A liberdade em Roscoe Pound

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Resumo: A obra Liberdade e Garantias Constitucionais, de Roscoe Pound, trata do direito como forma de liberdade, da limitação das ações dos monarcas, das decisões dos juízes e da influência deles no incremento das leis, do desenvolvimento das garantias constitucionais na Inglaterra, e posteriormente nos Estados Unidos. Pound expõe a conquista da liberdade de maneira histórica, mostra como se desenvolveram e tomaram forma devido a exigência de equilíbrio que deve existir entre governantes e governados.


Palavras-chave: Liberdade. Leis. Roscoe Pound.


Abstract: The book Freedom and Constitutional Guarantees, Roscoe Pound, the law treats as a form of freedom, limiting the actions of monarchs, the decisions of judges and their influence on the increment of laws, development of constitutional guarantees in England, and later in United States. Pound exposes the conquest of freedom of a historical way, shows how they developed and took form because of the requirement to balance that must exist between rulers and ruled.


Keywords: Freedom. Law. Roscoe Pound.


1 O autor


Roscoe Pound, mestre em filosofia jurídica norte americana, ao longo da obra Liberdade e Garantias Constitucionais vem tratar da conquista das garantias constitucionais o que implicou na conquista da liberdade, no direito inglês e norte americano.


É conhecido também como fundador da jurisprudência sociológica, onde os conceitos jurídicos são reconhecidos com um sistema dinâmico que é influenciado por condições sociais e que, por sua vez, influencia a sociedade como um todo.


Pound caracterizava o direito como uma série de conceitos fixos, dos quais derivavam as leis, estas formuladas com base na experiência social e na vida política. Desse modo teve fortes influencias do pragmatismo jurídico. Segundo Pound os juízes deveriam pensar nas consequências sociais e econômicas de suas decisões, os operadores do direito precisam relacionar preceitos acadêmicos para a solução concreta das lides, disponibilizando o universo teórico a serviço do mundo prático.


2 Origem filosófica do pragmatismo


O pragmatismo surgiu nos primeiros anos da década de 1870, em Cambridge, Massachusetts, onde um pequeno grupo de rapazes, William James, Charles Sanders Peirce, Oliver Wendell Holmes Jr. e Nicholas Saint John Green, se encontravam, sob a denominação de “O Clube Metafísico”, baseados na frase de Alexander Bain de que uma crença “é aquilo com base em que um homem está preparado para agir”. (WAAL, 2007, p.17)


Esses homens não acreditavam que o pragmatismo era uma idéia nova, conheciam que era um método praticado desde a antiguidade.


O pragmatismo trás uma conexão entre o pensamento e a ação, Peirce afirma que o significado de qualquer conceito é a soma de suas conseqüências práticas concebíveis, assim conceitos que não tenham conseqüências práticas concebíveis não possuem significado, do mesmo modo que dois conceitos que tenham a mesma conseqüência possuem significados iguais. (WALL,  2007, p.19)


Neste mesmo sentido os demais membros do Clube Metafísico se manifesta, Nicholas Saint John Green argumenta que a responsabilidade legal não deve ser definida abstratamente, distante dos atos das pessoas humanas e dos seus efeitos, mas de um modo que o indivíduo seja capaz de afirmar que tais efeitos seriam resultados dos seus atos. Na mesma linha Oliver Wendell Holmes Jr. Identifica o significado de uma lei como sendo o que o juiz prescreve destas regras em casos particulares (WALL,  2007, p.18)


É interessante lembrar que o pragmatismo não é uma teoria filosófica, é sim, um método de fazer filosofia. Inicialmente ele foi inventado para determinar o significado das palavras e termos filosóficos e científicos, posteriormente utilizada como método e atitude de orientação voltada para as conseqüências práticas, segundo William James. (JAMES, 1997).


