Os riscos da medicina baseada em evidências

Resumo: O autor
conceitua medicina baseada em evidências e se reporta aos critérios e às razões
dos defensores desta estratégia. A intenção deste trabalho é mostrar que há
riscos na “sacralização” deste novo paradigma assistencial e pedagógico na sua
forma de alcançar a verdade absoluta, principalmente levando-se em conta
algumas dificuldades ainda existentes na aquisição de publicações de alto nível
e no fato de que a medicina clínica é uma arte e não uma ciência exata. Ainda
mais quando se tenta passar a idéia de que existe mais evidências do que a
medicina realmente tem, e quando se sabe que os quadros clínicos mais complexos
não dispõem de elementos para uma decisão mais convincente. Coloca em dúvida a
“absolutização” da idéia de um padrão em saúde baseado em evidências e o risco
decorrente de uma profusão alarmante de publicações que chegam anualmente a 30
mil sobre assuntos biomédicos e, em cada matéria específica, cerca de 300
artigos e 100 editoriais por mês, sendo que alguns se colocam  em franca oposição com os outros – o que, na
visão do articulista, complica  ainda
mais a situação do médico que está no final do sistema. Afirma que o ideal
seria buscar um equilíbrio entre as teorias fisiopatológicas consagradas, na
experiência pessoal e no resultado das investigações clínicas.

Unitermos: Ceticismo médico; Epidemiologia clínica;
Medicina de resultados.

1. Os fundamentos

A medicina
baseada em evidências,
segundo seus ardentes defensores, seria a utilização
racional e judiciosa da melhor evidência científica disponível para se tomar
decisões sobre cuidados aos pacientes. Ou, o processo de sempre descobrir,
avaliar e encontrar resultados de investigação com base às decisões clinicas[1].

Significaria,
assim, o emprego do que se depreende melhor nos resultados científicos
disponíveis procedentes da pesquisa e da investigação, e não do que possam
dispor as teorias fisiopatológicas e a autoridade ou a experiência individual.
Uma medicina baseada na análise estatística de efeitos. Em suma, uma medicina
de resultados.

Desta forma,
o conceito de medicina baseada em evidências condiciona-se ao fato de que as
decisões clínicas e os cuidados de saúde devam estar baseados nas evidências
atuais, que chegam da publicação científica especializada em estudos e
trabalhos, e que possam ser criticamente avaliados e recomendados. Ou seja, a
aplicação dos meios e métodos médicos deve se concentrar na informação obtida
na literatura “cientificamente válida e relevante”, com implicação direta para
a prática médica dos cuidados de saúde. Isto redunda necessariamente na busca
incessante da localização da “informação precisa”.

Da
avaliação solitária e subjetiva do clínico passa-se a aceitar apenas, como de
reconhecido valor científico, as informações oriundas da pesquisa de cientistas
de peso em estudos demorados e em expressivo número de pacientes observados em
serviços de excelência.

Segundo esta concepção de
medicina, se ela permanecer apenas na experiência individual, perder-se-iam os
avanços que a ciência nos oferece nos dias de hoje, os quais são capazes de
ampliar e melhorar a atenção nos cuidados da saúde dos indivíduos e das
comunidades. E mais: como tal metodologia é utilizada por múltiplos agentes de
saúde, os programas são avaliados na sua melhor forma de utilização, o que significa
integrar uma consagrada experiência científica a toda equipe, como a melhor
evidência disponível.

Algumas vezes até podemos ter
dúvidas sobre uma melhor proposta de atenção à saúde diante de certas
peculiaridades e contingências. Ou mesmo alguma dificuldade para saber se tanto
investimento é justo e imprescindível. Todavia, o que se deve ter em conta é a
convicta certeza de estarmos fazendo sempre aquilo que se nos apresenta como
melhor e mais adequado ao paciente e que ele esteja recebendo o que é mais
apropriado às suas necessidades e circunstâncias.

Mesmo que a saúde seja aceita e
consagrada como um bem social da maior relevância, e que a utilização racional
dos recursos que a ela se aplicam seja de imperiosa obrigação, não se pode
admitir que a política de assistência à saúde individual ou coletiva seja uma
prática voltada apenas para a contenção de gastos, ou, pior ainda, para o lucro
desmedido. Não se pode retirar do paciente a melhor assistência dentro do que é
disponível, justo e necessário.

