Resumo:Partindo do pressuposto de que nem sempre se justifica a prisão provisória, seja qual for a modalidade, as prisões indevidas devem ser reparáveis economicamente pelo Estado, como maneira de compensar a ofensa imputada ao individuo que teve cerceado seu segundo maior bem, a liberdade. A reparação pela constatação da utilização desnecessária daquelas prisões constitui um meio de equilibrar a situação advinda da medida. Contudo, verifica-se que, embora haja essa possibilidade, ela nem sempre é eficaz, pois nem tudo na vida pe passível de ser valorado. Como exemplo pode-se citar a vida e a liberdade, que, quando ofendidas, dinheiro algum é capaz e reparar o dano. Por lidar com bens de primeira ratio, o processo penal deve ser cuidadoso, sob pena de impor ao individuo uma sanção descabida, e ainda que preveja a possibilidade de indenizá-lo por um eventual erro, não se pode trabalhar com essa idéia. No presente artigo pretendeu-se discutir o teor das medidas cautelares frente à ordem constitucional vigente, de modo a esclarecer alguns pontos relativos à sua legalidade diante do principio da presunção de inocência.[1]
Palavras-chaves: Medidas cautelares – Processo Penal – Principio da dignidade da pessoa humana
Sumário: Introdução. 1. As medidas cautelares no Código de Processo Penal. 1.1 Dos tipos de medidas cautelares. 1.1.1 Da prisão em flagrante. 1.1.2 Da prisão preventiva. 1.1.3 Da prisão resultante de pronúncia. 1.1.4 Da Prisão temporária. 1.1.5 Prisão decorrente de sentença penal condenatória recorrível. 1.2 Dos fundamentos para a concessão de medidas cautelares. 2. Dos princípios constitucionais. 2.1 Princípio da liberdade individual. 2.2 Princípio da dignidade da pessoa humana 3. Da constitucionalidade das medidas cautelares frente a possibilidade de reversão. Conclusão. Referências bibliográficas
INTRODUÇÃO
Todas as medidas cautelares previstas no Código de Processo Penal – Decreto Lei 3.689/41, precedem os atos necessários ao processo em sua plenitude e atingem diretamente a liberdade do indivíduo, seu bem de maior valor.
Exige-se, à luz da situação fática, que a prisão cautelar se descortine como forma de assegurar o império da lei penal, da garantia da ordem pública, da ordem econômica ou por conveniência da instrução criminal, de outro modo poder-se-ia afirmar que seu caráter é eminentemente inconstitucional, existindo ainda a previsão legal de indenizar o indivíduo que, preso cautelarmente, prove sua inocência ao fim do curso processual.
Esta possibilidade por si só poderia retirar a inconstitucionalidade das medidas cautelares, contudo a situação não deve ser analisada somente sob o aspecto legal, mas também sob o aspecto prático e social.
As medidas cautelares processuais penais são: prisão em flagrante, prisão preventiva, prisão resultante de pronúncia, prisão temporária e prisão decorrente de sentença penal condenatória recorrível. Todas elas trazem para a realidade do indivíduo a condição de preso, e ainda que possam ser revogadas, estabelecem em sua vida o estigma de presidiário que indenização nenhuma consegue retirar.
No mundo em que se vive os ex-presos são tratados com discriminação e, na maioria dos casos, não conseguem se inserir novamente no convívio social, retornando novamente para o crime, e vivendo à margem da sociedade.
O legislador ao criar o instituto quis dar uma maior garantia para a instrução criminal e às investigações e ainda adequar a medida à gravidade do crime. Em nada manifesta sobre a exigência constitucional do prévio processo legal, o que fica claro na redação do artigo 282 do Código de Processo Penal:
“I – necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de novas infrações penais;
II – adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.”
Pretende-se discutir no presente artigo se as medidas cautelares do processo penal são ou não constitucionais, abordando o tema sob a ótica constitucional da dignidade da pessoa humana, onde se estabelece que todos devem receber tratamento digno e compatível com sua condição de sujeito de direitos, todos expressamente dispostos pela Constituição Federal.
1. As medidas cautelares no Código de Processo PENAL
1.1. Dos tipos de medidas cautelares
Em matéria processual penal é freqüente a ocorrência de situações em que se faz necessária a utilização de medidas urgentes, quando, por exemplo, há o interesse de se garantir uma investigação adequada de um determinado fato ou mesmo de se garantir a execução de uma certa sanção penal, o que acaba por justificar a aplicação oportuna daquela medida de natureza cautelar.
