Direito de visitas – dos avós aos netos

Resumo: O presente artigo visa discutir e abrir precedentes sobre o direito de visitas dos avós no âmbito dos processos cautelares, com as modificações trazidas pela Lei nº 12.398/2011, quem alterou o art. 1.589 do Código Civil e art. 888 do Código de Processo Civil, estendendo o direito de visitas aos avós. Sustenta-se por meio do presente trabalho a autonomia do pleito judicial dos avós quanto à regulamentação de visitas, dada importância e relevância do tema no que tange à prevalência do interesse dos menores, princípio basilar em direito de família. Assim, pretende-se a sustentação de legalidade e pertinência do tema, pautado em dissídios jurisprudenciais análogos, bem como doutrina de renomados autores para amparar o entendimento aqui exposto.[1]

Palavras-chave: Regulamentação, visitas, avós, cautelar, autonomia.

Abstract: This article aims to discuss and set precedents on the visitation rights of grandparents in pre-trial proceedings, with the changes introduced by Law No. 12.398/2011, who changed the art. 1589 of the Civil Code and art. 888 of the Code of Civil Procedure, extending visitation rights to grandparents. Is sustained by the present work the autonomy of judicial pleading grandparents regulations regarding visits, given significance and relevance of the topic in relation to the prevalence of the interests of minor, basic principle in family law. Thus, we intend to support the legality and appropriateness of the subject, based on analogous jurisprudential disputes and doctrine of renowned authors to support the understanding set forth herein.

Keywords: Regulatory visits, grandparents, injunctive, autonomy.

Sumário: 1. Realidade familiar contemporânea e o poder judiciário. 2. Importância da presença dos avós aos menores. 3. Da autonomia do direito de visitas dos avós. 4. Conclusão. Referências.

1. REALIDADE FAMILIAR CONTEMPORÂNEA E O PODER JUDICIÁRIO

A realidade das famílias brasileiras infelizmente tem demonstrado uma grande perda de valores não só familiares, como religiosos, no que se relaciona à manutenção dos relacionamentos matrimoniais duradouros, realidade esta que pertence a tempos mais antigos, em que salvas exceções contemporâneas se comemoram longos casamentos.

Diante deste quadro de atual crise familiar, entidades representativas de pesquisas apontam um aumento no número de divórcios, os quais, em sua maioria envolvem menores de idade, demandando necessária participação judicial no procedimento de divórcio.

Na prática, com experiência de causa, podemos facilmente observar que, mesmo que se mantenha uma relação harmoniosa após separação de corpos, antes de que se tomem medidas judiciais para concretização do divórcio, o recebimento de uma citação inicial para tanto, causa, na maioria dos casos o início de uma incalculável peleia judicial, da qual não se pode estimar o desgaste psicológico, emocional, financeiro, dentro e fora dos autos de divórcio.

Tem ocorrido que, grande parte dos magistrados em nosso Poder Judiciário, ao receber uma petição inicial de divórcio proposta por quem não é detentor da guarda, mas tão somente do direito de visitas, mesmo que explicada em detalhes a rotina familiar estabelecida entre os cônjuges separados, bem como avós paternos e maternos, acabam por fixar de forma padrão o direito de visitas de forma alternada aos finais de semana, ou seja, a cada 15 (quinze) dias, até se que ouça a parte contrária em sua argumentação contestatória.

Magistrados mais sensatos, ab initio fixam audiência de conciliação e/ou estudo psicossocial, reduzindo então os prejuízos causados pelo longo trâmite dos autos, até que ocorra citação, juntada de mandado para fluência do prazo de defesa e finalmente a apresentação desta, para que, somente após seja feita conclusão dos autos e apreciado direito de visitas em juízo de valor nem sempre certeiro.

Advogados mais sensatos socorrem-se à mediação judicial, prática esta festejada em sua implementação pelo Judiciário de muitos estados como o de Mato Grosso do Sul, apresentando ótimos resultados na solução dos conflitos, ou seja, não só pondo fim ao processo em si, mas ao próprio conflito, quando as partes terão a oportunidade de se confrontar com equipe especializada para tal apaziguamento, salvas intransigentes exceções por algumas das partes que rechaçam tal possibilidade inovadora e de boa praxe à cidadania.

2. IMPORTÂNCIA DA PRESENÇA DOS AVÓS AOS MENORES

Prestigiando à boa praxe judicial conforme argumentação dos parágrafos anteriores, sem deixar de lado o objeto do presente texto, sabemos que os avós contribuem muito para a criação dos netos, seja por meio de assistência presencial, emocional e afetiva, sempre estão contribuindo.

A convivência e proximidade dos avós traz imensuráveis proveitos à criança, refletindo de forma positiva ao bom e pleno desenvolvimento de sua personalidade, bem como ligação com sua ancestralidade. Assim corrobora Edgard de Moura Bittencourt, com sabedoria e muita sensibilidade humana:

“A afeição dos avós pelos netos é a ultima etapa das paixões puras do homem. É a maior delícia de viver a velhice”. (Edgard de Moura Bittencourt, Guarda de Filhos, LEUD, SP, 1981, 2ªed, págs. 123 a 124).

