Resumo: Estado da arte do multiculturalismo e Direitos humanos na ordem contemporânea internacional, perpassando a declaração de 1948, a conferência de Viena de 1993, a Conferência do Cairo, os sistemas de proteção regional de Direitos Humanos; para tanto, aborda dois casos práticos – o caso da secessão do Quebec, e o caso das mutilações genitais femininas; além de três propostas de diálogo intercultural.
Palavras-chave: Direitos Humanos, Multiculturalismo, Quebec, circuncisão, mutilação.
Abstract: State of art of multiculturalism and Human Rights in the international contemporary order, perpassing the declaration of 1948, the Vienna’s conference of 1993, the Cairo’s Conference, the systems of regional protection of Human Rights; for in such a way, it approaches two practical cases – the case of the secession of Quebec, and the case of feminine genital mutilations; beyond three proposals of intercultural dialogue.
KeyWord: Human rights, Multiculturalism, Quebec, circuncition, mutilation.
Sumário: Multiculturalismo e Direito Internacional. Declaração de Direitos Humanos de 1948. Os debates após a II Conferência Mundial de Direitos Humanos de 1993. Conferência do Cairo. Sistema regional africano de proteção aos direitos humanos. Sistema regional europeu de proteção dos direitos humanos. Sistema regional interamericano de proteção aos direitos humanos. O caso da secessão de Quebec. O caso das mutilações sexuais. Três propostas de diálogo intercultural. Abdullahi Ahmed An-Na’im . Boaventura de Sousa Santos. Hermenêutica diatópica. will Kymlicka. Conclusão. Bibliografia
Multiculturalismo e Direito Internacional.
O objetivo deste artigo é traçar um estado da arte dos Direitos Humanos e multiculturalismo na ordem contemporânea. Para elaborar o direito à identidade cultural, é necessário fixar as definições dadas a “cultura”, “cultura tradicional” e “cultura popular” que serão usadas no texto.
Nesta linha, a UNESCO (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura) no preâmbulo da Declaração Universal da UNESCO sobre Identidade Cultural de 2001, definiu “cultura” como “o conjunto de traços espirituais e materiais, intelectuais e afetivos que definem e caracterizam uma sociedade ou um grupo social e que abrange, além das artes e as letras, os modos de vida, as formas de viver em comunidade, os valores, as tradições e as crenças”.
Já na recomendação sobre a salvaguarda da cultura tradicional e popular de 1989, está previsto que a cultura tradicional ou popular faz parte do patrimônio universal da humanidade e que é um poderoso meio de aproximação entre os povos e grupos sociais existentes e de afirmação de sua identidade cultural.
Além disso, prevê em seu artigo 1º que a diversidade cultural é tão importante para o ser humano quanto a diversidade biológica para os organismos vivos e constitui patrimônio da humanidade que deve ser reconhecido e consolidado em benefício das gerações futuras. No artigo 2º frisa que o pluralismo cultural constitui a resposta política para o fato diversidade cultural.
O Direito à Identidade Cultural, por sua vez, consiste no direito de todo grupo étnico-cultural e seus membros, pertencer a uma determinada cultura e ser reconhecido como diferente, conservar sua própria cultura e patrimônio cultural tangível ou intangível e a não ser forçado a pertencer a uma cultura diferente ou ser assimilado involuntariamente por ela. Conforme Will Kymlicka (ALVES, 2005:101) “desde o final da guerra fria os conflitos étno-culturais tornaram-se a fonte mais comum de violência política no mundo…”
Ressalta-se que a identidade cultural é fluida, tem um processo de reconstrução e revalorização dinâmico, resultado de contínuas discussões internas ou de contatos e influência de outras culturas (mas isto deve ocorrer de maneira voluntária, livre e deliberada). Em cada grupo étnico-cultural há subgrupos que a todo tempo retomam, readaptam ou rejeitam certos traços tradicionais culturais de seu grupo.
O principal garantidor do Direito à Identidade Cultural é o Estado do qual a minoria faz parte, contudo, a Comunidade internacional também se responsabiliza por sua proteção. Em função disto, cabe tratar da relação entre multiculturalismo e Direitos Humanos no âmbito internacional.
Declaração de Direitos Humanos de 1948.
Após a Segunda Guerra Mundial, cenário em que foi construída a Declaração de Direitos Humanos, representantes das mais diversas culturas passaram a discutir o conteúdo desta declaração. Assim, era necessário que se chegasse a um bom termo, a uma declaração que fosse aceitável a diversas religiões, ideologias, culturas.
Conforme nos afirma Laura Nader (1999:63) “mesmo com todos os seus esforços, houve enormes desacordos e vazios. Não havia representantes das populações indígenas do mundo, dos povos islâmicos do chamado ‘Terceiro Mundo’, e a representação das mulheres era pouco expressiva.”
