Resumo: O dano estético, que figura na família dos danos extrapatrimoniais, com suas características sempre existiu no mundo dos fatos, porém, sua existência demorou a ser reconhecida no mundo do direito, tendo sido um adendo ao dano moral durante muito tempo. Porém, tendo em vista a evolução processual, bem como o direito concreto acontecendo e forçando uma particularização, o dano estético tomou forma e assumiu sua identidade, apartando-se do dano moral, porém tendo ele como um aliado na compensação indenizatória[1].
Palavras-chave: Dano estético. Dano moral. Particularidades do dano. Prejuízos do dano.
Abstract: The esthetic damages contained in the family with the extra-marital affairs, has always existed in the world of facts, but it was slowly recognized in the world of law, having been an addendum to the moral damages for a long time. However, in view of the procedural developments, as well as a right and forcing a particularization, esthetic damages took shape and assumed his identity, departing from the moral damages, but having him as an ally in indemnity compensation.
Keywords: Esthetic damages. Moral damages. Particularities damages. Losses from harm.
Sumário:1.Introdução;2. Dano estético e Dano moral: o que os difere? 2.1 O surgimento do dano estético no ordenamento jurídico brasileiro, e suas características; 2.2 O surgimento do dano moral no ordenamento jurídico brasileiro, e suas características; 2.3Características conflitantes do dano estético e do dano moral; 3.Como comprovar o dano estético e o seu prejuízo 4. Dano estético por ricochete; 5. O dano estético: um braço do dano moral ou um dano único à personalidade? 6. Conclusão; 7. Referências.
1. Introdução
O dano estético é um dano extrapatrimonial, no âmbito da responsabilidade civil e nasceu após os danos materiais e morais, que são elencados no inciso V do artigo 5º da Constituição Federal.
O dano estético, antigamente, era absorvido na indenização do dano moral, sendo atrelado a ele, sem suas próprias características definidoras. Porém, com o passar do tempo e os casos concretos a que este clamava por uma particularização, foi considerado um dos danos à personalidade. Contudo, apesar de terem características conflitantes e idênticas, existem decisões que ainda unem a indenização pecuniária, de forma que o dano o moral, absorve o estético.
O objetivo do presente trabalho é analisar o dano estético e todas as suas características, benefícios e decisões, bem como apresentar a parte histórica de ambos os danos e comparar os pensamentos dos doutrinadores acerca deles, bem como estudar as decisões dos Tribunais ao longo do tempo, analisando sua fundamentação, de forma a concluir se tal dano à pessoa merece uma aplicação jurisdicional específica.
Kfouri Neto preconiza que o dano estético se trata de um dano extrapatrimonial e que, como o dano moral, traz prejuízo ou alteração de uma condição favorável, tanto pela força da natureza quanto pelo trabalho do homem . Esse dano, assim como os demais elencados no ordenamento jurídico, também estão dirimidos no Código Civil brasileiro, em seu artigo 927. Assim, com a aplicação das decisões acerca do dano moral e, posteriormente, tendo em vista a necessidade de dar ao dano estético a visibilidade atinente à importância do mesmo, este passou a ter sua própria particularidade e indenização.
O presente estudo tem por finalidade demonstrar as características únicas do dano estético e caracterizá-lo como um dano tão importante quanto o moral, e seu dever jurídico de indenizar, seja de forma cumulativa ou não. Pretende-se, ainda, apresentar as características conflitantes entre os danos moral e estético, a parte probatória deste e a forma reflexiva do dano em estudo. A base desse trabalho consiste na pesquisa em livros, artigos científicos, periódicos e jurisprudências diversas.
O artigo está organizado em introdução e cinco subtítulos, com o intuito de estudar o dano estético e o dano moral desde o seu surgimento, suas características, o que os difere, e, por fim, concluir se o dano estético realmente merece o status de dano extrapatrimonial, diferido do dano moral.
2. Dano estético e dano moral: o que os difere?
O dano etimologicamente vem do vocábulo latino demere, que significa tirar, apoucar, diminuir.
