Princípios da legalidade e anterioridade no Direito Tributário

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Resumo: Os princípios da legalidade e anterioridade são de estudo obrigatórios para a compreensão da ciência fiscal. Ambos apresentam-se como autênticas garantias ao contribuinte frente ao poder de tributar do Estado. A exigência de observância da lei para o exercício deste poder, bem como a necessidade de sua publicação com a razoável antecedência antes que entre em vigor, são dois pilares que indiscutivelmente estão a sustentar todo o sistema jurídico tributário.


Sumário: 1. Introdução. 2. Princípio da legalidade exceções ao princípio da legalidade medida provisória (art. 62, § 2° CF). 3. Princípio da anterioridade exceções ao princípio da anterioridade. 4. Princípio da noventena exceções ao princípio da noventena. 5. Conclusão


1. INTRODUÇÃO


Os princípios da legalidade e anterioridade são de estudo obrigatórios para a compreensão da ciência fiscal. Ambos apresentam-se como autênticas garantias ao contribuinte frente ao poder de tributar do Estado. A exigência de observância da lei para o exercício deste poder, bem como a necessidade de sua publicação com a razoável antecedência antes que entre em vigor, são dois pilares que indiscutivelmente estão a sustentar todo o sistema jurídico tributário e sem os quais este não consegue se sustentar.


Ambos os princípios estão previstos expressamente no texto constitucional, situados topologicamente dentro do capítulo das limitações ao poder de tributar. Dentro de um juízo de proporcionalidade, apontaríamos estes dois princípios como os mais importantes dentre os demais princípios esculpidos no texto constitucional, não que os demais não o sejam, mas porque o estudo de qualquer outro princípio é antecedido pelo estudo destes dois, os quais merecem, por esta razão, uma análise mais minudente.


Assim, nos propomos a estudar o princípio da legalidade e o princípio da anterioridade à luz da jurisprudência de nossos Tribunais Superiores, bem como observando as inovações legislativas que se sucederam após a promulgação da Constituição Federal de 1988.


2. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE


O art. 5°, II da Constituição Federal traz o princípio da legalidade de forma a contemplar o Estado Democrático de Direito, ao dispor que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei”. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, base da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, consignou em seu texto o princípio da legalidade, ao dispor que as balizas do direito natural só podem ser determinadas pela lei.


O princípio da legalidade quando dirigido ao particular deve ser entendido dentro da autonomia da vontade, onde está a afirmar que o particular pode fazer tudo que não for proibido por lei; e sob o prisma da Administração Pública, onde está a estabelecer que esta só pode fazer o que a lei permitir.


Com esta preocupação de delimitar o poder do Estado, sobretudo quando estamos a tratar do poder de tributar que se apresenta de forma compulsória ao particular e limitadora de seu patrimônio, o Poder Constituinte Originário reforçou o princípio ao repeti-lo no capítulo das limitações ao poder de tributar. O art. 150, I da Carta Magna estabelece vedação aos entes políticos, titulares da competência tributária, consistente em “exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”.


A doutrina convencionou chamar este mandamento constitucional de princípio da legalidade tributária, e com este nome é cobrado em concursos e exames da ordem. O princípio da legalidade tributária está a impor ao Estado a sua atuação incondicionalmente baseada na lei, é o que damos o nome de reserva legal.


Neste contexto o artigo 97 do Código Tributário Nacional estabelece as matérias sujeitas à reserva legal, quais sejam: a instituição de tributo ou a sua extinção; a majoração de tributos ou a sua redução; a definição do fato gerador da obrigação tributária principal e do seu sujeito passivo; a fixação de alíquota e da base de cálculo; a cominação de penalidades e as hipóteses de extinção, exclusão, suspensão do crédito tributário ou de dispensa ou redução de penalidades.


O princípio da legalidade ao impor a exigência de lei para exigir ou aumentar tributo, está a falar da lei ordinária ou lei complementar, pois está a dispor sobre a lei em seu sentido estrito. O leitor está a perguntar qual a diferença da lei complementar para a lei ordinária.


Existem duas diferenças principais entre a lei complementar e a lei ordinária, uma no seu aspecto material e a outra em seu aspecto formal.