Apesar disto, não foram sacrificados princípios básicos em prol da unanimidade, e chegou-se a um consenso, mesmo que ainda hoje hajam questões mal resolvidas, como a que diz respeito ao que se sobrepõe, se Direitos Individuais ou Coletivos, ou ainda, a questão do equilíbrio entre soberania nacional e os Direitos Humanos internacionais, ou ainda a questão dos Direitos Humanos como parte de um movimento hegemônico ocidental e predominantemente americano.
A primeira questão, sobre os Direitos Indivíduais e Coletivos foi crucial para as populações indígenas e outros grupos minoritários. Richard Falk (NADER 1999:63) trata esta questão como “cegueira normativa”, que acompanha uma visão que vê culturas pré-modernas como uma forma de atraso a ser superado. Em nome do desenvolvimento, populações indígenas foram e ainda estão sendo destruídas e deslocadas em várias partes do mundo, como é o caso dos U’wa ( SANTOS 2003:160).
Similarmente, a preocupação com o Estado em questões que deveriam ser de foro íntimo, como os Direitos Sexuais e Reprodutivos, excluiu muitos dos Direitos Humanos especificamente ligados à mulher.
Os debates após a II Conferência Mundial de Direitos Humanos de 1993.
A Conferência de Viena de 1993 pode ser vista como o marco da tensão universalismo-relativismo. Desde então, elevou-se sensivelmente a preocupação com a questão da diversidade cultural. De lá para cá, em diversas oportunidades, foi retomado o debate acerca dos desafios à universalidade dos direitos humanos.
Logo em seguida, no ano de 1995, a IV Conferência Mundial sobre a Mulher (Beijing, 1995), abordou a questão da validade das práticas culturais baseadas na inferioridade do sexo feminino.
Nos trabalhos preparatórios da Convenção sobre os Direitos das Crianças de 1989, houve divergência entre os países participantes com relação aos problemas atinentes à liberdade de religião e à adoção de menores. Contudo, o documento que foi adotado demonstrou que foi possível, através do diálogo intercultural travado, dar voz às propostas dos países islâmicos presentes.
Conferência do Cairo.
A Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, celebrada no Cairo em 1994, refletiu provavelmente as mais discutidas tendências das relações internacionais da época contemporânea. Também nesta conferência o diálogo intercultural foi necessário para se atingir harmonia.
O crescimento generalizado do fundamentalismo religioso, sobretudo o islâmico, ocasionou o debate no âmbito da Conferência. Possivelmente influenciados pelas objeções do Vaticano a passagens específicas do projeto do Programa de Ação, hierarcas de todos os credos, sobretudo muçulmanos, passaram a encarar a Conferência como um documento amoral e ateu, o que gerou uma aliança estratégica entre o dogmatismo cristão e as tradições do corão.
Essa aliança foi de suma importância para as deliberações no Cairo. A partir daí o panorama das discussões dividiu-se em blocos. De um lado a Santa Sé e o Irã, a Argentina e a Líbia, Malta e Iêmen, Honduras e Kuwait se posicionaram. No outro extremo a União Européia e os Estados Unidos, com alguns apoios afro-asiáticos. A mediação foi feita por países de culturas e civilizações variadas, como o Brasil, o Paquistão, o México e a Namíbia.
O tema “aborto” era objeto de dissenso No início dos trabalhos almejava-se reconhecer sua ampla ocorrência como uma questão de saúde pública.
Quanto à obrigatoriedade da Convenção, outro tema objeto de disputas, assentou-se da seguinte forma: “A implementação das recomendações contidas no Programa de Ação é direito soberano de cada país, consistente com as leis e prioridades de desenvolvimento nacionais, com pleno respeito para com os diversos valores religiosos e éticos e contextos culturais de seu povo, e em conformidade com os direitos humanos internacionalmente reconhecidos.”(Nações Unidas, 1994:12)
No Brasil, um Comitê Nacional dedicou-se a definir as posições a serem defendidas pelo país no Cairo através do uso das opiniões brasileiras predominantes sobre os subtemas da Conferência. Porque essas posições não conflitavam com as propostas contidas no projeto, nem ofendiam qualquer cultura, os delegados brasileiros no Cairo mediaram a discussão em prol do consenso.
A superação das principais divergências foi um exercício de tolerância recíproca, na procura de um mínimo denominador comum à humanidade como um todo. Tanto nas ações coletivas, como nas ações nacionais e decisões individuais influirão, além dos diferenciais de poder, as especificidades das culturas e tradições.
Sistema regional africano de proteção aos direitos humanos.