Essas medidas são utilizadas somente em casos de extrema necessidade, principalmente quando se pretende resguardar certas situações que possam sofrer alterações no decorrer do processo, devendo se atentar, porém, para que haja um mínimo de probabilidade de o resultado final ser compatível ao da pretensão, pois essa probabilidade está diretamente ligada ao exame dos fundamentos da própria acusação.
As cautelas processuais penais podem incidir sobre a pessoa do acusado causando gravíssimos danos, mormente ao afetar-lhes sua liberdade e sua dignidade, o que resultará, desses atos jurisdicionais danosos, o direito à reparação às vítimas pelo Estado, representado, no caso, pelo Poder Judiciário, na figura do magistrado no processo.
Das medidas cautelares de natureza pessoal, as prisões provisórias são as que atingem diretamente a liberdade do indivíduo, e se apresentam sob várias modalidades, como a prisão em flagrante, a prisão preventiva, a prisão resultante de pronúncia, a prisão temporária e a prisão decorrente de sentença penal condenatória recorrível.
1.1.1 Da prisão em flagrante
Considera-se em flagrante delito aquele que é surpreendido no momento da prática criminosa, seja no seu exato instante, seja numa das situações declinadas no estatuto processual. As hipóteses estão previstas no art. 302, incisos I a IV do Código de Processo Penal.
A prisão em flagrante, prevista no arts. 301 a 310 do CPP e também no inciso LXI do art. 5º da Constituição Federal, é uma das espécies de prisão cautelar de natureza processual e, portanto, sujeita aos critérios daquelas medidas.
A sua aplicação somente se torna viável frente à necessidade imperiosa da medida, isto é, quando há evidências sobre a autoria e o fato típico.
1.1.2 Da prisão preventiva
Medida de natureza cautelar, a prisão preventiva, em sentido amplo, compreende toda e qualquer prisão que seja decretada antes de uma sentença penal condenatória transitada em julgado.
De acordo com David Alves Moreira[2], prisão preventiva:
“é aquela medida restritiva da liberdade determinada pelo Juiz, em qualquer fase do inquérito ou da instrução criminal, seja como medida de segurança de natureza processual , seja para garantir eventual execução da pena, seja para preservar a ordem pública, seja por conveniência da instrução criminal”.
Como toda medida excepcional, sua utilização deverá ser sempre criteriosa, pois o resultado nem sempre poderá corresponder ao que se é desejado, ou seja, a manutenção de um acusado numa prisão não significará, por exemplo, que a chamada “ordem pública” esteja garantida em função daquela prisão, ao mesmo tempo que se verificará um enorme prejuízo com a medida se ao final houver o reconhecimento da inocência do acusado através de uma sentença absolutória.
1.1.3 Da prisão resultante de pronúncia
A pronúncia é um instituto processual de aplicação própria nos crimes da competência do Tribunal do Júri e, portanto, nos casos de crimes dolos os contra a vida e os conexos a este.
A pronúncia, dependente que é da existência material do crime e indícios de sua autoria, constitui verdadeira sentença, em que o magistrado, apreciando as provas constantes nos autos, encaminha o acusado para o julgamento definitivo pelo Tribunal do Júri.
As conseqüências dessa decisão, segundo a nossa sistemática processual, seria a de lançamento do nome do réu no rol dos culpados, a sua prisão, salvo exceções, e o seu julgamento pelo conselho de sentença, do que se dessume ser, a pronúncia, origem de mais uma modalidade de prisão cautelar.
1.1.4 Da Prisão temporária
Instituída pela Lei nº 7.960, de 21.12.89, a prisão temporária vem se somar às várias modalidades de prisão cautelar e, como medida extrema que é, também fica reservada aos casos de maior gravidade.
Representando a verdadeira prisão para averiguações, sempre presente no cotidiano das delegacias, a prisão temporária apóia-se na necessidade e conveniência de sua utilização para a realização de investigações na fase do inquérito policial e, quando indemonstrada essa necessidade, a medida fica prejudicada.
1.1.5 Prisão decorrente de sentença penal condenatória recorrível
A sentença penal condenatória recorrível, segundo o art. 393 do Código de Processo Penal, produz basicamente dois efeitos principais: o recolhimento do réu à prisão, salvo algumas exceções, e o lançamento do nome do réu no rol dos culpados.
