Novos advogados, velhos desafios: os conflitos entre a ética e o capital

Resumo: No presente artigo se discutirão as dificuldades dos novos advogados quando no início de suas carreiras tantas vezes se deparam com situações em que precisam decidir entre a observação dos preceitos éticos próprios de sua profissão e a necessidade premente de se ganhar dinheiro para garantir seu sustento e o de sua família. Na maioria das vezes o conflito entre a Ética e o Capital se dá em situações em que o novo advogado aceita causas diversas de diferentes ramos do direito, sabendo que não possuí condições técnicas e conhecimentos necessários para garantir do melhor modo possível os interesses do cliente, mesmo assim aceita as causas para poder aferir renda. Como base de pesquisa de campo foram utilizadas as informações disponibilizadas pelo Projeto Integrado do 8º período do Curso de Direito da UNIAGES, o qual traz um estudo sobre a realidade profissional de novos advogados egressos da instituição.     

Palavras-chave: Ética, Capital, Novos Advogados e Conflito Moral.[1]      

Resumen: El presente artículo se discutirán las dificultades de los nuevos abogados al principio de sus carreras tan a menudo se enfrentan con situaciones en las que debe decidir entre la observación de las normas éticas propias de su profesión y la necesidad urgente de hacer dinero para asegurar sus medios de vida y de su familia. sigue aceptando las causas con el fin de medir la renta. Como se usa base de la investigación de campo de la información proporcionada por Integrated octavo período del Curso de Derecho del Proyecto UNIAGES, que aporta un estudio sobre la realidad profesional de la nueva institución graduados abogados.

Palabras clave: Ética, capitales, nuevos abogados y Moral conflicto.

Sumário: Resumo. Introdução. 1. O Mercado e a Moral. 2. Entre a Ética e o Capital. Considerações Finais. Referências.     

INTRODUÇÃO

Na vida determinadas situações são impostas às pessoas de um modo tão peremptório que não lhes deixam a menor possibilidade de fazer suas próprias escolhas, ou tomar independentemente suas próprias decisões. Uma dessas situações se revela nas leis fatídicas do sistema econômico do mundo ocidental. Homens e mulheres ocidentais nascem capitalistas e crescem capitalistas, aprendendo desde a mais tenra idade que o dinheiro é, por excelência, o objeto dos desejos por ser quase que o único veículo da dignidade humana.

O problema dessa constatação, ou seja, o problema dessa valorização do capital, estar no fato de muitas pessoas potencializarem sobremodo o dinheiro em detrimento de outros valores de ordem diversa, mas que de suma importância para vida em sociedade e para a completa realização interior do ser humano.

Dinheiro é importante e indispensável para a vida no mundo capitalista, mas lealdade, honestidade, afeto e, sobretudo, o amor, são os valores incontestáveis e pujantes da alma humana, cuja inobservância tem ao longo da história homo sapiens causado os mais terríveis dissabores. Por isso os apelos éticos das profissões e por isso a necessidade inafastável de se observar a ética em todas e quaisquer relações humanas.       

Com base nessas premissas, considerou-se oportuno e pertinente investigar os desafios vivenciados por advogados neófitos quando no início de suas carreiras se deparam com situações em que têm que fazer uma escolha entre uma postura ética ou uma decisão de ordem prática que lhe confira algum rendimento financeiro.

A carência de valores éticos se revela não somente quando um advogado em começo e carreira, ou mesmo já veterano, aceita uma causa sabendo não possuir as melhores condições para conduzi-la, mas também se verifica quando o advogado buscando a defesa de seu cliente atropela direitos alheios, muitas das vezes até mesmo inovando a verdade dos fatos.

Assim, fazendo as devidas consultas à doutrina e tomando por base os depoimentos de novos advogados egressos da UNIAGES, constantes do Projeto Integrador realizado pelos discentes do 8º período do Curso de Direito da citada instituição, proceder-se-á nos parágrafos seguintes uma sucinta investigação do conflito vivenciado por novos advogados quando necessitam escolher entre a Ética e o Capital.       

