Resumo: Este trabalho apresenta os principais aspectos do auxilio acidente no Direito Previdenciário, informa as linhas gerais e particulares do benefício, e esclarece sobre a redação anterior do artigo 86 da Lei de Benefícios da Previdência Social o qual foi alterado ao longo dos anos, bem como, faz uma reflexão do assunto com a apresentação de situações práticas extraídas de decisões jurisprudenciais.[1]
Palavras-chave: Acidente. Benefício. Nexo causal. Indenização
Abstract: This paper presents the main aspects of the accident assistance in the Social Security Law, informs the general and particular lines of the benefit, and clarifies the previous wording of Article 86 of Law Benefits of Social Security which has changed over the years as well, makes a subject of reflection with the presentation of practical situations drawn from court decisions.
Keywords: Accident. Benefit. Causal link. Indemnity
Sumário: Introdução. 1. Situações que dão ensejo ao auxilio acidente. 2. Renda mensal inicial do benefício. 3. Data de início do benefício. 4. Período de carência. 5. Suspensão e cessação do benefício. 5.1. Mantém a qualidade de segurado 6. Manutenção do auxílio acidente concedido antes da lei 9.528/1997 cumulado com aposentadoria. 7. Conclusão. Referências bibliográficas.
Introdução
O auxilio acidente trata-se de um benefício previdenciário concedido como indenização mensal paga ao segurado empregado (urbano ou rural), trabalhador avulso e segurado especial, que após a consolidação de uma lesão decorrente de acidente de trabalho ou acidente de qualquer natureza, resulte em redução da capacidade laborativa que habitualmente exercia (Artigos 86, caput, 18, § 1º e 39, I da Lei 8.213/1991 e artigo 104 do Regulamento da Previdência Social – Decreto nº. 3.048/99).
A Lei 9.032/95 acrescentou acidente de qualquer natureza. Diante disso, não é necessário que seja acidente de trabalho, podendo este ocorrer no trabalho ou fora dele. No entanto, não basta apenas a ocorrência do acidente, pois, também é necessário que após a consolidação das lesões decorrentes do sinistro haja redução da capacidade para o trabalho que o segurado exercia anteriormente.
Assim, após a consolidação das lesões decorrestes do acidente, o segurado não está total e definitivamente incapaz para o trabalho o que seria o caso de concessão do benefício da aposentadoria por invalidez, mas sim, incapaz de forma parcial e definitiva, ou seja, houve redução da capacidade laborativa, causando sequelas definitivas.
Contribuintes individuais e segurados facultativos não fazem jus a esse beneficio, segundo a interpretação dominante, por não estarem enquadrados na proteção acidentaria (art. 19 da Lei 8.213/91).
Conforme entendimento do STJ é importante que a existência da lesão seja decorrente de acidente que implique em redução da capacidade para o labor habitualmente exercido, uma vez que, o nível do dano e o grau do maior esforço não interferem na concessão do beneficio, o qual será devido ainda que seja mínima a lesão. (STJ, REsp 1109591/SC, Rel. Min. Celso Lomongi. DJe 08/09/2010.)
1. Situações que dão ensejo ao auxilio acidente
De acordo com o artigo 104 do Regulamento da Previdência Social (RPS) o auxilio acidente é um benefício pago ao segurado quando houver sequelas definitivas que resultem:
a) redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia;
b) redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia e exija maior esforço para o desempenho da mesma atividade exercida à época do acidente; ou
c) impossibilidade de desempenho da atividade que exercia a época do acidente, porém permita o desempenho de outra, após o processo de reabilitação profissional, nos casos indicados pela perícia médica do INSS.
Frisa-se que os acidentes de qualquer natureza e do trabalho que após a consolidação das lesões apresentarem redução da capacidade funcional, mas sem repercussão na capacidade laborativa, não darão ensejo ao benefício, pois é necessário o preenchimento dos requisitos previstos no artigo 104 do RPS, acima mencionados.
Frisa-se que a perda da audição em qualquer grau, somente dará direito ao auxilio acidente, quando houver nexo causal entre a doença e o trabalho que resultar comprovadamente em redução ou perda da capacidade laborativa, conforme preceitua o artigo 86, § 4ª da Lei 8.213/91.