A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos somente foi adotada em 1981, passando a vigorar em 1986. A recente história do sistema regional africano reflete a singularidade e a complexidade deste continente, a luta pelo processo de descolonização, pelo direito de autodeterminação dos povos e pelo respeito às diversidades culturais.
Embora os Estados africanos tenham ratificado os principais tratados de direitos humanos do sistema global, que se somam à Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e ao Direito interno dos países membros, violações aos Direitos Humanos tem sido a realidade da África. Exemplo desta violação são as mutilações genitais praticadas neste continente que será abordada brevemente em seguida.
Em 1981, os chefes africanos adotaram a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e estabeleceram uma Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, para promover, proteger e interpretar as previsões de Direitos Humanos constantes dela.
Desde seu preâmbulo, a Carta mostra sua feição única, que a diferencia dos demais instrumentos internacionais e regionais de proteção dos Direitos Humanos. Nesse sentido, merecem destaque:
1. A atenção conferida às tradições históricas e aos valores da civilização africana. A eles se conjuga o processo de libertação da África, a luta por independência e dignidade dos povos africanos, o combate ao colonialismo e ao neocolonialismo, a erradicação do apartheid, do sionismo e de todas as formas de discriminação.
2. O “direitos dos povos”, que, para a carta africana, devem necessariamente garantir os Direitos Humanos. Diferentemente dos demais instrumentos de proteção, em especial a Convenção Européia e a Convenção Americana, a Carta Africana adota uma perspectiva coletivista, e a partir dela se chega ao indivíduo.
3. Existe na Carta Africana a previsão expressa de proteção aos direitos econômicos, sociais e culturais.
4. A Carta opõe deveres correlatos ao gozo dos direitos e liberdades.
Segundo nos diz Flávia Piovesan( 2006:123/124) “a respeito, merece destaque decisão da Comissão Africana no caso Social and Economic Rights Action Centre/Centre for Economic and Social Rights vs. Nigéria, quando acentua que: ‘O Direito Internacional e os direitos Humanos devem responder às circunstâncias africanas. A África construirá o seu próprio Direito quando necessário. Não resta dúvida de que direitos coletivos, direito ao meio ambiente e direitos econômicos e sociais são dimensões essenciais dos Direitos Humanos na África.’”
O catálogo de direitos da Convenção Européia compreende essencialmente direitos civis e políticos, a proclamar os valores dominantes da Europa ocidental. Os direitos sociais, econômicos e culturais foram previstos com a adoção da Carta Social Européia, que estabelece a implementação progressiva desses direitos, bem como uma sistemática de supervisão por relatórios periódicos dos Estados-partes, submetidos à apreciação de um Comitê de especialistas, a respeito dos avanços alcançados.
Há hoje diversos instrumentos internacionais adotados pelo Conselho da Europa, entre eles a Minoritárias, de 1992, em cujo preâmbulo se lê “considerando que a proteção das línguas regionais ou minoritárias históricas da Europa, algumas das quais correm o risco, ao longo do tempo, de desaparecer, contribui para manter e desenvolver as tradições e a riqueza culturais da Europa…” e a Convenção para a Proteção de Minorias Nacionais, de 1995 que prevê, também em seu preâmbulo, que considerando que uma sociedade pluralista e genuinamente democrática deve não somente respeitar a identidade étnica, cultural, lingüística e religiosa das pessoas que pertençam a uma minoria nacional, mas também criar condições apropriadas que os possibilite expressar, preservar e desenvolver esta identidade… [1] (tradução livre da autora)
Sistema regional interamericano de proteção aos direitos humanos.
O instrumento de maior importância no sistema interamericano é a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica). Esta Convenção assegura um rol de Direitos Civis e Políticos semelhante ao existente no Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos.
A Convenção Americana não assegura de forma explícita nenhum Direito Cultural, limita-se a prever no artigo 26 que os Estados devem progressivamente alcançar a plena realização esses Direitos. Mais Tarde, em 1988, foi editado um protocolo adicional ao pacto, concernente aos direitos sociais, econômicos e culturais, em vigor desde novembro de 1999.
Cabe ressaltar que a Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Mayagna Awas Tingni contra a Nicarágua, em 2001, reconheceu o Direito dos povos Indígenas à propriedade Coletiva da terra, como uma tradição comunitária, e como um direito fundamental e básico à sua cultura, à sua vida espiritual, à sua integridade, à sua sobrevivência econômica. Acrescentou que as comunidades indígenas têm direito à terra para preservar seu legado cultural e transmiti-lo a gerações futuras.
Em outro caso (Yakye Axa contra o Paraguai, em 2005) a corte decidiu que os povos indígenas têm direito a medidas específicas que garantam acesso aos serviços médicos de saúde, que devem ser apropriados sob a perspectiva cultural, incluindo cuidados preventivos, práticas curativas e medicinas tradicionais. Adicionou que para os índios, saúde tem uma dimensão coletiva, e que a ruptura de sua relação coma terra traria danos à sua saúde.
