É possível que, por vezes, alguém que não faz parte de um processo judicial se veja numa situação de sofrer os efeitos de determinada ação judicial.
Ao ser atingido por uma ação judicial, a esse alguém é facultado o direito de ajuizar embargos de terceiro.
Portanto, quando o processo de execução configura constrições ao patrimônio de terceiros, a primeira preocupação que vem à tona é sobre as defesas cabíveis.
Assim, não são raros os casos em que os juízes extrapolam os bens do devedor, alcançando bens de terceiros com algum tipo de constrição judicial.
Isso pode acontecer por causa de um anseio muito comum de se garantir o cumprimento das sentenças.
Todavia, o ordenamento jurídico prevê um importante mecanismo para garantir que os direitos de terceiros não sejam prejudicados nesses casos, como no caso dos embargos de terceiro.
Nesse sentido, é importante entender bem sobre o cabimento dos embargos de terceiro, como veremos mais adiante neste artigo.
Podemos conceber os embargos de terceiro como um tipo de ação judicial que visa proteger a posse ou propriedade de um bem apreendido por decisão judicial proferida em processo do qual o possuidor ou proprietário não fez parte.
As regras referentes aos embargos de terceiro estão previstas no título relacionado aos procedimentos especiais do Código de Processo Civil.
Assim, os embargos de terceiro, apesar de serem ajuizados no decorrer do processo, não possuem natureza de recurso, mas sim de ação.
Dessa maneira, os embargos de terceiros, bem como outros procedimentos especiais, possuem efeitos diversos.
O primeiro dos efeitos dos embargos de terceiro é o efeito declaratório, pois visa declarar ilegítimo o ato executivo que constringe o bem.
Além disso, os embargos de terceiro possuem efeito constitutivo, já que reconhece a existência de um direito.
Ainda, os embargos de terceiro possuem efeitos executórios, pois poderá determinar, de forma prática, a liberação de um bem.
Neste artigo vamos estudar essas e mais questões relacionadas à ação de embargos de terceiro.
Mas antes de mais nada, vamos procurar definir melhor o conceito de embargos de terceiro, como veremos a seguir.
Afinal, o que são embargos de terceiro?
Apesar dos efeitos de uma decisão jurisdicional geralmente se circunscrever à esfera jurídica das partes, é possível que eles afetem a relação jurídica de terceiro, que de alguma maneira possui algum tipo de vinculação com a relação objeto do processo.
Para estes terceiros, o ordenamento jurídico pátrio disponibiliza instrumento jurídico adequado que lhes permite intervir no processo.
O objetivo dessa intervenção é de influenciar o resultado, de modo que a decisão judicial possa conferir a tutela jurisdicional adequada aos interesses por eles defendidos.
Nesses cenários é que podemos observar estar inserido o instituto dos embargos de terceiros.
Surge nos casos do pronunciamento do órgão jurisdicional, com força de constringir a esfera jurídica de terceiro estranho ao processo e que não possui qualquer interesse jurídico relacionado à questão posta em juízo.
Ainda, pode ser que a constrição judicial vise a uma das partes, porém sobre esfera de seu patrimônio que a rigor escaparia de sua responsabilidade patrimonial, atingindo um terceiro.
Este terceiro, além de estranho ao processo, não se encontra em posição jurídica que justifique sua intervenção na relação processual.
Para poder integrar ao processo, e com isso influenciar o resultado final, uma vez que vê-se afetado em sua esfera jurídica, o ordenamento jurídico confere ao terceiro a possibilidade de ajuizar embargos de terceiros.
Portanto, a quem por força de decisão judicial proferida em processo de conhecimento, cumprimento de sentença ou processo de execução, sofrer ameaça ou ter efetivada turbação ou esbulho sobre bem seu, não sujeito à execução, é dada a possibilidade de propor ação de embargos de terceiro.
A ação de embargos de terceiro é voltada à obtenção de tutela que iniba ou que desfaça o ato indevido de apreensão judicial.
Dessa maneira, a pretensão do embargante é voltada a fazer cessar a eficácia de ato praticado no curso de processo jurisdicional.
