Resumo:[1] Com o advento da Constituição de 1988 o Ministério Público foi incumbido de grande poder, não estando submetido a nenhuma das Três Funções do Estado hierarquicamente. Este artigo pretende fazer referência aos acontecimentos mais recentes ligados ao Parquet, levando em consideração um assunto de fato relevante: O Ministério Público tem ou não o poder de realizar Investigações Criminais? O que diz a Carta Magna? O Supremo Tribunal Federal concorda com esta possibilidade?
Palavras-chave: Ministério Público, investigação criminal, ilegalidade.
DESENVOLVIMENTO
A Constituição de 1988 no Art. 127 bem como a Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, em seu Art. 1, definiram o Ministério Público da seguinte forma:
“O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.”
Essa definição trouxe algo de novo no cenário mundial, pois o Ministério Público alcançou status de poder constituído (Reis, 2008).
Levando em consideração os dois parágrafos do Art. 127;
“§ 1º – São princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional.
§ 2º – Ao Ministério Público assegurada autonomia funcional e administrativa(…)”
Não se fará aqui, referência a esse status ser ou não referente a um Quarto Poder, o que se pretende é argumentar sobre as funções do Ministério Público, mais especificamente se o Ministério Público possui ou não poder de realizar Investigações Criminais.
Esse assunto foi e está sendo amplamente debatido e argumentado por todas as esferas do Judiciário. Para o Supremo Tribunal Federal (STF), predomina a denegação de tal prerrogativa, enquanto no Superior Tribunal de Justiça (STJ), o Parquet possui essa função.
Após pesquisa na rede mundial de computadores, mais precisamente no site de busca Google (www.google.com.br), tivemos 22.200 ocorrências para a expressão: “Ilegalidade dos procedimentos investigatórios do Ministério Público”, que colocada entre aspas, busca a frase da forma que fora escrita, por sua vez, foram encontradas 83.000 para: Ilegalidade dos procedimentos investigatórios do Ministério Público; que busca as páginas que possuem todas as palavras contidas nos sites apresentados.
Observando alguns dos sites que possuem mais acessos e mais referências de seus colaboradores, bem como a comparação com as informações dadas pelo site do STF e também, o uso destes por autores como bibliografia, pude fazer uma seleção de fontes confiáveis para mensurar sobre o tema é verdadeiramente importantíssimo.
Desde a promulgação da CF 1988 e da Lei orgânica de 1993, existe esta controvérsia sobre as funções do Ministério Público, pois não existe uma subordinação a nenhum poder. Segundo João Gaspar Rodrigues[2], que é promotor de Justiça no Amazonas, “cada membro (desde o Promotor Substituto até o Procurador Geral) só está vinculado ao imperativo da lei e de sua consciência, esteios que dão sustentação à independência funcional, não podendo receber ordens ou recomendações de caráter normativo, quando de suas manifestações, para agir deste ou daquele modo.”.
Sabemos que cada Poder do Estado, apesar de ter suas atribuições bem definidas: Legislativo responsável por criar as Leis, o Judiciário responsável em julgá-las e o Executivo em cumpri-las, executam tarefas incumbidas a outros poderes, exemplo: Os deputados e senadores julgam casos que acham necessários em suas Comissões Parlamentares de Inquérito (inclusive com investigações), o Presidente da República cria as Medidas Provisórias e o Judiciário promove alterações de leis.
Esses fatos nos permitiriam admitir que o Ministério Público não devesse apenas ser o Guardião da Lei, bem como o que descreve o Art. 127, mas também, quando achasse necessário, fazer Investigações Criminais, seguindo a tese do “quem pode o mais, pode o menos[3]”.
Conforme Célio Jacinto dos Santos[4]: “Se o jurista optar por recorrer à hermenêutica para justificar que “quem pode o mais pode o menos”, também restará esvaziada sua proposição, eis que outro princípio elencado por Canotilho[5], o princípio da conformidade funcional, a vedará: “(….) a Constituição regula de determinada forma a competência e função dos órgãos, estes órgãos devem manter-se no quadro de competências constitucionalmente definido, não devendo modificar, por via interpretativa (através do modo e resultado da interpretação), a repartição, a coordenação e equilíbrio de poderes, funções e tarefas inerentes ao referido quadro de competências.” (grifei)”[6]
Porém, o embate mais forte, tange a questão da imparcialidade. Segundo o professor Ives Gandra[7], quanto ao inquérito policial, à tese prevalente foi a de que “a Polícia, como longa manus do Poder Judiciário é que deve investigar, cabendo ao Ministério Público controlá-la e somente com suprimento judicial assumir as funções investigatórias. É que, sendo o Ministério Público parte, como são os advogados da sociedade, a investigação deve ser dirigida por instituição neutra”.