Assim, nos casos de perda de audição, para ter direito ao benefício é necessário cumprir os seguintes requisitos:
a.) nexo causal entre o trabalho e a perda da audição;
b.) redução ou perda da capacidade laborativa que habitualmente exercia, em decorrência da perda da audição.
Diante disso, se mesmo existindo o nexo causal, este não provocar redução ou perda da capacidade laborativa, o segurado não terá direito ao auxilio acidente.
2. Renda mensal inicial do benefício
A renda mensal inicial do auxilio acidente corresponde a 50% do salário de benefício que deu origem ao auxilio doença, corrigido até o mês anterior ao do início do pagamento do benefício (Artigo 86, § 1ª da Lei 8.213/91 e artigo 104, § 1ª do RPS).
Em razão do caráter indenizatório desse benefício, a renda mensal inicial pode ser inferior a um salário mínimo, uma vez que a intenção do legislador não foi de substituir o rendimento do trabalho do segurado, mas sim, compensa-lo por não possuir plena capacidade para o trabalho.
O valor mensal do auxilio acidente integra o salário de contribuição para fins de cálculo do salário de benefício de qualquer aposentadoria, mas não integra o salário de contribuição aos benefícios da previdência social, salvo o salário maternidade, vide artigo 28, § 9ª, “a”, da Lei 8212/91 que segue:
Artigo 28 Entende-se por salário-de-contribuição:
I – para o empregado e trabalhador avulso: a remuneração auferida em uma ou mais empresas, assim entendida a totalidade dos rendimentos pagos, devidos ou creditados a qualquer título, durante o mês, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa; (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97)
II – para o empregado doméstico: a remuneração registrada na Carteira de Trabalho e Previdência Social, observadas as normas a serem estabelecidas em regulamento para
III – para o contribuinte individual: a remuneração auferida em uma ou mais empresas ou pelo exercício de sua atividade por conta própria, durante o mês, observado o limite máximo a que se refere o § 5o; (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999).
IV – para o segurado facultativo: o valor por ele declarado, observado o limite máximo a que se refere o § 5o. (Incluído pela Lei nº 9.876, de 1999).
§ 9º Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente:
a) os benefícios da previdência social, nos termos e limites legais, salvo o salário-maternidade; (…)
O Supremo Tribunal Federal, em decisão de relatoria da Ministra Relatora Carmen Lúcia, no julgamento do Ag. Reg. no Recurso Extraordinário n. 597.022 Rio de Janeiro, datado de 27/10/2009, entendeu que o valor do auxílio-acidente não pode ser inferior a um salário mínimo nacional, em razão de o art. 201, §2º da Constituição Federal ser autoaplicável.
Neste sentido extrai-se julgado do STF: “PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO. PISO SALARIAL. ART. 201, PARS. 5. E 6., DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. As normas dos dispositivos acima mencionados, que estabelecem piso não inferior ao salário mínimo para os benefícios previdenciários e gratificação natalina dos aposentados e pensionistas equivalente aos proventos do mês de dezembro, são auto-aplicáveis, independendo sua eficácia de edição de lei ordinária regulamentadora. Jurisprudência do STF. Recurso extraordinário conhecido e provido.” (RE 169.665, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ 24.2.1995).”
A ministra defende a tese de que estabelecer o pagamento do auxílio acidente em importe inferior que um salário mínimo é retroceder em relação à sistemática social assegurada pela Constituição Federal de 1988, quanto à valorização dos preceitos fundamentais, uma vez que, por se tratar de um benefício previdenciário que contribui fundamentalmente para a manutenção da qualidade mínima de vida e para a existência digna do segurado e a de sua família, não poderia ser estabelecido o piso inferior ao salário mínimo.
Diferentemente do entendimento da Ministra do STF, Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari (2014, p. 803), entendem que: “O valor do benefício, em qualquer caso, poderá ser inferior ao salário mínimo, uma vez que não se trata de beneficio substitutivo do salário de contribuição”.
