Direito de o servidor acusado apresentar memoriais depois do relatório da comissão e antes do julgamento do processo administrativo disciplinar original ou da sua revisão

Resumo: O artigo procura apresentar o direito de o servidor, tanto na qualidade de acusado ainda ou como de requerente de revisão, apresentar memoriais diante dos órgãos de consultoria jurídica ou a autoridade administrativa decisora, depois do relatório final da comissão e antes do julgamento.


Palavras-chave: Processo administrativo disciplinar e processo de revisão de processo administrativo disciplinar. Direito de o acusado ou de o requerente da revisão apresentar(em) memoriais perante os órgãos de consultoria jurídica ou a autoridade julgadora. Exercício de direito constitucional de petição. Possibilidade pelas regras da Lei federal n. 9.784/1999. Vedação à Administração Pública quanto à recusa de juntada de memoriais.


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1. Introdução


Assunto que não deveria gerar qualquer questionamento concerne à possibilidade de o servidor acusado apresentar memorais perante a autoridade julgadora ou os órgãos de consultoria jurídica, mesmo depois de elaborado o relatório final da comissão de processo administrativo disciplinar ou do conselho processante da revisão do feito disciplinar originário.


Na praxe administrativa, todavia, o que deveria ser um ato de ofício da parte dos órgãos administrativos, às vezes ainda é objeto de arbitrariedades por parte de certos agentes públicos, que tolhem o direito de o servidor ou seu advogado se pronunciarem antes do julgamento do feito punitivo ou revisional, tentando influenciar a autoridade decisora ou os órgãos de consultoria jurídica que elaborarão parecer sobre a responsabilidade funcional ou sobre a anulação da pena imposta ao requerente do processo de revisão.


Supõem alguns que, depois de apresentado o relatório final da comissão de processo administrativo disciplinar ou do conselho processante da revisão, o acusado ou o requerente outrora punido não teria mais a faculdade de falar nos autos, nem sequer apresentar memoriais diante dos órgãos de consultoria jurídica ou da autoridade que julgará o feito.


Não procede, como se demonstrará, o errôneo entendimento cerceador do direito do administrado de falar perante a Administração Pública antes da decisão do feito apenador ou da revisão do processo administrativo disciplinar.


2. Direito de apresentação de memoriais na revisão do processo administrativo disciplinar


A revisão do processo administrativo disciplinar é feito instaurado para rever o teor da decisão apenadora de feito punitivo anterior.


No processo de revisão, o que existe é um colegiado independente (comissão revisora de três servidores), que irá confrontar os trabalhos realizados pela trinca disciplinar original, cujos trabalhos resultaram na demissão-punição do servidor, havendo uma inversão do ônus da prova, que, no feito revisional, compete ao interessado (art. 175, Lei federal n. 8.112/1990), não à Administração Pública.


Não há mais, no processo de revisão, a idéia de pronunciamento da defesa, pronunciamento da acusação, pari passu, pois a Administração Pública, no feito revisional, não tem o ônus de comprovar a tese acusatória e a responsabilidade do servidor demitido, mas, ao contrário, o ex-funcionário requerente é que deve comprovar, com ônus para si, a ilegalidade da punição que lhe foi imposta.


Por isso que não procede a alegação de que o fato de o interessado apresentar um singelo memorial de defesa alteraria o pretenso direito da acusação de se pronunciar concomitantemente e de imediato sobre as razões do servidor.


Não se está, na revisão do processo administrativo disciplinar, num processo penal, em que as partes (Ministério Público ou querelante ou particular no exercício subsidiário da ação penal pública, de um lado, e acusado, de outro) são distintas do Juiz, para se falar do binômio isolado “defesa x acusação”, pois a Administração Pública, unilateralmente, ao mesmo tempo em que é parte, colhe provas e julga o processo administrativo apenador, apesar de fazê-lo por meio de órgãos distintos (comissão de processo administrativo disciplinar, como órgão instrutor, e a autoridade ou órgão colegiado julgador).


De outro ângulo, reside em impropriedade conceitual a tese de que a garantia constitucional de contraditório e do direito de influenciar a decisão do processo deveria ser religiosamente observada no que tange à revisão do processo administrativo disciplinar, com o efeito de devolver-se a palavra à acusação (que nem mais existe no feito revisional, pois a pena já foi imposta no processo originário), no caso de o servidor apresentar um memorial. Ora, é mais que sabido que a garantia constitucional da contraditoriedade e da ampla defesa não foi instituída em proveito do Estado, mas sim como garantia do indivíduo contra o arbítrio estatal, como meio de influenciar a formação de vontade do Poder Público e de carrear suas razões e elementos probatórios como meio de orientar a decisão a ser adotada pelo ente estatal.


O Estado é quem colhe provas, acusa e julga o feito, modo por que jamais terá sido privado de seu direito de pronunciamento contraditorial no feito revisional, mesmo porque a Administração Pública não atua com o risco de sofrer efeitos em sua esfera jurídica por uma decisão a ser proferida por terceiro superior. É a própria Administração quem formulará o ato administrativo decisório final.


