A aposentadoria transformou-se em problema de escala mundial, na medida em que aumenta o envelhecimento das populações, decorrente dos efeitos combinados do desenvolvimento econômico e dos avanços da ciência médica.
O Estado, lamentavelmente, além de cercear cada vez mais os direitos sociais dos cidadãos por meio de intermináveis reformas na Previdência, não se revela eficiente no resguardo da dignidade humana.
Neste contexto, surgiram as entidades de previdência complementar que, facultativas e independentes da Previdência Social, visam complementá-la e não sanar as suas deficiências.
No Brasil não tem sido diferente, com a agravante de que recentemente o Poder Judiciário, na tentativa de pacificar as controvérsias entre participantes e previdência complementar, editou a Súmula 321 que assim reza: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes”.
As impropriedades da Súmula 321, editada em dezembro de 2005, deram-se pela não distinção entre as entidades “ABERTAS” e “FECHADAS” de previdência complementar e por impor tratamento diverso daquele definido pela Constituição Federal.
As entidades fechadas de previdência complementar são frutos de iniciativas de empresas, as quais, visando propiciar padrão digno aos seus empregados quando da inatividade, criaram fundações sem fins lucrativos, cujo patrimônio é exclusivo à concessão e manutenção dos benefícios previdenciários.
Tais empresas cumprem seu papel social não apenas por meio da criação das fundações, mas também pela co-participação na formação da reserva financeira de seus empregados, posto que, não raras vezes, contribuem em igual valor ou em dobro daquele poupado pelo participante.
Note-se, ainda, que o público alvo é restrito, limitando-se aos empregados da(s) empresa(s) patrocinadora(s) e aos associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial.
Já as entidades abertas de previdência complementar destinam-se ao público em geral e normalmente são oferecidas por instituições financeiras, as quais, obviamente, visam o lucro e por isso vendem os planos de aposentadoria mediante remuneração. Nestas não há igual co-participação na formação da reserva financeira.
A atuação dos participantes nas entidades fechadas de previdência complementar é assegurada legalmente por meio da representação no Conselho Deliberativo dessas entidades, ao passo que nas entidades abertas o participante não tem ingerência nos planos de aposentadoria, simplesmente une-se por meio de contrato de adesão.
Ademais, a Constituição Federal (artigo 170, inciso V) inseriu a defesa do consumidor na Ordem Econômica e Financeira e as entidades de previdência complementar na Ordem Social (artigo 202), sendo, portanto, distintos os primados que regem cada qual.
Por todas estas sucintas razões, faz-se evidente que a Súmula 321 do STJ, ainda que sem efeito vinculante (ou seja, não determina necessariamente as decisões dos colegiados inferiores), criou grandes embaraços às entidades fechadas de previdência complementar que, como visto, em nada guardam identidades de consumidor, fornecedor ou relação de consumo no trato com seus participantes.
Fez-se, assim, nova afronta aos direitos sociais agora por vias transversas, posto que, no afã de conceder-se mais do que já definido na Constituição Federal, criaram-se novos obstáculos às empresas privadas que – sem remuneração, tampouco intenção de lucro – apenas têm por fim o desempenho de seu papel social.
Informações Sobre o Autor
Fabiana de Oliveira Cunha Sech
especialista em Direito Civil, advogada e sócia do escritório Idevan Lopes Advocacia & Consultoria Empresarial.