Segundo Valdez (2004:93/135) Sobre a base da disposição encontrada no artigo 27[2] do Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos, foram estabelecidos um grande número de documentos jurídicos internacionais e nacionais, que apontam para o estabelecimento do “pluralismo jurídico”, ou seja, a coexistência de mais de um sistema jurídico válido num mesmo território, dentre os quais podemos citar:
1. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em seu informe anual 1984/85, no tópico “Resoluções Relativas a Casos Individuais”, ao tratar do caso número 7615 do Brasil, reconheceu que:
“el Derecho Internacional, en su estado actual y tal como se encuentra cristalizado en el artículo 27 del Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos, reconoce a los grupos étnicos el derecho a una protección especial para el uso de su idioma, el ejercicio de su religión y, en general, de todas aquellas características necesarias para la preservación de su identidad cultural”.
2. A Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas aprovada em 13 de setembro de 2007 contém, entre outras, as seguintes disposições:
Art. 3 “Los pueblos indígenas tienen el derecho a la libre determinación. En virtud de ese derecho, determinan libremente su condición política y persiguen libremente su desarrollo económico, social y cultural.”
É de se observar que, não ratificaram a Declaração quatro países, a Austrália, o Canadá, os Estados Unidos e a Nova Zelândia
Já existia oposição por parte de alguns Estados quanto ao reconhecimento do direito de livre determinação dos povos indígenas, conforme previsto no artigo 3 da Declaração, desde as discussões do projeto. Quanto a este tema, nas Considerações feitas nas sessões de 8 a 12 de novembro de 1999, na reunião do Grupo de Trabalho da CDH, o Brasil fez a seguinte ressalva: “Por ‘livre determinação’, entende-se a capacidade dos [povos/populações] indígenas de desenvolver e exercer livremente suas formas de organização política, econômica, social e cultural, no contexto de autonomia ou de auto-governo compatível com a estrutura organizativa de cada Estado”.
Outra grande preocupação de alguns Estados refere-se à definição de “povos indígenas”. Não há definição no Projeto. Neste sentido, o Canadá, na mesma reunião, afirmou que reconhece que o direito de autodeterminação se aplica a todos os povos, incluindo os povos indígenas, mas, ao afirmar seu reconhecimento, o Canadá oferece uma interpretação que pode conotar que os direitos dos povos indígenas são sujeitos a algumas limitações. Para o Canadá o direito de autodeterminação de povos indígenas, devem ser exercidos de maneira a respeitar a integridade política, constitucional e territorial dos Estados democráticos.
“Art. 4
Los pueblos indígenas, en ejercicio de su derecho de libre determinación, tienen derecho a la autonomía o el autogobierno en las cuestiones relacionadas con sus asuntos internos y locales, así como a disponer de los medios para financiar sus funciones autónomas.”
Para Valdéz(2004:120) ao analisar com mais atenção os documentos e posições teóricas a favor dos Direitos Culturais e de sua institucionalização, percebem-se alguns problemas de não fácil solução.
Neste sentido, Valdéz toma como exemplo, mais uma vez, o projeto da Declaração de Direitos dos Povos Indígenas, levantando o problema de que se o sistema jurídico do povo indígena for incompatível com o sistema jurídico do Estado, o artigo 4º supra será irrealizável. Aponta, assim, para o fato de que não é possível sustentar ao mesmo tempo a vigência do direito indígena e pretender uma participação plena destes na vida política, econômica e social de cada Estado.
“Art. 15
1. Los pueblos indígenas tienen derecho a que la dignidad y diversidad de sus culturas, tradiciones, historias y aspiraciones queden debidamente reflejadas en la educación pública y los medios de información públicos.
2. Los Estados adoptarán medidas eficaces, en consulta y cooperación con, los pueblos indígenas interesados, para combatir los prejuicios y eliminar la, discriminación y promover la tolerancia, la comprensión y las buenas relaciones entre los pueblos indígenas y todos los demás sectores de la sociedad.
Art. 33
1. Los pueblos indígenas tienen derecho a determinar su propia identidad o pertenencia conforme a sus costumbres y tradiciones. Ello no menoscaba el derecho de las personas indígenas a obtener la ciudadanía de los Estados en que viven.
2. Los pueblos indígenas tienen derecho a determinar las estructuras y a elegir la composición de sus instituciones de conformidad con sus propios procedimientos.”
No entanto, como é possível notar especialmente no Convenio 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais em países independentes, o direito dos povos indígenas estão limitados pela incompatibilidade com os direitos fundamentais definidos pelo sistema jurídico nacional e com os direitos humanos internacionalmente reconhecidos.