No complexo exercício da arte
médica há três níveis de incertezas que não podem ser omitidos numa análise
como esta: A primeira seria relativa ao próprio paciente, quando se sabe que as
pessoas são tão diferentes em seus aspectos físicos e emocionais como desiguais
são os seus destinos; depois, as dúvidas que se originam no domínio de tantos
meios tecnológicos e condutas recomendadas, algumas vezes até em conflito entre
si, parecendo existir não apenas uma medicina, mas muitas; e, por fim, a
própria postura do médico baseada em suas convicções, experiências, cultura e
até mesmo nas suas habilidades pessoais[2].

Além disso, é evidente que uma boa
prática médica sempre será o resultado da experiência, da responsabilidade, da
competência e do respeito à dignidade do assistido. Ou seja, aquela na qual se
é capaz de tratar as pessoas com respeito, sentimento e eficiência.

Pelo visto, ao se defender a
liberdade e a experiência pessoal do médico não se está defendendo as práticas
não-convencionais, os procedimentos desnecessários, nem muito menos aceitando
todas as terapêuticas como efetivas e eficazes.

A facilidade de analisar e
utilizar a clinica priorizada em evidências não está ainda na disponibilidade e
no domínio de todos os que exercem a medicina. E estas publicações, com raras
exceções, são de utilidade discutível na prática clínica do dia-a-dia. Perde-se
muito tempo com consultas e o resultado, em nível de solução, é até certo ponto
desprezível.

Por sua vez, a barreira idiomática
no acesso à algumas informações é um fato incontestável, e as limitações de
meios e recursos em certas áreas fazem da medicina baseada em evidências uma
utopia. As experiências trocadas entre clínicos de mesma área de concentração e
que atuam numa mesma realidade têm se mostrado mais proveitosas.

O que se viu nestes últimos anos
foi uma verdadeira enxurrada de publicações médicas, algumas em notória
contradição, o que torna mais complicada ainda a decisão dos médicos –
principalmente dos que estão na ponta do sistema. Isto sem dúvida reflete de
forma negativa sobre as ações de saúde, não apenas pelos gastos desnecessários
e tempo perdido, mas também pelos prejuízos que podem trazer aos pacientes.
Publica-se, no mundo, uma média 30 mil revistas biomédicas por ano. Se alguém
quiser estar em dia com determinados temas mais específicos deverá ler cerca de
300 artigos e 100 editoriais por mês, nas revistas de maior destaque [3].

2. Os riscos

No instante em que a medicina
baseada em evidências tenta “clicherar” o atendimento baseado unicamente em
dados estatísticos, fugindo da avaliação da experiência pessoal e da capacidade
de conduta do médico diante de cada caso, ela desfaz o conceito de que “não
existem doenças e sim doentes”.

De onde provém o conhecimento
médico que se aplica diariamente na prática profissional? Será do que existe na
literatura mais sofisticada das revistas do mundo avançado? Certamente, não. É
da experiência pessoal do dia-a-dia, embora isto não queira dizer que sua
cultura também deixe de ser da experiência de tantos outros que publicam ou
divulgam seus conhecimentos.  É fato
inegável que o conhecimento está enraizado na experiência pessoal, de acordo
com o que se repete na prática diária do médico, sem que isto se constitua numa
propriedade intelectual ou que lhe dê sempre o selo da autoridade. E nem sempre
as decisões mais acertadas são as dos que possuem maior notoriedade.

O risco da “sacralização” deste
novo padrão assistencial e pedagógico de alcançar a verdade absoluta é o de que
o modelo de “paradigmas” estabelece que espécie de problemas será estudada, que
critérios devem ser usados para avaliar uma solução e que procedimentos
experimentais podem ser julgados aceitáveis[4].
Neste contexto, o que se verifica, na maioria das vezes, é a mudança de um
paradigma por outro sempre que haja dúvidas neste ou naquele conceito (crise).
Entre outros, pode se ter uma mudança desde que haja elevação de custos
assistenciais.

Sabe-se que muitas das práticas
terapêuticas não-avaliadas ou não- recomendadas pela investigação científica de
alta evidência têm, em certos casos, um efeito positivo, e o paciente as
solicita. É ético recusar uma prática terapêutica pelo fato de não estar
baseada numa evidência científica, como no caso das opções da chamada medicina
alternativa
? E o que fazer nestes casos?

A prática médica sempre será
baseada num projeto que alie a arte clínica e o cálculo das probabilidades. Por
isso já se disse que a medicina clínica, por mais avançada que venha a ser,
será sempre a ciência das probabilidades e a arte das incertezas. Mesmo que uma
ou outra evidência seja expressivamente denunciadora, por mais aparente que
seja, não deve ser concluída como “fato”. No entanto, até podemos concordar com
as evidências se estas forem dirigidas no sentido de balizar determinadas
condutas nos seus aspectos éticos ou deontológicos caracterizadas pela má
prática. 