O fato de o interessado apresentar suas razões antes da decisão do feito, perante a autoridade julgadora ou os órgãos de consultoria jurídica, em nada desequilibra o direito de punir estatal, sobretudo em se cuidando de processo de revisão, em que a pena já foi aplicada pela Administração Pública, a qual exauriu seu jus puniendi. Sobremais, não é a comissão de processo administrativo disciplinar ou a comissão revisora do feito disciplinar quem tem o exclusivo direito de expressar a vontade do Estado, nem menos ainda as trincas processantes possuem o status de “dominus litis”  da ação disciplinar, não são “parte” no feito administrativo, não têm direitos processuais próprios (diferentemente do Ministério Público quando atua como parte no processo-crime e como senhor da ação penal) a serem preservados, sob pena de nulidade e cerceamento de defesa, pela autoridade julgadora. Não.


A comissão de processo administrativo disciplinar e a comissão de revisão de processo administrativo disciplinar fazem as vezes de órgão de instrução, incumbido da coleta de provas, e meramente opinativo da decisão da autoridade administrativa julgadora. Não existe qualquer “lesão” a um suposto direito do conselho processante revisional de “acusar” ou de “fazer valer sua opinião censuradora” quando a autoridade julgadora, por exemplo, recebe um memorial apresentado pelo ex-servidor punido, antes do julgamento e depois do relatório final.


A comissão de processo administrativo disciplinar e o conselho trino revisional, lembre-se, são órgãos imparciais e isentos, que devem colher as provas e opinar pela culpabilidade ou inocência do servidor acusado, além de que a trinca disciplinar especial designada possui competência temporária, durante a vigência do ato administrativo de designação do colegiado para os ofícios processuais pertinentes, modo por que não haveria razão para, diante de um memorial de defesa, fazer retornar os autos à tríade revisional (que não mais existe, uma vez expirado o lapso temporal de validade do ato que lhe conferiu competência para atuar no feito) para que ela contraditasse os argumentos do interessado.


Quanto à desejada imparcialidade dos colegiados processantes, pede-se vênia para citar lição do nosso Manual de processo administrativo disciplinar e sindicância: à luz da jurisprudência dos tribunais e da casuística da Administração Pública, recentemente lançado (Editora Fortium, 1.072 páginas: www.fortium.com.br – editora – direito administrativo)[1]:


“Refulgente, pois, a importância singular da comissão processante no cenário da instância disciplinar administrativa, porque seu trabalho maior é, oferecendo ampla oportunidade de defesa ao acusado, levantar as provas dos fatos apontados inicialmente como comprobatórios da prática de infração funcional por parte de servidor público e, elucidando plenamente o quadro fático apurado nos autos do processo punitivo, trazer a lume a verdade material e o isento cotejo das razões defensórias do funcionário processado, com vistas a concretizar a justiça. […]


O conselho processante não atua para punir nem para proteger o acusado, mas sim para apurar a verdade, colhendo provas em regime de contraditório, ouvindo e analisando com seriedade os argumentos de defesa, para que se venha a fazer justiça no campo disciplinar.


Eduardo Pinto Pessoa Sobrinho aduz: “A comissão se constitui para apurar acusações, para apurar a verdade, não só para enfeixar documentos e acusar o funcionário; ela tem um objetivo mais alto.”[2]


Mais ainda, o propósito de constituição de comissões, imparciais e independentes, é de concorrer para o correto manejo do poder disciplinar da Administração Pública, absolvendo-se ou punindo-se os desvios de conduta dos servidores públicos na forma legal, de acordo com os princípios constitucionais e infraconstitucionais do processo administrativo e as regras estatutárias disciplinares.


Calha a lição de Carlos S. de Barros Júnior ao enfatizar a função dos colegiados disciplinares: “Trata-se, pois, de órgãos incumbidos de auxiliar as autoridades administrativas, a fim de que estas possam reprimir com acerto as faltas disciplinares, por meio da aplicação de penas justas e adequadas.”[3]


De fato, o papel dos colegiados disciplinares não é construir fundamentos e provas para concretizar a previamente deliberada punição do servidor público, agradando a autoridade superior, ou satisfazendo uma vaidade ou rusga pessoal dos integrantes da comissão contra o acusado, mas de funcionar como um órgão respeitável e idôneo de confirmação da existência, ou não, dos fatos inicialmente apontados como constitutivos de infrações funcionais, aclarando, com eficácia, o conjunto fático para um julgamento seguro, baseado no que realmente ocorreu no caso e na acertada aplicação do direito positivo na espécie.


Missão fundamental do conselho processante é confrontar a acusação inicial e os fatos e provas que lhe davam fundamento, quando instaurado o processo administrativo disciplinar, com os meios probatórios reunidos no curso da instrução, seja por iniciativa oficial ou da defesa, cotejando-os à luz dos argumentos defensórios, considerados de forma honesta e imparcial, tudo para o fim de concluir pelo exato elemento fático da conduta atribuída ao servidor, juntamente com o exame da respectiva culpabilidade ou inocência, para finalmente pugnar pelo que parecer juridicamente recomendado como proposta de julgamento.


Romeu Felipe Bacellar Filho alerta que não é função da Comissão encontrar justificativa e oferecer respaldo à acusação formulada. Ela tem o dever de opinar conclusivamente quanto à inocência ou a responsabilidade do servidor, após apreciação imparcial e independente (em relação aos desígnios da autoridade que a escolheu) da matéria debatida no processo.[4]


Não é dever da comissão pugnar sempre e a todo custo pela punição do servidor, antes a maior missão do colegiado processante é auxiliar no justo exercício do poder disciplinar da Administração Pública.