Outro ponto sobre o que William James vem tratar é quando ele aponta o pragmatismo como teoria da verdade, ele crê que possuímos um conjunto de idéias formadas adquiridas pela vivência, a medida que passamos por novas experiências, inicia-se um processo de adaptação da nova realidade ao conjunto das antigas idéias. Por fim a pessoa humana estaria constantemente vivenciando e agregando novas verdades. O autor sustenta que deve existir um processo de alargamento da verdade, em razão da experiência, opondo-se aos sistemas fechados, formados de verdades absolutas e inquestionáveis. A respeito da concepção da verdade no pragmatismo William James afirma:


“O “verdadeiro” (…) é somente o expediente no processo de nosso pensamento. (…) O “absolutamente” verdadeiro, significando o que nenhuma experiência posterior jamais alterará, é aquele ponto difuso ideal para o qual imaginamos que todas as nossas verdades temporárias algum dia convergirão (…). Nesse meio tempo, temos de viver hoje com a verdade que podemos ter hoje, e estarmos prontos amanhã para tachá-la de falsidade”. (JAMES, 1967, p.127)


 3 O pragmatismo jurídico


 Segundo Roscoe Pound, o direito é sobretudo experiência e não apenas lógica, sob a influência da Escola Sociológica do Direito, Pound afirma que o elemento político-social deve interferir na interpretação da lei, a fim de satisfazer o interesse público.


O direito é tido como um fenômeno social, relacionado com todos os aspectos da vida humana, não é um conjunto de leis pronto e acabado, desse modo o juiz não poderia abster-se de todas as contribuições sociais.


Para os pragmatistas, os juízes fazem o direito, e não simplesmente o
os reproduzem. A decisão mais acertada é aquela que melhor corresponde às necessidades humanas e sociais. (MELO, 2007)


Um dos principais nomes, nos dias de hoje, do pragmatismo jurídico é Richard Posner, juiz norte americano. Posner aproxima-se das teorias que norteiam a investigação empírica, como a economia. E entende o direito como uma ferramenta social, assim sendo, deve ter seu objetivo os fins sociais, a coletividade, o bem comum.


4 Liberdades e garantias constitucionais


Do mesmo modo que o livro, podemos iniciar falando sobre a liberdade com um questionamento, o que significa “liberdade”?


Para Kant a liberdade é a livre afirmação de si mesmo, limitada apenas pela liberdade de todos. (POUND, 1976, p.1)


Noberto Bobbio concorda com Kant e acrescenta a análise sobre os dois tipos de liberdades, a liberdade interna e a externa.


A liberdade interna como sendo a liberdade moral, entendida como uma adequação às leis que a nossa razão dá a nós mesmos, seria então uma relação de mim comigo mesmo. Enquanto a liberdade externa seria a liberdade jurídica, a faculdade de agir no mundo externo, não sendo impedido pela liberdade igual dos demais seres humanos livres, ou seja, é uma relação com os outros. (BOBBIO, 1984, p. 58 E 59) Neste mesmo sentido entende Giuliano Crifo, quando fala de liberdade liberal (liberdade interna) e liberdade democrática (externa).(CRIFO, 2005)


Roscoe Pound dá uma significação no sentido da liberdade sob a lei, que implica na aplicação sistemática e ordenada da força daqueles homens que governam uma sociedade politicamente organizada. De modo que esta força seja uniforme, igual e previsível, não devendo obedecer à caprichos ou impulsos.


Neste mesmo sentido o autor expõe:


“‘Liberdade’ que nos garante a nossa declaração de direitos consiste na reserva para o individuo de certas expectativas fundamentais razoáveis que entendem com a vida na sociedade civilizada e liberação em relação ao exercício arbitrário e desarrazoado do poder e da autoridade por parte daqueles que são nomeados ou escolhidos em sociedade politicamente organizada com o objetivo de ajustar relações e ordenar a conduta e se tornam dessa maneira capazes de aplicar a fora dessa sociedade aos indivíduos.” (POUND, 1976, p.1)


Pound acredita que a lei interna tem o poder de limitar o poder e a autoridade dos que governam, consequentemente a lei tem o poder de garantir a liberdade, a liberdade estabelecida pela Lei interna ou pelo costume.