No aspecto material a lei ordinária se diferencia da lei complementar pelo fato de esta vir taxativamente prevista no texto constitucional, sempre que a Constituição quiser que determinado assunto seja tratado por lei complementar fará menção expressa “lei complementar”, quando assim não o fizer estará tratando da lei ordinária.


Exemplo claro é o art. 146 da Carta Magna que tratou em dispor as matérias tributárias que exigem lei complementar:


“Art. 146. Cabe à lei complementar:


I – dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, Estados, o Distrito Federal e os Municípios;


II – regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;


III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:


a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;


b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;


c) adequado tratamento tributário ao cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas;


d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais e simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13 e da contribuição a que se refere o art. 239.”


Observe, igualmente, que a Constituição Federal ao dispor sobre o Imposto Sobre Grandes Fortunas (art. 153, VII), a Competência Residual da União para a criação de outros tributos não previstos no texto constitucional (art. 154, I) e sobre o empréstimo compulsório (art. 148), exigiu expressamente a necessidade da lei complementar. Nos casos, por exemplo, dos demais impostos da União, dos Estados e dos Municípios a Carta Magna não está a exigir lei complementar, o que indica o tratamento da matéria por lei ordinária.


No aspecto formal a lei ordinária se diferencia da lei complementar quanto a quórum de votação exigido para a sua aprovação. Enquanto que para a lei ordinária ser aprovada se exige apenas o quorum de maioria simples (maioria dos presentes na sessão de votação); para a lei complementar ser aprovada é necessário a maioria absoluta (maioria do total dos membros que compõem a Casa).


Assim, vamos imaginar a seguinte situação hipotética: Em uma determinada sessão do Senado Federal temos a presença de 60 (sessenta) senadores, dos 81 (oitenta e um) que compõem a casa. Se nesta sessão for colocada em votação a instituição do Imposto Sobre Grandes Fortunas (que exige lei complementar) e a instituição do Imposto Extraordinário de Guerra (que exige lei ordinária), para o primeiro precisaremos do voto favorável de 41 (quarenta e um) senadores (maioria absoluta), enquanto que para o segundo precisaremos do voto favorável de 31 (trinta e um) senadores (maioria simples).


EXCEÇÕES AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE


A primeira exceção ao princípio da legalidade está esculpida no artigo 97, § 2° do CTN, que dispõe não constituir majoração de tributo a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo. Observe que o dispositivo está a tratar de atualização, e não em aumento da base de cálculo.


Para a compreensão desta primeira exceção vamos utilizar como exemplo a atualização da base de cálculo do IPTU. O valor venal do imóvel obedece a uma tabela de valores disposta pelo Município a indicar o valor da área construída em determinada região, é claro que este valor com o passar do tempo sofre uma depreciação em razão da inflação, razão pela qual é necessária a atualização monetária.


Esta atualização monetária realizada pelo Município não representa um aumento real da base de cálculo, mas apenas um aumento nominal, facultando ao Município realizar esta atualização por meio de Decreto do Prefeito. Contudo, esta atualização deve ter limites, de forma a não configurar um aumento de base de cálculo revestido de atualização monetária, com esta preocupação firmou-se o entendimento sumulado do Superior Tribunal de Justiça: “Súmula 160 – É defeso, ao Município, atualizar o IPTU, mediante decreto, em percentual superior ao índice oficial de correção monetária.”


A segunda exceção ao princípio da legalidade está plasmada no artigo 153, § 1° da CF ao facultar ao Poder Executivo alterar as alíquotas do Imposto sobre Importação (II), Imposto sobre Exportação (IE), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O ato normativo é o decreto presidencial ou Portaria do Ministro da Fazenda, utilizada na prática para os impostos aduaneiros (II e IE).


Esta exceção está baseada no caráter extrafiscal destes impostos, vale dizer, são cobrados com a finalidade precípua de regular determinado setor da economia, exigindo maior dinamismo na alteração das alíquotas a fim de se adequar às rápidas variações da economia.


A terceira exceção ao princípio da legalidade está encartada no art. 177 § 4°, I, “b” da Constituição Federal, consistente na possibilidade de o Poder Executivo reduzir ou restabelecer a alíquota da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível. Esta exceção se materializa por decreto presidencial, e passou a ter previsão no texto Constitucional com a Emenda Constitucional n° 33/2001.