É necessário que se entenda que,
pelo fato de determinado procedimento ser tecnicamente correto, seja ele de
forma absoluta eticamente certo. Assim, o ato médico criterioso pode ser visto
por dois aspectos: o do procedimento correto e o da retidão moral[5].
Exige-se, portanto, uma análise criteriosa de cada caso, para que as coisas
fiquem no seu devido lugar: no expresso cumprimento da lex artis
e no respeito à dignidade de cada pessoa.

Por outro
lado, se fizermos uma leitura mais atenta no que se vem publicando em revistas
de alto nível e de grande circulação, como New
England Journal of Medicine, JAMA
e British Medical Journal, entre outras, vamos observar que nos trabalhos ali publicados não existe nenhum
critério para fundamentar “evidência”. 
É também necessário ter tempo para pesquisar na Internet e dispor
de um acervo regular de revistas especializadas, além do domínio de idiomas
estrangeiros. Esta é uma tarefa difícil e trabalhosa.

A medicina
não tem os rigores da exatidão matemática, nem se propõe a oferecer propostas
exatas e uniformes. É ela a mais circunstancial das ciências, e o ato médico o
mais condicional dos atos humanos. Por isso, o conhecimento médico nunca pode
ser certo, mas apenas provável. Em medicina – principalmente na clínica, porque
é meramente arte -, o provável nunca é uma abstração, mas aquilo que está entre
o possível e o real. Esta é a chamada “probabilidade objetiva”. A arte clínica
é muito mais uma ordem do pensar do que do ser. Isto não faz o ato médico
baseado na intenção menos importante do que aquele outro baseado na evidência.

Toda ciência experimental é um saber
dedutivo e não indutivo. Tem uma dedução empírica, nunca é completa e suas
conclusões são sempre prováveis. O princípio aristotélico de que as verdades
científicas são sempre certas e verdadeiras tende a modificar quando o assunto
em discussão é uma ciência indutiva e experimental.

A verdade
é que mesmo existindo duas opiniões opostas (eqüiprobabilismo),
defendidas por pessoas prudentes e qualificadas, pode qualquer uma delas pode
ser adotada e ser igualmente aceita como certa. Ou, ainda, existir uma opinião
defendida por apenas um autor competente e experimentado, e esta conduta ser
seguida prudentemente (laxismo)[6].
Todavia, na lógica da “medicina de resultados”, evidências incompletas e
conflitantes, além de aumentarem a incerteza, podem criar mais dúvidas ainda.
Na urgência e na emergência isto se verifica com mais razão e com resultados
mais graves.

Um dos
óbices à incorporação da medicina baseada em evidências é a falta de condições
de acesso às publicações tidas de qualidade e conceitos garantidos, que se
multiplicam no mundo inteiro, e de análise crítica dos artigos e matérias de
periódicos, quando o profissional não estaria em condições de elaborar suas
próprias conclusões. Ao lado disto, uma galopante e progressiva enxurrada de
publicações de qualidade duvidosa, verdadeiro entulho científico, em que se
impõem critérios em conceitos e condutas de importância relativa[7].

Junte-se a isto a resistência à
mudança de hábitos pelo médico quando está seguro do que faz, ainda mais quando
vem obtendo resultados tidos como satisfatórios. Não é o mesmo que se mostrar
obstinado a novos meios e condutas que possam reduzir os maus resultados e os
gastos desnecessários.

O risco desta nova ordem é fazer
acreditar existirem mais evidências do que a medicina realmente possa ter e
apresentar. E mais: pode até em determinadas situações retardar o avanço da
medicina e promover uma falsa opção aos mais jovens. Estas foram as conclusões
de um dos mais importantes criadores deste novo movimento denominado medicina
baseada em resultados quando, entre outros, anunciou de público “nunca mais
escrever ou atuar em qualquer coisa relacionada à prática clínica baseada em
evidências”[8].

Outro risco é do de certos
conceitos estarem transformando a medicina numa “sacola de truques”[9].
Ou o de profissionais jovens aceitarem alguma idéia nova não com a convicção do
seu valor científico, mas tão-só pela publicação estar em língua estranha ou
ser originária de centros tidos como avançados. Ou que se venha desdenhar da
relação médico-paciente como um ato romântico que não cabe mais neste programa
de exatidão metodológica[10].

Nenhum “expert” pode presumir-se
de autoridade incapaz de erro, mesmo não-intencional, porque não existe verdade
soberana. Por isto é sempre aconselhável não se procurar certeza absoluta
quando tudo isso se mostra impossível diante de decisões instáveis, pois os caminhos
da medicina clínica são contingentes e falíveis, e não há na sua prática
“verdades derradeiras”. O conhecimento científico está sempre em franca
evolução.