O autor analisa a liberdade em quatro momentos distintos: 1 na Inglaterra medieval até a conquista da Reforma; 2 era Tudors e dos Stuarts, da Reforma à Revolução de 1688; 3 As colônias da América até a Declaração de Direitos do Congresso Continental; e 4 a era das constituições escritas, que culmina em a Declaração federal de direitos.


5 Inglaterra Medieval


Antes de iniciarmos falando da Inglaterra devemos fazer uma explanação prévia sobre a Idade Média, sua sociedade e sua influência neste país.


A sociedade medieval estava organizada segundo relações, sejam elas as relações de parentesco ou entre suserano e vassalo.


A sociedade era estática e hierarquizada. A nobreza feudal era detentora de terras e arrecadava impostos dos camponeses. O clero tinha um grande poder, pois era responsável pela proteção espiritual da sociedade. Era isento de impostos e arrecadava o dízimo. A terceira camada da sociedade era formada pelos servos e pequenos artesãos. As comunicações sofriam muitas dificuldades, cada pessoa se via obrigada a depender do acaso dos encontros. (BLOCH. p.86)


Apesar da sociedade medieval está organizada de acordo com sociedades, ela estava em contato com as idéias de uma sociedade organizada politicamente, o Império Romano. Assim duas idéias de direito entraram em concorrência: o Digesto de Justianiano e a Lei Germânica.


Os Institutos Justinianos, era uma legislação autoritária do Império, que estabeleciam o que fossem do agrado do Imperador, em contraponto a Lei Germânica que era encarada como a busca da justiça e da verdade do criador.


A Lei Germânica afirmava que o homem deveria governar deveria se submeter a Deus e a lei. Não se pode esquecer o papel da Igreja, que organizava toda a cristandade, a sociedade religiosa, as universidades, onde se ensinava o direito de Justiniano em toda Europa.


Todavia na Inglaterra, não prosperou essa idéia, o direito inglês era o direito feito nos tribunais pelos juízes e juristas. Os juízes ingleses obedeciam o costume já fixado nos tribunais.


A Inglaterra possuiu grandes governantes, segundo Pound, todavia estava constantemente sob a ameaça de um governo tirano, que não estava disposto a submeter-se as leis.


Guilherme, o conquistador, era duque da Normandia, governante forte, resoluto, trabalhador árduo, sensato, não era tirano. Empenhou-se para estabilizar o país. Enquanto seu filho, Guilherme Rufus, tornou-se um grande tirano, possuía um governo arbitrário e opressor. Henrique I (irmão de Guilherme Rufus) possuía a mesma capacidade do pai, apesar de ter tendências despóticas, ele limitou seus caprichos quando organizou a administração do país, por exemplo quando organização do tribunal  do rei, a administração do “judiciar”. Além de cria a Carta das Liberdades, que se ocupava dos abusos concretos como o governo autocrático, exercício abusivo de poder, entre outras.


Apesar de alguns avanços nos campos da lei, foi com Henrique II que aconteceu o império das leis. Ele era jurista, dedicou-se a centralizar o poder, afastou o país do feudalismo, com relação as leis sua maior realização foi o grande júri, que possibilitou a investigação  e processo dos réus, além de proteger o povo das denuncias infundadas.


Posteriormente, no governo de João Sem Terra, os barões e a Igreja o obrigaram a assinar a Magna Carta (Carta de Henrique I), este documento limitou o poder dos monarcas da Inglaterra, especialmente o do rei João Sem Terra, impedindo assim o exercício do poder absoluto.