A quarta exceção, também inovação trazida pela Emenda Constitucional n° 33/2001, é a do art. 155, § 4°, IV da CF, permitindo aos Estados e Distrito Federal definir as alíquotas do ICMS monofásico incidente sobre combustíveis. O instrumento normativo utilizado no presente caso é o convênio do CONFAZ (Conselho Nacional de Política Fazendária).


Ainda em relação às duas últimas exceções inseridas pela Emenda Constitucional n° 33/01, cabe grifar que enquanto na CIDE as alíquotas podem ser reduzidas ou restabelecidas (retornar ao patamar inicial); no ICMS monofásico incidente sobre combustíveis o texto normativo utiliza a expressão “definir”, o que está a demonstrar uma amplitude maior de poder conferido aos Estados e Municípios que reunidos no Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) poderão não só restabelecer, mas aumentar a alíquota.


MEDIDA PROVISÓRIA (ART. 62, § 2° CF)


Inicialmente, cabe advertir que não nos cabe aqui tecer críticas ao funcionamento da medida provisória e ao número exorbitante de edições destas medidas pelo Poder Executivo. O fato é que, bem ou mal, esta espécie normativa assume relevante papel no cenário jurídico brasileiro, e com a Emenda Constitucional n° 32/01 passou definitivamente a integrar o estudo do Direito Tributário.


A medida provisória é ato normativo, com força de lei, a ser adotado pelo Presidente da República em casos de relevância e urgência, nos limites estabelecidos pelo artigo 62 da Constituição Federal.


O Supremo Tribunal Federal posicionou-se no sentido de admitir a edição de medidas provisórias por Governadores de Estado e Prefeitos, quando autorizados pela Constituição Estadual e Lei Orgânica Municipal, respectivamente. Cumpre registrar que um dos fundamentos para este entendimento foi encontrado no próprio texto constitucional que em seu art. 25, § 2° indicou a possibilidade de sua utilização pelo Estado ao prever a vedação de sua edição para a regulamentação da exploração de serviços locais de gás canalizado. (ADINS 425 E 812 e Informativos 280, 289 e 433 do STF).


O processo legislativo da medida provisória consiste em ato singular a ser praticado pelo Chefe do Poder Executivo e submetido à apreciação posterior do Congresso Nacional. Ao editar a medida provisória o chefe do Poder Executivo deve observar os requisitos constitucionais de relevância e urgência.


A medida provisória é submetida ao Congresso Nacional para a sua conversão em lei ordinária, todo o trâmite deve durar 60 (sessenta) dias, podendo ser prorrogado por igual período uma única vez. Se neste período de 120 (cento e vinte) dias não for convertida em lei perde a sua eficácia desde a sua edição, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes.


Considerando a urgência da matéria tratada pela medida provisória, se esta não for apreciada no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias contados de sua publicação, passa a tramitar em regime de urgência, sobrestando todas as demais deliberações legislativas até que esta seja apreciada, é o que se chama de trancamento de pauta e cria grande celeuma entre o poder legislativo e executivo, recebendo severas críticas por parte de deputados e senadores, muitas das quais facilmente presenciadas em veículos de informação, dentre os quais a TV Câmara dos Deputados e TV Senado.


Antes da Emenda Constitucional n° 32/01 a medida provisória era reeditada por um número ilimitado de vezes, com a nova redação passou a ser vedada a reedição de medida provisória, na mesma sessão legislativa que tenha sido rejeitada expressa ou tacitamente. A rejeição expressa se dá com a sua apreciação e não conversão pelos membros do Congresso Nacional através de decreto legislativo; a rejeição tácita ocorre com a não-apreciação no prazo assinalado de sessenta dias, prorrogável por mais sessenta. 


Antes da edição desta Emenda Constitucional certa corrente doutrinária advogava a tese de que o princípio da legalidade tributária deveria ser interpretado estritamente, de forma a não admitir o uso de medidas provisórias em matéria tributária, apenas a lei ordinária e complementar, ressalvando as exceções expressamente previstas no texto constitucional. A Emenda Constitucional n° 32/2001 pacificou a discussão acerca da possibilidade de a medida provisória disciplinar matéria tributária, corroborando o entendimento do Supremo Tribunal Federal.