1 O MERCADO E A MORAL

De antemão informe-se que este subtítulo foi tomado de empréstimo da obra de Michel Sandel, intitulada “O que o Dinheiro não Compra: os limites morais do mercado”, cuja pertinência se revela louvável para a presente proposta acadêmica, pois aqui neste primeiro capítulo, após a introdução, pretende-se demonstrar que o valor psicológico do dinheiro é limitado, ou deve ser limitado, pela presença de outros valores de natureza imaterial.

Sandel aduz, logo no início de seu livro, que os ocidentais vivem em uma época em que quase tudo pode ser comprado e vendido, de um modo tal que os valores de mercado passaram a governar inexoravelmente a vida em sociedade como nunca antes registrado na história da humanidade.  Alerta, porém, o autor, que não se chegou a essa situação por escolha deliberada. É quase como se a coisa tivesse se abatido sobre homens e mulheres do século XX por diante.

Então, escudado pelo pensamento de Sandel, é que neste artigo ousa-se a defender a ideia de que não se pode apontar acusativamente de modo impiedoso para o advogado, que por vezes peca contra a ética em nome da sobrevivência material, pois não foi sua escolha o mundo que aí está.

Neste mesmo raciocínio, Sandel assevera que numa sociedade em que tudo está à venda, a vida fica mais difícil para os que dispõem de recursos modestos. De nossa parte asseveramos que quanto mais dinheiro se tem mais se pode consumir, e quanto mais se consome, mais se é aceito e louvado na vida em sociedade. Do outro lado, aqueles que de pouco dinheiro dispõem, pouco consomem, e se pouco consomem, pouco são vistos pela sociedade, senão são vistos como a escória indesejável.  

Para a constatação de pressupostos deste artigo científico foram selecionadas algumas dentre as várias perguntas feitas pelos alunos do Projeto Integrador do 8º período da UNIAGES, no segundo semestre do ano de 2015, a advogados iniciantes na carreira, as quais serão transcritas a seguir procedidas de suas respectivas respostas, o que vem bem ao encontro das discussões realizadas no presente tópico. Senão vejamos:

A primeira pergunta do Projeto Integrador selecionada para esta discussão foi aquela em que os entrevistadores indagaram aos novos advogados sobre sua opinião a respeito da remuneração conferida à classe. Perguntaram o seguinte: “ Na sua opinião, como o mercado remunera os profissionais de sua área? “. Vejam-se, então, algumas das respostas a essa indagação:

“O mercado está remunerando mal, porque a correspondência, além de que o profissional não está se valorizando, porque está aceitando ser representante por correspondência, vai participar de uma audiência pra ganhar R$ 100,00 ( cem reais). O advogado tem que se respeitar e respeitar também a justiça, chegar ao ponto de ganhar R$ 50,00 pra tirar Xerox de processo, então a própria desvalorização e muitas vezes a necessidade, fazem com quer o cara faça isso. Mas todos eles que estão começando a vida tem que fazer determinada coisa. Mas com a visão de que futuramente não vai fazer esse tipo de coisa, se sujeitar esse tipo de coisa que sinceramente é feio pra profissão. Agora em termo de ganho a uma certa concorrência desleal, onde o cliente procura você dá um preço e lá na frente outro profissional baixa esse preço pra pegar clientela, certo tipos de leilões de causa.(Projeto Integrador UINIAGES, 2º semestre 2015).” (grifo nosso)

Vê-se nitidamente na resposta do entrevistado que certos valores éticos são desrespeitados em busca de dinheiro, até mesmo em busca de um ganho irrisório. Valores como o respeito e a lealdade ao colega de profissão deixam de ser observados quando profissionais da advocacia se sujeitam a patrocinar causa a preços humilhantes. Mas, se o fazem não o fazem por querer e sim por necessidade mesmo material. Flagrante, então, aqui se denota o conflito entre a Ética e o Capital. 