O dano estético e o dano moral estiveram atrelados durante muito tempo, e, ainda hoje, encontram-se decisões que os ligam, na forma de indenização pelo dano ocorrido, porém, diferente da súmula 387 do STJ (a qual institui a licitude da cumulação dos valores, mas com a comprovação da caracterização de ambos os danos no caso concreto, e a distinção entre eles, unindo assim, apenas os valores pecuniários) ainda encontram-se decisões recentes de Tribunais que os conjugam como um só, sem distingui-los, fazendo com que o dano moral absorva o dano estético.
O ilustre desembargador do TRT da 3ª Região, Sebastião Geraldo de Oliveira, adota o entendimento de que é possível a cumulação do dano moral com o dano estético, nos seguintes termos:
“Mesmo estando o dano estético compreendido no gênero dano moral, a doutrina e a jurisprudência evoluíram para deferir indenizações distintas quando esses danos forem passíveis de apuração em separado, com causas inconfundíveis. O dano estético está vinculado ao sofrimento pela deformação com sequelas permanentes, facilmente percebidas, enquanto o dano moral está ligado ao sofrimento e todas as demais consequências nefastas provocadas pelo acidente.
Desse modo, o dano estético materializa-se no aspecto exterior da vítima, enquanto o dano moral reside nas entranhas ocultas dos seus dramas interiores; o primeiro, ostensivo, todos podem ver; o dano moral, mas encoberto, poucos percebem. O dano estético, o corpo mostra, o dano moral, a alma sente”[2].
Conforme o pensamento deste jurista, o sofrimento, bem como o prejuízo causado por ambos os danos atuam de forma e seguimento diferente na vítima, devendo, portanto, serem reconhecidos de forma independente no ordenamento jurídico.
O direito evolui com o tempo e com os casos concretos que surgiram ao longo dele, tendo a nossa Carta Magna, em sua edição de 1988 previsto apenas três danos no artigo 5º, inciso V, sendo eles os danos materiais, morais e a imagem. Desde então as decisões vem mudando ao longo deste tempo e os danos se caracterizando de forma personalíssima, o que acontece em todos os seguimentos do nosso ordenamento jurídico, e se aperfeiçoando com o intuito de atender as demandas de forma justa e pessoal.
Esta evolução fez com que as diferenças entre os danos morais e estéticos viessem à tona e se personalizassem cada uma à sua forma e assim, tomassem formas distintas.
O dano moral é o dano que atinge o interior do indivíduo, é aquele dano que causa dor psíquica, humilhação, chacota, embaraçamento da vítima perante si mesmo e à sociedade em que convive. É o que traz dor à alma. Sua conjunção probatória se dá por meio de depoimento pessoal e testemunhal, o qual confirme que a vítima esteve abalada emocionalmente, e/ou constrangida perante a sociedade em razão daquele dano.
Aduz Zannoni[3] que o dano moral direto consiste na lesão a um interesse que visa a satisfação ou gozo de um bem jurídico extra patrimonial contido nos direitos da personalidade (como a vida, a integridade corporal, a liberdade, a honra, o decoro, a intimidade, os sentimentos afetivos, a própria imagem) ou nos tributos da pessoa (como o nome, a capacidade, o estado de família). O dano moral indireto consiste na lesão a um interesse tendente à satisfação ou gozo de bens jurídicos patrimoniais, ou melhor, é aquele que provoca prejuízo a qualquer interesse não patrimonial, devido a uma lesão a um bem patrimonial da vítima. Deriva, portanto, do fato lesivo a um interesse patrimonial.
Já o dano estético se carateriza pela alteração da forma de origem da vítima, o enfeamento do corpo, a diferença entre o seu estado normal para um estado de inferiorização, a qual, como o dano moral, também causa embaraçamento, porém de forma visual, estética. A prova cabal do dano estético é o contato visual com a vítima, pessoalmente ou através de imagens, a qual demonstre a diferença visual após o acontecimento danoso.