O STF não admitiu a discussão da matéria em sede de Recurso Extraordinário por se tratar de divergência sobre a natureza jurídica do benefício, sendo interpretação de ordem infraconstitucional (ARE 705.141, Plenário, Rel. Min. Gilmar Mendes. DJe de 16/11/2012).
Já o segurado especial[2], conceituado como produtor, parceiro, meeiro, arrendatário rural, pescador artesanal e seus assemelhados, que exerçam essas atividades individualmente ou em regime de economia familiar, com ou sem auxilio eventual de terceiros (mutirão), receberá benefício no percentual de 50% do salário mínimo nacional, e caso esteja contribuindo facultativamente, terá o benefício concedido com base no salário de contribuição.
Para o cálculo da renda mensal inicial do auxilio acidente quando o salário de benefício apurado for inferior ao salário mínimo nacional, o STJ entende que embora não seja cabível a fixação imediata do auxilio acidente em valor igual ou maior que o salário mínimo, nesse caso, o salário de benefício que lhe serve como base não poderá ser inferior que o mínimo legal. Assim o valor pago a titulo de RMI (renda mensal inicial) do auxilio acidente será de pelo menos 50% do salário mínimo vigente ao tempo da concessão.
Antes da vigência da Lei 9.032/95 que fixou a renda mensal inicial do auxilio acidente em 50% do salário de benefício, este variava de acordo com o grau de redução da capacidade laborava do segurado, que correspondia a 30%, 40% ou 60% do salário de contribuição vigente no dia do acidente, não podendo ser inferior ao percentual do seu salário de benefício.
Assim, é o que se pretende demonstrar na presente etapa.
3. Data de início do benefício
Conforme estabelece o artigo 86, § 2º da Lei 8.213/91, o auxilio acidente será devido após a cessação do auxilio doença anteriormente concedido, ou da data do requerimento administrativo (DER), quando não houver concessão de auxilio doença, sendo que, a partir de 10/11/1997 passou a ser devido até a véspera do início de qualquer aposentadoria, em face da Medida Provisória n.º 1.596-14, convertida na Lei nº 9.528/97 que alterou o artigo 86 da Lei de Benefícios.
Segundo o Superior Tribunal de Justiça, não havendo concessão de auxilio doença, bem como ausente o requerimento administrativo para concessão do auxilio acidente, o termo inicial para o pagamento do benefício será a data da citação da Autarquia Previdenciária, dado ser este o momento em que o INSS toma conhecimento da pretensão da parte autora. (AgRg no Ag 1364221/SP, Rel. Min. Celso Limongi, 6ª Turma, DJe 25/05/2011).
Segundo Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari (2014, p. 801): “Salienta-se que o agendamento via internet ou pelo telefone 135 sequer preveem o requerimento de auxilio acidente, sendo, portanto, inadmissível a exigência de prévio ingresso na via administrativa neste caso – Súmula nº 89 do STJ, presumindo-se daí que a perícia do INSS indeferiu o auxilio acidente quando a cessação do auxilio doença”.
Quando a discussão é levada para o âmbito judicial, cabe ao juiz decidir consubstanciado em laudo técnico pericial, elaborado por perito médico nomeado nos autos, sobre a existência ou não de sequelas geradoras do direito ao benefício, não podendo o perito deixar de emitir parecer conclusivo, favorável ou não à matéria, sob pena de nulidade por cerceamento de defesa aos interesses do segurado (TJPR, AC 830291-6, 6ª Câmara Cível, Rel. Luiz Osório Moraes Panza, julg. 19/06/2012).
4. Período de carência
A concessão do auxilio acidente independe de carência, mas é necessário ter qualidade de segurado.
Há situações em que os segurados ficam um período sem contribuir e, mesmo assim, têm direito aos benefícios previdenciários enquanto mantiverem a qualidade de segurado.
4.1 Mantém a qualidade de segurado:
Sem limite de prazo, quem estiver recebendo benefício;
Até 12 meses após cessar o benefício por incapacidade ou o pagamento das contribuições mensais.
Esse prazo pode ser prorrogado para até 24 meses, se o trabalhador pagar mais de 120 contribuições mensais sem interrupção que acarrete perda da qualidade de segurado.