Vejamos outra resposta a mesma indagação:

“A profissão do Advogado, considerando os valores propostos na tabela de honorários da OAB, seria muito bem remunerada. Contudo, considerando os valores propostos por empregadores ou  ausência de riquezas em nossa região, a realidade está muito distante. (Projeto Integrador UINIAGES, 2º semestre 2015).” (grifo nosso)

Percebe-se que nessa resposta a questão social aparece como uma das responsáveis pela remuneração insatisfatória do advogado em começo de atividade, pois se a região possui uma economia precária isso se transmite aos rendimentos de todos os profissionais, inclusive, o advogado.

Em O que o dinheiro não compra: os limites morais do mercado, seu autor, Michael Sandel procede a uma análise crítica acerca da cada vez mais frequente mercantilização da vida moral, análise está que indubitavelmente se presta à reflexão acerca do conflito investigado nesta produção acadêmica.

Se no mundo hodierno, em especial após a segunda guerra mundial, conforme adverte Sandel, quase tudo passou a ser objeto de mercantilização, de certo modo, mesmo que haja proibição expressa nos diplomas reguladores da advocacia, a profissão do advogado vez por outra também trilha esse mesmo destino.

Advirta-se, contudo, tomando por base as reflexões de Michel Sandel, que muitas coisas não podem ser encontradas no mercado, a exemplo de família, o meio ambiente, a saúde, pois tais valores não são mercadorias, logo não possuem um preço e não são bens com os quais se possam manejar para aferir lucro.

De certo modo, aquilo que diz respeito à dignidade da pessoa humana não pode e geralmente não se torna mesmo objeto de mercantilização, de um modo que as pessoas necessitam aprender a viver conquistando certos valores sem que tenham que dispor de dinheiro para isso. Essa lição, às vezes de difícil assimilação, deve ser enfrentada pelos advogados, especialmente por aqueles em início de carreira.

Veja-se, a tal respeito, a seguinte pergunta elaborada pelos alunos do Projeto Integrador UNIAGES 2015: “O mercado de trabalho comporta vagas de trabalho suficiente para a quantidade de formandos anualmente no ramo do direito?

A essa indagação uma das repostas se mostrou crucial ao entendimento do equilíbrio que aqui se busca entre a Ética e o Capital. O advogado entrevistado respondeu o seguinte: “Sim. Sempre irá se destacar quem prestar os melhores serviços. Honestidade com os clientes é fundamental. “Jogar limpo” é o melhor jogo. O mercado comporta quem tiver qualidade e honestidade. Quem não tiver, ficará no caminho.” (Projeto Integrador UINIAGES, 2º semestre 2015). (grifo nosso).

Esta situação de mercantilização da vida ocorre, sobretudo, por conta de nossa opção, ou mais acertadamente da imposição, do sistema capitalista como nosso modelo econômico global. O dinheiro e o consumo se tornaram os norteadores de nossas ambições e ações.   

Não restam dúvidas de que o poderio econômico segrega classes, arrastando aquelas menos favorecidas de recursos a uma situação de periferia social. Somos todos humanos, mas não somos todos iguais. O poder consumir e o não poder consumir nos fazem tão diferentes que até dá para se indagar se somos de fato espécies do mesmo gênero.       

Não obstante a crescente mercantilização da vida, valores de ordem moral ainda há que por sua natureza não se prestam e nem cedem mesmo ao poderio econômico. São ‘riquezas’ da alma, acessíveis a todos aqueles humanos que optam pelo bem, que fazem suas escolhas norteados pela justiça e pelo amor. De um modo tal que também para o advogado em começo de carreira essas lições são salutares: “na vida se colhe o que se planta.”      

2. ENTRE A ÉTICA E O CAPITAL        

Não raras vezes, em seu mister profissional, o advogado se depara com situações em que de um lado lhe acena a possibilidade de lucro e do outro lado, em perfeita oposição,  a ética reclama uma tomada de atitude positiva. Para encetar essa discussão, vejam-se a seguir algumas reflexões de John Grisham, produzidas em seu romance intitulado ‘O Advogado’.                           

Em ‘O advogado’, John Grisham traz o drama de um jovem e talentoso advogado chamado Michael que trabalhava já há alguns anos em uma poderosa firma de advogados em Washington, mas um acontecimento inesperado lhe leva a romper escandalosamente com seu estilo de vida. 