2.1. O surgimento do dano estético no ordenamento jurídico brasileiro, e suas características
O Código Civil de 1916, em seu artigo 1538, § 2º aduzia a uma situação especial de indenização por aleijão ou deformidade, se a vítima fosse mulher solteira ou viúva, ainda capaz de casar. Nesta situação o código determinava uma indenização que era denominada dote, segundo as posses do causador do dano e a gravidade do defeito. Este dote seria a compensação pecuniária que aliviaria a dificuldade que esta mulher teria para se casar. A índole deste era de indenização por dano moral, uma vez que nem se falava em dano estético, mas a sua caracterização já era a mesma dos dias de hoje, uma alteração morfológica de formação corporal que agride a visão, causando desagrado e repulsa. O dano estético é sempre visível, pois se concretiza na deformidade.
Para Tereza Ancona Lopes, Estética advém do grego aisthesis, que significa sensação. Tradicionalmente é o ramo da ciência que tem por objeto o estudo da beleza suas manifestações na arte e na natureza[4].
Maria Helena Diniz preconiza que “O dano estético é toda alteração morfológica do indivíduo, que além do aleijão, abrange as deformidades ou deformações, marca e defeitos, ainda que mínimos, e que impliquem sob qualquer aspecto um afeamento da vítima, consistindo numa simples lesão desgostante ou num permanente motivo de exposição ao ridículo ou de complexo de inferioridade, exercendo ou não influência sobre sua capacidade laborativa”[5]. Frisa-se aqui que é necessário que tenha havido uma piora em relação ao que a pessoa era antes, relativamente aos seus traços de nascimento e não em comparação com algum exemplo de beleza.
Já Sebastião Geraldo de Oliveira, na sua obra “Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional”, aduz que:
“Além das indenizações por dano material e moral, pode ser cabível a indenização por dano estético, quando a lesão decorrente do acidente do trabalho compromete ou pelo menos altera a harmonia física da vítima. Enquadra-se no conceito de dano estético qualquer alteração morfológica do acidentado, como, por exemplo, a perda de algum membro ou mesmo de um dedo, uma cicatriz ou qualquer mudança corporal que cause repulsa, afeamento ou apenas desperte a atenção por ser diferente.
O prejuízo estético não caracteriza, a rigor, um terceiro gênero de danos, mas representa uma especificidade do dano moral, sobretudo quando não produz repercussão de natureza patrimonial como ocorre no caso de um artista ou modelo”[6].
O erro médico é um grande gerador do dano estético, não somente nas cirurgias plásticas, as quais, em sua maioria, visam o embelezamento, mas também nos demais procedimentos, como em um caso concreto acontecido em Minas Gerais/MG, em que, durante o parto realizado em uma na Clínica Mater, houve vários erros de procedimentos e a perícia constatou que o erro médico deixou inúmeras sequelas. Segundo os autos, a vítima ficou sem a capacidade de controlar a defecação, perdeu parte do reto e do intestino, o controle do esfíncter e sofreu prejuízos à vida profissional e sexual. Em primeira instância a clínica foi condenada em 200 mil reais por danos morais e materiais, sendo reformada em sede de apelação para um valor menor, tendo, no STJ a sua majoração para 50 mil de danos morais, sendo que O ministro destacou que o dano estético causa danos materiais e morais, não tendo previsão própria no ordenamento jurídico brasileiro. Entretanto, o ministro admitiu que a orientação da 3ª Turma tem sido de conceder a indenização, que fixou em R$ 150 mil[7].
Decisões nessa esfera buscam a reparação material de um dano extrapatrimonial, visando à compensação pecuniária pelo dano sofrido, em sua maioria, de forma permanente ou duradoura.
2.2. O surgimento do dano moral no ordenamento jurídico brasileiro, e suas características
Na legislação brasileira o dano moral teve seu desenvolvimento ao longo de diversas leis, que, aos poucos, foram reconhecendo a figura da reparação ao dano não material. O desenvolvimento social trouxe consigo os conflitos entre os indivíduos, que extrapolavam da esfera patrimonial, chegando a ofender direitos pessoais, tais como dignidade, honra, intimidade, e os demais direitos de personalidade.