Com o advento da atual Constituição, o segundo efeito, o do lançamento do nome do réu no rol dos culpados, praticamente foi revogado, pois contraria o princípio constitucional da presunção da inocência.
A questão principal, portanto, limita-se ao primeiro efeito da sentença condenatória recorrível, origem de mais uma modalidade de prisão que, em razão da possibilidade recursal, ainda figura entre as medidas cautelares.
1.2. Dos fundamentos para a concessão de medidas cautelares
As medidas cautelares de natureza processual também são chamadas de prisões provisórias, e como afirma Thiago Naves[3] apud MANZINI (1952), “a prisão provisória consiste em uma limitação mais ou menos intensa da liberdade física de uma pessoa, para uma finalidade processual penal”.
Através do instituto da prisão provisória, se restringe a liberdade da pessoa, tendo em vista a tutela do processo. As medidas cautelares são formas de se garantir a defesa de determinados direitos, até que se confirme a tutela definitiva, isto é, a guarda e a defesa da sociedade mediante o direito. A prisão cautelar é imprescindível para que a lei penal impere, quando necessário.
São dois os requisitos essenciais para a aplicação da medida cautelar de natureza processual. O primeiro deles é o do periculum in mora. Se existe urgência em afastar-se o perigo de prejuízo ao processo, resultante do decurso do tempo, a medida cautelar torna-se necessária. Por outro lado, é também importante o requisito do fumus boni iuris. A aplicação da medida cautelar torna-se justa havendo possibilidade, para uma das partes, de solução favorável no processo principal. Deve-se fazer um juízo de probabilidade, que indique a necessidade de intervenção do processo cautelar.
Não obstante os dois requisitos acima narrados, Thiago Naves[4] assevera que:
“Na doutrina existem outros argumentos legitimadores da prisão provisória, tais como a garantia de se evitar que o imputado realize uma fuga, a necessidade de se fazer uma instrução criminal perfeita e eficaz colheita de provas, ou a proteção do imputado, preservando sua incolumidade contra possíveis represálias advindas do público que clama, em certas ocasiões, pela solução imediata dos crimes considerados hediondos. O mais importante, entretanto, é que todas essas condições de legitimidade só podem ser consideradas válidas quando respeitam a razão intrínseca da prisão provisória, que tem, por natureza, o princípio do devido processo legal”.
2. Dos princípios constitucionais
2.1 Princípio da liberdade individual
A Liberdade Individual, mais do que fator de promoção da abundância econômica e da paz civil é o princípio definidor do Homem enquanto ser moral. O compromisso com a Liberdade Individual pressupõe a convicção de que só uma ordem social na qual caiba aos indivíduos a condução da sua vida permitirá o pleno desenvolvimento da dignidade do ser humano.
E, segundo Marco Aurélio Alves Adão[5]
“O anseio por liberdade se reduz, muitas vezes, a mera liberdade individual: não estar submetidos senão às leis, não ser detido, preso, morto, nem maltratado arbitrariamente, dizer a opinião sem conseqüências, escolher a profissão, ir e vir, não dar conta à ninguém dos próprios passos, reunir-se sem empecilhos, etc”.
Certamente, o individualismo se sobrepõe ao pensamento mítico sobre a democracia, pois o imaginário popular foi construído pela cultura e pela promessa de felicidade do “meu” e do “fazer”. Transforma-se tudo em posse, inclusive as pessoas (minha esposa, meu filho, meu amigo, meu trabalho, meu cargo) e tudo sob a ótica de uma prática fabril (fazemos amor, fazemos amizades).
Como assevera Marco Aurélio Alves Adão[6]:
“O direito individual surge como forma de libertar o homem das amarras do estado absolutista. A esfera individual não mais pode ser restringida pelo Estado de forma deliberada e absoluta. O problema é como estabelecer equilíbrio entre a “liberdade individual” e a “autoridade estatal”. Isto porque o conceito de liberdade não é absoluto, não implica em ausência de coação. Liberdade consiste na ausência de coação anormal, ilegítima e imoral. Daí concluir-se que somente a lei geral estatal pode restringi-la, e assim mesmo devendo aquela ser elaborada segundo regras preestabelecidas e aceitas pela coletividade que busca regular. A lei limitadora do conteúdo da liberdade individual precisa ser normal, moral e legítima, no sentido de ser consentida por aqueles que a liberdade restringe.”
