Sumário: Introdução. AP470. Conceito. Direito Processual Penal. Lei nº 8.038/90. Observação.
Introdução.
A elaboração deste artigo objetiva acrescentar dados para a discussão a respeito do mais recente e importante acontecimento da política nacional que é o julgamento denominado “Mensalão” ou “Mensalão do PT”. Preferimos utilizar a expressão “Mensalão do PT” porque também existe e lhe é anterior o “Mensalão do PSDB”, supostamente decorrente do mesmo esquema de financiamento de campanha eleitoral do então Governador de Minas Gerais, Eduardo Azeredo. Isto sem falar no Mensalão do DEM e na Operação Satiagraha.[1]
O “Mensalão do PT” seria, assim, um esquema utilizado para corromper parlamentares e aumentar a base política de Lula na Presidência da República.
Muito se tem falado recentemente a respeito do “Mensalão do PT” sendo julgado no Supremo Tribunal Federal. Lá foram condenados 25 de 40 réus e intermináveis debates foram travados a respeito de tudo. Até um suposto candidato à Presidência da República foi cogitado. Relevante foi a pressão de setores da imprensa a respeito do voto do decano daquele Tribunal que decidiu pela admissibilidade dos recursos infringentes de certo número dos réus já condenados inicialmente pela Corte Suprema.
A respeito do “Mensalão do PT” já foram escritos diferentes livros, blogs, artigos, etc. A nossa intenção, na qualidade de estudante do Direito há mais de 20 anos é traçar um esboço do denominado embargo infringente que recentemente causou tanta repulsa em setores distintos da mídia que tentaram “desmoralizar” o STF como se este não estivesse a cumprir sua função jurisdicional determinada constitucionalmente.
O método de produção deste artigo, científico ou não, na opinião de alguns, será a exposição, comparação e conclusão a respeito deste instituto processual. Os limites da pesquisa poderão ultrapassar fronteiras e a pesquisa será eminentemente eletrônica, apesar da desconfiança de muitos autores pátrios ou não contra a rede mundial de computadores.
Finalmente, não se vislumbra nenhuma intenção de se estudar história, sociologia ou moral. Busca-se o conhecimento e a compreensão do Direito e das suas normas.
AP470.
Inicialmente há que se expor que se trata de estudos acerca do embargo infringente e sua utilização na Ação Penal – AP 470, do Supremo Tribunal Federal.[2]
Conceito.
Partindo-se da Enciclopédia Livre Wikipédia, no Brasil, no âmbito civil, embargo infringente é o recurso cabível contra acórdãos que não atingiram a unanimidade e que foram proferidos pelos tribunais superiores nas ações que buscam a reapreciação das ações impugnadas pela parte recorrente.[3]
O texto dos artigos 530 a 534 do Código de Processo Civil é o seguinte:
“Art. 530. Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência.
Art. 531. Interpostos os embargos, abrir-se-á vista ao recorrido para contra-razões; após, o relator do acórdão embargado apreciará a admissibilidade do recurso.
Art. 532. Da decisão que não admitir os embargos caberá agravo, em 5 (cinco) dias, para o órgão competente para o julgamento do recurso.
Art. 533. Admitidos os embargos, serão processados e julgados conforme dispuser o regimento do tribunal.
Art. 534. Caso a norma regimental determine a escolha de novo relator, esta recairá, se possível, em juiz que não haja participado do julgamento anterior”.
Note-se que os artigos foram modificados por duas leis que inovaram os recursos: Lei 10.352, de 2001 e Lei 8.950, de 1994.[4]
O Código de Processo Penal, por sua vez, determina que:
“Art. 609 – Os recursos, apelações e embargos serão julgados pelos Tribunais de Justiça, câmaras ou turmas criminais, de acordo com a competência estabelecida nas leis de organização judiciária.
Parágrafo único – Quando não for unânime a decisão de segunda instância, desfavorável ao réu, admitem-se embargos infringentes e de nulidade, que poderão ser opostos dentro de 10 (dez) dias, a contar da publicação de acórdão, na forma do Art. 613. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto de divergência”.
O texto do artigo 613, por sua vez, é o que segue:
“Art. 613 – As apelações interpostas das sentenças proferidas em processos por crime a que a lei comine pena de reclusão, deverão ser processadas e julgadas pela forma estabelecida no Art. 610, com as seguintes modificações:
I – exarado o relatório nos autos, passarão estes ao revisor, que terá igual prazo para o exame do processo e pedirá designação de dia para o julgamento;
II – os prazos serão ampliados ao dobro;
III – o tempo para os debates será de um quarto de hora”.
Já o artigo 610 estabelece que:
“Art. 610 – Nos recursos em sentido estrito, com exceção do de habeas corpus, e nas apelações interpostas das sentenças em processo de contravenção ou de crime a que a lei comine pena de detenção, os autos irão imediatamente com vista ao procurador-geral pelo prazo de 5 (cinco) dias, e, em seguida, passarão, por igual prazo, ao relator, que pedirá designação de dia para o julgamento.
Parágrafo único – Anunciado o julgamento pelo presidente, e apregoadas as partes, com a presença destas ou à sua revelia, o relator fará a exposição do feito e, em seguida, o presidente concederá, pelo prazo de 10 (dez) minutos, a palavra aos advogados ou às partes que a solicitarem e ao procurador-geral, quando o requerer, por igual prazo”.
Direito Processual Penal.
Em razão de se tratar aqui de uma ação penal, enfocaremos os embargos infringentes previstos no Código de Processo Penal, de 1941.[5]
Segundo Alexandre Camanho, Presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República – ANPR, embargos infringentes são uma espécie de recurso em caso de condenação por um tribunal para que os réus solicitem a revisão da decisão. Tanto os embargos de declaração quanto os embargos infringentes são espécies de recursos diferentes que possuem funções diferentes e requisitos próprios.