O caso da secessão de Quebec.
O Quebec é uma província do Canadá em que cerca de 80% da população é descendente de franceses, em contraste com as outras províncias do país, cujos habitantes são em sua maioria descendentes de ingleses ou escoceses. A forte influência francesa, torna a província sensivelmente diferente do resto do país.
Ao longo da década de 1960, o Quebec exigiu do governo canadense maior autonomia quanto a problemas exclusivos de sua região. Em 1974, o Quebec adotou o francês como único idioma oficial da província.
Foi realizado um plebiscito em 1980, a respeito da possibilidade de haver uma cessão política entre Canadá e Quebec, permanecendo a união econômica. Na votação, 60% dos eleitores votaram contra a secessão.
Em 1981, foram instituídas diversas mudanças na Constituição canadense, e muitas delas não agradaram aos quebequenses, que acreditavam que estas mudanças não ajudariam a preservar a língua francesa no Canadá. Em 1982, reuniram-se secretamente políticos canadenses, com exceção do governador de Quebec, para assinar e aprovar oficialmente a Constituição do Canadá. Quebec não a assinou nem posteriormente. A nova constituição foi aprovada pelo Reino Unido, e entrou em vigor ainda no mesmo ano.
Em 1987, no chamado Meech Lake Accord, o primeiro-ministro do Canadá propôs algumas mudanças à Constituição, entre elas, o reconhecimento do Quebec como uma sociedade canadense distinta, mas a proposta não obteve êxito. Numa segunda tentativa em 1992 foi reprovada por 56,7% dos canadenses não-quebequenses e por 57% da população quebequense. Até hoje, a Constituição do Canadá continua em vigor sem a assinatura do Quebec.
Em 1995, um novo plebiscito foi realizado a favor da independência do Quebec. 50,6% dos eleitores quebequenses votaram contra a secessão e 49,4% votaram a favor. Em 1996, uma emenda reconheceu ao Quebec sua linguagem, cultura e leis civis, e outra emenda deu ao Quebec e às outras quatro regiões canadenses o poder de veto sobre mudanças à constituição canadense.
O caso das mutilações sexuais.
A mutilação sexual é um problema global que afeta 15.3 milhões de crianças e jovens adultos anualmente (NADER 1999:73). De acordo com o sistema de crenças das sociedades que praticam mutilação sexual, os órgãos sexuais são vistos como propriedade comum, sob o controle dos médicos, feiticeiros, figuras religiosas, parentes, etc.
Esta cirurgia ocorre em diversos países ao redor do mundo, como Sudão, Somália, Etiópia, Egito, Sri Lanka, Inglaterra, França e Estados Unidos. Há mesmo alguns relatos que chegam a apontar para a ocorrência no nordeste brasileiro.
Esta violação em diversas culturas, islâmica, cristã, hindu, seitas africanas…, contudo, é sempre apontada como prática africana. Neste sentido, tanto homens americanos quanto as mulheres africanas não acreditam terem perdido qualquer coisa, ao contrário, afirmam que suas práticas são embelezadoras, higienizadoras, recomendadas por médicos, etc.
Conforme Nader (1999:75) “no momento médicos e enfermeiras estão se opondo à circuncisão” tratando-a como uma epidemia fundada em falsas razões médicas.
Da mesma forma com que nossa ética encara as circuncisões africanas, ativistas de direitos humanos deste continente vêm questionando a prática hoje comum em nossa sociedade de colocar implantes de silicone no seio. Como levar estes africanos a entender que o tamanho dos seios de uma mulher tem direta ligação com sua auto estima, , bem-estar e valor social? Como equacionar essa prática determinada pela cultura ocidental com as mulheres que tiveram complicações em razão da cirurgia?
Em ambas as práticas a mutilação ocorre teoricamente em seu benefício, para a melhora de sua aparência feminina e em ambos os lugares a escolha pela cirurgia se dá fora do indivíduo, na sociedade.
È certo que a mutilação genital é uma prática que fere os Direitos Humanos, é um atentado à integridade e dignidade, ou ainda uma forma de violência física e sexual, mas, serve como exemplo para pensarmos em como há que se pensar não somente nas práticas “deles”, mas também nas “nossas” de modo a atingirmos um respeito à diferença, ao mesmo tempo em que se resguardam direitos mínimos.
Três propostas de diálogo intercultural.
Abdullahi Ahmed An-Na’im. [3]
Para An-Na‘im, dentre os diversos fatores responsáveis pelas freqüentes violações dos direitos humanos nos dias de hoje, pode-se destacar a falta ou insuficiência de legitimidade cultural do padrão universal, o qual é estranho aos valores e instituições de determinadas culturas. Por isso, torna-se problemático o respeito aos direitos humanos.