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Pode o trio instrutor deixar de acusar o servidor e não elaborar termo de indiciação, atendo-se a subscrever termo ou despacho de instrução, em cujo fim recomende a absolvição do acusado, seja porque os argumentos de defesa afastaram a prática do fato ilícito, seja porque as provas reunidas dos autos não permitem a taxativa ilação acerca do cometimento da falta funcional inicialmente atribuída ao funcionário imputado.”


A Administração Pública pode falar mesmo depois da apresentação de petições escritas do interessado, seja por meio de pronunciamento (censurador, inclusive) dos órgãos de consultoria jurídica, seja mesmo pela autoridade decisora, modo por que não ocorre rompimento do “equilíbrio processual” pelo fato da apresentação de um memorial pelo interessado.


3. Possibilidade de apresentação de memoriais no processo administrativo disciplinar ou em sua revisão, apesar da inexistência da fase de razões finais


Sob outro prisma, apesar de não haver a previsão de necessária abertura de prazo a título de fase de razões finais da defesa no processo administrativo disciplinar ou na revisão do processo administrativo disciplinar, após o oferecimento do relatório da comissão processante ou revisora, nada impede, todavia, que o servidor, no exercício do seu direito constitucional de petição, formule memoriais perante os órgãos de consultoria jurídica e decisores da Administração Pública, medidas da mais comum praxe diária da Administração Pública dos entes federados, que é salutar, porque traz luzes e razões que em nada prejudicarão o ato decisório, o qual poderá acolher ou rejeitar o arrazoado, mas não deverá recusar recebê-lo, num Estado democrático de Direito, no qual a ativa participação do cidadão nos processos administrativos de seu interesse não constitui um estorvo ao direito de punir estatal, mas, ao contrário, um meio de assegurar maior transparência, mais probabilidade de se chegar a um ato administrativo decisório final mais próximo da justiça, depois da ampla franquia do direito de oitiva do particular interessado.


Aliás, nossa firme opinião sobre o tema foi vazada em nosso segundo livro e que, por oportuno, se pede novamente vênia para transcrever[5]:


“Ressalve-se, de todo modo, que nada impede que o acusado, pessoalmente ou por seu defensor constituído ou dativo, valendo-se do direito que lhe assiste (arts. 2º, par. único, X; 3º, III; 38, caput, todos da L. 9.784/99), formule alegações e apresente documentos antes da decisão, os quais deverão ser objeto de consideração pelo órgão competente, especialmente em caso de anexação, depois do relatório, de pareceres jurídicos de corregedorias, assessorias ou órgãos jurídicos, ouvidos antes do julgamento, sobretudo quando os pronunciamentos são desfavoráveis ao processado, devendo, nesses casos, ser recebidas as petições e memoriais juntados pelo servidor, visto que é proibida à Administração Pública a recusa imotivada de documentos e alegações (art. 6º, par. único, L. 9.784/99).


Demais, a garantia constitucional do contraditório pressupõe o direito de repelir e formular razões contra fatos e provas, interpretações e conclusões contrárias ao interesse do acusado no processo administrativo.


Isso porque não é raro, na praxe da Administração Pública, o expediente de serem alteradas as acusações contra o acusado, depois do oferecimento do relatório final da comissão processante, por intermédio de pareceres de órgãos de consultoria, assessoria jurídica e corregedorias, quiçá até a juntada de novos documentos ou provas outras, sem concessão de oportunidade de contrapartida processual e reação pertinente pelo servidor.


Nessas hipóteses, não somente haverá de ser deferido o espontâneo exercício do direito de apresentação de razões finais ou requerimento de contraprovas úteis ou necessárias pelo processado, como ainda competirá à autoridade julgadora abrir vista dos autos e prazo pertinente para o mister, caso não tomada a iniciativa pelo funcionário indiciado, sob pena de, comprovado prejuízo para a defesa, acarretar-se a nulidade da pena disciplinar imposta, se embasada nesses novos elementos colacionados.


Não se admite a novidade de linha acusatória sem oportunidade de formal conhecimento prévio e expresso pela defesa antes do julgamento, sob pena de cerceamento e de manifesta deslealdade processual da parte dos órgãos acusadores”.


Léo da Silva Alves[6] também defende a plena possibilidade de o acusado ou seu patrono apresentar(em) memorial – razões finais depois do relatório da comissão de processo administrativo disciplinar:


“Mesmo que o estatuto dos servidores não tenha essa previsão, ela é da natureza de um processo regular e está dentro do conceito de ampla defesa, onde se assegura a manifestação legítima. Portanto, é lícito que o defensor, ao cabo da instrução, apresente à comissão processante as razões finais, demonstrando, sob a ótica da defesa, qual a solução de direito para a causa. Pode apresentá-las, ainda, após o relatório da comissão, com o objetivo de influir no julgamento da autoridade.


José Armando da Costa[7], por sua vez, endossa o perfeito cabimento do memorial, apresentado antes do julgamento e depois do relatório final da comissão, como direito do servidor:


Destarte, entendemos que, ainda na constância do processo administrativo disciplinar sem julgamento, o memorial disciplinar constitui o antídoto mais prático, oportuno, apropriado e expedito.