Segundo os termos da Magna Carta, João deveria renunciar a certos direitos e respeitar os procedimentos legais, bem como reconhecer que a vontade do rei estaria sujeita à lei. O que proporcionou grandes avanços na conquista das liberdades.


Os historiadores dizem que a Magna Carta tem raízes na Carta das Liberdades do Rei Cnuto, na Carta da Liberdade de Henrique II e as cartas semelhantes de Stephen e Henrique I.


Ela estabelece as idéia que se encontram na base da vida social e política medieva. Pensava-se a respeito da sociedade como sustentada por um sistema de direitos e deveres recíprocos, importando em relações meio humanas, meio divinas, uma vez que a autoridade dividia-se entre Igreja e Estado.


 Henrique III, filho de João Sem Terra, assume seu reinado por volta de 1216, após a morte do pai. Seu governo foi marcado por lutas e reinvindicações que giravam em torno dos direitos assegurados pela Magna Carta.


Seu sucessor, Eduardo I, aceitou as reivindicações, ele promulgou leis que restringiam o poder do governo e convocou os primeiros parlamentos oficialmente reconhecidos, em seu reinado termina a luta medieval em prol da constituição. Pound afirma que com Eduardo I houve o fim de um período de formação na história política e inicia-se a histórica política legal da constituição inglesa. Garantindo a liberdade conforme se tem mantido na parte do mundo de língua inglesa ate hoje.


O autor não trata da liberdade na Guerra dos Cem Anos (1337-1453), entre Inglaterra e França, ausenta-se de comentar esse momento histórico e cuida da Era Tudors e Stuarts.


6 Era dos Tudors e dos Stuarts


Chamou esse período de três R, que equivaliam a: renascença; reforma; e recepção do direito romano.


Na renascença, os humanistas não se agradaram das qualidades duradouras da lei interna inglesa. Por conseguinte recepcionaram o direito romano. Esta reforma demolira metade do direito fundamental que o jurista do medievo elaborou, não era mais possível aos juízes recusar fazer cumprir estatutos promulgados pelo Parlamento, independente da razão. Alguns estudantes de direito reclamava contra o abandono da lei comum (lei interna).


Nota-se que neste período houve uma ameaça a continuidade histórica jurídica inglesa.


Pound afirma que a renascença:


“Era uma época em que se abandonavam as antigas crenças, em que se derrubavam as antigas instituições, em que os homens se revoltavam contra o passado no qual se apoiavam e substituíam a razão pela autoridade. Que a lei comum, desenvolvida do século XIII ao XV tivesse podido sobreviver em tal época prova suficientemente a vitalidade das suas idéias fundamentais.” (POUND, 1976, p.25)


Assim, apesar de todas as mudanças, da tentativa de instalação de um governo absoluto (já instalado na Espanha e França), apesar da recepção do direito romano, a tradição inglesa resistiu aos três R e continuou sua influência no direito interno da Inglaterra.


Vivia-se uma transformação, a Inglaterra tinha saído de duas guerras, Guerra dos Cem Anos (1337-1453), a Guerra das Rosas (1455-1487), o fim da idade média, o fim de uma sociedade organizada segundo relações, o Rei era tido como superior a Igreja, fato que ia de encontro a Magna Carta. Iniciaram-se as grandes navegações, houve a descoberta do novo mundo, a exploração das riquezas naturais e a expansão do comércio.


O inglês estava adquirindo nova importância e novo sentido de independência, além de um espírito individualista, aventureiro, competitivo, fatos impossíveis de acontecerem na organização da sociedade na Idade Média.


Com a reforma protestante, pode-se interpretar a Bíblia, cada um podia ler e explicá-la a si próprio. Além das forças atuantes no sentido do absolutismo, os ingleses tiveram que resistir e criar outras forças no sentido de manter e desenvolver as garantias da liberdade individual.


Henrique VII, foi o primeiro Rei da Era Tudor, não foi um rei popular, utilizou ao máximo os impostos e apropriou-se das terras daqueles nobres falecidos durante a guerra das Rosas.