Logo, o objetivo dos embargos de terceiro é possibilitar que alguém, não parte do processo em questão, possa defender seus bens que sejam indevidamente alvo de algum tipo de constrição dentro da demanda judicial.
Destarte, os embargos de terceiro constituem demanda à disposição daquele que, não sendo responsável patrimonial, ou possuindo bem específico que escapa a esta responsabilidade, sofre sobre seu patrimônio a prática de turbação ou de esbulho perpetrado por força de decisão judicial.
Resumidamente, podemos dizer que os embargos de terceiro são um instrumento pelo qual a pessoa que não é parte de um processo, mas, mesmo assim tem algum bem bloqueado por ordem judicial, pode utilizar para fazer cessar a constrição indevida.
Cabe ressaltar que os embargos de terceiro são um procedimento especial disposto no Código de Processo Civil de 2015, como analisaremos a seguir. Mas antes, vamos analisar algumas mudanças recentes.
Alterações dos embargos de terceiro no NCPC
Os embargos de terceiro já estavam previstos no Código de Processo Civil de 1973, não sendo uma novidade do NCPC. Por outro lado, o Código de Processo Civil de 2015 apresenta algumas mudanças sobre o assunto.
Primeiramente, houve uma ampliação do conceito de “terceiro” para a interposição dos embargos de terceiro, possibilitando uma compreensão maior de quais são os legitimados para propor tal ação.
Nesse sentido, houve uma ampliação do conceito para passar a ser o terceiro proprietário ou fiduciário, não apenas o possuidor, como leciona Humberto Theodoro Júnior.
Em segundo lugar, uma mudança foi a codificação de entendimentos já consolidados na jurisprudência dos tribunais, incluindo a possibilidade dos embargos de terceiro mediante a ameaça de constrição sobre o bem indevido.
Por fim, outra novidade operada no Código de 2015 foi a solidificação da possibilidade de interposição dos embargos de terceiro a qualquer momento do processo, respeitando a exceção de trânsito em julgado da sentença final.
Isso pode se aplicar tanto no processo de execução, como no cumprimento de sentença da adjudicação, alienação por iniciativa particular ou arrematação, excluído o caso de remição.
Assim, os embargos de terceiro podem ser opostos a qualquer tempo, enquanto a sentença não transita em julgado.
O que diz o Código de Processo Civil?
Os embargos de terceiro são um instituto previsto no Capítulo VII, do Título III do CPC. Mais especificamente nos artigos 674 a 681.
Os embargos de terceiro estão, portanto, situados em meio aos procedimentos especiais de jurisdição contenciosa.
Em relação aos embargos de terceiro, Código versa sobre:
- legitimidade ativa (art. 674);
- momento para seu ajuizamento (art. 675);
- competência (art. 676);
- petição inicial, citação, legitimidade passiva (art. 677);
- efeitos da decisão de procedência (arts. 678 e 681);
- defesa e seus limites (arts. 679 e 680).
Assim, o CPC determina que os embargos de terceiro são uma possibilidade para que uma pessoa de fora do processo possa pedir para que os seus bens, alvos de arresto, sequestro, penhora ou outras formas de ameaça não se envolvam na disputa.
Analisemos o texto do Código de Processo Civil, que dispõe em seu artigo 674:
Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro.
Dessa maneira, podemos dizer que os embargos de terceiro são uma forma legal de consertar um equívoco cometido por uma das partes envolvidas no processo ao demandar a constrição de um bem que não tem ligação com a demanda em questão.
Como funcionam os embargos de terceiro?
Já vimos que os embargos de terceiro são um procedimento especial que faz com que uma pessoa de fora do processo entre nele para defender seu direito sobre bens que sofreram ou venham a sofrer algum tipo de constrição.
De tal forma que os embargos de terceiro possuem seus próprios regramentos, a respeito do momento de ingresso do pedido, legitimados ativos, dentre outros.
Analisaremos agora os requisitos para o ingresso dos embargos de terceiro, bem como o seu trâmite.
Dos requisitos para embargos de terceiro
Através do o que já foi apresentado, podemos estabelecer os requisitos primordiais, sem os quais o ajuizamento de embargos de terceiro não pode ser caracterizado.