Ao longo de tal peça de memória cumprirá ao defendente empreender competente esforço para demonstrar – à luz dos elementos probatórios dos autos – que são absolutamente destituídas de fundamentos as conclusões do colegiado processante, e que, diferentemente de tais ilações, são procedentes as suas razões de defesa apresentadas em face do despacho de instrução e indiciação. Em síntese, é este o legítimo escopo do memorial disciplinar.


[…]


Pelo que induz e impõe a exigência da letra “a”, tal expediente deverá ser interposto ainda na constância do processo, em qualquer momento que medeie entre a elaboração do relatório final da comissão e os dias que antecedem o julgamento da autoridade hierárquica competente. Vale enfatizar que o memorial disciplinar somente poderá ser apresentado depois do relatório da comissão, quando ainda não haja ocorrido o julgamento. […]


Se os aspectos esdrúxulos e erráticos gravitam ao redor do direito em tese, e que tais tópicos já foram enfrentados, contrasteados e contrastados na defesa escrita do acusado, nada impede que o memorial a ela se reporte, e que traga à tona, com o devido relevo e vigor, tais tópicos jurídicos, confrontando-os com o ponto de vista técnico adotado pela comissão.


O objetivo primaz do memorial disciplinar é fazer ver à autoridade julgadora que as conclusões da comissão de processo disciplinar – por afrontarem as provas dos autos e por não guardarem razoável consonância com o direito em tese aplicável ao caso – não atendem a legitimidade requisitada pelos dispositivos legais referidos (art. 168, e seu parágrafo único, da Lei nº 8.112/90), devendo, por via de conseqüência, ser rechaçadas na ocasião do julgamento do caso.


(…) o expediente que ora alvitramos deva merecer a honrosa acústica por parte de todos quantos, como parecerista ou autoridade julgadora, venham, depois do oferecimento do relatório final da comissão, opinar, fundamentar ou julgar questões disciplinares, notadamente se levarmos em conta que os argumentos que devam ser expostos em tais memoriais não trazem, ou não devem trazer, nenhuma novidade fática, e sim limitam-se a aclarar e dilucidar ponderáveis aspectos (relacionados à defesa do acusado) que não foram levados em conta por tal colegiado. Havendo, muito pelo contrário, sido truncados, deturpados e escamoteados.


Legitimam, ainda, a articulação de tais memoriais o fato de que – sendo o processo disciplinar tocado, dentre outros, pelo princípio da verdade real – nunca será impérvia a via que (numa última empreitada de busca do restabelecimento da verdade e da justiça), viesse proporcionar, com a demonstração cristalina dos fatos já constantes dos autos, uma escorreita repressão disciplinar, mesmo porque poderá a Administração, à vista de tais pedidos, aferir e rastrear a procedência das razões neles contidas. O que não provocará, por conseguinte, qualquer prejuízo à lisura do processo, ainda mais se levarmos em conta a asserção de que – enfeixando a Administração em suas mãos as funções de acusador, instrutor e julgador – restará incólume a tutela do interesse público, que permanecerá, destarte, automaticamente assegurada e protegida. Sim, porque é a própria Administração que, em face do que possam revelar tais memoriais, irá aferir e decidir sobre a procedência das revelações e demonstrações neles contidas.


Vale enfatizar, por outro lado, que essa mesma segurança não ocorre em relação a quem pretenda um dia louvar-se em tais remédios, haja vista que, bem diferentemente da comissão processante e da autoridade julgadora, que tudo podem e tudo fazem, os acusados em processo disciplinar somente articulam, em fase própria e limitada, a sua defesa escrita, e, mesmo assim, para, no mais das vezes, frustrar-se diante do descaso feito pelos protagonistas mencionados, o quais, fazendo quase sempre ouvidos de mercador às razões da defesa, partem para a industriação de silogismos ocos, inconsistentes e sofismáticos.


Ademais, ressalte-se que o fenômeno da concentração processual – ocorrível na seara da processualística disciplinar e consistente no fato de um mesmo colegiado enfeixar em sua alçada de atribuições as funções de instruir, acusar, e quase julgar, faz com que, na prática, as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa flexionem, para cima ou para baixo, ao talante da boa ou má digestão desses sodalícios processantes, que ora são fleugmáticos, ora são biliosos, conforme as variações do seu estado psicossomático, que costuma trepidar em função deste ou daquele acusado. Por isso é que tais princípios, diante dos descomedimentos dessas comissões, acabam por transformar-se, na maioria das vezes, em meras peças de retórica. Tal errônea supremacia – além de destoar das garantias constitucionais atinentes – é exercitada, na prática, com abrangência ainda bem maior do que a realmente permitida pelos textos legais, os quais, a bem da verdade, não asseguram tão agigantado dimensionamento arbitrário e antidemocrático, como concebem tais comissões.


Deste modo, podemos inferir que o memorial disciplinar aqui recomendado, que deverá consistir num esforço de defesa oponível às equivocadas e maldosas conclusões de comissões de processo administrativo disciplinar – longe de espancar e arrostar qualquer norma do nosso jus positum – encontra-se, a bem da verdade, em perfeita e absoluta consonância e harmonia com os princípios legais e constitucionais atinentes.


Agregue-se que aludida ensancha legal de discórdia – em face da simbiótica e harmoniosa convivência entre as comissões e as autoridades instauradoras e julgadoras – ressoa e projeta-se na prática com diminuta probabilidade de ocorrer, uma vez que tais autoridades, já havendo, na maioria das vezes, feito a escolha e indicação pessoais dos componentes desses colegiados processantes, inclinam-se e propendem-se sempre para prestigiar as suas conclusões, restando, assim, pouco ensejo a possíveis dissenções.