A liberdade somente pode ser limitada pela lei. Esta forma de considerar-se a legalidade frente à liberdade é baseada em um conteúdo negativo, sendo a liberdade o conceito geral e a restrição da lei a exceção. Não há uma relação no sentido de poder-se fazer tudo o que a lei permite, mas de poder-se fazer tudo, exceto o que a lei expressamente proíbe.
O conteúdo das leis é também fonte de considerações éticas. Pode uma lei ser formalmente válida e emanada de poder legítimo, e mesmo assim ser moralmente considerada inválida, enquanto limitadora do conteúdo das liberdades. Daí concluir-se que a legitimidade do poder não é suficiente para que a legalidade seja legítima, é necessário também que o conteúdo das leis seja expressão da soberania popular.
Para Marco Aurélio Alves Adão[7]:
“As leis podem ser moralmente questionáveis quanto à sua esfera interna. O comando legal que limita a liberdade individual pode trazer regra que moralmente não traduza o interesse coletivo, a despeito de ser emanado de poder legítimo e elaborada de forma correta, segundo regras preestabelecidas.”
Se há uma limitação ao exercício de uma liberdade, por parte de uma lei, é necessário que os conceitos de que a lei se vale sejam eticamente aceitos, para que a eficácia seja assegurada.
2.2 Princípio da dignidade da pessoa humana
O princípio da dignidade da pessoa humana obriga ao inafastável compromisso com o absoluto e irrestrito respeito à identidade e à integridade de todo ser humano. De modo geral, é a dignidade humana um atributo da pessoa, não podendo ser medida por um único fator, pois nela intervém a combinação de aspectos morais, econômicos, sociais e políticos, entre outros. Como princípio fundamental do Estado Democrático brasileiro, a dignidade da pessoa humana, juntamente com o direito à vida e à liberdade, são garantias individuais asseguradas pela Constituição Federal de 1988.
Como explicita Sílvia Mota[8] apud Sérgio Ferraz:
“O princípio da salvaguarda da dignidade da pessoa humana é base da própria existência do Estado brasileiro e, ao mesmo tempo, fim permanente de todas as suas atividades. É a criação e manutenção das condições para que as pessoas sejam respeitadas, resguardadas e tuteladas, em sua integridade física e moral, asseguradas o desenvolvimento e a possibilidade da plena concretização de suas potencialidades e aptidões”.
Dignidade e liberdade atrelam-se à pessoa humana, indissoluvelmente. Cabe recordar, um dos fins do Estado é propiciar as condições para que as pessoas se tornem dignas. Todavia, a dignidade humana pode ser por diversas maneiras violada, entre estas, através da qualidade de vida desumana, de medidas como a tortura que, sob todas as modalidades, são inibidoras do desenvolvimento humano. Enquanto ao homem cabe dar sentido à sua própria vida, ao Estado cabe facilitar-lhe o exercício da liberdade.
3. Da constitucionalidade das medidas cautelares frente a possibilidade de reversão
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que não há inconstitucionalidade alguma nas prisões provisórias, ao sumular o assunto, em 06/09/1990: “a exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência”.
Segundo Vanderley Muniz[9]:
“O instituto da presunção de inocência é relativo, relativo porque é direito individual, e o direito público, da coletividade, se sobrepõe ao direito individual. Evidentemente que a prisão cautelar deve – e na maioria dos casos é – reservada para os casos de extrema gravidade em que a liberdade individual venha a colocar em risco toda a coletividade, daí a tolerância de nosso sistema jurídico repressivo que prevê, dentre outras coisas, a liberdade provisória – art. 310, parágrafo único do C.P.P; a fiança arts.323 e seguintes; o regime aberto, art. 33 do C.P., a suspensão condicional da pena, art 77, as penas substitutivas, art 43 e seguintes; a lei 9.099/95 nos casos cabíveis, etc”.
Com efeito, o princípio da presunção de inocência, não inviabiliza a decretação de qualquer das prisões provisórias, desde que os requisitos e pressupostos legais atinentes a espécies estejam presentes: a) indícios suficientes da autoria e b) prova da materialidade, seqüenciados por garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e para garantia da aplicação da lei penal.
As medidas cautelares são excepcionais e de utilização restrita e cuidadosa, de forma que, ao atingir a liberdade do indivíduo, em tese inocente, poderá vir a prejudicá-lo patrimonial, ou moralmente, ensejando a responsabilidade civil do Estado pelos danos causados aos acusados com essas medidas.