Sempre que possível, deve-se
avaliar uma proposição com base nos fatos e na lógica que a sustentam, e não
nas qualidades pessoais ou no status dos seus defensores[11].
Os métodos científicos não são muito diferentes das coisas racionais do
dia-a-dia. O que a ciência faz a mais é utilizar-se de testes e controlar
estatísticas, insistindo na repetição ordenada de experiências. Isto, no
entanto, não é o mesmo que dizer que a ciência é menos valiosa que a observação
dos fatos cotidianos. Mas, no fundo, ela só serve para explicar a coerência das
nossas experiências.

Mesmo os defensores mais
exaltados desta nova ideologia médica não escondem algumas desvantagens deste
método: consome muito tempo em pesquisa; constitui um trabalho intelectual
complexo; não consegue melhorar diretamente a qualidade dos estudos; é
praticamente imprevisível fazer uma revisão sistemática sozinho; faltam
subsídios disponíveis para resolver a maioria das questões clínicas; existem
estudos não-consensuais, estudos quase sempre projetados num contexto diferente
onde se encontra o paciente-questão; há poucos relatos na literatura médica sobre
determinados males.

Em algumas oportunidades o que se
verifica mesmo é uma política de compensação, que em outra coisa não se firma
senão na redução de gastos com hotelaria, com a diminuição do tempo de
internamento, com a restrição de solicitação de exames subsidiários e com o
indisfarçável aviltamento dos salários profissionais. Tudo isto ditado por um
sistema empresarial que promove a colonização médica.

É bom
lembrar que algumas objeções feitas à chamada medicina baseada em evidências
não significam intolerância às inovações advindas da tecnologia moderna, nem
muito menos ao que se incorpora de meios e recursos em benefício dos pacientes.

A própria
expressão “evidência”, tal qual vem sendo colocada aqui, já se mostra
inconsistente, pois se diz que algo é evidente quando prescinde de prova ou
quando dispensa uma justificação. Evidente é o que se mostra notório. A
evidência é inimiga da prova. Ela é a consagração da verdade. Assim, o
importante é saber o que se pode considerar como “evidência” e quem a determina
como “fato concreto”.

Por outro
lado, dizer que evidência em medicina são “dados e informações que comprovam
achados e suportam opiniões”, não oferece a segurança que se espera. Como
qualificar uma medicina que se diz evidente, racional e científica quando ela
depende tão-só de percentuais levantados em dados estatísticos? E o que fazer,
por exemplo, quando se sabe que há tópicos da medicina prática para os quais
não se conta com nenhuma evidência convincente?

Até
podemos entender que muitas das decisões tomadas em epidemiologia clássica
sejam baseadas em dados estatísticos, na tentativa de se criarem novas
“evidências” para a prática das ações em medicina preventiva. Mas daí dizer que
tal lógica deve conduzir e definir as questões de natureza clínica parece um
exagero. Primeiro, a clínica trata das conseqüências e a epidemiologia das
causas; depois, na clínica o centro do interesse está no prognóstico através da
prevenção secundária e terciária e, na epidemiologia, nos fatores de risco na
prevenção primária; e, por fim, a clínica baseia-se num raciocínio dedutivo (da
doença para o caso concreto) e a epidemiologia num raciocínio indutivo (dos
casos para a doença).

Cada vez que cresce a intervenção
tecnológica com seus meios invasivos, mais surgem os resultados atípicos e
indesejáveis, como a relação custo-beneficio, cujos limites tornam-se cada vez
mais discutíveis. O perigo é de se criar uma medicina influenciada pela
globalização e pelos interesses de mercado, e que não faz outra coisa senão afastar-se
progressivamente da ética.  Ou uma
medicina prisioneira das empresas de saúde. A importância da industria
farmacêutica na edição das revistas e na promoção dos eventos médicos já é um
fato irrefutável.

Há, no âmbito das fontes das
evidências, muitos interesses financeiros e profissionais em conflito entre os
que detêm o poder de informação, em que não falta o patrocínio das empresas
fabricantes de remédios e de equipamentos médicos.

A obsessão pela quantificação
despreza as habilidades pessoais e pode transformar os dados objetivos da
anamnese e do exame semiológico em dados contaminados por valores estatísticos.
Todo conhecimento quantificado é ideológico e não científico[12].