Diante destas ofensas imateriais, o legislador passou a dar mais valor para tal situação, assim, para amparar as vítimas dos danos morais, as legislações começaram a introduzir a reparação não mais restrita ao dano patrimonial, mas também ao dano extrapatrimonial.
O dano moral tem suas raízes nas mais remotas civilizações, o que, consequentemente, influenciou o nosso legislador para implantar o instituto da reparabilidade ao dano imaterial em nosso ordenamento jurídico.
À época da colonização do Brasil, eram as Ordenações do Reino que apresentavam normas para regularizar as relações sociais, ou seja, tais ordenações eram um conjunto de normas que regulavam o direito comercial, civil, processual e outros, que deveria ser aplicado na coroa portuguesa e em suas colônias.
Tais ordenações já previam a possibilidade da reparação ao dano extrapatrimonial, conforme assevera Claudia Regina Bento de Freitas[8]:
“Talvez uma das mais antigas referências à indenização por dano moral, encontrada historicamente no direito brasileiro, está no Título XXIII do Livro V das Ordenações do Reino (1603), que previa a condenação do homem que dormisse com uma mulher virgem e com ela não se casasse, devendo pagar um determinado valor, a título de indenização, como um “dote” para o casamento daquela mulher, a ser arbitrado pelo julgador em função das posses do homem ou de seu pai”.
O Código Penal de 1890, em seu Titulo XI, trouxe previsão para os crimes que atentem contra a honra e a boa fama das pessoas, conforme o artigo 316:
Art. 316. Si a calumnia for commettida por meio de publicação de pamphleto, impresso ou lithographado, distribuido por mais de 15 pessoas, ou affixado em logar frequentado, contra corporação que exerça autoridade publica, ou contra agente ou depositario desta e em razão de seu officio: Penas – de prisão cellular por seis mezes a dousannos e multa de 500$ a 1:00000$.
Vê-se no artigo acima que se quer punir aquela pessoa que deprecie a honra de outrem, assim fica criatalina a preocupação do Código Penal de 1890 com o bem imaterial do individuo, ou seja, a honra, aplicando ao autor do dano pena de prisão e multa.
O Código Civil Brasileiro de 1916, elaborado pelo jurista Clóvis Beviláqua, compilou normas para regular as relações privadas entre os indivíduos, e dentre estas normas, o referido Código apresentou a possibilidade para a reparação ao dano imaterial. O artigo 1547 do referido código, trouxe em sua redação a ideia da reparação ao dano extrapatrimonial, dispondo que: “A indenização por injúria ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido.”. O artigo 76 e seu parágrafo único, ainda do Código de 1916, trouxeram como dos pressupostos para a legitimidade da ação, o interesse moral do postulante: Art. 76. Para propor, ou contestar uma ação, é necessário ter legítimo interesse econômico, ou moral. Parágrafo único. O interesse moral só autoriza a ação quando toque diretamente ao autor, ou à sua família.
Ante exposto acima, compreende-se que, indiscutivelmente, o código de 1916 trouxe a possibilidade da reparação ao dano moral, o que certamente direcionaria os legisladores brasileiros a ver este instituto de forma diferente, e obviamente fortalecê-lo em outros diplomas legais.
Observa-se que o Código Civil brasileiro de 1916 plantou a semente da reparação do dano moral, que ao longo do desenvolvimento da sociedade brasileira teve enorme dificuldade para ser reconhecido, assim com o advento do referido código, o dano moral ganhou evidencia no ordenamento jurídico pátrio, chegando ao ponto de obter um caráter constitucional. A Constituição Federal do Brasil, promulgada em 1988, trouxe em seu texto previsão legal para garantir os direitos individuais dos cidadãos brasileiros, desta forma o artigo 5º, incisos V e X, trás a seguinte disposição acerca da reparabilidade da lesão a moral, senão vejamos:
“V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente da sua violação;”
A partir de seu reconhecimento constitucional, o Dano Moral passa a ser valorizado pelos aplicadores do direito, pois a promulgação da Constituição de 1988 abriu caminhos para se pleitear indenização ao Dano que fosse de caráter moral. Vimos que a reparação ao dano moral apareceu de forma taxativa na Constituição Federal de 1988, tal previsão, traz a forma de reparação da lesão ao dano unicamente extrapatrimonial. Assim, com o amparo constitucional o Dano Moral enraizou-se de forma definitiva em nosso ordenamento jurídico.