Juntamente com outros advogados da mesma firma, Michael é mantido refém por um sem-teto e após ouvir as razões e as queixas do sem-teto em relação às injustiças sociais experimentadas por ele e por sua gente, Michael passa a refletir sobre sua postura diante da vida. Investigando o mendigo ele descobre se tratar de um veterano de guerra, perturbado psiquicamente, e ainda descobre um segredo comprometedor em relação a sua firma de advogados. Então, Michael resolve mudar de vida, abandonando a firma e passando a advogar a causa dos sem-teto.

Não obstante se tratar de ficção, o romance de Grisham revela no drama de seu protagonista uma realidade com a qual por vezes se depara o advogado em qualquer momento da carreira, e com muito mais significado psicológico o advogado em início de carreira. De fato, às vezes entram em confronto duas realidades sociais opostas e conflitantes, de um lado a riqueza e o luxo desmedido, de outro a miséria e o desprezo como marcas indeléveis de uma classe social segregada.

O advogado deverá tomar sua decisão, nunca se esquecendo de que o que sobra de um lado é justamente a exata medida do que falta do outro lado. Tal realidade se fomenta no sistema capitalista de economia e política vivenciado pelo mundo ocidental hodierno, em que oportunamente (oportuno para os senhores do capital) se remete para a marginalidade, e muitas vezes para a marginalidade rotulada de criminosa, aquela parcela da população que não serve aos detentores do capital. Não serve porque não possui condições de consumir.

Aos poderosos da economia capitalista somente interessam os consumidores de seus produtos e a mão-de-obra barata, eficiente e pacata. Inclusive, a esses senhores também interessa o advogado barato, pacato e cego às injustiças sociais. No entanto, como esta produção se pretende científica e não moralista, advirta-se, em especial aos novos advogados e estudantes de Direito, que conforme John Grisham revela em seu romance, na vida, tantas vezes, o preço de se lutar pela verdadeira justiça é bastante caro e muitos não estão dispostos a pagar.

Ser ético exige uma coragem e uma determinação que nem todos as personalidades possuem condições de apresentá-las, justamente por temer as represálias daqueles poderosos a quem muito agrada a atual situação, o atual status quo.

Mas, não há motivos para desânimo daqueles que apostam na ética, pois às vezes o esforço, a obstinação e o zelo ético prevalecem sobre as “trevas” do egoísmo, da ganância e da insensibilidade. O aparente lucro em determinado aspecto do viver, pode se revelar prejuízo irremediável em outros aspectos da vida. Nós humanos, somos multidimensionais de tal modo que necessitamos de equilíbrio entre as diferentes dimensões para sermos plenos.  

Além do romance de John Grisham acima referido, para o presente capítulo buscou-se também a orientação do grande jurista Rui Barbosa de Oliveira que em sua obra intitulada Carta aos Moços traz revigorantes lições morais que se observadas servirão de norte ao advogado em começo de carreira no momento de resolver os conflitos advindos entre o Capital e a Ética.

Antes de irmos a Rui Barbosa, vejamos mais uma pergunta elaborada pelos alunos do Projeto Integrador UNIAGES 2015: “Quais as dificuldades de um advogado recém-formado? O que mais decepciona e o que mais agrada no exercício da profissão?”.

A essa indagação aqui selecionamos duas respostas dos advogados entrevistados que muito bem se prestam às reflexões que se seguirão norteadas pelo pensamento de Rui Babosa.

“As dificuldades são as mesmas para todas as profissões, creio eu. Sempre existirá aquela insegurança no início da carreira, bem como faltará alguém que lhe ajude a dar os primeiros passos. Mas com o tempo as pessoas começam a te dar credibilidade e tudo fica mais fácil com a divulgação de um bom trabalho prestado. O que mais me decepciona na profissão é a desvalorização do trabalho prestado. Tanto por parte da sociedade, quanto das autoridades que não enxergam que o Advogado é indispensável à administração da justiça. Mas isso está mudando. O que mais me agrada é ser reconhecido com um bom profissional, não só financeiramente. Um simples elogio já te dá mais força para continuar. (Projeto Integrador UINIAGES, 2º semestre 2015).” (grifo nosso)

Pelo teor dessa resposta se percebe nitidamente que o advogado em começo de atividade carece de quem lhes oriente com conselhos salutares, o que conforme se verá logo mais à frente, Rui Barbosa o fez muito bem. Porém, antes de irmos ao grande jurista brasileiro, vejamos a segunda resposta selecionada.  