Para o trabalhador desempregado, os prazos anteriores serão acrescidos de mais 12 meses, desde que comprovada à situação por registro no Ministério do Trabalho e Emprego;
Até 12 meses após cessar a segregação, para o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
Até 12 meses após o livramento, para o segurado preso;
Até três meses após o licenciamento, para o segurado incorporado às Forças Armadas;
Até seis meses após interrompido o pagamento, para o segurado facultativo.[3]
Importante ressaltar que, dependentes que nunca tenham contribuído para o Regime Geral da Previdência Social, ou tenham perdido a qualidade de segurado, não fazem jus ao benefício.
A Previdência Social passou a conceder o auxilio doença no período de graça somente a partir da nova redação do artigo 104, § 7ª, conferida pelo Decreto nº 6.722 de 2008. A restrição até então adotada administrativamente não encontrava amparo legal.
5. Suspensão e cessação do benefício
Conforme preceitua o artigo 86, § 1º da Lei 8.213/91, o auxílio acidente será devido até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado. O benefício deixou de ser vitalício e passou a integrar o salário de contribuição para fins de cálculo do salário de benefício de qualquer aposentadoria.
O artigo 129 do Decreto 3048/1999 estabelece uma nova hipótese de cessação do benefício, conforme segue: “O segurado em gozo de auxílio-acidente, auxílio-suplementar ou abono de permanência em serviço terá o benefício encerrado na data da emissão da certidão de tempo de contribuição”.
A mencionada certidão de tempo de contribuição – CTC é expedida para os segurados que contribuíram para o Regime Próprio de Previdência, que juntando com o tempo de contribuição para o Regime Geral de Previdência Social, efetua-se uma contagem recíproca de tempo de contribuição.
Essa hipótese de cessação do auxilio acidente é controversa, uma vez que a Lei 8.213/91 nada menciona a respeito, sendo que, não havendo nenhuma previsão legal, não há possibilidade da autoridade administrativa legislar, limitando o direito do segurado.
O artigo 129 do Decreto 3048/99, dispõe que: “Art. 129. O segurado em gozo de auxílio-acidente, auxílio-suplementar ou abono de permanência em serviço terá o benefício encerrado na data da emissão da certidão de tempo de contribuição.”.
Ocorre que, data máxima vênia, o artigo 86 da Lei 8.213/91 nada prevê sobre esta ultima condição.
Nesse sentido segue a Jurisprudência: “ACIDENTE DO TRABALHO. A MERA EMISSÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO NÃO AUTORIZA O CANCELAMENTO DO AUXÍLIO ACIDENTE. EVENTUAL CUMULAÇÃO DE AUXÍLIO ACIDENTE COM APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. VIABILIDADE, NO CASO EM TESTILHA. AUXÍLIO ACIDENTE CONCEDIDO EM CARÁTER VITALÍCIO, OU SEJA, ANTERIORMENTE AO ADVENTO DA MEDIDA PROVISÓRIA 1596-14 DE 10 11.97. DIREITO ADQUIRÍDO. RECURSO IMPROVIDO. (…) A cumulação pressupõe, por si mesma, a ideia de duplicidade de benefícios, o que, com rara exceção, sempre se admitiu, proibindo, assim, a duplicidade, a regra nova, de constitucionalidade a reclamar estudo, operar-se-á se o fato gerador do auxílio acidente lhe for posterior, ou seja, reportar-se a momento aquisitivo de 12 de novembro de 1997 em diante, independentemente da data da aposentadoria, mesmo porque a aposentadoria é benefício que não pode, de forma alguma, ser negado ou suspenso, desde que, por óbvio, estejam presentes seus requisitos autorizadores. No caso dos autos, sequer a aposentadoria foi concedida, havendo, apenas, a emissão de uma certidão de tempo de contribuição, o que não sustenta o cancelamento do auxílio acidente, pelo simples fato do segurado pleitear informação a respeito de seu tempo de contribuição perante a autarquia. Assim, embora a aposentadoria ainda não tenha sido concedida, o benefício perseguido é bem anterior a 1997, razão pela qual antecede a regra nova e proibitiva, tendo, assim, um caráter vitalício, destarte, no caso em debate, a futura aposentadoria não obsta, sem qualquer sombra de dúvida, a cumulação do auxílio acidente” (grifo nosso).