A grande novidade que trouxe o Código de 2002 foi à expressão “exclusivamente moral”, pois sacramentou de forma bem clara, que se alguém sofresse um dano exclusivamente moral, teria o direito de receber indenização.
O artigo 186 do referido código civil, deixa explicita a obrigação da reparação ao dano imaterial, apresentando a seguinte redação:
“Art. 186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
Assim não restam dúvidas que quando o legislador de 2002 utilizou a expressão “ainda que exclusivamente moral”, somente ratificou a existência da reparação do dano moral, que já estava presente no artigo 5º da constituição pátria, que trata sobre os direitos e garantias fundamentais.
Assim, resta configurada a evolução histórica do dano moral no direito brasileiro, e como ele se solidificou no nosso ordenamento jurídico pátrio, e a sua importância caracterizada como uma lesão grave, imaterial e extrapatrimonial.
2.3. Características conflitantes do dano estético e do dano moral
Orlando Gomes leciona acerca do dano moral o seguinte: “Ocorrem duas hipóteses. Assim, o atentado ao direito, à honra e boa fama de alguém pode determinar prejuízos na órbita patrimonial do ofendido ou causar apenas sofrimento moral. A expressão ‘dano moral’ deve ser reservada exclusivamente para designar o agravo que não produz qualquer efeito patrimonial. Se há consequências de ordem patrimonial, ainda que mediante repercussão, o dano deixa de ser extrapatrimonial[9]”.
No parágrafo acima Orlando Gomes preceitua o dano moral como totalmente distinto do dano patrimonial, desfazendo qualquer relação entre os danos material e moral.
O dano estético também está na família dos danos imateriais e extrapatrimoniais, e por essa característica, dentre outras, foi muitas vezes tratado como um adendo do dano moral, o qual era absorvido por este no momento da compensação pecuniária.
O dano moral e o dano estético possuem algumas características idênticas, tais como imaterial, extrapatrimonial, à personalidade. Ambos ferem a honra, a dignidade, a imagem e ambos causam dor, aflição, angústia.
São frutos da responsabilidade civil e precisam de nexo causal, bem como o dolo ou a culpa do causador do dano.
O dano estético é aquele dano que causa uma mutação, afeamento, qualquer alteração no aspecto físico do indivíduo, deixando-o, diferente de sua forma original.
Igualmente, o efeito prolongado ou a permanência dos efeitos deste dano caracterizam o dano estético, uma vez que uma situação em que o dano possa ser revertido totalmente em um prazo razoável de tempo não há o que se falar em dano estético, mas em atentado reparável à integridade física ou lesão passageira que se resolve em perdas e danos[10]. (nota de fim – DINIZ, Maria Helena, op. cit., p. 47DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2012).
O dano moral pode ser classificado em sentido próprio, ou seja, constitui aquilo que a pessoa sente como, por exemplo, a dor, tristeza, amargura, angústia, depressão e, em sentido impróprio, onde o dano moral constitui qualquer lesão aos direitos de personalidade, como a liberdade, a opção sexual, a opção religiosa, entre outros, neste último não há que se falar em prova para sua caracterização.
Nota-se aqui que a maior diferença entre os danos é que o estético exige um resultado físico, diferente do moral que é um abalo psíquico, não visível aos olhos. Também não se exige uma durabilidade do abalo moral, que se exige no estético.