“Formar uma carteira de clientes para poder ocupar um espaço no mercado é a maior dificuldade, pois o advogado recém-formado é sempre olhando com desconfiança, seja pela inexperiência profissional ou por não estar previamente inserido no meio jurídico. O que é mais decepcionante na profissão é o advogado se deparar com um Judiciário moroso e arbitrário, seja através de Magistrados que agem de maneira parcial e por serventuários que se portam nos cartórios como se estivesse na sala das suas casas. Claro que há exceções! Promover a justiça garantindo a parte que você representa o bem da vida, é o que mais agrada na profissão. (Projeto Integrador UINIAGES, 2º semestre 2015).” (grifo nosso)

Como forma de orientação aos advogados neófitos para lhes ajudar nas dúvidas e angústias de um começo de carreira, conforme se deduz das duas entrevistas acima descritas, tem-se em Oração aos Moços, uma carta que Rui Barbosa escreveu aos formandos da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, um norte salutar. Na verdade não se trata de uma simples carta, mas de um escrito com fins didáticos e literários, escrita por Rui Barbosa em 1920, quando Rui Barbosa se encontrava já bastante idoso e com graves problemas de saúde, motivos pelos quais não pôde comparecer à formatura dos discentes da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em que seria paraninfo. Logo, para compensar, enviou-lhes a carta que foi lida na solenidade pelo professor Reinaldo Porchat em março de 1921.

A carta trata principalmente de Ética Profissional, mas também tece críticas à legislação pátria por seu caráter corporativista voltado aos interesses das elites econômicas dominantes. De um modo quase didático Rui Barbosa tece a missão do advogado como a de um sujeito processual indispensável à realização da justiça, mas de uma justiça pensada e organizada em benefício dos privilégios de uma minoria poderosa e em detrimento dos mais necessitados.

 Assim, Rui Barbosa conclama aos novos advogados e a operadores outros do Direito que não desanimem na luta pela igualdade perante a Justiça, sempre se esmerando pela ética e pela moral.  

O celebrado mestre jurista exalta a juventude daqueles novos operadores do Direito, mostrando-se contente por eles ainda não estarem corrompidos pelo sistema. Ele próprio se mostra satisfeito por ter a oportunidade de no final de sua carreira se encontrar com iniciantes, pois aí surge a possibilidade de transmitir sua experiência, fazer todos os alertas necessários, exortar ao bom caminho e, como se o grande entusiasmo de Rui Barbosa neste momento se desse pelo fato de ele vislumbrar a continuação de seus valores ético-jurídicos naqueles novos operadores do Direito.       

Rui Barbosa anuncia sua intenção de aconselhar os formando, a partir de sua própria experiência, nos caminhos do mundo jurídico. Porém, antes de se ater às questões atinentes ao Direito, Rui Barbosa faz uma reflexão sobre a própria existência humana na Terra, dialogando sobre a inevitabilidade da morte e sobre a necessidade de se preparar para a receber serenamente.

Na sequência, Rui Barbosa se esforça para desfazer mitos a seu respeito e se revela como um ser humano qualquer, com defeitos e medos. Ensina aos jovens juristas que não há outro caminho para o conhecimento que não seja o do estudo disciplinado, dando seu próprio exemplo de muito ter estudado nas madrugadas e nos inícios de manhã. Quer fazer os formando acreditar que o conhecimento é fruto muito mais do esforço disciplinado do que da inspiração.

Por fim, Rui Barbosa mergulha de vez na crítica ao sistema, aconselhando de um modo veemente que aqueles novos operadores do Direito não se deixem acomodar diante das injustiças sociais perpetradas na própria legislação pátria, mas que lutem incansavelmente pela transformação.

