizações não-governamentais, sendo que alguns deles, como Burundi, inscreveram-se no programa de assistência jurídica em Direito Internacional Penal da No Peace Without Justice, sob os auspícios da ONU.[27] As organizações não-governamentais, em relação a esses Estados, foram acusadas de falar em nome das delegações estatais e mesmo de substituí-las, retirando dos Estados o monopólio das negociações.[28] Os Estados árabes, considerados autoritários e pouco abertos à sociedade civil, apoiaram a criação do Tribunal, não bloqueando as negociações, apenas abstendo-se quando o assunto não lhes agradava. Da mesma forma, os Estados democratizados recentemente, como os do Leste Europeu, em geral favoráveis às demandas das organizações não-governamentais, assim restaram isolados os Estados que se opunham ao Tribunal como a Coréia do Norte, os Estados Unidos e Israel.[29]


Durante a Conferência, os Estados discutiram se a jurisdição do Tribunal deveria ser universal ou limitada, automática ou dependente do consentimento do Estado. Discutiu-se também quem poderia provocar a jurisdição do Tribunal, especialmente se o Procurador teria o poder de iniciar as investigações por conta própria. Em relação ao Conselho de Segurança, discutia-se como ele determinaria uma investigação e, principalmente, se uma investigação poderia ser anulada por uma decisão sua. A respeito destes temas, a Coalizão pelo Tribunal Penal Internacional adotou bandeiras de luta gerais que passaram a promover como objeto de sua campanha, dentre elas a inclusão dos crimes de guerra realizados em conflitos armados internos, a jurisdição automática para o Tribunal sob crimes de sua competência, a possibilidade do Procurador iniciar uma investigação a proprio motu e a independência do Tribunal perante o Conselho de Segurança da ONU. Para promover estas bandeiras, a Coalizão passou a publicar um jornal diário com a posição consolidada das diversas delegações a respeito destes assuntos, como ferramenta de persuasão.[30] Como a imprensa não tinha autorização para participar da Conferência, a Coalizão preparava notícias curtas e press releases para a mídia, além de organizar entrevistas coletivas sobre o andamento das negociações. O uso da internet foi essencial para a mobilização das organizações não-governamentais e movimentos sociais nos diferentes países do globo, pois permitiu que o máximo de pessoas permanecessem informada por um custo baixo e no menor tempo possível, e serviu como base de dados para a atuação nacional e regional das organizações não-governamentais em busca de apoio para o Tribunal.[31]


A Coalizão organizou-se em uma delegação gigantesca que destinou equipes para trabalhar junto aos treze grupos de negociação. Grandes organizações não-governamentais componentes, como a Human Rights Watch, enviaram membros para monitorar todos os grupos. No entanto, organizações não-governamentais que representavam interesses específicos, geralmente ligadas a movimentos sociais, direcionaram-se para os grupos de negociação que lhe eram afetos, apresentando propostas de artigos para o Estatuto de Roma.[32]


Como, por exemplo, a organização não-governamental Women´s Caucus, que integrou o grupo que acompanhou a definição dos crimes que entrariam na competência do Tribunal de forma a incluir os crimes de gênero, bem como as disposições do texto que garantem o equilíbrio entre homens e mulheres dentre os juízes do Tribunal. A organização tem como objetivo advogar por uma justiça inclusiva quanto às questões de gênero, por meio dos tratados internacionais e, especialmente, do Tribunal Penal Internacional.[33]


A noção de crimes de gênero, ou seja, cometidos contra mulheres devido à esta condição, não se encontrava no anteprojeto da Comissão de Direito Internacional. Sua inclusão dentro dos crimes contra a humanidade foi proposta em 1997 na esteira da Conclusão nº 39 do Alto Comissariado para Refugiados das Nações Unidas, que reconheceu aos Estados o direito de oferecer a condição de refugiado às mulheres vítimas de tratamentos severos ou desumanos decorrentes da transgressão de códigos morais das sociedades em que vivem, quando estas sociedades forem consideradas “grupos sociais particulares”.[34] Durante a Conferência, a proposta enfrentou dissensões, especialmente dos países árabes e da Santa Sé, que temiam que o termo gênero pudesse vir a abarcar “dubious interpretations based on the world views which assert that sexual identity ca be adapted indefinitely to suit new and different purposes.”[35] Como resultado, o artigo 7 do Estatuto de Roma dispõe que:


Artigo 7. Crimes contra a Humanidade


1. Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por “crime contra a humanidade”, qualquer um dos atos seguintes, quando cometido no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil, havendo conhecimento desse ataque:[…] h) Perseguição de um grupo ou coletividade que possa ser identificado, por motivos políticos, raciais, nacionais, étnicos, culturais, religiosos ou de gênero, tal como definido no parágrafo 3o, ou em função de outros critérios universalmente reconhecidos como inaceitáveis no direito internacional, relacionados com qualquer ato referido neste parágrafo ou com qualquer crime da competência do Tribunal;[…] 3. Para efeitos do presente Estatuto, entende-se que o termo “gênero” abrange os sexos masculino e feminino, dentro do contexto da sociedade, não lhe devendo ser atribuído qualquer outro significado.” (Grifos nossos)


O Estatuto de Roma tornou-se, deste modo, o primeiro tratado internacional da História a usar e definir crimes cometidos devido ao gênero de suas vítimas. Além disso, o Estatuto redefiniu os crimes de guerra transformando a violência sexual em crime internacional. O estupro, a escravidão sexual, a prostituição forçada, a gravidez e a esterilização forçada, bem como outras formas de violência sexual de gravidade semelhante, são tipos penais tanto dos crimes contra a humanidade quanto dos crimes de guerra.


Outra vitória das organizações não-governamentais diz respeito ao papel das vítimas dentro do Tribunal Penal Internacional, cujo status jurídico dentro do procedimento supera o papel de meras testemunhas dos crimes podendo estas opinarem acerca do andamento do processo , bem como auxiliarem os trabalhos do Procurador. No entanto, a principal conquista é o direito de reparação previsto no artigo 75 do Estatuto:


Artigo 75. Reparação em Favor das Vítimas


1. O Tribunal estabelecerá princípios aplicáveis às formas de reparação, tais como a restituição, a indenização ou a reabilitação, que hajam de ser atribuídas às vítimas ou aos titulares desse direito. Nesta base, o Tribunal poderá, de ofício ou por requerimento, em circunstâncias excepcionais, determinar a extensão e o nível dos danos, da perda ou do prejuízo causados às vítimas ou aos titulares do direito à reparação, com a indicação dos princípios nos quais fundamentou a sua decisão.2. O Tribunal poderá lavrar despacho contra a pessoa condenada, no qual determinará a reparação adequada a ser atribuída às vítimas ou aos titulares de tal direito. Esta reparação poderá, nomeadamente, assumir a forma de restituição, indenização ou reabilitação. Se for caso disso, o Tribunal poderá ordenar que a indenização atribuída a título de reparação seja paga por intermédio do Fundo previsto no artigo 79. 3. Antes de lavrar qualquer despacho ao abrigo do presente artigo, o Tribunal poderá solicitar e levar em consideração as pretensões formuladas pela pessoa condenada, pelas vítimas, por outras pessoas interessadas ou por outros Estados interessados, bem como as observações formuladas em nome dessas pessoas ou desses Estados. 4. Ao exercer os poderes conferidos pelo presente artigo, o Tribunal poderá, após a condenação por crime que seja da sua competência, determinar se, para fins de aplicação dos despachos que lavrar ao abrigo do presente artigo, será necessário tomar quaisquer medidas em conformidade com o parágrafo 1o do artigo 93.5. Os Estados Partes observarão as decisões proferidas nos termos deste artigo como se as disposições do artigo 109 se aplicassem ao presente artigo.6. Nada no presente artigo será interpretado como prejudicando os direitos reconhecidos às vítimas pelo direito interno ou internacional.”[36]


O artigo 75 teve como base uma proposição francesa e sua aceitação é resultado de uma campanha movida principalmente pela Federação Internacional dos Direitos do Homem e pela Redress, uma organização não-governamental britânica especializada nos direitos das vítimas de tortura.[37] O Tribunal Penal Internacional é o primeiro tribunal internacional a reconhecer o direito de reparação às vítimas. Este tema não foi abordado em Nuremberg, Tóquio, Iugoslávia ou Ruanda.[38]


Assim, inserindo novos temas na pauta de discussões e fazendo lobby com países que buscam uma maior expressão internacional, as organizações não-governamentais auxiliaram a Conferência de Roma a tornar o Tribunal Penal Internacional, da previsão inicial de órgão judicial permanente do Conselho de Segurança da ONU, conforme no anteprojeto da Comissão de Direito Internacional de 1994, em uma instituição judicial independente – ou quase, devido ao conteúdo de seu artigo 16[39] cujo trabalho mostra-se paralelo e algumas vezes contrário aos interesses dos membros permanentes do Conselho de Segurança.


Dirigindo-se para este resultado, malgrado os esforços norte-americanos em contrário, as negociações transcorreram lentamente, sendo que até o penúltimo dia existia concordância em pouco mais de 90 dos 128 artigos do Projeto de Estatuto. A maior parte dos assuntos mais importantes – como o papel do Conselho de Segurança e a natureza da jurisdição do Tribunal – permaneciam em um impasse.


Tal fato gerou muita resistência aos rumos que o Estatuto de Roma ia tomando, por parte principalmente dos Estados Unidos, que buscava inviabilizar as negociações. Com o prazo final da Conferência se esgotando, e a possibilidade de que esta fosse encerrada sem que fosse adotado nenhum texto, alguns participantes da Conferência relataram posteriormente que a situação tornou-se dramática. Poucas horas antes do prazo final de encerramento da Conferência, à meia noite do dia 17 de julho de 1998, o Secretário Philippe Kirsche divulgou uma proposta “tudo ou nada”, que contemplava soluções para todos os pontos de conflito e propôs a votação do texto. Em uma última tentativa de sabotagem, Estados Unidos e Índia apresentaram emendas que descaracterizariam o Estatuto, sendo fortemente rejeitadas. Poucos minutos antes da meia-noite, o texto foi submetido à votação e adotado pela Conferência, com cento e vinte votos a favor, sete votos contrários – entre eles China, Iraque, Israel, Catar e Estados Unidos – e vinte e uma abstenções.[40]


O texto final do Estatuto de Roma foi divulgado, nas seis línguas oficiais da ONU, às duas horas da manhã do dia 17 de Julho de 1998, estando aberto para assinaturas no Ministério das Relações Exteriores da Itália até 17 de Outubro de 1998 e, após esta data, no Secretariado das Nações Unidas, em Nova York, até 31 de Dezembro de 2000.[41] Entrou em vigor noventa dias após o depósito de sua sexagésima ratificação, no dia 1º de julho de 2002. Para o Brasil, passou a vigorar a partir de 1º de setembro do mesmo ano, tendo sido introduzido no ordenamento jurídico pátrio pelo Decreto nº 4388/02.


Pode-se dizer, portanto, que as negociações do Estatuto de Roma devem-se muito ao ativismo das organizações não-governamentais, as quais desenvolveram habilidade profissional e estratégias de mobilização que possibilitaram não apenas que o Estatuto de Roma trouxesse sua marca, mas também que nele fossem reconhecidas como atores internacionais, como será visto adiante.[42] Por outro lado existe a crítica de que as novidades introduzidas ou patrocinadas pelas organizações não-governamentais não possuem correlação com outras áreas do Direito Internacional Penal, sofrendo restrições tanto de técnica jurídica[43] quanto de política judiciária,[44] o que tornaria o Estatuto de Roma algo como uma locomotiva tentando movimentar-se em uma trilha para cavalos.[45]


4. O papel das organizações internacionais na atuação do Tribunal Penal Internacional


O reconhecimento do papel da sociedade no Estatuto de Roma garantiu às organizações não-governamentais o seu reconhecimento como atores internacionais por parte do Tribunal Penal Internacional, nos termos dos parágrafos 1 e 2 no artigo 15 do Estatuto de Roma:


“Artigo 15. Procurador


1. O Procurador poderá, por sua própria iniciativa, abrir um inquérito com base em informações sobre a prática de crimes da competência do Tribunal. 2. O Procurador apreciará a seriedade da informação recebida. Para tal, poderá recolher informações suplementares junto aos Estados, aos órgãos da Organização das Nações Unidas, às Organizações Intergovernamentais ou Não Governamentais ou outras fontes fidedignas que considere apropriadas, bem como recolher depoimentos escritos ou orais na sede do Tribunal.” (Grifos nossos)


É um direito das organizações não-governamentais, portanto, a denúncia da ocorrência de um crime perante o Estatuto de Roma, da mesma forma que um Estado ou uma organização interestatal, atores tradicionalmente reconhecidos como os únicos capazes de serem objetos de direitos dentro da comunidade internacional. A Coalizão pelo Tribunal Penal Internacional, por sua vez, tem sua atuação garantida por uma Resolução da Assembleia dos Estados Parte do Tribunal Penal Internacional com o objetivo de facilitar seu papel de parceria com a instituição.[46]