3. Como comprovar o dano estético e o seu prejuízo
Para que o dano estético seja comprovado é necessário que haja, necessariamente, todas as seguintes características:
a) Existência do dano à integridade física da pessoa. Ou seja: lesão que promova “afeamento” à imagem externa da pessoa atingida, sendo que tal alteração deve ser para pior. Mais sucintamente, tal piora deve ocorrer em relação ao que a pessoa era antes da ocorrência da mesma relativamente aos seus traços naturais (de nascimento), não em comparação com determinado exemplo de beleza.
b) A lesão promovida deve ter um resultado duradouro ou permanente. Caso contrário, não há dano estético propriamente dito, mas sim atentado reparável à integridade física ou lesão estética passageira. Fica evidente que a característica que se busca neste tópico identificar consiste na irreparabilidade do prejuízo causado à aparência externa da pessoa sofredora da lesão.
c) Não há necessidade de a lesão ser aparente. Ou seja, não existe necessidade que a mesma seja facilmente vista por terceiros. Basta somente que a mesma exista no corpo, mesmo que resida em partes nem sempre em evidência. Logo, há de se ater à possibilidade da lesão ser vista sob qualquer circunstância.
d) Por fim, em se tratando do ponto mais importante a ser evidenciado quando se promove a conceituação de dano estético, há de ser ressaltado que o dano estético necessariamente enseja dano moral. Ou seja: persiste a necessidade da lesão à imagem externa da pessoa proporcionar à mesma um “mal-estar”, ou melhor, humilhação, tristeza, constrangimento, enfim, menos feliz em virtude do sofrido.
Em síntese, pode-se afirmar que são quatro os elementos que caracterizam o dano estético: piora na aparência, irreparabilidade, permanência e sofrimento moral. Assim, sendo-os comprovados está caracterizado o dano estético.
Tendo em vista as situações diversas que podem dar origem ao dano estético faz-se necessário observar que este pode ser delitual (quando não há vinculo anterior entre as partes) e contratual (por exemplo, as lesões advindas de operações ou tratamentos médicos, dentários, entre outros).
Salienta-se também que a obrigação da reparação do dano existirá sempre produzida contratualmente ou de forma delitual, com a observância da responsabilidade civil objetiva ou teoria do risco, onde neste caso basta o nexo de causalidade entre fato e dano, independente de culpa para ensejar obrigação de indenizar[11].
Existem outros pontos distintos quanto à diferenciação das duas responsabilidades relativas ao dano estético, uma vez que a contratual é definida por termos contratuais podendo constar dela limitações, como cláusulas excludentes de culpa leve (até mesmo a culpa delitual). Outra diferença, e esta primordial, diz respeito à presunção de culpa, que acarreta a inversão do ônus da prova quanto à responsabilidade contratual, o que traz maior facilidade para vitima. Já quanto a delitual, a culpa do autor deverá ser provada pela vitima.
Observando o dano estético, este deve ser sempre indenizado, sendo originário de contrato ou não, pois sua proteção vai além do acordo de vontade das partes, por se tratar de direitos absolutos.
As cirurgias plásticas estéticas ou cosmetológicas visam a melhorar a aparência externa de alguém, ou seja, têm por objetivo o embelezamento da pessoa, sendo assim, uma obrigação de resultado, diferente dos procedimentos médicos que visam a saúde do paciente e assim sendo, são obrigações de meio, pelo fato do médico não poder dar a certeza da cura.
Concluindo, para Teresa Ancona Lopez, a indenização deve ser a mais completa possível, para efetiva proteção da vitima[12].
4. Dano estético por ricochete
Trata-se da possibilidade de extensão da indenização a outras pessoas que não a do ofendido. É a hipótese de os parentes e até amigos íntimos do lesado virem a pedir indenização por dano estético, a título de dano moral, em virtude do vinculo que os une. É o que a doutrina chama de dano ricochete, também citado como dano moral reflexo ou indireto. É a repercussão de um dano sofrido por outras pessoas. Trata-se de interesse próprio.
Carlos Alberto Bittar afirma que “os parentes até o 4º grau estão legitimados a pedir indenização por dano moral ricochete. São exatamente aquelas pessoas que mantêm ou vínculos firmes de amor, de amizade ou de afeição, como os parentes mais próximos; os cônjuges que vivem em comum; os unidos estavelmente[13]”.