Prosseguindo.
Na hipótese de reabertura de auxílio doença por acidente de qualquer natureza que deu origem ao auxílio acidente, este será suspenso até a cessação do auxílio doença reaberto, oportunidade em que será reativado. O auxílio acidente suspenso será restabelecido após a cessação do auxílio doença reaberto.
Assim, se ocorrer novo afastamento de trabalho em razão do mesmo evento que deu origem ao auxílio acidente, este será suspenso, e será restabelecido o auxílio doença enquanto perdurar a incapacidade laboral, na forma total e temporária.
Entretanto, se houver novo afastamento de trabalho do segurado por novo evento, o auxílio doença poderá acumular com o auxílio acidente desde que sejam provenientes de eventos distintos.
Importante ressaltar que o INSS indefere administrativamente a concessão do benefício auxílio acidente ao segurado que se encontra desempregado ao tempo do acidente, mas que mantém vínculo com a Previdência Social em razão do período de graça.
Tal entendimento está equivocado uma vez que a Lei 8.213/91 não vincula a concessão do benefício à existência de relação de emprego, ou seja, não há lei no sentido formal ou material que limite a concessão do beneficio ao segurado que era empregado e que se encontra sem vínculo de emprego ao tempo do acidente, ou seja, no período de graça, pois o segurado durante esse período se encontra coberto pelo plano de benefícios da previdência social, conforme estabelece o artigo 15, §3ª da Lei 8.213/91.
6. Manutenção do auxilio acidente concedido antes da lei 9.528/1997 cumulado com aposentadoria:
A Lei 9.528/1997 vedou a acumulação do auxilio acidente com qualquer aposentadoria, e, dentre outras modificações, alterou o artigo 31 da Lei 8.213/91, que passou a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 31. O valor mensal do auxílio-acidente integra o salário-de-contribuição, para fins de cálculo do salário-de-benefício de qualquer aposentadoria, observado, no que couber, o disposto no art. 29 e no art. 86, § 5º".
Nesse sentido, Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari (2014, p. 806) aduziu:
“Dessa forma, o legislador procurou amenizar os efeitos da nova norma – que afastou o caráter de vitaliciedade do auxilio acidente – possibilitando ao segurado recuperar parte do prejuízo com a elevação do valor da aposentadoria a ser concedida pelo RGPS (…).”
“A nova disciplina do beneficio em comento retirou-lhe a vitaliciedade, porém manteve sua percepção desde a cessação do auxilio doença até a concessão da aposentadoria – § 1º do art. 86 da Lei 8.213/91. Violando tal previsão legal, o Regulamento estabelece, em seu artigo 104, § 7º a possibilidade de o INSS suspender o benefício quando o segurado estiver desempregado, o que não encontra o menor amparo legal. Não havendo tal restrição na Lei, não cabe à autoridade administrativa “legislar”, limitando o direito do segurado ao benefício”.
Ocorre que o INSS administrativamente diverge do entendimento jurisprudencial.
Por exemplo, um segurado em gozo de auxilio acidente concedido em 02/1999, em virtude de acidente ocorrido no ano de 1995, quando requerida à aposentadoria por tempo de contribuição teve o beneficio cessado administrativamente, aplicando o dispositivo legal (artigo 86, § 3ª da Lei 8.213/91) que veda a acumulação de auxilio acidente com aposentadoria.
Entende-se que, em face do princípio tempus regis actum, que significa que o ato é regido pela lei vigente ao tempo de sua realização, é possível a acumulação das duas prestações previdenciárias, pois, a legislação vigente ao tempo do acidente não vedava o recebimento conjunto do auxílio acidente com aposentadoria.