Destaque-se, ainda, que a concentricidade processual aqui execrada (traduzindo-se no julgamento singular realizado, por vezes, pela mesma autoridade que inaugura o procedimento, escolhe e designa os componentes da comissão, interfere em qualquer fase do processo, nomeia defensor dativo ao indiciado revel e, ainda por cima, orienta e influencia os trabalhos apuratórios) – ajuntada à circunstância de que os órgãos jurídicos dessas autoridades, quando instados a opinar sobre esses procedimentos disciplinares que irão a julgamento, limitam-se, vergonhosamente, a examiná-los apenas pelos seus aspectos meramente formais, assim agindo por pusilanimidade ou ignorância – constitui o mais vigoroso fator de propulsão das distorções da processualística disciplinar.


Os setores jurídicos dessas entidades públicas, não fosse a incúria acima denunciada, poderiam evitar muitas injustiças, apontando as discordâncias acaso existentes entre as provas dos autos e as conclusões das comissões, bem como examinando o enquadramento da conduta dos servidores imputados, procurando, assim, verificar se são procedentes, em tese, as increpações que lhes são assestadas, posto que esses órgãos colegiados, não raras vezes, costumam cometer os mais absurdos disparates, chegando a conceber transgressões disciplinares inexistentes ou, quando existentes, dotadas de baixíssimo teor de gravidade”.


4. Violação do contraditório no sistema da Lei federal n. 8.112/1990 pela ausência de razões finais do servidor acusado no processo administrativo disciplinar ou do requerente da revisão


O professor Dr. Romeu Felipe Bacellar Filho[8], em sua obra doutrinária e produto de sua tese de doutorado na Universidade Federal do Paraná, aduz que, na disciplina da Lei federal n. 8.112/1990, o próprio fato de o relatório, que seria as razões finais da comissão de processo administrativo disciplinar, ser apresentado por último, isto é, após a defesa ter se pronunciado, incorre em inconstitucionalidade, pois o servidor teria o direito de falar, com suas razões finais, após a acusação ter formalizado relatório (que assume a natureza de razões finais acusatórias, na hipótese de reprovação da conduta do servidor pelo colegiado processante):


“O relatório constitui as alegações finais do órgão instrutor e acusador (Comissão de Inquérito) […] Com efeito, uma Lei que preveja alegações finais da acusação e não preveja alegações finais da defesa, será inconstitucional por quebrar o liame contraditório a unir a atuação dos sujeitos processuais. A situação de inconstitucionalidade é ainda mais grave quando as alegações finais da acusação cumprem um papel decisivo no processo. É o caso da Lei 8.112/1990, ao determinar que imediatamente após o Relatório, o ´processo disciplinar´ seja remetido à autoridade que determinou sua instauração (art. 166).”


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Tem a mais plena razão o nobre doutrinador, porquanto, se existe uma etapa processual em que a comissão de processo administrativo disciplinar, na hipótese de recomendar a punição do servidor, pode formular as razões finais da acusação, intituladas de relatório no sistema da Lei federal n. 8.112/1990 (art. 166), seria corolário lógico da garantia constitucional do contraditório que o servidor acusado também dispusesse da oportunidade de apresentar suas razões finais, depois da acusação ter se valido de igual prerrogativa.


Se o contraditório envolver a possibilidade de a parte repelir interpretações jurídicas que lhe são desfavoráveis ou críticas sobre a sua conduta, formuladas pelo órgão oficial, seria necessário prever o direito de a defesa ofertar também suas razões finais, depois de o conselho processante ter exercitado essa faculdade.


Daí que a apresentação de memoriais pelo servidor acusado no processo administrativo disciplinar, ou mesmo pelo requerente da revisão do feito disciplinar originário no qual foi imposta punição, vem como instrumento jurídico à guisa de corrigir o desequilíbrio processual e a violação à garantia constitucional de contraditório albergada na disciplina da Lei federal n. 8.112/1990.


Esse juízo foi acolhido pelo colendo Superior Tribunal de Justiça ao sedimentar o juízo de que, se o órgão de consultoria jurídica reenquadrar o fato ou censurar a conduta do servidor, seria nulo, por cerceamento de defesa, o processo administrativo disciplinar se não se oportunizasse ao servidor nova oportunidade de ofertar razões contra as opiniões que lhe são desfavoráveis.


Cumpre assinalar, com efeito, que o acusado tem o direito de se pronunciar acerca do teor de pareceres lançados nos autos após o relatório final da comissão processante, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o qual só não anulou a demissão imposta, porque o julgamento não se embasou nas conclusões formadas nos opinativos posteriores, mas em outras peças do autuado, colhidas durante a ação disciplinar.[9]


Efetivamente, se promovido o reenquadramento jurídico das infrações para infrações mais gravosas ao indiciado, ou se formuladas acusações novas nos opinativos dos órgãos jurídicos antes do julgamento, cumpre ser previamente aberta vista dos autos ao acusado, sob pena de cerceamento de defesa.


