Resumo: A convivência familiar é um direito tanto dos pais quanto dos filhos e subsistirá, bem como o poder familiar, ainda que os primeiros se encontrem encarcerados, cumprindo pena. Tal garantia só comporta exceção se a condenação dos pais tiver sido fixada em virtude de crime doloso cometido contra a própria prole e que tenha pena de reclusão. Não havendo incidência desta situação, a visita dos filhos menores aos pais encarcerados independe de autorização judicial. Ademais, as denominadas “mães do cárcere”, possuem o direito de amamentar seus filhos durante o período de aleitamento materno. Sabe-se, contudo que os estabelecimentos prisionais brasileiros possuem condições precárias, ambiente desaconselhável aos menores de idade, sem contar o procedimento constrangedor de revista pelo qual os visitantes são obrigados a passar. Portanto, tem-se, de um lado, o direito do menor à convivência familiar e, de outro, o seu direito à dignidade. Este trabalho aborda este conflito de direitos fundamentais da criança e do adolescente, contribuindo para o debate da temática tendo em vista uma melhor solução para o problema.[1]
Palavras-chave: Poder familiar. Direito à convivência familiar. Pais encarcerados. Filhos menores.
Resumen: La convivencia familiar es un derecho de los padres y los niños y continúa existiendo, asi cómo el poder familiar, aunque aquellos vivan presos en la cárcel. Sólo hay excepción a esta garantía si hay la condena de los padres con prisión se ha fijado en virtud de un delito intencional cometido contra el hijo. Si no hay incidencia de esta situación, el acceso de los niños a los padres encarcelados no depende de autorización judicial. Además, las llamadas "madres de la prisión," tienen el derecho de amamantar a sus hijos durante el período de lactancia. Se sabe, sin embargo, que las prisiones brasileñas tienen malas condiciones, el medio ambiente desaconsejable para los menores, sin contar con el procedimiento embarazoso de revista en que los visitantes están obligados a pasar. Así tenemos, por una parte, el derecho del niño a la familia y, por otro, su derecho a la dignidad. Este artículo aborda el conflicto entre derechos fundamentales de los menores de edad, lo que contribuye para el debate del asunto buscando una mejor solución al problema.
Palabras-clave: Poder familiar. Derecho a la convivencia familiar. Padres presos. Hijos menores de edad.
Sumário: Introdução. 1. Dos princípios que regem as relações paterno/materno-filiais. 2. Da convivência de crianças e adolescentes com pais encarcerados. 2.1. Das grávidas do cárcere. 3. A convivência familiar a qualquer preço? – direito à convivência familiar versus proteção integral do menor. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n° 8.069 de 13 de julho de 1990), em seu art. 2º, especifica que “considera-se crianças, para efeito desta lei, a pessoa até 12 anos incompletos e adolescentes aqueles entre 12 e 18 anos de idade”.
Referido diploma legal estabelece princípios para efetivação dos direitos fundamentais dos mesmos, sendo que a este conjunto de garantias deu-se o nome de doutrina da proteção integral ao menor, considerando sua situação de pessoa cuja personalidade ainda está em desenvolvimento.
Dentre os direitos assegurados aos menores por este diploma legal está o da convivência familiar, ainda que os pais se encontrem encarcerados cumprindo pena, situação em que o poder familiar subsistirá, exceto na hipótese de a condenação ter sido por crime doloso cometido contra o próprio(a) filho(a), desde que sujeito a pena de reclusão, conforme dispõe o § 2º do art. 23.
O direito à convivência familiar neste contexto peculiar foi inserido no § 4o. do art. 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente pela Lei 12.962/2014, passado a prever que “será garantida a convivência da criança e do adolescente com a mãe ou pai privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável ou, nas hipóteses de acolhimento institucional, pela entidade responsável, independentemente de autorização judicial”.