O questionamento sempre é se deve, o indiciado ou o acusado, suportar inerte essas medidas, quando desnecessárias e danosas, tudo em nome de uma boa prestação jurisdicional pelo Estado, ou, em outras palavras, em sacrifício de uma sociedade que se diz democrática.
Segundo David Alves Moreira[10]:
“As medidas cautelares, uma vez aplicadas indevidamente, resultam no nascimento do direito ao acusado, de ser reparado pelo Estado por todos os prejuízos sofridos em razão da imputação, inclusive pelos danos morais”.
Percebe-se que há uma tentativa do Estado em equilibrar o dano à ofensa, como maneira de fazer uma compensação pelo ato praticado pelo Estado na tentativa de uma aplicação correta da lei e restauração da ordem pública.
Não obstante a já manifestação do STJ, acerca da constitucionalidade das prisões provisórias, pode-se dizer que a possibilidade de indenização constitui um plus, uma tentativa de restaurar o status quo do individuo, ainda que seja através de uma compensação financeira.
Como dito anteriormente, todos têm direito a viver uma vida com dignidade e a receber do Estado todas as condições necessárias para a realização desta condição. Como também mencionado anteriormente, as medidas cautelares de natureza processual foram criadas como uma ferramenta estatal para a dar eficácia aos procedimentos envolvendo a aplicação da lei penal, devendo resguardar, contudo, os direitos fundamentais de cada um.
A possibilidade de indenizar o individuo revela a intenção do legislador de creditar constitucionalidade às prisões provisórias, uma vez que, na impossibilidade de restaurar ao individuo sua condição anterior, oferece-lhe uma compensação monetária. O STJ já decidiu pela constitucionalidade das prisões provisórias, restando ao legislador apenas corroborar esta posição, afastando do instituto o caráter de supressor de direitos quando indevidamente utilizado, com a previsão de indenização que amenize os danos causados.
Conclusão
O desenvolvimento normal do processo demanda, muitas vezes, um tempo superior ao esperado pelos litigantes, dá margem a que algumas situações apresentadas inicialmente sofram alterações em detrimento de uma das partes.
Daí a necessidade do uso de medidas que possam garantir a originalidade dos fatos apresentados no início do processo ou mesmo de situações que se verificaram anteriormente à propositura da demanda, evitando, dessa forma, eventuais prejuízos viabilizados pela demora da prestação jurisdicional.
No processo penal, da mesma forma que em outras áreas do direito, as medidas cautelares muitas vezes se fazem necessárias para a garantia do bom desenvolvimento de um processo, tanto que os próprios estatutos legais dispõem sobre as várias modalidades dessas providências.
Particularmente nesse ramo do direito, tais medidas, além de estarem sempre apoiadas nas regras gerais a que estão submetidas, são tomadas de excepcionais cuidados quando da sua utilização, e isto porque o objeto da pretensão provisória é a privação da liberdade do indivíduo como medida necessária, por exemplo, nos casos de investigação criminal.
A medida cautelar no processo penal é excepcional porque a restrição da liberdade do acusado obtida através das providências cautelares, em não representando mais nenhum risco para o bom desenvolvimento do processo, poderá ser considerada verdadeiro constrangimento ilegal, atentando contra o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, podendo ainda configurar abuso de autoridade por parte do responsável.
E importante ressaltar que, como afetam diretamente a liberdade dos indivíduos, as prisões cautelares, quando infundadas, ensejam a responsabilidade civil do Estado, como meio de reparar o dano sofrido, reforçando o aspecto de revogabilidade dos seus efeitos.
Diante do exposto, percebe-se que, embora as prisões cautelares a princípio atentem contra o principio da presunção da inocência, seu caráter revogável, sua natureza e sua função as tornam compatível com o sistema constitucional vigente, havendo ainda a possibilidade de indenização estatal como meio de compensação por danos irreparáveis.
Contudo, cabe ao intérprete uma criteriosa análise do caso concreto ao encontrar-se diante de uma situação que enseje a aplicação de alguma medida cautelar, pois seus efeitos afetam diretamente a liberdade e a dignidade do acusado.
Informações Sobre o Autor
Guilherme Ribeiro Teixeira
Acadêmico de Direito de Direito da Universidade Presidente Antônio Carlos(Unipac)-Ubá.