O artigo 62, § 2° da Constituição Federal, prevê a possibilidade de edição de medida provisória para a instituição ou majoração de impostos, condicionando a produção de seus efeitos no exercício financeiro seguinte, desde que tenha sido convertida em lei até o último dia daquele que foi editada. Com a presente previsão a medida provisória que verse, por exemplo, acerca da majoração de uma alíquota de um imposto, deverá ser apreciada e convertida em lei no mesmo exercício financeiro que tenha sido editada e só produzirá seus efeitos no exercício financeiro seguinte.


Este condicionamento constitucional tem ressalvas, previstas no próprio dispositivo, em relação aos Impostos de Importação (II), Exportação (IE), Sobre Produtos Industrializados (IPI), Sobre Operações Financeiras (IOF) e os Impostos Extraordinários de Guerra, os quais não precisam se submeter ao princípio da anterioridade, como mais adiante se verá.


O princípio da anterioridade nonagesimal, ou reforçada, também deve ser observado pela medida provisória naqueles casos em que a instituição do tributo ou majoração da alíquota deve obediência.


Cumpre registrar, por necessário, que as vedações constantes no § 1° do art. 62 da CF também se aplicam à matéria tributária, dentre as quais grifamos a vedação de edição de medidas provisórias sobre matéria reservada à lei complementar.  Assim, a título de exemplo, o Imposto Sobre Grandes Fortunas, os Empréstimos Compulsórios, a Competência Residual da União para criar impostos, bem como as matérias disciplinadas no art. 146 da Constituição Federal não poderão ser objeto de medida provisória, pois, por expressa previsão constitucional, devem ser disciplinadas por lei complementar.


3. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE


O artigo 150, III, “b” da Constituição Federal veda a cobrança de tributos “no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou”. O princípio da anterioridade do exercício financeiro predica, tão-somente, que se uma lei vier a aumentar ou criar um tributo, ela deverá ser anterior ao exercício financeiro em que o tributo será cobrado.


O exercício financeiro corresponde ao ano civil (01 de janeiro a 31 de dezembro). Assim, se quiser aumentar a alíquota do ICMS para o ano de 2015, a lei deverá ser publicada no ano de 2014. Da mesma forma, se quiser instituir o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) em 2010, a lei deverá vir em 2009.


O fundamento deste princípio é a não surpresa. Explico: o escopo da norma é evitar que o contribuinte seja surpreendido com a cobrança de um determinado tributo do dia para a noite, dando tempo para ele se programar para a nova exação que será cobrada.


Observe que este princípio vem a reforçar o princípio da irretroatividade, pois além de o legislador vedar a aplicabilidade da lei a fatos anteriores à sua edição, ele também veda que a lei que crie ou aumente tributo venha a ser aplicada no mesmo exercício financeiro. Este princípio constitucional, assim como o princípio da irretroatividade, é considerado cláusula pétrea, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal na ADIN 939-7 DF, Rel. Min. Sydney Sanches.


EXCEÇÕES AO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE


O próprio artigo 150 traz as exceções ao princípio da anterioridade do exercício financeiro em seu § 1°, quais sejam:


1. Imposto sobre a importação de produtos estrangeiros – II; (art. 153, I da CF)


2. Imposto sobre a exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados – IE; (art. 153, II da CF)


3. Imposto sobre produtos industrializados – IPI; (art. 153, IV da CF)


4. Imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários – IOF; (art. 153, V da CF)


O fundamento destas exceções ao princípio da anterioridade está no caráter extrafiscal destes tributos, que são instrumentos reguladores da economia e da política monetária e fiscal do país. Não pode o Poder Executivo aguardar a virada do exercício financeiro para colocar em prática iniciativas tendentes a amenizar ou contornar crises de setores da economia, sobretudo em um mundo globalizado.


Ex: frente a um desabastecimento de feijão, em razão de um problema climático, a fim de evitar a sua falta e o aumento de preço, aumento a alíquota do imposto de exportação; (regular a oferta de bens no país)


Ex: frente a uma crise na indústria de calçados, a fim de evitar o desemprego no mercado de calçados, aumento a alíquota do imposto de importação; (proteção do mercado interno)


Outro exemplo recente é o da redução do IPI para automóveis, com a finalidade de amenizar os efeitos da crise mundial e evitar demissões na indústria automobilística. (fomentar a economia)


1. Empréstimo Compulsório para atender a despesas extraordinárias decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; (art. 148, I da CF)


2. Impostos Extraordinários de Guerra; (art. 154, II da CF)


Fundamento: A própria excepcionalidade do tributo está a indicar a necessidade de sua não submissão ao princípio da anterioridade. Não tem como o país entrar em guerra no mês de março e aguardar até janeiro do ano seguinte para angariar os recursos necessários para o custeio das despesas que devam ser realizadas, como compra de armamento, deslocamento de tropas, medicamentos, etc.