A Coalizão caracteriza seu trabalho por campanhas de ratificação do Estatuto de Roma e do Acordo de Privilégios e Imunidades que garante a atuação de funcionários do Tribunal Penal Internacional no território de um Estado. Para isso articula-se com organizações não-governamentais em nível regional e nacional, de forma a fornecer informações e promover eventos com o objetivo de convencer autoridades governamentais a apoiar o Tribunal Penal Internacional.[47] Em 2008, por exemplo, a Coalizão promoveu um debate divulgado na mídia sobre a ratificação do Estatuto de Roma na América Central em parceria com o Centro Nicaraguense de Direitos Humanos. Em Lima, no Peru, promoveu em março daquele ano, um curso para membros do Poder Judiciário dos países andinos sobre o Estatuto de Roma, especialmente sobre a complementaridade de sua jurisdição aos sistemas constitucionais de Peru, Bolívia, Colômbia, Equador e Venezuela.[48] O Estados “alvo” de suas campanhas de ratificação em 2009 são Iêmen, Turquia, Líbano, Nepal e Egito.[49] A Coalizão tem funcionado, também, como um fórum de discussão sobre o desenvolvimento das atividades do Tribunal e como um banco de dados atualizado sobre o assunto.[50]


A Women´s Caucus, por sua vez, realiza atividades de monitoramento no Tribunal, de acordo com sua demanda por punição dos responsáveis por crimes de gênero. Como os crimes sexuais têm sido a tônica dos casos em andamento ou sob investigação no Tribunal Penal Internacional, a organização não-governamental tem atuado conjuntamente com o Tribunal, pressionando autoridades locais pelo fim da impunidade dos perpetradores destes crimes, como na Carta Aberta que a organização dirigiu ao Presidente de Uganda, em 10 de Março de 2009, exigindo o respeito dos direitos das mulheres e crianças afetados pela guerra civil, em um documento que conta com a assinatura de duzentas e cinquenta organizações não-governamentais.[51]


A Redress mantém um trabalho de advocacia junto ao Tribunal Penal Internacional. Em Uganda, no Caso Joseph Kony, a Câmara de Pré-Julgamento aceitou a demanda pela capacidade postulatória de cinquenta e seis vítimas, determinando pré-condições para a garantia da confiabilidade de seus procuradores. Em Darfur, a Câmara de Pré-Julgamento foi obrigada a estabelecer um prazo limite para a inclusão de novas vítimas no pólo ativo da ação penal, devido ao grande número de sobreviventes reivindicando inclusão no pólo ativo do processo.[52] No caso Lubanga, relativo ao conflito na República Democrática do Congo, a 1º Câmara de Pré-Julgamento prolatou uma decisão pioneira que estabelece as regras gerais de participação das vítimas em julgamento: garantindo às vítimas a possibilidade de participar do processo também na qualidade de testemunhas, determinando parâmetros para a juntada de petições e para a representação coletiva, derrubando a tese de que elas devem apresentar provas do dano que sofreram relacionadas às acusações específicas constantes no indiciamento, bastando demonstrar o nexo entre as evidências apresentadas contra o réu e o dano sofrido.[53]


No entanto, talvez a maior contribuição que as organizações não-governamentais podem dar ao Tribunal Penal Internacional encontra-se prevista no artigo 44, parágrafo 4 do Estatuto de Roma:


Artigo 44. O Pessoal


4. O Tribunal poderá, em circunstâncias excepcionais, recorrer aos serviços de pessoal colocado à sua disposição, a título gratuito, pelos Estados Partes, organizações intergovernamentais e organizações não governamentais, com vista a colaborar com qualquer um dos órgãos do Tribunal. O Procurador poderá anuir a tal eventualidade em nome do Gabinete do Procurador. A utilização do pessoal disponibilizado a título gratuito ficará sujeita às diretivas estabelecidas pela Assembleia dos Estados Partes.” (Grifos nossos)


O artigo 44, deste modo, autoriza o Procurador a utilizar os serviços dos peritos das organizações não-governamentais sempre que o trabalho for excessivo ou requerer especialização, o que coloca à sua disposição um grande número de indivíduos com grande capacidade técnica que respondem a uma estrutura organizacional mais dinâmica e eficaz que o próprio Tribunal.[54] Nesse sentido, o trabalho das organizações não-governamentais pode ser fundamental na medida em que, frequentemente, elas são as primeiras a testemunhar as violações aos direitos humanos. Como trabalham diretamente com a população, possuem contato privilegiado com as vítimas e testemunhas, além da possibilidade de colher evidências do ocorrido podendo se tornar uma fonte de informação importante para o Procurador, tanto durante as investigações preliminares, quanto após a abertura do caso.[55]


Depois da entrada em funcionamento do Tribunal, algumas organizações não- governamentais internacionais realizaram campanhas acerca da otimização da coleta de informações em benefício do Tribunal Penal Internacional. A Human Rights First – antiga Lawyers Committe for Human Rights – distribuiu um paper sobre o tema para discussão entre as organizações não-governamentais presentes à Terceira Sessão da Assembleia dos Estados Parte do Tribunal Penal Internacional, em 2004. O trabalho enfatiza o papel das organizações não-governamentais como principal fonte de informação para o Tribunal em situações de ausência ou não-cooperação do Estado em um caso, salientando a possibilidade de fornecimento de informações confiáveis acerca do contexto sócio-político da região, além de promover a divulgação do trabalho do Tribunal perante a população local e o estabelecimento de laços de confiança entre as comunidades afetadas e os investigadores do Escritório da Procuradoria.[56] Paralelamente, a Human Rights Watch distribuiu um manual discriminando os modos de interação entre o Tribunal Penal Internacional e as organizações não-governamentais, esclarecendo procedimentos, esquematizando campanhas de informação sobre o Tribunal frente às comunidades afetadas pelos incidentes e estabelecendo modelos de coleta de informações em campo de forma a que estas informações possam ser utilizadas como prova em algum caso pela Promotoria.[57]


As organizações não-governamentais têm atuado de forma decisiva na coleta de provas em alguns casos do Tribunal Penal Internacional. Na República Centro-Africana, o escritório de campo da Procuradoria trabalha de forma coordenada com membros de organizações locais para a produção de programas de rádios, peças teatrais e materiais impressos que conscientizem as vítimas a denunciar os crimes sexuais ocorridos em larga escala durante a guerra civil naquele país, visto que as restrições culturais locais têm favorecido a impunidade dos perpetradores.[58] Na República Democrática do Congo, organizações formadas exclusivamente por mulheres têm se destacado pelo seu papel preponderante na denúncia e no testemunho de crimes relacionados a gênero.[59] Em Uganda, o Centro pela Paz e Reconciliação Nacional juntou farto material sobre o recrutamento de meninos e a transformação de meninas em escravas sexuais pelo grupo rebelde Exército de Resistência do Senhor.[60]