Cabe lembrar que, nos embargos de terceiro, não é necessário que o bem seja indevidamente capturado para ingressar com a ação, bastando a comprovação de que há uma ameaça iminente de que isso ocorra.
Sendo assim, a título de exemplo, o terceiro interessado em proteger os seus bens pode ajuizar embargos de terceiro no momento em que uma das partes indicar incorretamente um bem como elegível para penhora da parte ré do processo.
Dessa forma, o requisito principal para a interposição de embargos de terceiro em um processo é que o bem de um terceiro alheio ao processo esteja sob ameaça ou tenha sido indevidamente indicado para constrição.
Ainda, um outro requisito para os embargos de terceiro é que a parte que ingressa com o pedido seja alheia ao processo, isto é, que não seja uma das partes ou que não esteja envolvida nele de qualquer outra forma.
Da legitimidade ativa
Apesar de que, pelo nome do procedimento, se indique que a pessoa que interpõe embargos de terceiro seja alguém alheio ao processo e suas partes, é crucial saber quem pode ser elegível para entrar com a ação.
As pessoas entendidas como terceiros, aptas a entrar com os embargos são definidas pelo Código de Processo Civil nos parágrafos 1º e 2º do artigo 674, são:
- o terceiro proprietário, inclusive fiduciário, ou possuidor;
- o cônjuge ou companheiro, quando defende a posse de bens próprios ou de sua meação, ressalvado o disposto no art. 843;
- o adquirente de bens cuja constrição decorreu de decisão que declara a ineficácia da alienação realizada em fraude à execução;
- quem sofre constrição judicial de seus bens por força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte;
- o credor com garantia real para obstar expropriação judicial do objeto de direito real de garantia, caso não tenha sido intimado, nos termos legais dos atos expropriatórios respectivos.
Pelas definições, o legislador definiu o terceiro como, além do proprietário do bem que está indevidamente sendo alvo de algum tipo de constrição, também o possuidor do bem ou até o proprietário fiduciário do mesmo.
Ademais, deve-se entender como terceiro, além das pessoas que são possuidoras do bem em questão, seja direta ou indiretamente, mas também algum credor que já tenha garantia real de expropriação judicial do bem em questão.
Outrossim, o terceiro, para os embargos de terceiro, pode ser entendido como algum outro credor que ainda não tenha o bem como o seu, mas seja detentor do título judicial que garante que o bem em questão é legalmente dele.
Do momento para seu ajuizamento
Quanto ao tempo do ajuizamento dos embargos de terceiro pelo terceiro, o CPC dispõe em seu artigo 675:
Art. 675. Os embargos podem ser opostos a qualquer tempo no processo de conhecimento enquanto não transitada em julgado a sentença e, no cumprimento de sentença ou no processo de execução, até 5 (cinco) dias depois da adjudicação, da alienação por iniciativa particular ou da arrematação, mas sempre antes da assinatura da respectiva carta.
Assim sendo, o terceiro embargante poderá entrar com embargos de terceiro a qualquer momento durante o processo de conhecimento.
Só não é admitido quando transite em julgado a sentença que leva consigo a restrição do bem indevidamente apontado no processo.
Importa destacar que é possível entrar com os embargos de terceiro até no momento do cumprimento de sentença, em até cinco dias após a adjudicação, alienação ou arrematação, mas sempre antes que a respectiva carta seja assinada.
Já após a assinatura da referida carta que compromete o bem indevidamente à sua respectiva constrição legal, o processo para que o terceiro o reveja torna-se muito mais complexo e demorado.
Da competência
O Código de Processo Civil indica qual é o juiz responsável para analisar o pedido de embargos de terceiro em seu artigo 676.
De acordo com o referido dispositivo legal, a responsabilidade de analisar o caso é do próprio juiz que autorizou a constrição do bem indevidamente.
Importa destacar o parágrafo único mesmo artigo determina que os embargos de terceiro são oferecidos no juízo deprecado em situação onde a constrição do bem é realizada através de uma carta precatória, voltando ao juízo responsável se a carta já tiver sido devolvida ou se o bem for indicado pelo juízo deprecante.