Os defensores de que o Parquet pode e deve fazer tais investigações, baseiam-se na lei nº 8625 que menciona:
“Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: (…)
VI – expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva;(…)
VIII – requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;”
Mas, de fato, o mesmo artigo regulamenta quais fins e objetivos de instauração de inquérito policial:
“Art. 129 São funções institucionais do Ministério Público: (…)
III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.”
Assevera Lara Vanessa Milloon[8], advogada que tais atribuições constitucionais não são legitimadoras, ou mesmo legalizadoras, de um procedimento administrativo criminal, da natureza do ora impugnado, sucedâneo de inquérito policial.
Levando em consideração trecho do Relator Marco Antônio no processo suso: “Fundamenta sua irresignação no fato de a inicial acusatória vir embasada por procedimento administrativo criminal, que pretendeu substituir adequado inquérito policial, realizado internamente por “Grupo” integrado por membros do Ministério Público Estadual, em total descompasso com os procedimentos legais e constitucionais em vigor.”
Natália Bitencourt Gasparin[9], citou em seu artigo intitulado: LEGITIMIDADE DA FUNÇÃO INVESTIGATÓRIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO:
“A partir de uma análise mais acurada do texto constitucional percebe-se que tais argumentos não encontram sustentação legal. Aqui, a fim de não deixar dúvidas em relação a esta afirmação, cita-se o melhor da doutrina referente a matéria, STECK e FELDENS:
Recorrentemente, aqueles que desafiam a legitimidade do Ministério Público para proceder a diligências investigatórias na seara criminal esgrimem o argumento de que tal possibilidade não se encontraria expressa na Constituição, locus político normativo de onde emergem suas funções institucionais. Trata-se em verdade, de uma armadilha argumentativa. Esconde-se por detrás dessa linha de raciocínio, aquilo que se revela manifestamente insustentável: a consideração de que as atribuições conferidas ao Ministério Público pelo art. 129 da Constituição são taxativas, esgotando-se em sua literalidade mesma. Equívoco, data venia, grave.”
Para finalizarmos nossa exposição sobre o assunto, vejamos uma decisão do STF, publicada por revista eletrônica[10]:
“O Ministério Público não possui atribuições para realizar, diretamente, investigação de caráter criminal — essa foi à decisão, prolatada em maio próximo passado, no recurso ordinário em habeas corpus nº 81.326-7 (1), pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, unanimemente, sob o voto condutor do ministro Nelson Jobim. Esse julgamento erige-se num corolário de diversas outras decisões de tribunais de todo o país que, não sem algumas hesitações, têm consagrado o mesmo entendimento. (…)
Fico a meditar sobre a origem do inquérito policial, sua utilidade e conveniência e, invariavelmente, concluo por sua indispensabilidade como supedâneo a enfeixar as provas que são produzidas durante esta importante fase, que é preliminar ao processo criminal; aliás a fase que justifique o próprio processo. Assim, o inquérito policial é uma peça de relevo e, sendo dirigida por uma autoridade policial, objetiva, principalmente, a apuração dos fatos com imparcialidade, porquanto o delegado de polícia que o preside, jamais acusa, como também não defende, pois busca-se uma autoridade imparcial[11]” . (…)
Se a intervenção da Defesa é cerceada no inquérito policial, porque seria correto, em descompasso com a ordem constitucional, violando princípio da paridade de tratamento das partes, proporcionarem ao Ministério Público (órgão que despontará para a acusação, no caso de eventual ação penal), a presidência da investigação policial, ocasionando um desequilíbrio desproporcional na relação processual que está por vir e que, nem mesmo o órgão jurisdicional, por mais imparcial que seja, poderá sanar.”
CONCLUSÃO
As idéias apresentadas neste trabalho, bem como o que diz a Constituição Brasileira e também o Supremo Tribunal Federal, nos levam a entender que o Parquet não teria a Legalidade prevista em nossa Constituição para realizar Investigações Criminais.
A Constituição deixa clara a existência da Polícia Judiciária:
“§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a: (Redação da EC nº 19/98). (…)
IV – exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. (…)
§ 4º – às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.”
Porém, o fato mais relevante é: Por que o Ministério Público faria Investigações Criminais tendo tantos outros trabalhos de maior importância e relevância a serem feitos? Caso o Parquet venha a ter a Legalidade para estas ações, teríamos que criar outra Instituição para cuidar dos fatos que agridam a Constituição? Bem como os Direitos mais íntimos da sociedade?
Resta-nos esperar a decisão do STF, que julga a Legalidade ou não do Parquet para este fim, com a aposentadoria do Ministro Nelson Jobim, que pediu vistas ao processo, esta tarefa pertence agora a Ministra Cármen Lúcia.
Acesso em: 10 abr. 2008.
Informações Sobre o Autor
Henrique Manoel Gomes Brandão
Acadêmico de Direito na Faculdade São Geraldo/ES