Em meio a tantas controvérsias sobre os valores e normas da cultura islâmica, muito se tem discutido sobre a possibilidade de uma noção islâmica de direitos humanos. An-Na’im procura legitimar a concepção ocidental de direitos humanos dentro do espectro de valores possíveis de reinterpretarão e reconstrução da cultura islâmica.
Assim, visa construir uma interpretação alternativa dos Direitos Humanos, ao invés de renunciar aos valores que informam a tradição islâmica e que, aparentemente, revelam-se incompatíveis com estes.
An-Na’im argumenta que a legitimidade cultural do padrão universal de direitos humanos deve ser alcançada em duas etapas: a primeira no plano interno – através de discursos culturais internos – e, em seguida, no plano externo – através de diálogos interculturais.
Para aumentar a legitimidade cultural interna, ele explora as possibilidades de reinterpretação e reconstrução dos valores, normas e instituições tradicionalmente consagradas, através do chamado discurso cultural interno, efetuado por debates acadêmicos, lutas políticas e manifestações artísticas e literárias.
Tal movimento traria alternativas mostrando que os valores e instituições tradicionalmente consagrados podem e devem ser revistos e reformulados de acordo com a nova realidade. Assim, se o jurista de hoje trabalhar com as mesmas fontes, pode chegar a uma interpretação moderna dos escritos sagrados. Essa nova interpretação, assim como ocorreu outrora, seria condicionada pela realidade histórica, social, econômica e política atual.
Existe outro requisito essencial para a legitimidade: os personagens envolvidos na luta para a conquista desse espaço argumentativo devem ser internos, isto é, pertencentes à comunidade em questão. Cabe ao discurso interno estimular a boa-fé, o respeito mútuo e o sentimento de igualdade em relação às culturas alheias.
Com relação ao diálogo intercultural, o tempo para iniciá-lo não pode ser estabelecido de forma unilateral, a disposição para o diálogo deve sobrevir concomitantemente em todas as culturas envolvidas.
O momento de cessar o diálogo deve ser deixado à livre e unilateral decisão das culturas, pois não se pode denegar a decisão sobre a reversibilidade do diálogo às comunidades culturais individualmente, uma vez que, se determinada cultura perceber que o diálogo a enfraquece, pode decidir finalizá-lo ou suspendê-lo imediatamente.
Para o autor, “o objetivo do discurso interno e do diálogo intercultural é concordar sobre um corpo de crenças para guiar ações que auxiliam os direitos humanos, apesar do desacordo sobre a justificação dessas crenças”.
Boaventura de Sousa Santos.
A viabilidade da política multicultural exige resposta adequada a dois tipos de problemas: a multidimencionalidade das formas de dominação e opressão suscita formas de resistência e de luta que mobilizam atores coletivos, vocabulários e recursos diferentes e nem sempre inteligíveis entre si; e, tendo a maior parte dessas lutas origem local, os atores devem lograr firmar alianças translocais e globais para que tenham eficácia e legitimidade.
A resposta a esses problemas está relacionada com a teoria da tradução, que permite a visualização de um ponto em comum nas lutas indígenas, feministas, ecológica, etc., sem que desapareçam nenhuma delas, nem suas diferenças.
Boaventura elenca cinco teses sobre multiculturalismos emancipatórios e escalas de luta contra a dominação:
(1) Diferentes coletivos humanos produzem formas diversas de ver e dividir o mundo, que não obedecem necessariamente às diferenciações eurocêntricas como, por exemplo, as que dividem as práticas sociais entre a economia, a sociedade, o Estado e a cultura, ou a que separa drasticamente a natureza da sociedade. Está em curso uma reavaliação das relações entre estas diferentes concepções do mundo e suas repercussões no Direito e na Justiça.
(2) Diferentes formas de dominação ou de opressão geram formas de resistência, de mobilização, de subjetividade e de identidades coletivas também distintas, que invocam noções de Justiça diferentes. Nessas resistências e em suas articulações locais/globais reside o impulso da globalização contra-hegemônica.
(3) A Incompletude das culturas e das noções de dignidade humana, do Direito e da Justiça exige o desenvolvimento de formas de dialogo (a hermenêutica diatópica) que promovam a ampliação dos círculos de reciprocidade.
O debate sobre universalidade e multiculturalismo dos Direitos Humanos ilustra um problema mais geral, o de tornar mensuráveis exigências de dignidade humana formuladas em linguagens distintas de Direitos e Justiça.
(4) As políticas emancipatórias e a invenção de novas cidadanias jogam-se no terreno da tensão entre a igualdade e a diferença, entre a exigência de reconhecimento e o imperativo da redistribuição.