Dos efeitos da decisão de procedência
Em relação aos efeitos, cabe ao terceiro embargante demonstrar, já na petição inicial, que o bem ameaçado de constrição ou constringido é seu, apresentando as provas ou testemunhais da posse ou propriedade.
Sendo assim, ao apresentar o pedido de embargos de terceiro, as partes envolvidas no processo possuem o prazo de 15 dias úteis para apresentar suas contrarrazões.
Já quando o terceiro envolvido é um credor com garantia real sobre o bem constringido, o embargado pode alegar apenas três coisas sobre os embargos de terceiro, conforme dispõe o artigo 680:
- o devedor comum é insolvente;
- o título é nulo ou não obriga a terceiro;
- é outra a coisa dada em garantia.
Quem entra com embargos de terceiro pode atribuir como embargado tanto a parte credora como a parte devedora da ação, já que ambas se beneficiariam da constrição indevida do bem alheio.
Isso ocorre porque o credor, que apontou o bem como passível de apreensão, se beneficia por buscar o título de compensação sobre um bem que não é do devedor.
Por outro lado, o devedor se beneficia por ter indicado um bem que legalmente não é seu, utilizando-o como forma de quitação da dívida.
Ainda, como efeito caso o juiz responsável entenda como procedente os embargos de terceiro, ordenará a suspensão da constrição sobre o bem, reconhecendo a incompatibilidade do mesmo com o processo que segue.
Dessa forma, destaca-se que os efeitos da decisão procedente dos embargos de terceiro estão previstos no artigo 678 do CPC.
Mas impera destacar que a suspensão não é sobre a matéria do processo em si, mas especificamente sobre a constrição colocada no bem do terceiro não envolvido na demanda judicial.
De qualquer maneira, é possível que o juiz, ao acatar os embargos de terceiro, determine a prestação de caução para que o bem indevidamente incluído no processo seja liberado do mesmo, com o objetivo de garantir que não se prejudique o processo principal.
Ainda, quando acolhidos os embargos de terceiro, resulta a exclusão do bem que foi constringido indevidamente no processo, reconhecendo a incompatibilidade do bem com a demanda, de acordo com o artigo 681 do CPC.
Conclusão
Como sabemos, o processo civil contempla situações onde a constrição de bens é algo necessário para se efetivar o pagamento de dívidas entre partes.
Dessa maneira, é possível que por vezes, os bens sejam indevidamente selecionados para o pagamento de tais dívidas. Assim, os embargos de terceiro são o remédio jurídico cabível para combater esse tipo de erro.
Este artigo, teve por objetivo apresentar o que são embargos de terceiro, discorrendo sobre o seu funcionamento dado pelo Código de Processo Civil de 2015.
Abordamos diversos aspectos sobre embargos de terceiro, indicando como funciona, qual o seu trâmite processual e outras discussões sobre o assunto.
Estudamos neste artigo que o mecanismo dos embargos de terceiro tem como objetivo proteger os bens de um alguém não envolvido no processo de uma alienação indevida, já que nem ele, nem seus bens, têm relação direta com a demanda judicial em questão.
Vimos que esse estudo é imprescindível, pois a possibilidade legal dos embargos de terceiro, não implica só nos direitos do terceiro, mas de todos os envolvidos no processo.
Fizemos uma breve revisão das alterações do referido instituto de embargos de terceiro, comparando as atualizações trazidas pelo Novo Código de Processo Civil, em relação ao diploma de 1973.
Na sequência, também nos detivemos sobre a análise do texto legal referente aos embargos de terceiro, insculpido no Código de Processo Civil de 2015, em capítulo específico.
Através das definições da letra da lei, avançamos nosso estudo para compreender o funcionamento dos embargos de terceiro no processo.
Analisamos mais detalhadamente sobre os requisitos necessários para que se caracterize os embargos de terceiro.
Depois falamos da legitimidade ativa para propositura da ação de embargos de terceiro, delimitando quem que pode ajuizá-la.
Na sequência apontamos o tempo adequado ao ajuizamento dos embargos de terceiro e também a competência para seu julgamento.
Por fim, estudamos sobre os efeitos da decisão procedente dos embargos de terceiro e sua implicação processual.
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