É necessária a máxima preservação da comunidade familiar em que se integram os menores, assunto tratado na Constituição Federal:

“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

Neste sentido também é o entendimento da Carga Magna em seu artigo 226, §4º, em resguardo à comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes:

“Art. 226 – A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. […]

§ 4º – Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.”

Da mesma maneira, dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n. 8.069/90, no artigo 16, inciso V, com repetição no capítulo III, sob a rubrica “Do direito à convivência familiar e comunitária”, bem como o conceito de família natural previsto no art. 25 do mesmo codex, veja-se:

“Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos: […] V – participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação; […]

Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes”.

Como bem afirma Carlos Roberto Gonçalves em obra recente:

“Lato sensu, o vocábulo família abrange todas as pessoas ligadas por vínculo de sangue e que procedem, portanto, de um tronco ancestral comum, bem como as unidas pela afinidade e pela adoção. Compreende os cônjuges e companheiros, os parentes e afins.”

“O direito de família é o mais humano de todos os ramos do direito. Em razão disso, e também pelo sentido ideológico e histórico de exclusões, como preleciona Rodrigo da Cunha Pereira, ‘é que se torna imperativo pensar o Direito de Família na contemporaneidade com a ajuda e pelo ângulo dos Direitos Humanos, cuja base e ingredientes estão, também, diretamente relacionados à noção de cidadania’.” (Direito Civil Brasileiro – Direito de Família, vol. 6, Ed. Saraiva, 2013, 10ª ed., SP, pág. 17-22).

Nada mais verdadeiro e mais condizente à sabedoria popular de que ser avô(ó) é “ser pai/mãe duas vezes”, pois esta visão íntima na esfera familiar, serve de plano de fundo para a questão do direito de visita aos menores, que requer maior abrangência do mera regulamentação legal restrita aos contatos com um dos pais não encarregados da guarda, diante da ruptura da vida do casal quando um dos genitores, de forma totalmente equivocada e egoísta, proíbe o contato dos filhos com os avós, pais do outro genitor, ocasionando rupturas e traumas irreparáveis, portanto, eternos às crianças.

3. DA AUTONOMIA DO DIREITO DE VISITAS DOS AVÓS

Contextualizando toda a dinamicidade do direito de família em adequação à mais pura realidade das famílias constituídas é que finalmente veio o legislador fazer melhor justiça aos menores e seus avós, por meio da promulgada a Lei nº 12.398/2011, quem alterou o art. 1.589 do Código Civil e art. 888 do Código de Processo Civil, estendendo o direito de visitas aos avós e assim possibilitando tal medida cautelar, trazendo tão importante reconhecimento legal do direito de visitas e principalmente o respeito ao direito fundamental de convivência familiar afetiva. Veja-se tal alteração:

“Art. 1o O art. 1.589 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil, passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo único: 

“Art. 1.589. (…)

Parágrafo único.  O direito de visita estende-se a qualquer dos avós, a critério do juiz, observados os interesses da criança ou do adolescente.” (NR) 

Art. 2o  O inciso VII do art. 888 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, passa a vigorar com a seguinte redação: 

“Art. 888. (…)

VII – a guarda e a educação dos filhos, regulado o direito de visita que, no interesse da criança ou do adolescente, pode, a critério do juiz, ser extensivo a cada um dos avós;”

Enfim, o que se mantém acima de toda dissolução da vida em comum do casal de genitores da menor, é a manutenção do contato da criança com sua família, ou seja, não pode perder o referencial de família. 

Frise-se, que acima de tudo, deve-se por óbvio resguardar uma permanência de relacionamento afetivo digno entre os envolvidos, preservando todo o esforço de avós presentes, ao teor do art. 1.634 do Código Civil, art. 229 da Constituição Federal e ainda Estatuto da Criança e do Adolescente que em seu art. 21, sem contar a jurisprudência pátria no que diz respeito à prevalência do interesse dos menores. Vejamos:

“CÓDIGO CIVIL

Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:

I – dirigir-lhes a criação e educação;

II – tê-los em sua companhia e guarda;

III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;

IV – nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;

V – representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;

VI – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;

VII – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência.”

 Pois bem. Como dito, apesar do ambiente aparentemente hostil e extremamente litigioso, repleto de mágoas, a família deve prevalecer com relação aos menores de idade, sob os inocentes conceitos destes que muitas das vezes reclamam em saudades pelos pais e parentes, que eventualmente possam ter suas rotinas alteradas por conta de ações judiciais, ratificados por proibições insensatas dos próprios cônjuges em desfavor uns dos outros.