(5) O sucesso das lutas emancipatórias depende das alianças que seus protagonistas são capazes de forjar. No início do século XXI, essas alianças têm de percorrer uma multiplicidade de escalas locais, nacionais e globais e têm de abranger os movimentos e lutas contra diferentes formas de opressão.
Hermenêutica diatópica.
Através da hermenêutica diatópica, Sousa Santos procura traçar um caminho para superar as dificuldades que surgem do diálogo intercultural.
As premissas capazes de levar à transformação teórica e prática dos direitos humanos, de forma a conceitualizá-los e aplicá-los como multiculturais, são as seguintes: (1) a superação da tensão universalismo-relativismo; (2) a constatação de que, embora todas as culturas possuam concepções de dignidade humana, nem todas elas a concebem em termos de direitos humanos; (3) a verificação de diferentes versões de dignidade humana; (4) a percepção da incompletude das culturas; e, finalmente, (5) a aproximação entre as políticas de igualdade e de diferença. Passa-se, então, à análise pormenorizada dessas premissas.
No contexto dos direitos humanos, a posição universalista conduz a um “localismo ocidental globalizado”. Como afirma Sousa Santos, toda tentativa de universalizar ou globalizar valores pressupõe uma procedência local. A globalização pressupõe a localização. Daí afirmar-se que os valores “universais” consagrados nas cartas e tratados internacionais de direitos humanos e a concepção de dignidade humana por eles defendida possuem uma imersão cultural específica: a tradição ocidental.
Do mesmo modo, a posição relativista não concebe o consenso, não há intento de uma compreensão cultural mútua. Qualquer tentativa nesse caminho representaria a imposição de uma cultura à outra.
Já que o que se procura é precisamente uma perspectiva para a construção de uma concepção de direitos humanos que possa ser compartilhada com as diferentes culturas, ambas as posições devem ser superadas.
A segunda premissa considera que nem todas as culturas concebem a dignidade humana em termos de direitos humanos. Contudo, dado que todas as culturas de alguma forma concebem a dignidade da pessoa humana, é forçoso concluir que existem diferentes versões desta. Assim, dentre as diversas versões de dignidade humana de determinada cultura, há que se buscar a que mais largamente aceita as particularidades das demais construções culturais.
A terceira premissa prevê que o reconhecimento do outro assume papel de extrema importância para a formação de uma identidade multicultural. Essa noção de identidade implica em que a afirmação da identidade do ser humano e sua autocompreensão ocorre em contato com o outro, mais precisamente, com outras culturas.
É através do binômio identidade-reconhecimento que a cultura é capaz de se conhecer e perceber sua incompletude, o que, por sua vez, pode resultar na vontade de dialogar.
A quarta premissa dita que, de acordo com o autor, é o sentimento de frustração e descontentamento com a própria cultura que provoca a curiosidade pelas respostas dadas por outras culturas. Aguçada a curiosidade por outras respostas culturais, desenvolve-se o sentimento de incompletude, que, por sua vez, impulsiona o diálogo entre as culturas e a hermenêutica diatópica. Nesses casos, deve ocorrer uma mudança recíproca nas crenças que têm status de verdade. É o caminho para a construção de uma concepção multicultural de direitos humanos.
Entretanto, a percepção da incompletude não é fácil quando se está dentro da cultura a que se visa contestar, é muito mais fácil perceber a incompletude de determinada cultura quando o sujeito se coloca no exterior dela, a partir de outra perspectiva cultural.
Por último, a quinta premissa é a de que as culturas tendem a se organizar com base em dois princípios a igualdade e a diferença. Assim, as pessoas são normalmente divididas em iguais, de um lado, e diferentes, do outro. Desta forma, não há que se distinguir entre as políticas de igualdade e de reconhecimento das diferenças, a fim de alcançar uma política emancipatória de direitos humanos. Pelo contrário, ambas devem estar intimamente ligadas.
Em suma, a proposta de Sousa Santos consiste em transformar a concepção de direitos humanos num projeto cosmopolita, de forma a realizar a transformação cosmopolita dos direitos humanos. Procura, assim, traçar o caminho para uma concepção multicultural de direitos humanos, “uma concepção que, em vez de recorrer a falsos universalismos, se organiza como uma constelação de sentidos locais, mutuamente inteligíveis, e que se constitui em redes de referências normativas capacitantes”.
Will Kymlicka.
Kymlicka defende que o desafio do multiculturalismo é acomodar as diferênças culturais de maneira estável e moralmente defensível. Assim, muitos países têm aceitado cada vez mais que algumas formas de diferença cultural só podem ser acomodadas mediante medidas legais e constitucionais, além dos direitos comuns de cidadania.É a chamada cidadania diferenciada, ou seja, os membros do grupo dissidente devem possuir alguns direitos específicos como grupo.
Em seguida, o autor ressalta três formas de direitos específicos em função do grupo. A primeira delas é o “Direito de Auto-governo”.