Incita aos jovens, para quando operarem o Direito, não se deixarem transformar em aduladores do Estado, sempre lhe reconhecendo a razão em detrimento dos interesses legítimos e justos do particular. Também dá conselhos de natureza estratégica para o procedimento em juízo, mostrando os inconvenientes de se acusar com muita empáfia os réus, pois, como se diz no dito popular, o tiro pode sair pela culatra.         

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É bem certo que nos dias atuais, sobretudo, no mundo capitalista ocidental, quase nada escapa à força do dinheiro. Nem mesmo certos atributos tão íntimos de nossa personalidade, a exemplo do próprio nome que por tantas vezes se torna objeto de mercantilização. Vende-se e se compra tudo: mercadorias, o tempo, o voto, os corpos para prazeres sexuais alheios, e como não poderia ser diferente, vende-se também o dever de ética profissional. 

É neste mundo mercantilizado e insensível aos valores da moral que o novo advogado é inserido para nele atuar. Muitas das vezes o advogado se lança na profissão levando consigo tão-somente a inexperiência e muitas dívidas contraídas no passado, além das necessidades prementes do dia-a-dia. Logo, não é fácil ao advogado neófito assumir uma postura intransigente diante das possibilidades de flexibilizar o dever ético ante aos apelos do capital.    

Esta situação de mercantilização da vida ocorre, sobretudo, por conta de nossa opção, ou mais acertadamente da imposição, do sistema capitalista como nosso modelo econômico global. O dinheiro e o consumo se tornaram os norteadores de nossas ambições e ações.   

Não restam dúvidas de que o poderio econômico segrega classes, arrastando aquelas menos favorecidas de recursos a uma situação de periferia social. Somos todos humanos, mas não somos todos iguais. O poder consumir e o não poder consumir nos fazem tão diferentes que até dá para se indagar se somos de fato espécies do mesmo gênero.       

Não obstante a crescente mercantilização da vida, valores de ordem moral ainda há que por sua natureza não se prestam e nem cedem mesmo ao poderio econômico. São ‘riquezas’ da alma, acessíveis a todos aqueles humanos que optam pelo bem, que fazem suas escolhas norteados pela justiça e pelo amor.

Lembre-se, então, o novo advogado, não somente no início de sua carreira, mas em toda sua trajetória profissional, que lutar para conseguir dinheiro é salutar e indispensável no mundo em que se vive. Porém, certas coisas não são objeto de mercantilização, certos valores não possuem um preço, a exemplo da família, do meio ambiente, da saúde, pois tais valores não são mercadorias, logo não possuem um preço e não são bens com os quais se possam manejar para aferir lucro.

De certo modo, aquilo que diz respeito à dignidade da pessoa humana não pode e geralmente não se torna mesmo objeto de mercantilização, de tal maneira que as pessoas necessitam aprender a viver conquistando certos valores sem que tenham que dispor de dinheiro para isso. 

Ao advogado instável ainda na profissão e atormentado pelas muitas necessidades materiais, exige-se apenas o mínimo ético. Exige que a cada decisão, a cada sim, a cada não, reflita antes sobre os valores que estão em jogo, de um modo que jamais atente contra o sentimento de justiça, nem abra mão da sua própria dignidade.

 

Referências
GRISHAM, John. O Advogado. São Paulo: Editora Rocco, 1998. 
OLIVEIRA, Rui Barbosa de. Oração aos Moços. Rio de Janeiro: Edições Casa de Rui Barbosa, 1999.
SANDEL, Michael J. O que o Dinheiro não Compra: os limites do mercado. Tradução de Clóvis Marques. 5º ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013.
Projeto Integrador do 8º período do Curso de Direito, segundo semestre. Paripiranga: UNIAGES, 2015. 
 
Nota:
[1] Trabalho orientado pelo Prof. Bernardo Cecílio da Fonseca. Especialista em Gestão de Direito Ambiental pela Universidade de Uberaba. Mestre em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas. Professor da UNIAGES.


Informações Sobre o Autor

Eraldo Oliveira de Almeida

Acadêmico da UNIAGES Paripiranga/BA


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