Os embargos de declaração não seriam propriamente um recurso, mas integradores da jurisdição para sanar contradições, omissões, ambiguidades e obscuridades nas sentenças e nos acórdãos. Podem ser utilizados por autor e réu.
Já os embargos infringentes são recurso exclusivo da defesa, fundamentado na falta de unanimidade na decisão colegiada. Também questiona pontos específicos de discordância. Apenas os itens constantes dos embargos poderão ter seus efeitos suspensos ou reapreciados: o restante da decisão permanece inalterado.
A despeito de estar prevista no Regimento Interno do STF, a utilização de embargos infringentes em ações originárias da Suprema Corte como a AP 470 é polêmica.
Lei nº 8.038/90.
Alguns juristas entendem que a ausência de previsão na Lei 8.038/90 que estabelece as normas procedimentais do STJ e STF implicaria o não cabimento deste recurso. O Supremo, contudo, já julgou embargos infringentes, o que poria fim, desta forma, à discussão.[6]
A Lei 8.038, de 28 de maio de 1990, por sua vez, instituiu normas procedimentais para os processos que especifica, perante o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal.[7]
O Título I da Lei 8.038 trata dos processos de competência originária. O Capítulo I disciplina a ação penal originária, caso da AP 470.
A Lei 8.038, além dos processos de competência originária, prevê normas sobre o cabimento de reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para preservação da competência do Tribunal ou para garantia da autoridade das suas decisões.
Além disto, a Lei 8.038 prevê como será requerida a intervenção federal prevista na Constituição Federal, artigo 36, II e IV, ou seja, prevê normas para a intervenção federal, no caso de desobediência a ordem ou decisão judiciária, de requisição do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do Tribunal Superior Eleitoral.
O inciso IV do mesmo artigo previa a intervenção de provimento pelo STJ, de representação do Procurador-Geral da República, no caso de recusa à execução de lei federal e foi revogado pela Emenda Constitucional 45, de 2004, desatualizando, desta forma, a redação da Lei 8.038.
O próximo recurso ou ação previstos na Lei 8.038 é o do habeas corpus. Entretanto, sua redação prevê, no artigo 23, que aplicam-se ao Habeas Corpus perante o Superior Tribunal de Justiça as normas do Livro III, Título II, Capítulo X do Código de Processo Penal.
Outros procedimentos previstos em lei são os dos artigos 24 e 25 que prevêem que na ação rescisória, nos conflitos de competência, de jurisdição e de atribuições, na revisão criminal e no mandado de segurança, será aplicada a legislação processual em vigor.
No mandado de injunção e no habeas data, serão observadas, no que couber, as normas do mandado de segurança, enquanto não editada legislação específica.
Exceto quando a causa for fundamentada em matéria constitucional, compete ao Presidente do Superior Tribunal de Justiça, a requerimento do Procurador-Geral da República ou da pessoa jurídica de direito público interessada, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, suspender, em despacho fundamentado, a execução de liminar ou de decisão concessiva de mandado de segurança, proferida, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados e do Distrito Federal.
O Título II da Lei 8.038/90 prevê os recursos extraordinário, especial – ambos somente no efeito devolutivo -, ordinário em Habeas Corpus, ordinário em Mandado de segurança, Apelação Cível e Agravo de Instrumento. Além disto, nas causas em que forem partes, de um lado, Estado estrangeiro ou organismo internacional e, de outro, município ou pessoa domiciliada ou residente no País, caberá apelação da sentença e ou agravo de instrumento, das decisões interlocutórias.
Haverá revisão, no Superior Tribunal de Justiça, nos processos de ação rescisória; ação penal originária; revisão criminal.
Em habeas corpus originário ou recursal, havendo empate, prevalecerá a decisão mais favorável ao paciente.
O artigo 42 da Lei 8.038/90 modificou a redação de alguns artigos do CPC e este passou a prever o cabimento dos embargos infringentes, dentre outros. Modificou a redação do artigo 500 do CPC, no seguinte sentido:
“Art. 500. Cada parte interporá o recurso, independentemente, no prazo e observadas as exigências legais. Sendo, porém, vencidos autor e réu, ao recurso interposto por qualquer deles poderá aderir a outra parte. O recurso adesivo fica subordinado ao recurso principal e se rege pelas disposições seguintes:
I – será interposto perante a autoridade competente para admitir o recurso principal, no prazo de que a parte dispõe para responder;
II – será admissível na apelação, nos embargos infringentes, no recurso extraordinário e no recurso especial;
III – não será conhecido, se houver desistência do recurso principal, ou se for ele declarado inadmissível ou deserto.
Parágrafo único. Ao recurso adesivo se aplicam as mesmas regras do recurso independente, quanto às condições de admissibilidade, preparo e julgamento no tribunal superior”.
Finalmente, o novo artigo 508 do CPC previsto pela Lei 8.038 determina que na apelação e nos embargos infringentes, o prazo para interpor e para responder é de quinze dias.
Observação.
Entretanto, como já vislumbrado, este escrito não visa ao estudo dos embargos infringentes no processo civil, mas no processo penal.
Informações Sobre o Autor
Francisco Mafra.
Doutor em direito administrativo pela UFMG, advogado, consultor jurídico, palestrante e professor universitário. Autor de centenas de publicações jurídicas na Internet e do livro “O Servidor Público e a Reforma Administrativa”, Rio de Janeiro: Forense, no prelo.