Julgou o Tribunal Regional Federal da 1ª Região:


“2. O Professor da Universidade de Brasília – UnB possui direito líquido e certo à reintegração ao seu cargo, com o pagamento dos valores atrasados, em razão de sua demissão ter sido embasada em relatório da Comissão Disciplinar Administrativa que concluiu pela transgressão de normas da Lei n. 8.112/1990 que não foram imputadas ao servidor quando de seu indiciamento. Precedente do STF.”[10]


5. Direito de apresentação de memoriais com fundamento na Lei federal n. 9.784/1999


A Administração Pública está sujeita ao princípio da legalidade, sendo que vigora a Lei federal n. 9.784/1999 (dispõe sobre o processo administrativo em geral na União), a qual estatui expressamente:


Art.2º…


Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de: …


X – garantia dos direitos à comunicação, à apresentação de alegações finais, à produção de provas e à interposição de recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de litígio; …


Art. 3º O administrado tem os seguintes direitos perante a Administração, sem prejuízo de outros que lhe sejam assegurados:…


III – formular alegações e apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente; …


Art.6º…


Parágrafo único. É vedada à Administração a recusa imotivada de recebimento de documentos, devendo o servidor orientar o interessado quanto ao suprimento de eventuais falhas. …


Art. 38. O interessado poderá, na fase instrutória e antes da tomada da decisão, juntar documentos e pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do processo.


§ 1o Os elementos probatórios deverão ser considerados na motivação do relatório e da decisão.”


Da transcrição dos dispositivos legais, nota-se que o Estatuto do Processo Administrativo federal, que se aplica subsidiariamente ao processo administrativo disciplinar e com maior propriedade ainda na revisão do processo administrativo disciplinar (art. 69, Lei federal n. 9.784/1999), alberga, inequivocamente, o princípio do direito à comunicação, direito de aduzir alegações e apresentar documentos antes da decisão referentes à matéria objeto do processo (art. 3º, III, e 38, caput, L. 9.784/1999), sendo ainda vedado à Administração Pública a recusa ao recebimento de petições e documentos (art. 6º, par. único, Lei federal n. 9.784/1999).


Isso porque o processo administrativo representa avanço emanado do Estado democrático de Direito, com o efeito de que o cidadão tem o direito de influenciar a formação de vontade estatal, formulando alegações e carreando provas nos feitos de interesse do indivíduo, de sorte que não se tolera mais que o feito administrativo se transforme num monólogo dos agentes e órgãos públicos acusadores, ou instrutores e decisores no caso do processo revisional, mas, sim, que o ato administrativo final, resultado da tramitação anterior de um processo contraditorial e democrático, deve espelhar uma decisão mais acertada, com a oitiva e participação ativa dos que podem ter suas esferas jurídicas afetadas pelo ato decisório.


Ora, o processo administrativo nada mais é que a forma que a Administração Pública deve observar na sua atuação e constitui reflexo da submissão do próprio Estado ao ordenamento jurídico, com o império do Estado de Direito (“rule of law, not rule of men: governo da lei, não dos homens), reconhecidamente firmado após o advento da Revolução Francesa e da queda do Absolutismo. Com efeito, outrora com a monopolização das três funções estatais básicas de legislar, julgar e administrar na pessoa do monarca, o cidadão não tinha como exercer o controle dos atos administrativos praticados em seu desfavor, época em que sagrados os ditados de que “The King can do no wrong” (o rei não pode errar) e “Le roi ne pêut mal faire” (o rei não pode fazer mal a alguém), de sorte que o súdito não podia senão assistir, impassível, as determinações estatais refletidas sobre sua pessoa.


Na quadra vigente, com o estabelecimento do direito administrativo ante a construção do Estado de direito democrático, firmou-se a atuação em processo do Estado quando no exercício de sua função administrativa, com vistas a assegurar o efetivo controle de legalidade dos atos administrativos pelo cidadão e, mais, para permitir que o administrado influencie e possa participar das determinações estatais que serão adotadas sobre sua pessoa, podendo externar suas razões para convencimento do órgão estatal decisor.


Sendo assim, longe de constituir um suposto procedimento irregular ou supostamente abusivo, o fato de um cidadão, por seu advogado, apresentar razões perante a autoridade julgadora ou os órgãos de consultoria jurídica, antes da decisão do processo administrativo revisional de seu interesse, representa o mais límpido e legítimo exercício do direito constitucional de petição, com amplo respaldo em diversos preceptivos da Lei federal de Processo Administrativo (Lei n. 9.784/1999).


José dos Santos Carvalho Filho[11], por sinal, destaca, ao comentar o art. 3º, III, da Lei federal n. 9.784/1999:


“O direito a formular alegações é inerente também ao princípio da ampla defesa e contraditório. No sistema do devido processo legal (due process of law), a possibilidade de expor razões, invocar fundamentos e requerer decisões em certo sentido reflete o pleno exercício do direito de defesa com vistas à satisfação dos interesses do indivíduo. Note-se, por oportuno, que nem sempre uma alegação tem em mira rebater fatos e alegações outras; em certas ocasiões, a alegação é uma informação nova a ser apreciada. Distinguem-se, portanto, as alegações constitutivas de direito das impeditivas, modificativas e extintivas. Todas são, no entanto, alegações pelo fato de exibirem informações e argumentos no processo administrativo”.