Todavia, o maior desafio para as organizações não-governamentais é a coleta de provas relativas ao genocídio em curso na região de Darfur, no Sudão. Como não é permitido ao Tribunal Penal Internacional entrar no território sudanês, as provas são colhidas pelas organizações que dão assistência aos sobreviventes e refugiados, as quais capacitam as populações locais para registrar os ataques, fornecendo-lhes câmeras e equipamentos para registrar os crimes e transmiti-los. As evidências colhidas, muitas delas postadas no sítio Youtube, demonstram que, ao contrário do que o governo sudanês afirma, existe um genocídio em curso e que o exército Sudanês tem ligação direta com os eventos.[61]


Assim, pode-se dizer que a atuação das organizações não-governamentais multiplica a capacidade da Procuradoria do Tribunal Penal Internacional em coletar provas e realizar procedimentos de campo nas áreas afetadas por sérias violações aos direitos humanos.


5. Críticas à atuação das organizações não governamentais


Os fatos e argumentos expostos acima denotam que as organizações não governamentais atuaram ativamente na formação do Tribunal Penal Internacional e atuam de forma complementar a ele na consecução de seus objetivos, seja por meio de campanhas de ratificação do Estatuto de Roma e conscientização, seja mediante a coleta de provas incriminadoras dos Estados para a Procuradoria do Tribunal. Tal atuação é objeto de críticas e suscita um debate no campo internacional. As críticas concentram-se principalmente na propalada ilegitimidade das organizações não governamentais, pela falta de embasamento em mecanismos formais de representação e em sua ineficácia, por se oporem a uma estrutura estatal sem se constituírem em um modelo alternativo viável de exercício de poder político dentro da comunidade internacional.


Em relação à falta de legitimidade na atuação das organizações não governamentais em prol do Tribunal salienta-se que os Estados não se deixariam transformar em porta-vozes instrumentalizados por grupos ideológicos se os seus cálculos não coincidissem com os interesses destes grupos.[62] Assim, o espaço direta ou indiretamente concedido no campo das relações internacionais para que as organizações não governamentais atuem seria o resultado de um cálculo político. Para se aferir a sinceridade da atuação destas organizações, deste modo, seria necessário distinguir-se duas espécies de organizações não governamentais: as chamadas organizações “operacionais”, que se encontram presentes nos territórios em conflito, animadas por um ideal respeitável e cujos membros correm riscos, e as organizações “ideológicas”, que se restringem às posturas normativas, aspirando-se tornar partidos políticos internacionais, sem legitimidade, sem raízes e sem controle, e que desenvolvem uma diplomacia paralela à dos Estados, interferindo na política internacional sem representatividade democrática.[63] No caso das chamadas organizações “ideológicas” o que se veria seria uma utilização cínica de valores morais internacionalmente respeitados na qual a adoção de posturas aparentemente desinteressadas possibilitaria a determinados “Estados modelo na cooperação com a sociedade civil” assumirem o papel de advogados do interesse geral e, assim, explorarem a consciência de culpa da comunidade internacional de forma a assumir posições de poder que sua importância geopolítica não permitiria.[64]


Outra questão afeta à legitimidade das organizações não governamentais diz respeito ao seu financiamento. Enquanto manifestação da globalização econômica, o aspecto organizacional das redes de organizações não governamentais estaria marcado pela dicotomia entre as chamadas “ONGs do Norte” e as “ONGs do Sul”, na qual os financiadores das primeiras representariam um papel semelhante aos dos acionistas e investidores das sociedades anônimas. Deste modo, a esfera valorativa, inerente a estas organizações não-governamentais, acabaria eclipsada por uma tradução dos valores do mercado aplicados ao contexto local, pela quantificação de mudanças culturais e conceitos abstratos, como reconciliação, em eventos e números para figurarem em relatórios de atividades. A mudança da cultura organizacional dos movimentos sociais organizados pelas “ONGs do Sul” por conta de sua internacionalização, ou seja, das fontes de financiamento das “ONGs do Norte”, distanciariam as primeiras de suas comunidades, perdendo o vínculo que consiste em seu maior valor e transformando sua atuação em uma negócio, em que a captação de recursos seria guindada não apenas por exortações morais, mas por estratégias de marketing.[65]


Às dúvidas a respeito da estrutura organizacional das coalizões de organizações não governamentais segue a questão da transparência de sua atuação e, consequentemente, da sinceridade de seus objetivos, redundando, por fim, em denúncia pura e simples da perversão dos valores perseguidos por estas organizações pela lógica do mercado. Um exemplo desta crítica é a descrição de Philip Gourevitch a respeito da ação humanitária após o genocídio de Ruanda. Durante cem dias a comunidade internacional quedou-se inerte enquanto o governo ruandês realizava o genocídio mais intenso da história da Humanidade. Quando um exército rebelde composto pela própria etnia vitimizada, os tutsis, numa ofensiva desesperada para salvar seu povo, consegue derrubar o governo, os genocidas, acompanhados de multidões de cidadãos da etnia agressora, com medo da vingança, atravessam a fronteira com a República Democrática do Congo e tornam-se refugiados. Neste momento, a comunidade internacional comove-se com a sorte dos fugitivos e iniciou – para os agressores em fuga – um grande programa de ajuda humanitária, que foi descrito, posteriormente, como uma “indústria das doações internacionais”.[66]


Outra crítica presente na doutrina ressalta que o Tribunal Penal Internacional, ao trabalhar com as organizações não governamentais, sofre com a ineficácia de sua atuação, na medida em que estas organizações se opõem às estruturas burocráticas estatais sem se constituírem, todavia, em um modelo viável de exercício de poder político dentro da comunidade internacional. Deste modo o Tribunal em sua “escolha pelas organizações não-governamentais”, ficou reduzido a um papel simbólico e residual.[67] Apoiado por Estados oportunistas sem maior expressão internacional e pelas organizações não governamentais o próprio Tribunal Penal Internacional fica alijado do apoio dos grandes exércitos e das alianças militares que conduzem as intervenções, precisando contar com o acaso ou com uma suspeita boa vontade dos Estados para realizar uma prisão e julgar um acusado, enquanto os maiores criminosos permaneceriam intocáveis.