O
risco das ideologias  no  campo 
da  saúde  está 
no  seu  caráter  reacionário  e centralizador por não  admitir o pensar ou  o agir individual. Sua inclinação é pelas
idéias abstratas.  E o mais desanimador
em medicina baseada em evidências é que quanto mais complexo é o quadro
clínico, menos evidências científicas ela dispõe para uma convincente tomada de
decisão.

Outro
risco é a tendência de as conclusões das revisões continuadas serem mantidas
pela aceitação de trabalhos que só se reportam aos resultados que se ajustam às
esperadas e não àqueles que revelam conseqüências  adversas ou que não se enquadram numa determinada linha de
critérios estabelecida na seleção dos artigos de revisão, deixando-os de fora
por razões nem sempre justificadas[13].

3.
As conclusões

Diante
do exposto, fica bem evidente que ninguém de bom senso poderia voltar-se
contra, ou pelo menos ficar indiferente, a todo este acervo cultural e a toda
contribuição tecnológica que vem inserindo-se às ciências médicas nestes
últimos tempos. Tampouco o que tudo isto pode resultar de contribuição na luta
cada vez mais eficaz contra as doenças e em favor dos melhores níveis de vida e
de saúde da população.

Todavia,
não se pode admitir serenamente que a medicina abra mão da intuição, das
teorias fisiopatológicas consagradas e da experiência clínica pessoal, pois não
existe nenhuma análise metodológica, nem nenhuma prova científica aprimorada
que não tenha como partida a vivência e a observação individual na prática
profissional. Ainda mais: a medicina baseada em evidências não é uma receita
pronta e acabada na orientação de todos os procedimentos médicos. E quando
diante da multifária condição humana permanecem tantas incertezas em derredor
dos processos clínicos[14].

O
ideal será sempre a associação da investigação clínica científica, do ensino
médico continuado, das teorias fisiopatológicas consagradas e da contribuição
de cada experiência pessoal.  Também a
análise e a aplicação racional da informação científica, aliadas à experiência
clínica de cuidar de pacientes, seja o indivíduo ou o coletivo, dentro das
concepções humanísticas que sempre nortearam esta profissão e a colocaram num
lugar de destaque.

Notas:

[1] Rosenberg, WMC – Evidence
based medicine: An approach to clinical problem solving
, 1995,
310:1122-1126.

[2] Dantas, F – Normatizando
e normalizando práticas não-convencionais: Ética e pesquisa num contexto de
incerteza
, Méd on line, vol. 2, nº 5, ano II, jan/mar, 1999.

[3] Silva, JJS – Medicina basada en evidencia:
Um desafio permanente
, Revista Hospital Clinico Universidad de Chile, 1999,
2:142-144.

[4] Kuhn, T – A estrutura das revoluções científicas,
3ª edição, São Paulo: Editora Perspectiva, 1995.

[5]
Gracia, D – Medicina Basada em Evidencias,
Bioética, 2000; 8: 74-84.

[6] Gracia, D, id, ibidem.

[7] Stross, JH e
Harlan WR – The dissemination of new medical information, JAMA, 241:2622-4,
1979.

[8] Sackett, DL – The
sins of expertness and a proposal for redemption
, BMJ, 2000,               320:1283.

[9] Bauman, Z – Modernidade e ambivalência, Rio de
Janeiro: Jorge Zahaar, 1995.

[10] Duclos, J – Medicina basada em evidencias: Uma
estratégia que acerca ou aleja de la medicina interna?,
Revista Chile,
1999, 127:1398-1402.

[11]Sokal A e Bricmont, J – Imposturas intelectuais
–  O abuso da ciência pelos filósofos
pós-modernos
, Rio de Janeiro: Record, 1999, pág. 207.

[12] Barata, RB – Epidemiologia clínica: Uma ideologia
médica
?, Cadernos de Saúde Pública,          1996, 12:555-560.

[13] Lamperts, A – Methodological
studies of systematic review: is there         Publication
Bias?,
Arch Intern Med 1997; 157:357.

[14] Castiel, LD e
Póvoa, EC – Dr. Sackett & “Mr.
Sackteer” …
Encanto e desencanto no reino da expertise na medicina
baseada em evidência
s, Cad. Saúde
Pública, Rio de Janeiro, 17 (1):205-214. jan.-fev-, 2001.


Informações Sobre o Autor

Genival Veloso de Franca

Professor Convidado dos Cursos de Graduação e Pós-graduação do Instituto de Medicina Legal de Coimbra (Portugal).
Membro Titular da Academia Internacional de Medicina Legal e Medicina Social.
Trabalho publicado em SAÚDE, ÉTICA & JUSTIÇA, 1 (2):17-28, 1998.


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