Trata-se de uma garantia nova e que suscita muita polêmica, pois ainda que seja louvável a tentativa do legislador pátrio em manter os vínculos entre pais e filhos, inclusive mantendo o poder familiar dos pais privados do direito de liberdade, sabe-se que os estabelecimentos prisionais brasileiros possuem condições precárias, ambiente desaconselhável aos menores de idade.
Portanto, tem-se, de um lado, o direito do menor à convivência familiar e, de outro, o seu direito à dignidade, este garantido nos arts. 15 e 18 do ECA, a saber:
“Art.15. A criança e o adolescente tem direito a liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.
Art.18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”.
Este trabalho aborda o conflito entre direitos fundamentais da criança e do adolescente acima especificados, contribuindo para o debate da temática, tendo em vista uma melhor solução para o problema. Considerando que o convívio familiar é de extrema importância para o sadio desenvolvimento da criança e do adolescente, há que se pensar em um modelo diferenciado para que este ocorra no ambiente prisional, considerando as condições precárias deste na atualidade.
A pesquisa desenvolvida foi qualitativa, essencialmente bibliográfica e documental.
1 Dos princípios que regem as relações paterno/materno-filiais
A família, antes de qualquer previsão legal que a defina ou regule, é uma realidade sociológica e constitui a base do Estado, sendo o núcleo fundamental no qual repousa toda a organização social; merecendo, portanto, ampla proteção do Estado (GONÇALVES, 2005, p. 1).
Sendo uma realidade estudada pelo Direito de Família, tanto este quanto as famílias propriamente ditas são regidas por alguns princípios fundamentais. Adiante serão apresentados apenas os princípios que estão diretamente relacionados com o tema do presente estudo.
Em primeiro lugar, o principio da Dignidade da Pessoa Humana, previsto constitucionalmente como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito brasileiro (art.1º, III), tem incidência não apenas nas relações sociais, mas, principalmente, nas relações familiares.
O principio da dignidade da pessoa humana foi conceituado por Sarlet da seguinte forma: “Temos por Dignidade da Pessoa Humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano,como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos” (2004. p. 59-60 ).
Em sede de complemento, Dias explica que “(…) trata-se de um princípio garantido constitucionalmente, no que tange o Estado, pode-se dizer que este , tem não apenas o dever de abster de atitudes que ferem a dignidade da Pessoa Humana, mas também o dever de proporcionar meios existenciais para que cada ser humano viva de forma digna” (2009, p. 62).
Contextualizando o referido princípio dentro da temática deste trabalho, pode-se dizer que o mesmo traz a concepção de que todos possam conviver em comunidade ou núcleos familiares em ambiente sadio e digno de convivência e sobrevivência. Assim, ”a dignidade da pessoa humana encontra na família o solo apropriado para florescer. A ordem constitucional da especial atenção a família, independente de sua origem. A multiplicação das entidades familiares preserva e desenvolve as qualidades mais relevantes entre os familiares: o afeto, a solidariedade, a união, o respeito, a confiança, o amor, o projeto devida em comum, permitindo o pleno desenvolvimento pessoa e social década participe, com base em idéias pluralistas, solidarizas democráticos e humanistas” (DIAS, 2005, p. 57-58).
Espera-se tanto da família pois a mesma é a base da sociedade, conforme estabelecido no caput do art. 226 do texto constitucional. Frise-se que o conceito de família na atualidade não pode se dissociado de sua pluralidade com relação às formas de se constituir. “O principio do pluralismo das entidades familiares é encarado como reconhecimento pelo Estado, da existência de várias possibilidades de arranjos familiares “ (DIAS, 2009, p. 66).
Assim, não importa se decorrente do matrimônio, de união estável, de uniões homoafetivas, monoparentais, dentre outros modelos que possam vir a surgir, as famílias são a base da sociedade e no seio das mesmas deve ser protegida e promovida a dignidade de seus membros, sendo esta sua função social enquanto instituto jurídico. Gagliano e Pamplona Filho explicam que “numa perspectiva constitucional, a funcionalização social da família significa o respeito ao seu caráter eudemonista, enquanto ambiência para a realização do projeto de vida e de felicidade de seus membros, respeitando-se, com isso, a dimensão existencial de cada um” (2015, p. 99).