Henrique VIII, foi o segundo rei da dinastia Tudor, subiu ao trono em 1509. Henrique VIII teve grandes problemas com a Igreja Católica, ocasionados por sua vontade de casar-se mais de uma vez, como não lhe foi concedido seu pedido, Henrique VIII criou uma Igreja inglesa, onde despojou de todo seu poder e riqueza, o Papa respondeu a estes acontecimentos excomungando a Henrique VIII, o parlamento aprovou várias atas que selaram o rompimento com Roma. Em 1534, o Rei declarou no Ato de Supremacia que “o Rei é a única cabeça suprema na terra da Igreja da Inglaterra”.


Todos os reis da Era Tudors possuíam muita coragem, eram violentos e cruéis, infringiam os direitos individuais consagrados. De acordo com Roscoe Pound só havia um motivo para eles não avançaram na opressão do povo, era a ausência de um exército.


Apesar de toda a opressão o povo não deixava de se opor aos governantes, quando Henrique VIII tentou impor pesadas contribuições financeiras sem o consentimento do Parlamento encontrou oposição irresistível, argumentaram que o povo era livre e não escravo, os comissários do rei foram atacados, houve ameaças e insurreição armada, e os oficiais do reis não puderam levantar forças que dominassem.


Sob os governantes Tudors não havia conflitos dos tribunais como na Era Stuarts. A Rainha Isabel (Elisabeth), da era Stuart, escreveu aos juízes dizendo o que queria que eles fizessem, e como decidissem.


 Os Stuarts não tinham limites, opunham-se obstinadamente a qualquer restrição jurídica, provocaram a própria ruína e a instituição de garantias jurídicas de liberdade.


Começou a haver a remoção de vários juízes devido a decisões desfavoráveis à coroa, ou porque não concordavam em decidir conforme o rei desejava. Carlos I removeu 3 juízes, Carlos II, 10,  Janes II, 13, em apenas três anos de reinado.


Embora houvesse juízes fortes, o tribunal estava dominado pela política, sujeitava-se a fazer tudo que o governo ordenasse, neste período a história jurídica inglesa desceu a seu ponto mais baixo.


Nessa mesma época se destaca um grande jurista que vem ter destaque no restante do livro de Roscoe Pound, Sir Edward Coke, Cursou o Trinity College em Cambrige e fez estudos em Inner Temple, desempenhou vários cargos, entre eles o de advogado, solicitador-geral, promotor-geral sob Elisabeth, e presidente dos pleitos Comuns em Jaime I.


Edward Coke é a maior figura nas controvérsias entre a coroa e os tribunais. Para Coke, no tribunal qualquer aparência de subserviência para com a coroa desaparecia, ele submetia-se apenas a lei interna, afirmava a independência judicial e se opunha quando acontecia o contrario.


Escreveu quatro institutos, o Primeiro Instituto trazia comentários ao tratado sobre a posse de um juiz do reinado de Eduardo IV, o Segundo Instituto era um comentário sobre a Magna Carta e sobre os antigos estatutos de Eduardo I, o Terceiro Instituto tratando sobre pleitos da coroa (direito criminal), por fim o Quarto Instituto trata sobre a jurisdição dos tribunais.


Os relatórios de Coke sobre decisões dos tribunais possuíam autoridade nos tribunais, alguns juristas o consideram como o oráculo da lei comum, Pound acredita que ele é o “melhor campeão da liberdade assegurada pela lei”. (POUND, 1976, p.36)


O livro de Roscoe Pound trás inúmeros casos resolvidos por Coke mostra como ele influenciou outros juristas nas suas decisões. A obra dele que mais teve destaque foi o Segundo Instituto contendo os comentários a Magna Carta, ele foi publicado por ordem da Câmara dos Comuns, é tido como documento fundamental para a história da lei constitucional americana.