A questão sobre a legitimidade da atuação internacional das organizações não governamentais é importante, haja vista que sua ação não é realmente fundamentada pelos mecanismos de escolha da democracia representativa. No entanto, pode-se afirmar que a legitimidade destas organizações não-governamentais decorre do direcionamento de suas ações no sentido de preservar valores e normas eleitos como supremos pela comunidade internacional, em detrimento de autoridades acusadas por uma instituição judicial pelo cometimento de crimes internacionais. Isto é mais do que os mecanismos de representação democrática, conquanto indiretos e formais, podem garantir. A existência do Estado de Direito na França, por exemplo, não impediu que seu governo se envolvesse no genocídio ocorrido em Ruanda.[68] Além disso, se representatividade democrática fosse o parâmetro para a legitimidade de um Sujeito de Direito Internacional dois dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança não poderiam ocupar suas cadeiras. Não se pode confundir a democracia representativa, invenção moderna, datada de fins do século XVIII, com a democracia como um todo. A revolução nas telecomunicações possibilita ao cidadão auto-representar-se segundo seus interesses em âmbito internacional e as organizações não-governamentais têm sido o veículo deste fenômeno.


Por fim, a própria existência de um Tribunal Penal Internacional a quebrar o monopólio do exercício da jurisdição já consiste em uma limitação objetiva à soberania dos Estados. E esta limitação, cuja tradução jurídica é o princípio da complementaridade, reflete uma opção por parte da comunidade internacional de se qualificar o respeito a certos valores – os direitos fundamentais do ser humano – em detrimentos de considerações estratégicas dos Estados. O fato destas coalizões de organizações não-governamentais e redes de movimentos sociais atuarem – em termos organizacionais – de forma semelhante a empresas transnacionais, apenas torna mais clara sua diferenciação das estruturas burocráticas do Estado. A propalada perda da legitimidade é algo possível, mas não uma fatalidade nestas organizações.


A responsabilização das organizações governamentais pela ineficácia das primeiras ações do Tribunal, por sua vez, é injusta. Em seus primeiros anos de funcionamento o Tribunal foi semelhante, em número de sucessos e fracassos, ao Tribunal Ad Hoc para a Ex-Iugoslávia, criado pelo Conselho de Segurança e que contava com a poderosa OTAN ocupando o território sob a jurisdição daquela Corte. Isso significa que a submissão total ao Conselho de Segurança não se traduz necessariamente em efetividade. Traduz-se, ao contrário, em seletividade na defesa aos direitos humanos. Mesmo se voltássemos aos Tribunais de Nurembergue e Tóquio, veríamos que a tradicional afirmação de que foram corte eficazes não é verdadeira. Os responsáveis por alguns dos maiores crimes de guerra, como os bombardeios a Dresden e Hiroshima, nem foram nominados, e mesmo do lado perdedor, considerações políticas deixaram alguns criminosos impunes. Em sentido oposto, observando os primeiros anos do Tribunal Penal Internacional, constata-se que as ações das organizações não-governamentais, enquanto instâncias da sociedade civil, são mais dinâmicas e assertivas que os mecanismos diplomáticos internacionais. Além disso, significam pressão sobre os governantes nacionais ao atingirem a opinião pública de seus Estados. As organizações não-governamentais contribuem, também, de forma efetiva com as investigações da Procuradoria, realizando denúncias e colhendo provas de forma a multiplicar a capacidade de ação do Tribunal.


6. Considerações finais


Devido à preponderância da figura do Estado soberano no modelo de relações internacionais tradicionalmente considerado, o papel dos atores internacionais não estatais na comunidade internacional sempre foi reduzido. Não obstante, com o fenômeno da globalização, a atuação destes atores, em especial das organizações não governamentais, leva a indagar-se a respeito do surgimento de uma sociedade civil internacional. A expressão “sociedade civil”, como o termo de uma dicotomia na qual na outra ponta encontra-se o Estado, foi cunhada por Karl Marx em sua obra “Para a Crítica da Economia Política” ao dividir a vida social nas esferas econômica, política e jurídica.[69] É interessante notar que a tradução literal do termo utilizado por Marx (bürgerlich Gesellschaft) corresponde à “sociedade burguesa”, no sentido da classe social que conseguiu a emancipação política e que contrapõe ao Estado os direitos do homem de forma a proteger seus interesses de classe. Norberto Bobbio observa que, ao adotar o conceito originalmente formulado por Hegel, Marx o modifica decisivamente,[70]


A novidade na obra de Marx é compreender um espaço social desvencilhado da esfera de atuação do Estado fazendo assim, a leitura histórica do viés liberal predominante no Estado Constitucional do século XIX. A partir da proposição marxiana de que o “modo de produção da vida material também condiciona o processo em geral da vida espiritual” e, levando em conta os estudos sobre as relações de poder de Weber – que divide as relações de poder em uma sociedade em poder político, econômico e ideológico – Gramsci considera sociedade civil a esfera na qual agem os aparatos ideológicos que buscam exercer a hegemonia.[71] Seria, portanto, a sociedade civil o espaço das instituições sociais não pertencentes ao Estado em que surgem e se desenvolvem as demandas de ordem econômica, social, religiosa e ideológica que lhe são apresentadas. Seus sujeitos buscam atrair a opinião pública, manifestação de um suposto consenso veiculado pela mídia, como forma de realizar pressão sobre o Estado. São parte da sociedade civil as organizações de classe, os grupos de interesse e os movimentos sociais, entre outros.


Os movimentos sociais ultrapassam o limite da realização de pressão pela realização de suas demandas, visto que possuem um discurso questionador sobre o tratamento de seus membros pela sociedade como um todo, e não apenas em relação ao Estado. A pressão política se apresenta como uma forma de induzir uma reforma social, com vista ao reconhecimento dos direitos dos membros do grupo.[72] Para Graziela de Oliveira:


“Os movimentos sociais que contestam a (des) ordem econômica social estabelecida são produtos do sistema de valores dominantes e da imposição dos interesses do capital à sociedade. Não são facilmente analisados como categoria de classe social, pois aglutinam pessoas de diversas e diferentes condições sociais. Contudo, os objetos que os movem e aglutinam são produtos do sistema capitalista e de sociedades baseadas em relações de privilégio e discriminação.”[73]


Nesse sentido os movimentos voltados à proteção do meio ambiente, por exemplo, ocupam-se com o resultado da poluição industrial e da especulação imobiliária, atividades voltadas exclusivamente ao lucro e que são custeadas por toda a sociedade.[74] No entanto, apresentam-se como instâncias da sociedade civil que possuem reivindicações morais e culturais, vinculando-se, muitas vezes, à busca pelo direito de deliberar em assuntos públicos de interesse de seus membros em detrimento das demandas tradicionais de outros sujeitos da sociedade civil, relativas à distribuição de bens e recursos, como certos grupos que visam, por exemplo, a redução da carga tributária ou a realização de determinadas obras públicas em uma região.[75]


