No início da discussão da Pec, que prorroga a CPMF até o final do ano de 2011, o governo, com sua costumeira arrogância, vinha batendo pé firme na sua aprovação sem alterar uma vírgula sequer. Não demonstrou menor disposição de negociar a prorrogação deste tributo que a sociedade inteira quer ver na lata do lixo, e com toda razão.
Não faz o menor sentido o titular de dinheiro depositado no banco ter que sofrer um confisco parcial, quando o retira para satisfazer suas necessidades diárias. A CPMF é um tributo que beira às raias da loucura. É irracional e oportunista. É próprio de governo eficiente na arrecadação, porém, absolutamente incompetente na aplicação dos recursos arrecadados.
Estudos de economistas da Fiesp, realizados com base na proposta orçamentária da União para o ano de 2008, e com base nas arrecadações feitas nos exercícios anteriores, projetam, com segurança, um superávit da ordem de 53 bilhões, portanto, muito mais do que os 38 bilhões que o governo pretende arrecadar com a prorrogação da CPMF.
Agora, o governo, acuado pela decisão da Corte Suprema em torno da fidelidade partidária, que impede o parlamentar de mudar de partidos ao sabor dos interesses do momento, tenta sua última cartada, porém, de forma extremamente demagógica.
Acena com a isenção dos que ganham até 1.700 reais e com a redução gradual de 0,02% até o final de 2011.
É impossível não ter passado pela cabeça do proponente de tal medida, a sua inexequibilidade. Como os bancos irão identificar, em relação a cada cheque apresentado, o valor do rendimento mensal do respectivo correntista? Seria o caso de colocar, aleatoriamente, na ficha cadastral do correntista, o valor do rendimento mensal? O que é fácil em relação ao imposto de renda, que é pago mediante declaração de cada contribuinte, não é viável em relação à CPMF.
Quanto à redução gradual, além de ridículo o percentual proposto, ela tem o sentido de empurrar o “abacaxi” para frente. Prorrogada a CPMF, ninguém garante que o governo venha implementar efetivamente a redução; e caso a implemente, não há garantia de que não haverá retorno à alíquota original, como, aliás, já aconteceu no passado. Hoje, aprovar uma Pec é mais fácil do que aprovar uma lei ordinária.
Por tudo isso, essa proposta demagógica do governo parece que tem um outro sentido: o de encontrar uma saída honrosa para alguns dos Senadores que, por razões pessoais, querem recuar de suas posições iniciais. Tanto é assim que um deles já acenou com o aumento da faixa de isenção.
O que se tem que considerar, independentemente da alíquota ou da faixa de isenção, é que a CPMF é um tributo amoral, que não deve contar com a concordância do Senado Federal, última instância da defesa da sociedade, já que na outra Casa tudo se tolera.
SP, 18-110-07
Informações Sobre o Autor
Kiyoshi Harada
Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro em várias instituições de ensino superior. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.