É necessário que os avós, quando presentes, assim permaneçam, sem qualquer resistência infundada de quaisquer dos cônjuges como ocorre não é passível de aceitação pelo Poder Judiciário, de forma que neste exato sentido já se decidiu em outros tribunais pátrios:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. AVÓ MATERNA. INTERESSE DA CRIANÇA. 1. O convívio da criança com os avós é, em regra, saudável e, no caso, é até necessário para preservar os vínculos afetivos com avó materna. 2. Se o sistema de visitação está regulado de forma a atender o interesse e as conveniências da infante, sem prejudicar o convívio com a genitora, de forma a estabelecer um vínculo saudável com a avó, mostra-se totalmente descabida a resistência da mãe, que tangencia uma situação de alienação parental. Recurso desprovido”. (Agravo de Instrumento Nº 70058328808, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 30/01/2014) (TJ-RS – AI: 70058328808 RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Data de Julgamento: 30/01/2014, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 05/02/2014)

Portanto, o que se discute no presente contexto é a autonomia do direito de visitas dos avós, sem que, com isso esteja ‘atrelados’ ao de quaisquer dos pais, o que muitas vezes sequer reflete a rotina estabelecida entre cada um destes protagonistas familiares.

Por isso o Código de Processo Civil tratou de se atualizar e amparar a concessão de medida cautelar de exibição conforme se vê no art. 888, VII do CPC. Após promulgação da Lei nº 12.398/2011, quem alterou o art. 888 do Código de Processo Civil, estendeu-se o direito de visitas aos avós e possibilitou-se tal medida cautelar e neste mesmo sentido já decidiram os diversos tribunais pátrios em dissídios análogos, novamente a exemplo do tribunal de justiça gaúcho:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. VISITAS AVÓ MATERNA SEM PERNOITE. A guarda deve atender, essencialmente, ao interesse da criança. Estipulação que se mostra adequada a fim de assegurar o convívio da infante com a avó materna. Agravo de Instrumento provido.” (Agravo de Instrumento Nº 70052520343, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em 27/02/2013) (TJ-RS – AI: 70052520343 RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Data de Julgamento: 27/02/2013, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 05/03/2013)

Enfim, não há dúvidas de que o direito dos avós pode ser bruscamente ameaçado e a reparação dos danos causados é irreversível, em se tratando de princípios familiares de um menor de idade.

4. CONCLUSÃO

Diante de tamanha urgência, é de se esperar, portanto, de nossas Cortes e julgadores singulares que reconheça tal urgência, com a verificação da verossimilhança do direito material posto em jogo, onde o fumus boni iuris consubstancia-se pelo tamanho prejuízo na convivência entre as partes envolvidas, posto que, como dito a proximidade traz imensuráveis proveitos à criança, refletindo de forma positiva ao bom e pleno desenvolvimento de sua personalidade, bem como ligação com sua ancestralidade

Por sua vez, o periculum in mora atrela-se ao requisito acima explicado e se faz ainda mais presente quando do temor de que enquanto se aguarda a tutela definitiva, venham a ocorrer fatos que prejudiquem a apreciação dos direitos de visitas ou frustrem sua execução.

Concluindo a análise familiar processual em comento, há muito que se aperfeiçoar na praxe forense, pois é necessária a aproximação dos causídicos aos servidores do judiciário, demonstrando tamanha repercussão da eventual morosidade nos bastidores de um processo judicial, de forma que, o maior prejudicado são os menores de idade, prejuízo este que, incansavelmente se pode dizer ser irreversível, gerando futuras marcas, traumas e lembranças que não se apagam em meio ao drama familiar vivenciado sob a égide de um processo judicial.

 

Referências

BITTENCOURT, Edgard de Moura Bittencourt. Guarda de Filhos, LEUD, SP, 1981, 2ª ed, págs. 123 a 124.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família, vol. 6, Ed. Saraiva, 2013, 10ª ed., SP, pág. 17-22.

JURISPRUDÊNCIA. Disponível em: [http://www.tjrs.jus.br]. Acesso em: 31.03.2014.

BRASIL. Lei n.° 5.869, de 11 de Janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Diário Oficial [da] Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF, 17 jan., 1973.

BRASIL. Constituição Federal, de 05 de Outubro de 1988. Diário Oficial [da] Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF, 05 out., 1988.

BRASIL. Lei n.° 8.069, de 13 de Julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providÊncias. Diário Oficial [da] Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF, 16 jul., 1990.

BRASIL. Lei n.° 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial [da] Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF, 11 jan., 2002.

 

Notas:


[1] Artigo com contribuições de Larissa da Silva Pedro Almeida, estagiária da P&M Advogados Associados, em convênio com o CIEE – Centro de Integração Empresa Escola, registrada sob nº 8079102


Informações Sobre o Autor

Pedro Puttini Mendes

Advogado inscrito na OAB/MS n 16.518 e Professor de Pós-Graduação nas matérias de Direito Agrário, Ambiental e Políticas Públicas. Sócio-Diretor da P&M Consultoria Jurídica, Docente no IPOG – Instituto de Graduação e Pós-Graduação. Membro e Representante da União Brasileira de Agraristas Universitários UBAU. Membro fundador da União Brasileira da Advocacia Ambiental UBAA. Articulista em legislação agroambiental para a Scot Consultoria, colaborador do portal DireitoAgrario.com e escreve artigos para Correio do Estado. Foi Presidente da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS entre 2013/2015


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