Em seu corpo ele possui preceitos como a impossibilidade de privar alguém da propriedade ou retirar-lhe o meio de subsistência, senão mediante processo legal, que para que alguém seja preso ele teve se submeter a julgamento por seus pares, através de um julgamento legítimo, entre outros.


Nota-se um avanço sem tamanho nos comentários de Coke, uma vez ele vivia em uma era de constantes e freqüentes abusos de podes.


Mais uma vez o autor dá um salto histórico para falar da Revolução de 1688 que antecedeu a Revolução Gloriosa (1695 a 1740). E Coke mais uma vez é citado pois suas ponderações acerca da organização política era a que a Revolução aceitava e a que se introduziu nas constituições.


Todavia o ponto mais alta da história das garantias constitucionais de liberdade na Inglaterra é a Declaração de Direitos (Bill of Rights).  A Declaração de direito determinou, entre outras coisas, a liberdade, a vida e a propriedade privada.


7 Nas Colônias da América


No tópico anterior iniciamos expondo a época vivenciada, falamos das grandes navegações, dos “descobrimentos”, então, enquanto havia controvérsias entre a coroa e os tribunais, iniciou-se a situação entre nas Colônias da América, no século XVIII.


Não se havia decidido ainda o direito da coroa nesse país, Pound afirma que


“A América, um país que se desenvolvia rapidamente, dispondo de comércio de expansão, grande riqueza natural, população pioneira aventureira, corpos legislativos e tribunais próprios, compunham-se politicamente de 13 províncias, separadamente sujeitas ao governo absoluto de Westminster.” (POUND, 1976, p.44)


As forças políticas não estavam bem definidos, nem havia tido ainda a necessidade de defini-las, todavia no século XVIII a colônia precisava de proteção e dinheiro. E buscaram suas fontes próprias de receita, sem autorização do Palarmento.


Do mesmo modo o rei (Era Stuart) procurava levantar dinheiro das colônias sem procurar por consentimento.


Pound vem tratar do papel do jurista colonial na solução dos conflitos de interesse entre os Stuarts e os colonos, os juristas encontraram suas armas nas doutrinas da Magna Carta e nos escritos de Coke. O resultado foi da oposição política foi: uma nação regida pela Lei (Inglaterra) e a constituição escrita como lei fundamental (Estados Unidos).


Durante muito tempo o “Novo Mundo” não houve necessidade de um conjunto de preceitos jurídicos tão adiantados e técnicos como o direito inglês do século XVII, a necessidade do direito e de juristas fez-se sentir com o desenvolvimento econômico das colônias e o surto de comércio, ao mesmo tempo surgiram juristas em número cada vez maior na colônia, que haviam estudado na escola de direito de Londres.


Começou a haver decisões que obedeciam aos preceitos estabelecidos por Coke, na Pensilvânia, na Virgínia, Massachusetts, Carolina do Sul. Os juristas americanos da época e os do século XIX adotavam várias idéias que faziam parte do direito e da maneira de governar, em contraste com a monarquia absoluta dos Stuarts, por exemplo: 1- a idéias de uma  lei fundamental a “lei da terra” (lei interna); 2- a idéia de direitos imemoriais dos ingleses; 3- a idéia de declarações autorizadas desses direitos em cartas e documentos; 4- a idéia de poder judiciário independente, conforme estabelecido na Declaração Inglesa de Direitos; 5- e a idéia de poderem os tribunais recusar aplicar leis em contravenção à lei fundamental.


Em 1687 publicou-se o primeiro livro das leis na Filadélfia, que trazia grande influencia do Segundo Instituto de Coke.


Desde o início estamos visualizando a conquista da liberdade e das garantias constitucionais ao longo da história inglesa e norte americana, e nesta época especificamente houve um grande desenvolvimento desta idéia de possuir uma constituição escrita que limitasse a ação dos governantes e garantisse a liberdade do povo.