Presume-se o dano moral para aqueles que têm ligação de parentesco ou vinculo. Outros terão que provar, como por exemplo, noivos ou amigos íntimos. O momento do pedido é importante, já que a dor passa ou se ameniza.
É o dano moral indireto, no qual a legitimidade processual muda, uma vez que quem postula a compensação pecuniária é um familiar ou cônjuge de quem sofreu o dano. Neste caso específico, é o dano moral indenizado à pessoa que sofreu forte abalo com o resultado ocasionado pelo dano estético na vítima.
Este dano deve ser postulado em ação própria, podendo também ser ajuizado na Justiça do Trabalho, uma vez que o dano tenha sido ocasionado em acidente de trabalho, e por ascendentes, descendentes, cônjuge ou parente que dependa economicamente da vítima.
Conforme o julgado abaixo colacionado, o dano reflexo tem de ser amplamente comprovado naquela pessoa que convive com a vítima e postula tal indenização.
“Responsabilidade civil Queda no interior de veículo de transporte coletivo Lesões sofridas pela irmã da autora Cerceamento de defesa Danos morais reflexos. 1. Não há cerceamento de defesa quando o julgamento da lide independe de dilação probatória. 2. Para que se configurem os danos morais reflexos é necessário que as consequências do evento lesivo causem grave abalo psicológico naqueles que convivem com a vítima, sem o que, caracteriza-se mero aborrecimento do cotidiano.Recurso não provido”. (TJ-SP – APL: 1281456220098260001 SP 0128145-62.2009.8.26.0001, Relator: Itamar Gaino Data de Julgamento: 21/09/2011, 21ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 23/09/2011)(grifei)
5. O dano estético: um braço do dano moral ou um dano único à personalidade?
Chegar ao conceito de Estética é um desafio para os estudiosos desde o início dos tempos. No entendimento de Aristóteles, é a estética uma ciência prática ou normativa que dá regra ao fazer humano sob o aspecto do belo. Portanto, é a ciência que tem como objeto material a atividade humana (fazer) e como objeto formal (aspecto sob o qual é encargo esse fazer), o belo. Na realidade, essa definição tende-se sempre ser dada de acordo com as realidades.
Quando falamos em dano estético, estamos falando da ofensa à beleza externa de alguém, ou seja, da integração das formas físicas de alguém. Ele surge a partir de um sentimento de constrangimento ou de humilhação e desgosto que o lesado tem ao ver que não existe mais a harmonia de seus traços, e que no lugar destes existirá uma marca, mesmo que pequena, que lhe desperte a sensação de inferioridade.
Existem divergências com relação à possibilidade de cumulação de danos morais com dano estético, isto porque o dano estético (grave deformação física) é uma espécie de dano moral, este que trata de danos a bens inestimáveis, como as tristezas interiores da vítima e que podem seguir esta pelo resto da vida.
Alega-se que o dano estético deve ser considerado um “plus negativo” ao dano moral, pois a vítima terá que pelo resto da vida enfrentar o ambiente social e os preconceitos causados por suas possíveis deformidades.
Pelo dano estético ser este dano que, como o dano moral, abala o íntimo da vítima, causando sofrimento e humilhação, teve por muito tempo no ordenamento jurídico, uma conotação de “adendo” ao dano moral. Sua indenização era inserida e o mesmo não era reconhecido como um dano, mas como uma causa do dano moral.
Com o passar do tempo conforme discorrido durante o artigo, o dano estético foi se enquadrando no ordenamento jurídico e ganhando sua própria personalidade, sendo que o dano estético está mais dependente do dano moral pelo fato de que, por óbvio, quem sofre o dano estético, também sofre o dano moral em razão dele, e a sua cumulatividade é inclusive defendida por súmula, porém trata-se de danos diferentes e com características que são decisivas para a sua configuração, diferentes.