Este caso é o de Estados multinacionais, em que as nações específicas reivindicam algum tipo de autonomia política ou jurisdição territorial, para assegurar o desenvolvimento de sua cultura, e o interesse de seus membros. O extremo deste direito é a secessão, a qual exemplificamos acima com o exemplo do Canadá.
O Direito Internacional reconhece, com certos limites, o direito de autodeterminação dos povos. A carta das nações unidas prevê a autodeterminação dos povos, contudo, não define o que são “povos”, e este direito tem sido aplicado apenas quanto às colônias de ultramar, e não às minorias internas dos Estados.
Um dos mecanismos de auto-governo é o federalismo. Entretanto, anota que o federalismo tem uma dificuldade, qual seja, a manutenção do equilíbrio entre centralização e descentralização.
O Canadá resolveu este impasse instituindo um federalismo assimétrico em que o Quebec possui competências que não foram outorgadas a outras províncias.
Em alguns Estados se faz necessário que as fronteiras internas sejam traçadas de acordo com a concentração da população minoritária. Ocorre pois o federalismo somente pode servir como auto-governo se a minoria representa uma maioria naquela unidade da federação.
Este é o caso dos “inuit”, popularmente chamados de Esquimós. Os “Inuit” requisitaram a divisão do nordeste canadense em dois, de modo a constituírem a maioria na metade oriental.O governo Federal Canadense aprovou a separação.
Outra forma de proteção das minorias que levanta Kymlicka são os “Direitos Poliétnicos”. Em princípio este direito consistia somente na possibilidade das minorias imigrantes expressassem livremente suas particularidades. Se requisitava que a política se separasse da nacionalidade.
Posteriormente este direito foi expandido em várias direções, como na requisição de subvenção pública das práticas culturais das minorias, o financiamento de estudos e associações étnicas, a adoção pelas escolas de ensino na língua dos imigrantes, excessões em leis e disposições que prejudiquem a prática religiosa…
O objetivo deste direito é fomentar a integração no conjunto da sociedade.
Por fim, Kymlicka trata dos “direitos especiais de representação”. Este direito se baseia na afirmação de que o processo político não consegue refletir a diversidade da população. Assim, deveria incluir no processo membros das minorias, fazendo com que os partidos políticos sejam mais inclusivos,adotando a forma de representação proporcional, ou até mesmo o direito de veto da minoria.
Estas medidas serão, na opinião do autor, mais plausíveis se forem temporárias. Uma vez que a sociedade não necessite mais de representação especial, volta-se ao sistema anterior.
Kymlicka conjetura que, a fim de que o direito das minorias não seja contrário a direitos individuais, devemos fazer a distinção entre restrições internas e proteções externas. O primeiro tipo implica em reivindicações do grupo contra seus próprios membros. O segundo, traduz a reivindicação do grupo contra a sociedade em que este se incere.
Assim, com as restrições internas o grupo pode pretender usar o direito para restringir a liberdade de seus membros em nome da solidariedade de grupo. Isto ocasiona o perigo da opressão individual.
De outra forma, as proteções externas podem ser contempladas como algo que coloca os grupos em pé de igualdade, na medida em que a minoria é mais vulnerável que a maioria.
Para Kymlicka, as proteções externas devem ser postuladas, mas as restrições internas devem ser totalmente rechaçadas.
Conclusão.
Temos o problema dos Direitos Humanos como parte de um discurso ocidental, ou até mesmo de um discurso ocidental hegemônico. As perspectivas de avanço dos Direitos Humanos estão ligadas às possibilidades de reconstrução cultural que dependem de um processo aberto de comunicação livre de interferência dogmática.
Qualquer análise de práticas culturais devem ser conduzidas da perspectiva tanto dos de “dentro” como dos de “fora”. Nós somos parte do silencio hegemônico quanto a temas politicamente incorretos dos Direitos Humanos. Privilegiar preocupações ocidentais de Direitos Humanos é etnocêntrico.
È necessário que os acadêmicos e ativistas de Direitos Humanos não usem a “cultura” como escudo para práticas que violam Direitos Humanos, mas estes últimos também não podem ser usados como uma arma de imperialismo moral para oprimir outras comunidades e modos de vida.
O diálogo, ou tradução como quer Boaventura, aproximando o “nós” e o “eles”, de forma que se protejam os direitos mais fundamentais sem haver violações em ambas as partes parece ser a forma mais justa – e necessária – para solucionar o problema do relativismo cultural versus universalismo.
Informações Sobre o Autor
Marcela Giorgi Barroso
Advogada, Auxiliar do programa PAE/USP nas disciplinas Filosofia do Direito I e II. Mestranda em Direitos Humanos pela FDUSP