 Com a centralização de poder em Westminster, os juristas começaram a queixar-se de algumas situações: lançamento de impostos sem consentimento do poder legislativo, a unificação de todos os poderes do governo na administração em Westminster, privação de julgamento por júri, realização de julgamento longe da vizinhança, o que causava despesas e incômodos, etc. A colônia reivindicava concessões morais apoiadas pela Lei da interna que os tribunais podiam aplicar, direitos que tinham sido sempre reivindicados desde a Magna Carta.


Os juristas norte-americanos traziam a herança dos institutos de Coke, foram criados na idéia que o tribunal deveria se recusar a aplicar as Leis que violassem a Lei interna. Eles acreditavam que existem direitos naturais válidos para todos os homens, em todos os tempos e lugares, que o Estado existe para assegurar (garantir) aos homens esses direitos, e o direito positivo, executado nos tribunais, é o modo pelo qual o Estado cumpre sua função.


Um exemplo que se destaca é o que aconteceu em 1765, o Ato do Selo, exigia-se que todos os papéis utilizados nos trabalhos dos tribunais fossem selados, entretanto tal papel não existia, era uma artimanha para fechar os tribunais. Então o Tribunal do Condado em Virgínia, era o tribunal superior competente para decidir sobre o caso em questão e pronunciou-se da seguinte maneira “o Ato do Selo não obrigava, afetava ou dizia respeito aos habitantes dessa colônia”.  Com isso nota-se a consciência dos juristas a respeito das suas liberdades e das garantias que a lei proporcionava na vida.


8 Da Revolução à Constituição


Neste capítulo Pound trás detalhes das constituições de cada Estado, garantias e direitos que lhes eram importantes, até a Declaração de Independência dos Estados Unidos.


Antes da declaração da independência o congresso Continental havia recomendado que as colônias formassem governos estaduais independentes. A Virgínia foi o primeiro a fazê-lo através de uma constituição escrita. Depois veio New Jersey, Pensilvânia, Delaware, Maryland e Carolina do Norte. Antes do fim da Guerra Revolucionária quase todos os estados já tinham constituição escrita menos New Hampshire, Rhode Island e Connecticut.


Existiam alguns direitos que estavam presentes em todas as constituições estaduais, por exemplo: ninguém pode ser processado duas vezes sob a mesma acusação e ninguém pode ser preso por crime infamante senão por denuncia ou acusação de grande júri, garantia de julgamento por júri, que o acusado seja informado da acusação e confrontado com testemunhas contra ele, garantiu-se o direito a advogado para todos os processos criminais, exigiam que o acusado tivesse testemunhas a seu favor, além de instituir a separação dos poderes, liberdade de imprensa e a segurança da vida, liberdade e propriedade.


Outros direitos estavam mais presentes nas declarações de alguns estados, como Massachusetts que proibia o Poder Legislativo de declarar alguém culpado de traição ou delito grave. New Hampshire e Pensilvania afirmou que não é possível tomar conta de propriedade particular para uso público sem a devida compensação  e garantia de emigrar para outro estado.


Um dos direitos mais interessantes e próprios dos Estados Unidos, é a garantia de trazer armas, ele decorre do princípio da revolução, eles afirmavam que o direito de revolução é natural, então não permitir a utilização de armas impediria a nação de rebelar-se.


Após a guerra de independência (1775–1783), foi promulgado a Constituição dos Estados Unidos (1787), garantindo o direito à independência e à livre escolha de cada povo e de cada pessoa (“o direito à vida, à liberdade e à procura da felicidade” é definido como inalienável e de origem divina), mas ainda construindo uma federação de estados dotados de uma grande autonomia e aprovando uma constituição política, onde se consignavam os direitos individuais dos cidadãos, se definiam os limites dos poderes dos diversos estados e do governo federal, e se estabelecia um sistema de equilíbrio entre os poderes legislativo, judiciário e executivo de modo a impedir a supremacia de qualquer deles, além de outras disposições inovadoras.