Não é verdade que, após o relatório da comissão revisora ou mesmo do colegiado do processo administrativo disciplinar originário, o interessado ou acusado não possa expor suas razões, seja perante a autoridade julgadora, seja perante o órgão de consultoria jurídica que orientará, decerto, a decisão a ser adotada pela autoridade administrativa decisora. A participação ativa do interessado, reafirme-se, não consubstancia nenhum estorvo ao direito de punir estatal ou ao exercício do poder decisório da Administração Pública, mas serve, ao contrário, para trazer mais reflexões, com vários pontos de vista, o que só vem em auxílio de uma melhor decisão final.


A Administração Pública já aplicou a demissão ou pena mais branda ao servidor requerente da revisão. Admitindo-se apenas para argumentar que não houvesse estrita previsão legal deferitória do direito de apresentar razões ao administrado antes da decisão final, quando na verdade há (art. 3º, III, L. 9.784/1999), qual seria, ainda assim, o prejuízo experimentado pelo Estado pelo fato de o ex-funcionário público apresentar um memorial perante os órgãos de consultoria jurídica ou a autoridade julgadora previamente à decisão do processo administrativo revisional?


Ora, aboliu-se, porventura, a garantia constitucional do direito de petição (art. 5º, XXXIV, “a”, Constituição Federal de 1988)? Há com isso uma “ameaça” de que a pena imposta possa ser eventualmente revista? Não é exatamente para eventual reapreciação dos motivos fáticos e jurídicos do feito e da sanção imposta, que o ordenamento jurídico criou o instituto da revisão do processo administrativo disciplinar, na hipótese de reparar um possível erro decisório anterior, se for o caso?


6. Dever legal de os órgãos de consultoria jurídica e a autoridade julgadora examinarem o teor dos memoriais apresentados pelo acusado ou pelo requerente da revisão do processo administrativo disciplinar


Ademais, irregularidade alguma haveria no fato de o órgão de consultoria jurídica ou a autoridade julgadora considerarem o teor do memorial apresentado pelo servidor interessado, apreciando as alegações do servidor para fins de formação do convencimento dos agentes públicos opinantes ou decisores. Na verdade, trata-se de estrito cumprimento do dever legal, pois, depois de assegurar o direito do administrado de apresentar razões antes da decisão final, o Estatuto do Processo Administrativo da União (Lei federal n. 9.784/1999) determina:


Art. 3º O administrado tem os seguintes direitos perante a Administração, sem prejuízo de outros que lhe sejam assegurados: ….


III – formular alegações e apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente.”


Portanto, ilegalidade haveria, sim, se os órgãos de consultoria jurídica ou a autoridade julgadora ignorassem, sem levar em consideração, o teor de memoriais apresentados pelos interessados, violando-se o disposto no art. 3º, III, da Lei federal n. 9.784/1999. Seria, no caso, conduta arbitrária, ditatorial, rechaçadora do postulado fundamental de ouvir as razões do administrado, ainda mais em se cuidando de processo administrativo, no qual se sabe que até novas provas podem ser produzidas em grau recursal, dado o princípio da verdade material.


É preciso trazer a lume que os órgãos competentes de consultoria jurídica da advocacia pública zelam pela legalidade e justiça em todos os processos administrativos que lhes são submetidos à apreciação, independentemente da parte interessada.


Os órgãos competentes de consultoria jurídica da advocacia pública, no exame de autos de processos administrativos disciplinares e sindicâncias, antes do consentâneo julgamento pela autoridade decisora competente, agem movidos por sua postura essencialmente técnica, de isenção e independência, na qual não perseguem administrados, nem funcionam como órgãos acusadores, mas, ao contrário, agem cobertos com o manto da justiça e do direito, irradiando luzes para que o administrador público possa agir e melhor julgar.


Não seria, portanto, de se esperar que os órgãos competentes de consultoria jurídica da advocacia pública, tutores da legalidade na Administração Pública, descumprissem a lei, paradoxalmente, negando vigência à norma legal que assegura ao interessado o direito de apresentar razões antes da decisão e veda a recusa do recebimento do memorial.


Destarte, em vez de pretenso procedimento irregular, o que sucede, quando os órgãos competentes de consultoria jurídica da advocacia pública recebem e apreciam memoriais dos interessados ou acusados é o estrito e mais legítimo cumprimento da lei quando, nos termos do art. 6º, par. único, da Lei federal n. 9.784/1999, não se recusam a receber um memorial apresentado pelo ex-servidor interessado no processo de revisão.


A bem da verdade, a intervenção do advogado do acusado, previamente ao julgamento, em vez de atrapalhar a Administração Pública, antes contribui para a elaboração de melhores pareceres dos órgãos de consultoria jurídica, os quais normalmente não participaram do curso do processo administrativo disciplinar ou do feito revisional, ainda que os opinativos, independentes e imparciais, venham a refutar as teses defensórias e alvitrar a punição, mesmo a demissória, se for o caso.


Mas, com a consideração das alegações do servidor, o cidadão terá sido respeitado em sua garantia constitucional de petição, a qual compreende, inequivocamente, também a prerrogativa de peticionar junto aos órgãos competentes de consultoria jurídica da advocacia pública ou à autoridade julgadora, apontando falhas procedimentais ou questões meritórias presentes nos feitos disciplinares. Ouvir o interessado no processo administrativo não prejudica a Administração Pública, enobrece-a e legitima seu poder punitivo ainda mais, conferindo-lhe inspiração democrática e justa.