A Jurisprudência do STJ é pacifica, e nesse sentido aduz: “PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE E APOSENTADORIA. CUMULAÇÃO. MOLÉSTIA SURGIDA ANTES DA LEI 9.528/97. POSSIBILIDADE. 1. Conforme matéria já pacificada pela Terceira Seção deste Tribunal, tendo a moléstia acidentária acometido o autor antes da vigência da Lei 9.528/97, que proíbe a cumulação do auxílio-acidente com qualquer aposentadoria, em respeito ao princípio do tempus regit actum, deve ser garantida a percepção dos benefícios pleiteados. 2. Embargos de divergência acolhidos para negar provimento ao recurso especial.” (EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 481.921 – SP (2003/0100806-5) RELATOR : MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA EMBARGANTE : JOSÉ HONÓRIO DO AMARAL ADVOGADO : ARMANDO CAVINATO FILHO EMBARGADO : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS PROCURADOR : SÉRGIO LUÍS RUIVO MARQUES E OUTROS).”
Essa alteração foi prejudicial ao segurado, por dois motivos:
Primeiro, porque, incluídos os valores do auxilio acidente no salario de contribuição para o cálculo da aposentadoria, depois de aplicados os índices de correção monetária, o fator previdenciário e o coeficiente, aquele valor restará diluído, de modo que não representará acréscimo na renda mensal inicial do beneficio idêntico ao da renda mensal do auxilio acidente.
Segundo, caso o novo beneficio ultrapasse o valor do teto haverá dedução, ao passo que, no regime anterior, não estava descartada a hipótese de que a aposentadoria, somada a auxilio acidente, superasse o valor do teto, sem ferir a lei, na medida em que se tratava de dois benefícios distintos. (In ROCHA, Daniel Machado da, BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social, 3.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado/Esmafe. 2003, pp. 267-268).
O STF ainda não decidiu sobre a possiblidade de cumulação do auxilio acidente, concedido antes da vigência da Lei 9.528/97, com aposentadoria, o qual será apreciado pelo RE 687.813/RS, relator Ministro Luiz Fux, DJe de 18/10/2012.
Conclusão:
O benefício em questão é devido ao segurado acidentado como forma de indenização, sem caráter substitutivo do salário, quando após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza ou do trabalho, resultem em sequelas que diminuam a capacidade laborativa que o segurado exercia habitualmente.
O auxilio acidente não deve ser confundido com auxilio doença. O primeiro é devido após a consolidação das lesões ou perturbações funcionais de que foi vitima o acidentado, já o segundo é devido de forma temporária, enquanto perdurar a incapacidade para o trabalho. O auxilio acidente não é percebido juntamente com o auxilio doença, mas somente após a cessação do mesmo.
A concessão do beneficio independe do numero de contribuições pagas, mas é preciso preencher o requisito da qualidade de segurado (vide item “5”). A sua concessão se dá a partir do dia seguinte ao da cessação do auxilio doença, independente de qualquer remuneração ou rendimento percebido pelo acidentado, o que demonstra o caráter indenizatório do beneficio e não substitutivo do salário.
Após a entrada em vigor da Lei 9.528/1997, ficou vedada a acumulação do auxilio acidente com qualquer aposentadoria, ou seja, deixou de ser vitalício e passou a integrar o salário de contribuição para fins de cálculo do salario de beneficio de qualquer aposentadoria.
Já com a entrada em vigor da Lei 9.032/95, a Renda Mensal Inicial passou a corresponder a 50% do salário de beneficio, sendo devido até a véspera de qualquer aposentadoria, uma vez que é vedada a sua acumulação, ou até a data do óbito do segurado.
A cessação do beneficio se dá com a aposentadoria ou morte do segurado e quando da emissão da certidão de tempo de contribuição – CTC. Esta última hipótese de cessação é discutível a sua legalidade, pois não se encontra amparada pela Lei 8.213/91 e não havendo previsão legal, não cabe à autoridade administrativa legislar.
Diante de todo o exposto, conclui-se que este trabalho aborda questões práticas sobre o auxilio acidente e cita entendimentos jurisprudenciais em relação ao tema, com ênfase nas alterações legislativas ocorridas ao longo dos anos.
Informações Sobre o Autor
Verônica Caminoto Chehoud
Advogada. Escritório de Advocacia, sito à Rua Couto Magalhães, 1888. Centro. CEP: 14400-490. Franca/ SP. Membro da Federação das APAES do Estado de São Paulo e da Comissão do Jovem Advogado de Franca/SP – 13ª Subseção. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Franca. Franca/SP