Pound afirma a constituição dos Estados Unidos é um documento histórico e jurídico, conservando a característica primária da constituição inglesa. E que essa declaração de direito é uma declaração de liberdades.


9 Considerações Finais


Ao longo de um estudo histórico, presente no livro Liberdade e Garantias Constitucionais, de Roscoe Pound, podemos notar a evolução dos direitos e das liberdades, vistas através de um autor pragmático, que acredita que a evolução dos direitos constitucionais proporcionaram uma conquista da liberdade.


Pound mostra que os juízes e suas decisões tiveram papel fundamental na conquista das liberdades, que a lei interna inglesa sobreviveu a ditadores, enquanto muitos países estavam vivendo em administrações absolutistas, os tribunais conseguiram, algumas vezes mais do que outras, controlar o poder dos seus governantes.


Os Estados Unidos, por ser colônia inglesa, receberam todos os avanços, e benefícios da luta pela liberdade que já tinham ocorrido na Inglaterra, a maioria dos primeiros juristas eram formados em Londres, sendo influenciados pelo Segundo Instituto, de Coke.


Entretanto precisaram que passar por suas próprias guerras e revoluções, para libertar-se do poder despótico dos reis da Inglaterra, que estavam utilizando a colônia como forma de adquirir dinheiro, sem o consentimento do Parlamento.


 Nota-se a absorção do direito inglês quando estuda-se as constituições estaduais, institutos de direito penal como ninguém pode ser processado duas vezes sob a mesma acusação, garantia de julgamento por júri, garantiu-se o direito a advogado para todos os processos criminais, entre outros. Além de resguardar os direitos de propriedades, já exigidos por Coke desde os comentários do Segundo Instituto.


O livro trás a história da construção da liberdade, desde uma época onde dificilmente os reis limitavam seu poder. Pound trás os juízes como grandes criadores de liberdades, como as pessoas capazes de limitar o poder do soberano. Acaba nos convencendo de que a lei é capaz de proporcionar uma liberdade, como Kant nos fala, como sendo a livre afirmação de si mesmo, limitada apenas pela liberdade de todos.


 


Referências bibliográficas:

BLOCH, Marc. SOCIEDADE FEUDAL . . Revisao de Edicoes 70, Lisboa.

BOBBIO, Noberto. Direito e Estado no Pensamento de Emanuel Kant. Trad. Alfredo Afait. Brasília: Universidade de Brasília, 1969.

CRIFO, Giuliano. Civis, La cittadinanza tra antico e moderno. Ed. Laterza. Itália 2005.

JAMES, William. O que significa pragmatismo. O Pragmatismo: um nome novo para algumas formas antigas de pensar. Trad. Fernando Silva Martinho. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1997.

JAMES, William. Concepção da verdade no Pragmatismo. Pragmatismo e outros ensaios. Trad. Jorge Caetano da Silva. Rio de Janeiro: Lidador, 1967.

MELO, Lorena Freitas de. Um Diálogo entre o Pragmatismo e Direito: Contribuições do Pragmatismo para Discussão da Ideologia na Magistratura. Disponível em: http://www.pucsp.br/pos/filosofia/Pragmatismo/cognitio_estudos/cog_estudos_v4n1/cog_est_v4n1_freitas_lorena_de_m.pdf

MIRANDA, Jorge. apud PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 8 ed., rev., ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007

POUND, Roscoe. Liberdade e Garantias Constitucionais. 2 ed. São Paulo: IBRASA, 1976.

WALL, Cornellis de. Sobre o Pragmatismo. Ed. Loyola.2007.3246661


Informações Sobre o Autor

Ana Rosa de Brito Medeiros

Bacharel em Direito – UEPB. Mestranda em Direito Econômico- UFPB.


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