Assim, o conceito de movimento social não se subsume ao conceito de classe social, visto que seus integrantes podem ser oriundos de diversas classes. Caracterizam-se por ser coletivos fracamente organizados que atuam de maneira não institucionalizada, unidos por um objetivo comum de mudança social. Em uma sociedade caracterizada pela diversidade de identidades os movimentos sociais são capazes de interagir em relações dinâmicas e complexas as quais o Estado é incapaz de acompanhar devido à sua estrutura burocrática ainda pautada em um modelo positivista de ordem jurídica, inadequado para responder às demandas da realidade social contemporânea.[76]


A transnacionalização do capital somada ao avanço da tecnologia da informação contribuiu para alterar as formas de luta e organização dos movimentos sociais no sentido de um intercâmbio de ideias, projetos e recursos financeiros entre entidades de diferentes nacionalidades que se tornam atores internacionais. Reproduzindo o sistema de produção globalizado, formam-se redes de movimentos sociais, com o objetivo de se constituir formas de pressão institucional e se alcançar uma mobilização de maior escopo, atingindo a opinião pública. Nesse sentido, a internet possibilitou a circulação e a democratização das informações, bem como a articulação entre os diferentes grupos.[77]


Com o intuito da concretização de seus objetivos, a articulação dos movimentos sociais tornou-se fundamental para a formalização de suas demandas frente ao Estado. Considerando que as políticas públicas integradoras exigem a relação com organizações institucionalizadas os movimentos podem utilizar-se das organizações não-governamentais como veículos de sua atuação.[78]


São relativamente recentes, dentro dos aparatos da sociedade civil, as chamadas organizações não-governamentais cujos fins sociais, indiretamente políticos, ora contrapõe-se ao Estado, ora atuam de forma complementar a ele. Embora suas atividades apresentem grande diversidade quanto ao objeto, pode-se entender as organizações não-governamentais como associações privadas com propósitos não-lucrativos cujas atividades são desenvolvidas fora da esfera governamental.[79]


Representando, majoritariamente, movimentos sociais, organizações não-governamentais, atuando de forma coordenada, formaram uma coalização que se mostrou decisiva, tanto no sentido de realizar uma campanha eficiente para a implantação do Tribunal Penal Internacional, quanto no sentido de que suas demandas moldaram o caráter da nova instituição.[80] Em termos teóricos, a instituição do Tribunal representou uma evolução não apenas do Direito Internacional Penal, mas do Direito Internacional como um todo com consequências profundas para o alcance do princípio da soberania. Assim, a intensa participação das organizações não-governamentais poderia ser considerada como um elemento caracterizador de uma nova ordem internacional emergente, pois modifica as estruturas estabelecidas tradicionalmente a respeito da confecção da norma jurídica internacional por excelência – os tratados – e estabelece esferas de influência não estatais dentro de uma organização intergovernamental, como o Tribunal Penal Internacional.


O atual estágio das relações internacionais pode não tornar possível que se vislumbre qual será o modelo de ordem internacional do novo milênio. No entanto a vinculação do atributo da soberania e do instituto do Estado-Nação à própria existência de uma ordem na esfera das relações internacionais parece se tornar um raciocínio equivocado. Na verdade, a percepção de interdependência, que os processos de globalização trouxeram, parece realmente conduzir-nos a uma nova ordem que não separe os indivíduos em nacionais de diferentes Estados, mas, sim, que os una, enquanto condôminos de um mesmo planeta, com os mesmos direitos e, portanto, merecedores de uma mesma justiça.


 


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WOMEN´S GENDER INITIATIVE FOR THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT. Open Letter to the President of Uganda Joseph Kony and the Leader of the Lords Resistance Army, Joseph Kony. Disponível em: <http://www.iccwomen.org/news/docs/Open_Letter.pdf>. Acesso em: 12 abr. 2009.

 

Notas:

[1] Este foi o caso do Tribunal de Leipzig, constituído para julgar os criminosos de guerra do Império Alemão após a Primeira Guerra Mundial. A incapacidade da Corte em apenar adequadamente os responsáveis pelos crimes que julgou levou-a ao descrédito perante a sociedade alemã que, pouco tempo depois de seus julgamentos, abraçaria o regime nazista. Neste sentido ver: PENROSE, Mary Margaret. Lest we fail: the importance of enforcement in international criminal law. American University International Law Review. Washington D.C. v.15, n.2, p. 328,  1999.

[2] AMBOS, Kai. Os princípios gerais do Direito Penal no Estatuto de Roma. In CHOUKR, Fauzi Hassan; AMBOS, Kai. Tribunal Penal Internacional. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2000. p. 28.

[3] SCHABAS, William A. An Introduction to the International Criminal Court. Cambridge : Cambridge University Press, 2001. p. 60.

[4] CASSESE, Antonio, International Criminal Law. In: EVANS, Malcom D. International Law. Oxford: Oxford University Press, 2004. p. 732.

[5] KAUL, Hans Peter. A Corte Internacional Criminal: a luta pela sua instalação e seus escopos in CHOUKR, Fauzi Hassan; AMBOS, Kai (Orgs.). Tribunal Penal Internacional. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2000. p. 112.

[6] PAULUS, Andreas L. The legalist groundwork of the International Criminal Court: commentaries on the Statute of the International Criminal Court. The European Journal of International Law, v. 14, n. 4, p. 853, 2003.

[7] MAIA, Marriele. Tribunal Penal Internacional: aspectos institucionais, jurisdição e princípio da complementaridade. Belo Horizonte : Del Rey, 2001. p. 81.

[8] SCHABAS, William A. An Introduction to the International Criminal Court. Cambridge: Cambridge University Press, 2001. p. 55.

[9] PIOVESAN, Flávia. Princípio da Complementaridade e Soberania. Revista CEJ, n. 11, p.71,  maio/ago. 2000.

[10] PERRONE-MOISÉS, Cláudia. O princípio da complementaridade no Estatuto do Tribunal Penal Internacional e a soberania contemporânea. Revista Política Externa, v. 8, n. 4, p. 6, mar./maio 2000.

[11] PIOVESAN, op. cit., p. 72.

[12] HALL, Christopher Keith. The Role of the Permanent International Criminal Court in Prosecuting Genocide, Other Crimes Against Humanity and Serious Violations of Humanitarian Law in GUDMUNDUR, Alfredsson; GRIMHEDEN, Jonas; BERTRAM, Ramcharan G.; ZAYAS, Alfred D. (Ed.). International Human Rights Monitoring Mechanisms. London : Kluwer Law International, 2001. p. 461.

[13] PACE, William. Situations under Analysis. The ICC Monitor: Journal of the Coalition for the International Criminal Court, n. 37, p. 8- 9, 2008.