Além das exceções plasmadas no art. 150, I da Constituição Federal, temos outras três exceções esparsas no texto constitucional, a saber:


A prevista no artigo 195, § 6º da Constituição Federal:


1. Contribuições de seguridade social, incluídas a contribuição para o PIS/PASEP e a CONFINS. (art. 195 da CF)


A prevista no artigo 177, § 4°, I “b” da Constituição Federal:


2. Contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível – CIDE, no caso de redução ou restabelecimento de sua alíquota por ato do Poder Executivo;


 A prevista no artigo 155, § 4º, IV, “c” da Constituição Federal:


3. Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação – ICMS, incidente em etapa única sobre combustíveis e lubrificantes, no caso de redução e restabelecimento da alíquota mediante convênios de ICMS, celebrados no âmbito do CONFAZ.


Das nove exceções apresentadas, as oito primeiras estão incluídas na Competência da União, sendo que a última está a tratar de imposto de competência estadual. Destas oito de competência da União verificamos que dos impostos deste ente político apenas o IR, ITR e o IGF são os que não constam nesta lista.


Outrossim, no que pertine às duas últimas (CIDE e ICMS), a excepcionalidade está apenas na redução e restabelecimento da alíquota. Desta forma, a exceção ao princípio da anterioridade não está autorizando que se ultrapasse o teto da alíquota fixada anteriormente à redução, razão pela qual se fala em restabelecimento e não em aumento de alíquota.


4. PRINCÍPIO DA NOVENTENA


O princípio da noventena é também conhecido como princípio da anterioridade nonagesimal ou princípio da anterioridade reforçada. Este último nome se explica pela razão de que este princípio foi acrescentado pela Emenda Constitucional n° 42/2003, de forma a reforçar o princípio da anterioridade do exercício financeiro.


Ocorre que apenas o princípio da anterioridade do exercício financeiro não era o bastante para assegurar a não-surpresa do contribuinte na publicação de leis que viessem a instituir ou aumentar tributo. Por algumas vezes os contribuintes foram surpreendidos com o aumento e instituição de tributos nos últimos dias do ano, sem que esta lei estivesse a desobedecer ao princípio da anterioridade comum, pois o Estado estava a cobrar o tributo horas depois, contudo, em outro exercício financeiro.


Assim, a fim de coibir que um tributo fosse criado ou tivesse a sua alíquota aumentada no dia 31 de dezembro e passasse a ser cobrado no dia 01 de janeiro, horas depois, o princípio da noventena veio para reforçar o princípio da anterioridade do exercício financeiro, exigindo a observância do prazo de 90 (noventa dias) da data em que haja sido publicada a lei que instituiu ou aumentou o tributo.


EXCEÇÕES AO PRINCÍPIO DA NOVENTENA


O mesmo artigo 150 que contempla este princípio, em seu § 1° aponta exceções, quais sejam:


1. Imposto sobre a importação de produtos estrangeiros – II; (art. 153, I da CF)


2. Imposto sobre a exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados – IE; (art. 153, II da CF)


3. Imposto de Renda – IR; (art. 153, III da CF)


4. Imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários – IOF; (art. 153, V da CF)


Chamo a atenção do leitor, neste ponto, para apontar que no lugar do Imposto sobre produtos industrializados – IPI, que se encontrava no item 3, quando falamos da anterioridade do exercício financeiro, agora temos o Imposto de Renda – IR.


5. Empréstimo Compulsório para atender a despesas extraordinárias decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; (art. 148, I da CF)


6. Impostos Extraordinários de Guerra; (art. 154, II da CF)


Ademais, quanto à fixação da base de cálculo não se submetem ao princípio da noventena os seguintes impostos:


7. Imposto sobre propriedade de veículo automotor – IPVA; (art. 155, III)


8. Imposto sobre propriedade territorial urbana – IPTU. (art. 156, I)


Podemos notar que o princípio da noventena não é aplicado sempre em conjunto com o princípio da anterioridade do exercício financeiro, existindo situações em que apenas um deles é aplicado, uma vez que as exceções destoam de um para outro princípio.