Por isso que, mesmo depois de apresentado o relatório pela comissão de processo administrativo disciplinar, é lícita e legítima a apresentação de memorial pela defesa, antes do julgamento, não havendo no recebimento da petição pelo órgão administrativo qualquer procedimento irregular, mas estrito cumprimento da lei.


7. Da consagrada praxe de apresentação de memoriais perante órgãos administrativos e judiciários brasileiros


Além disso, a apresentação de memoriais antes de julgamentos, perante todos os órgãos do Poder Judiciário, é medida mais comum da praxe da advocacia, inclusive por parte dos advogados públicos quando representam as entidades federadas e seus entes descentralizados junto à Justiça.


Esse expediente é de praxe corrente, também, na Administração Pública dos três Poderes, sem que nisso resida qualquer mácula ou irregularidade. Muitos magistrados, na verdade, às vezes chegam a decidir (sobretudo os juízes vogais, integrantes de tribunais, que não relataram os recursos judiciais) com fundamento nas razões postas nos memoriais.


Seria necessário desconhecer o diário funcionamento dos tribunais e órgãos jurídicos, inclusive Tribunais de Contas, para considerar proibida a apresentação de um memorial ou o recebimento da petição respectiva pela Administração, no estrito cumprimento do disposto nos artigos 3º, III, e 6º, par. único, da Lei federal n. 9.784/1999, antes da emissão do ato administrativo decisório final.


8. Conclusão


Por isso, conclui-se que é direito do servidor acusado, no processo administrativo disciplinar, ou do requerente da revisão do feito punitivo originário, apresentar memoriais, depois da apresentação do relatório da comissão processante original ou revisora, previamente ao julgamento, como forma legítima de expor suas razões e influenciar a autoridade administrativa decisora, o que, além de se afinar com a praxe diária consagrada dos órgãos judiciários e administrativos do Brasil, logra amplo respaldo na Lei federal n. 9.784/1999, na própria garantia constitucional do contraditório e na jurisprudência pátria.


 


Referências

ALVES, Léo da Silva. Prática de processo disciplinar. Brasília: Brasília Jurídica, 2001.

BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Princípios constitucionais do processo administrativo disciplinar. São Paulo: Max Limonad, 1998.

BARROS JÚNIOR, Carlos S. de. Do poder disciplinar na administração pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1972.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. MS 2004/0070420-6, relator o Ministro gilson dipp, 3ª Seção, julgamento de 24.11.2004, DJ de 06.12.2004, p. 190.

CARVALHO, Antonio Carlos Alencar. Manual de processo administrativo disciplinar e sindicância: à luz da jurisprudência dos tribunais e da casuística da Administração Pública. Brasília: Fórtium, 2008.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Processo Administrativo Federal: comentários à Lei 9.784 de 29/1/1999. Lumen Júris. 2001.

COSTA, José Armando da. Teoria e Prática do Processo Administrativo Disciplinar. 5ª Edição. Rev., atual. e ampl. Brasília Jurídica, 2005.

SOBRINHO, Eduardo Pinto Pessoa. Manual dos servidores do Estado. 13ª. ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1985.

 

Notas:

[1] CARVALHO, Antonio Carlos Alencar. Manual de processo administrativo disciplinar e sindicância: à luz da jurisprudência dos tribunais e da casuística da Administração Pública. Brasília: Fórtium, 2008, p. 317 ss.

[2] SOBRINHO, Eduardo Pinto Pessoa. Manual dos servidores do Estado. 13ª. ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1985, p. 1.118.

[3]  BARROS JÚNIOR, Carlos S. de. Do poder disciplinar na administração pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1972, p. 177.

[4] BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Princípios constitucionais do processo administrativo disciplinar. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 318.

[5] CARVALHO, Antonio Carlos Alencar. Manual de processo administrativo disciplinar e sindicância: à luz da jurisprudência dos tribunais e da casuística da Administração Pública. Brasília: Fórtium, 2008, p. 660-661.

[6] ALVES, Léo da Silva. Prática de processo disciplinar. Brasília: Brasília Jurídica, 2001, p. 232.

[7] COSTA, José Armando da. Teoria e Prática do Processo Administrativo Disciplinar. 5ª Edição. Rev., atual. e ampl. Brasília Jurídica, 2005, p. 377-381. 

[8] BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Princípios constitucionais do processo administrativo disciplinar. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 256

[9] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. MS 2004/0070420-6, relator o Ministro gilson dipp, 3ª Seção, julgamento de 24.11.2004, DJ de 06.12.2004, p. 190.

[10] BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Apelação em Mandado de Segurança 200034000282420, julgamento de 29/11/2006 Primeira Turma, relator o desembargador federal Antônio Sávio de Oliveira Chaves,  DJ de 18.12.2006, p.67.

[11] FILHO, José dos Santos Carvalho. Processo Administrativo Federal. Comentários à Lei 9.784 de 29/1/1999. Lumen Júris. 2001, p. 75. 


Informações Sobre o Autor

Antonio Carlos Alencar Carvalho

Procurador do Distrito Federal, Procurador-Chefe da Procuradoria de Pessoal da Procuradoria-Geral do Distrito Federal, pós-graduado em Direito Público e Advocacia Pública pelo Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP. Autor do livro “Manual de processo administrativo disciplinar e sindicância: à luz da jurisprudência dos tribunais e da casuística da Administração Pública” (Editora Fortium, 2008, 1.072 páginas).


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