[14] PACE, William. In Rome, 120 Countries Committed to Ending Impunity. The ICC Monitor. Journal of the Coalition for the International Criminal Court,  n. 36, p. 1, 2008.

[15] CASSESE, Antonio, International Criminal Law in EVANS, Malcom D. International Law. Oxford University Press, 2004. p. 730.

[16] Ibid., p. 731.

[17] COALITION FOR THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT. About Us. Disponível em: <www.iccnow.org>.  Acesso em:  02 abr. 2009.

[18] NO PEACE WITHOUT JUSTICE. About NPWJ. Disponível em www.npwj.org Acesso em 02/04/2009.

[19] NO PEACE WITHOUT JUSTICE. NPJW´S International Criminal Justice Program. Disponível em: <www.npwj.org>. Acesso em:  02 abr. 2009.

[20] TORNQUIST-CHESNIER, Marie, op.cit., p. 450.

[21] BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Consultoria Jurídica. Boletim Informativo, v. I, n. 3, p. 2, fev./mar. 2008.

[22] TORNQUIST-CHESNIER, Marie. How the International Criminal Court Came to Life: the role of Non-governamental Organizations. Global Society, v. 21, n. 3, p. 449-466, jul. 2007. p. 453 e 454.

[23] PACE, William. In Rome, 120 Countries Committed to Ending Impunity. The ICC Monitor: Journal of the Coalition for the International Criminal Court, n. 36, 2008.   p. 11.

[24] Ibid., p. 13. Durante a Conferência a Anistia Internacional bloqueou as ruas no entorno do Coliseu com milhares de pessoas deitadas simbolizando as vítimas dos crimes internacionais de forma a pressionar os Estados pela criação do Tribunal Penal Internacional através do evidente apelo midiático que estas manifestações possuíam.

[25] SUR, Serge. Vers une Cour Penale Internationale: La Convention de Rome entre les ONG et le Conseil de Securité. Revue Genérale de Droit International Public, tome CIII, p. 36, 1999.

[26] CASSESE, Antonio, International Criminal Law in EVANS, Malcom D. International Law. Oxford University Press, 2004. p.  731.

[27] TORNQUIST-CHESNIER, Marie. How the International Criminal Court Came to Life: the role of Non-governamental Organizations. Global Society, v. 21, n. 3, p. 449-466, jul. 2007.  p. 461.

[28] SUR, Serge. Vers une Cour Penale Internationale: la Convention de Rome entre les ONG et le Conseil de Securité. Revue Genérale de Droit International Public, tome CIII, p. 29-47, 1999.  p. 35.

[29] TORNQUIST-CHESNIER, Marie. How the International Criminal Court Came to Life: the role of Non-governamental Organizations. Global Society, v. 21, n. 3, p. 449-466, jul. 2007.  p. 462.

[30] PACE, William. In Rome, 120 Countries Committed to Ending Impunity. The ICC Monitor: Journal of the Coalition for the International Criminal Court, n. 36, 2008.  p. 11.

[31] TORNQUIST-CHESNIER, op. cit., p. 456.

[32] TORNQUIST-CHESNIER, Marie. How the International Criminal Court Came to Life: the role of Non-governamental Organizations. Global Society, v. 21, n. 3, p. 449-466, jul. 2007.  p. 454 e 455.

[33] WOMEN´S COALITION FOR THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT. Disponível em: <www.iccwomen.org>.  Acesso em:  03 abr. 2009

[34] OOSTERVELD, Valerie. The Definition of “Gender” in the Rome Statute of the International Criminal Court: a step Forward or Back for the International Criminal Justice? Harvard Human Rights Journal, v. 18, p.59, Spring 2005.

[35] “Interpretações dúbias baseadas em visões mundanas que afirmam que a identidade sexual pode ser adaptada de forma indefinida para buscar novos e diferentes propósitos” (tradução do autor) OOSTERVELD, Valerie, op.cit., p. 65. Esta frase que denota a preocupação dos citados sujeitos de Direito Internacional de que futuramente o Tribunal Penal Internacional viesse a qualificar como crimes contra a humanidade políticas homofóbicas tem como base notas pessoais da autora do artigo, tomadas durante as negociações do Estatuto de Roma, das quais ela participou na qualidade de membro da delegação canadense.

[36] INTERNATIONAL FEDERATION OF HUMAN RIGHTS. Disponível em: <http://www.fidh.org/-Portuges>- Acesso em:  09 abr. 2009.

[37] REDRESS. Disponível em: < www.redress.org>.  Acesso em: 10 abr. 2009.

[38] TORNQUIST-CHESNIER, Marie. How the International Criminal Court Came to Life: the role of Non-governamental Organizations. Global Society, v. 21, n. 3, p. 449-466, jul. 2007.  p. 459.

[39] BRASIL. Decreto n.4388/2002 – Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Artigo 16. Adiamento do Inquérito e do Procedimento Criminal. Nenhum inquérito ou procedimento crime poderá ter início ou prosseguir os seus termos, com base no presente Estatuto, por um período de doze meses a contar da data em que o Conselho de Segurança assim o tiver solicitado em resolução aprovada nos termos do disposto no Capítulo VII da Carta das Nações Unidas; o pedido poderá ser renovado pelo Conselho de Segurança nas mesmas condições.

[40] PACE, William. In Rome, 120 Countries Committed to Ending Impunity. The ICC Monitor: Journal of the Coalition for the International Criminal Court, n. 36, 2008.  p. 11.

[41] BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Consultoria Jurídica. Boletim Informativo, Ano I, n. 3, p. 1, fev./mar. 2008.

[42] TORNQUIST-CHESNIER, Marie. How the International Criminal Court Came to Life: the role of Non-governamental Organizations. Global Society, v. 21, n. 3, p. 449-466, jul. 2007.  p. 449.

[43] O princípio da complementaridade, por exemplo, necessita que haja uma legislação nacional que preveja os mesmos crimes que o Estatuto e que preveja a cooperação judiciária com o Tribunal Penal Internacional, menos de 10 países, dentre os signatários, o fizeram até agora.

[44] Muitos países, inclusive o Brasil, têm por princípio não extraditar nacionais, no entanto a entrega ao Tribunal Penal Internacional é compulsória, no entanto, a mudança na legislação doméstica destes países enfrenta questões constitucionais muito sérias, visto que geralmente envolvem direitos e garantias fundamentais.

[45] SUR, Serge. Vers une Cour Penale Internationale: la Convention de Rome entre les ONG et le Conseil de Securité. Revue Genérale de Droit International Public, tome CIII, p. 29-47, 1999.  p. 31.

[46]INTERNATIONAL CRIMINAL COURT – ASSEMBLY OF THE STATES PARTY. Resolution n.8 (II). Disponível em: <www.icc-cpi.int>. Acesso em:   12 jan. 2009.