Até o item 6 temos apenas a alteração do Imposto sobre produtos industrializados – IPI (exceção ao princípio da anterioridade do exercício financeiro) para o Imposto de Renda – IR (exceção ao princípio da noventena). Temos assim, o II, IE, IOF, Empréstimo Compulsório decorrente de guerra externa ou sua iminência e o Imposto Extraordinário de Guerra como exceções comuns aos dois princípios.


Por outro lado, as exceções do princípio da anterioridade do exercício financeiro dos itens 7, 8 e 9 (contribuição de seguridade social, CIDE e o ICMS) não se repetem no princípio da noventena, dando lugar ao IPVA e IPTU. Cumpre registrar que estas duas últimas exceções ao princípio da noventena dizem respeito, apenas, à fixação da base de cálculo.


Por fim, e não menos importante, a contribuição de seguridade social está a se submeter ao princípio da anterioridade nonagesimal de acordo com o art. 195 § 6° da Constituição Federal que dispõe que “só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado”. No que pese a expressão “modificado” no lugar de “aumentado” do art. 150, I, “c”, o Supremo Tribunal Federal já firmou entendimento que a expressão modificado tem o mesmo significado que aumentado.


5. CONCLUSÃO


Os princípios da legalidade e anterioridade no direito tributário nos oferecem uma rica análise de discussões e um importante comando de observância quando do estudo do sistema tributário. Olvidar qualquer destes princípios é trafegar em um mar de inconstitucionalidade insanável que, como o Rei Midas, irá contaminar de nulidade tudo o que vier a tocar.


A análise da ciência tributária deve ser feita, sempre, partindo do texto constitucional e, dentro desta diretriz, encontramos nos primeiros passos dados os princípios da legalidade e anterioridade, os quais irão nos acompanhar durante todo o percurso, como verdadeiros guias.


Neste percurso se olvidarmos qualquer das diretrizes definidas por estes guias, trafegaremos por caminhos equivocados, desperdiçando esforço e tempo sem um resultado satisfatório. Por esta razão o estudo destes princípios deve anteceder ao estudo de qualquer outro instituto, antes de começar a caminhar temos que nos valer destes dois instrumentos para uma viagem de conhecimento segura e efetiva.


Ambos os princípios são constantemente tratados por nossos Tribunais Superiores na análise das mais diversas matérias postas sob sua apreciação, tornado-se um rico manancial de informações a serem aproveitados pelo operador do direito, razão pela qual é indicada a leitura de julgados do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, neste sentido os informativos assumem relevante papel.


Dentro deste estudo, grifa-se a importância a ser dedicada na análise das exceções, são estas constantemente cobradas em provas de concurso e exame de ordem. Como exceções que o são, devem vir expressamente previstas em lei.


Desta forma, os princípios da legalidade e anterioridade, mais do que limitações ao poder de tributar, são indicativos de existência de um Estado Democrático de Direito, razão pela qual a sua importância transcende as palavras, se espraiando por todo o sistema jurídico tributário.


 


Referências bibliográficas

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ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO, Vicente. Direito Tributário na Constituição e no STF: teoria e jurisprudência – 11ª ed. – Rio de Janeiro: Impetus, 2006.

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MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário30ª ed. Malheiros Editores – São Paulo – 2009.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional – 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2008.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional – 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2007.

PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 11ª ed. – Porto Alegre: Livraria do Advogado; EMAFE, 2009.


Informações Sobre o Autor

Alexandre Machado de Oliveira

Juiz de Direito Substituto do Estado de Alagoas. Procurador do Estado de Roraima 2004-2008. Chefe da Procuradoria Fiscal 2004. Membro do Conselho Superior da Procuradoria Geral do Estado de Roraima 2004-2006. Professor Contratado da Universidade Federal de Roraima 2004-2005 (Direito Tributário e Comercial). Professor do Alagoas Cursos 2009 (Tributário). Professor do Centro de Ensino Superior de Maceió – CESMAC (Administrativo). Juiz Membro da Turma Recursal da Segunda Região – Arapiraca. Especialista em Direito Processual Civil


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