A cumulatividade destas duas matérias possuem argumentos que se baseiam na existência de dois bens jurídicos distintos, atingidos no mesmo fato danoso, justificando a reparação cumulativa do dano.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro apresentou a diferença entre os danos de modo mais claro: ‘O dano moral é aquele invade psique do indivíduo, tais como, a dor, o sofrimento, a humilhação, o constrangimento, o vexame e outros, enquanto o dano estético abala o corpo, o físico, o visível, a deformidade, o aleijão, a cicatriz, a repulsa que pode causa àqueles que, sem sentimento e respeito, expõe ao lesado a sua repugnância. A diferença é notória, pois não guarda qualquer semelhança à violação da honra – princípio que norteia o caráter, a honestidade, a dignidade – como o aleijão, a deformidade e as cicatrizes, ressaltando, ainda, que o tempo se encarrega de fazer a vítima superar a primeira, enquanto que a segunda se perpetua até a morte[14].
Assim, haja vista as diferenças significativas na caracterização de ambos os danos, se conclui que o dano estético é um dano único ao indivíduo, e suas consequências, na maioria das vezes, é permanente e muito mais dolorida emocionalmente do que um dano moral por si só.
6. Conclusão
O presente artigo versou sobre a “personalidade” do dano estético, com todas as suas características, particularidades, surgimento, evolução histórica e aplicação nos casos concretos, com o intuito de analisar suas semelhanças com o dano moral, dano também extrapatrimonial como o estético, e concluir o porquê o dano estético esteve, e ainda hoje figura como um apenso do dano moral, nem sempre sendo reconhecido como um dano único à personalidade e muitas vezes somente mencionado na decisão e não compensado monetariamente.
Por tal motivo, o artigo foi desenvolvido, a fim de esmiuçar as características determinantes na configuração do dano estético, e assim compará-las com as características do dano moral, a fim de entender o motivo pelo qual alguns julgadores, com seu poder discricionário, acabam por não reconhecer o dano estético como um dano único e indenizável.
Durante o desenvolvimento, foi observado que ambos os danos provocam efeitos iguais na vítima, como o constrangimento, a humilhação, o sofrimento psicológico, porém, tais sentimentos são considerados como o abalo moral que o indivíduo sofre quando vítima do dano estético. Ocorre que a caracterização do dano estético tem pontos totalmente diferentes do dano moral, sendo um trauma primeiramente físico, e na maioria das vezes, permanente.
Assim, a alteração física permanente que sofre o indivíduo, que provoque uma piora ao seu estado físico anterior, faz com que este seja considerado vítima de dano estético. Tal modificação, por óbvio o deixa abalado moralmente, pois o dano estético provocou o dano moral.
A cumulação das indenizações pelos danos moral e estético está assegurada pela súmula 387 do Superior Tribunal de Justiça, que preconiza:
É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral[15].
A licitude está em arbitrar um valor que abranja ambas as indenizações, suficiente para tanto, sendo que deve ficar claro no decisório que os valores condizem com a compensação pelos danos estéticos e morais.
Talvez tal norteador confunda ainda algumas pessoas, uma vez que está pacificada a cumulação, porém, o dano estético é um dano por si só grave, e ser suprimido pelo dano moral é injusto com a vítima.
Assim, tendo em vista o estudo realizado conclui-se que o dano estético, por ter suas características definidoras muito opostas às do dano moral, e por causarem tanta penúria à vítima do dano, trata-se de um dano único à personalidade, que deve ser reconhecido e compensado pecuniariamente de forma justa e personalíssima, tendo no dano moral um “parceiro”, igualmente indenizável.
Informações Sobre o Autor
Michelle Antunes Espinoza
Advogada graduada em Direito pela Universidade Estácio Fargs. Atuou como assistente nos escritórios Lúcio de Constantino e Advogados Associados Jobim Salzano Advogados Nedel Wurdig Advogados e Flávio Obino Filho Advogados Associados. Atuou como Assessora no Gabinete do Prefeito de Minas do Leão/RS. Atualmente consultora jurídica da Rama Consultoria ramaconsultoria.com.br.