[47] COALITION FOR THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT, cit.

[48] UPDATE Latin American Countries. The ICC Monitor: Journal of the Coalition for the International Criminal Court, n.36, p. 25, may/oct. 2008, p. 25.

[49] COALITION FOR THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT. Civil Society at Work. Disponível em: <www.iccnow.org>. Acesso em:  12 abr. 2009.

[50] COALITION FOR THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT. In situ. Disponível em: <http://iccnow.org/blog/ >Acesso em:  04 abr. 2009.

[51] WOMEN´S GENDER INITIATIVE FOR THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT. Open Letter to the President of Uganda Joseph Kony and the Leader of the Lords Resistance Army, Joseph Kony. Disponível em: <http://www.iccwomen.org/news/docs/Open_Letter.pdf >.Acesso em: 12 abr. 2009.

[52] REDRESS. ICC Victim´s Rights Legal Update. Sept./Dec. 2008. Disponível em: <www.redress.org>. Acesso em:  13 abr. 2004.

[53] A LANDMARK Decision on Victims. The ICC Monitor: Journal of the Coalition for the International Criminal Court, n.36, p. 20, may/oct. 2008.

[54] TORNQUIST-CHESNIER, Marie. How the International Criminal Court Came to Life: the role of Non-governamental Organizations. Global Society, v. 21, n. 3, p. 449-466, jul. 2007. p. 452, 460.

[55] COALITION FOR THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT. Role of NGOs in ICC Investigations and Prosecutions. Disponível em: <www.iccnow.org>. Acesso em: 12 abr. 2009.

[56] HUMAN RIGHTS FIRST. The Role of Human Rights NGOs in Relation to ICC Investigations. Discussion Paper distributed for comments to members of the NGO Coalition for the International Criminal Court during the Third Session of the Assembly of States Parties. The Hague, September, 2004, p. 3 e 6.

[57] HUMAN RIGHTS WATCH. How Nongovernmental Organizations can Contribute to the Prosecution of War Criminals. The Hague, September 2004, p. 14-15.

[58] CENTRAL African Republic: Adapting Outreach Strategies to Realities on the Ground. The ICC Monitor: Journal of the Coalition for the International Criminal Court, n.36, p. 6, may/oct. 2008.

[59] COALITION FOR THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT. In situ. Disponível em: <http://iccnow.org/blog/> Acesso em:  04 abr. 2009. 

[60] COALITION FOR THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT. Civil Society at Work. Disponível em:  <www.iccnow.org>. Acesso em:  12 abr. 2009.

[61] Muito antes do indiciamento do Presidente Bashir o sítio <www.wantedforwarcrimes.org> já listava as acusações que pesavam contra ele citando eventos, tipos penais e número de vítimas. Em 03/03/2009 a organização não-governamental britânica Aegis Trust postou no Youtube o vídeo “‘Darfur Destroyed – Sudan’s perpetrators break silence” em que membros do governo do Sudão e soldados testemunham acerca dos crimes que cometeram sob as ordens diretas do governo sudanês.

[62] SUR, Serge. Vers une Cour Penale Internationale: la Convention de Rome entre les ONG et le Conseil de Securité. Revue Genérale de Droit International Public, tome CIII, p. 29-47, 1999. p. 47.

[63] Ibid., p. 37.

[64] Ibid., p. 46.

[65] CARVALHO, Cristina Amélia; SACHS, Tatiane Régine. A Internacionalização da Economia chega ao Terceiro Setor: as relações (de) pendentes entre as ONGS do Sul e do Norte. Organizações e Sociedade. Salvador, v. 8, n.20, p. 114-115, 1998.

[66] GOUREVITCH, Philip. Gostaríamos de informá-lo de que amanhã seremos mortos com nossas famílias: histórias de Ruanda. São Paulo : Companhia das Letras, 2006. p. 263-268.

[67] SUR, Serge. Vers une Cour Penale Internationale: la Convention de Rome entre les ONG et le Conseil de Securité. Revue Genérale de Droit International Public, tome CIII, p. 29-47, 1999.  p. 45.

[68] Neste sentido vide GOUREVITCH, Philip. Gostaríamos de informá-lo de que amanhã seremos mortos com nossas famílias: histórias de Ruanda. São Paulo : Companhia das Letras, 2006.  p. 302.

[69] MARX, Karl. Para a Crítica da Economia Política. São Paulo : Abril Cultural, 1982. p. 25.

[70] BOBBIO, Norberto. Estado, Governo e Sociedade. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1987. p. 42.

[71] Ibid.,  p. 39.

[72] COSTA, Igor Sporch da. Igualdade na Diferença e Tolerância. Viçosa : UFV, 2007, p. 126.

[73] OLIVEIRA, Graziela de. Os Movimentos Sociais frente a Reestruturação Produtiva. Proposta, v. 26, n. 74, p. 22, set./nov. 1997.

[74] Ibid.,  p. 23.

[75] BERNARDINO, Joase apud COSTA, Igor Sporch da. Igualdade na Diferença e Tolerância. Viçosa : UFV, 2007, p. 127.

[76] AREND, Cássio Alberto. Direitos Fundamentais e sua Inter-Relação com os Movimentos Sociais: uma concepção sistêmica do Direito e da Sociedade. Revista de Direito, Santa Cruz do Sul, n. 23, p. 103, jan./jun. 2005.

[77] VIANA, Masilene Rocha. Lutas Sociais e Redes de Movimentos no Final do Século XX. Serviço Social e Sociedade, v. XXI,  n. 64, p. 45-51, nov. 2000.

[78] AREND, Cássio Alberto. Direitos Fundamentais e sua Inter-Relação com os Movimentos Sociais: uma concepção sistêmica do Direito e da Sociedade. Revista de Direito, Santa Cruz do Sul, n. 23, p. 89-105, jan./jun. 2005.  p. 102.

[79] TORNQUIST-CHESNIER, Marie. How the International Criminal Court Came to Life: The Role of Non-governamental Organizations. Global Society, v. 21, n. 3, p. 450, jul. 2007. Apresentam-se como organizações não-governamentais desde entidades direcionadas à defesa do meio ambiente quanto dos direitos humanos, sem falar em organizações religiosas, sectárias ou orientadas para promover objetivos de Estados que são, na verdade, agências governamentais disfarçadas.

[80]  Ibid., p. 449.


Informações Sobre o Autor

João Irineu de Resende Miranda

Graduado em Direito pela UEPG, Mestre e Doutor em Direito Internacional pela Universidade de São Paulo. Professor do Curso de Direito da UEPG e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais Aplicadas da UEPG


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