No âmbito familiar, existindo filhos menores, há que se trazer à baila, invariavelmente, os princípios da parentalidade responsável e da proteção integral do menor. “Isso significa que, em respeito à própria função social desempenhada pela família, todos os integrantes do núcleo familiar, especialmente os pais e mães, devem propiciar o acesso aos adequados meios de promoção moral, material e espiritual das crianças e dos adolescentes viventes em seu meio” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2015, p. 100).
Segundo Tartuce e Simão, “na ótica civil, essa proteção integral pode ser percebida pelo princípio do melhor interesse da criança, ou best interest of the child, conforme reconhecido pela Convenção de Haia, que trata da proteção dos interesses das crianças” (2008, p. 39).
No âmbito da legislação nacional, o princípio da proteção integral encontra-se no art. 227, caput da Constituição Federal, o qual prevê que é dever não só da família, mas da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária, colocando-os a salvo de toda forma de negligência, discriminação, violência, crueldade e opressão.
Ademais, o art. 3o. do Estatuto da Criança e do Adolescente determina que a criança e o adolescente gozam de todos os direitos inatos à pessoa humana, assegurando-lhes oportunidades e facilidades para que seu desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social de dê de forma saudável.
O princípio da parentalidade responsável está previsto na Constituição Federal como um dos requisitos impostos ao livre planejamento familiar. Será responsável a paternidade e a maternidade que cumprirem os deveres inerentes ao poder familiar.
Importante ressaltar que o pai e a mãe possuem os mesmos direitos e deveres em relação aos filhos. O Estatuto da Criança e do Adolescente traz em seus arts. 21 e 22 o seguinte:
“Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência.
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.
“Parágrafo único. A mãe e o pai, ou os responsáveis, têm direitos iguais e deveres e responsabilidades compartilhados no cuidado e na educação da criança, devendo ser resguardado o direito de transmissão familiar de suas crenças e culturas, assegurados os direitos da criança estabelecidos nesta Lei”
Além disso, é importante deixar claro que a parentalidade responsável não é dever apenas dos pais biológicos, alcançando os pais adotivos e socioafetivos. Esta extensão do poder familiar e, portanto, do dever da parentalidade responsável aos pais socioafetivos decorre do princípio da afetividade.
Conforme explica Madaleno, “o afeto decorre da liberdade que todo indivíduo deve ter de afeiçoar-se a um outro, decorre das relações de convivência do casal entre si e destes para com seus filhos, entre os parentes, como está presente em outras categorias familiares, não sendo o casamento a única entidade familiar” (2008, p. 66-67).
Assim, da mesma forma que uniões estáveis e homoafetivas sem qualquer registro (apenas baseadas no ânimo de constituir família, na durabilidade e na publicidade) produzem efeitos jurídicos, o mesmo ocorrerá na relação materno ou paterno-filial de fato, sem qualquer liame biológico ou sentença de adoção, se dela puder ser extraído ânimo recíproco de constituição de família, publicidade e durabilidade.
Em outras palavras, diante da constatação da situação fática da parentalidade socioafetiva, passam os pais a serem cobrados relativamente ao exercício do poder familiar. O art. 1634 define os deveres inerentes ao poder familiar da seguinte forma:
“Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:
I – dirigir-lhes a criação e a educação;
II – exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584;
III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;
IV – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;
V – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município;
VI – nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
VII – representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;
VIII – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
IX – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição”.
O poder familiar continua existindo mesmo se os pais estiverem encarcerados. Contudo, o art. 1637 do Código Civil prevê que o mesmo será suspenso se o pai ou a mãe forem condenados, por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão. Groeninga acrescenta que “tal dispositivo não contempla as hipóteses de cumprimento de pena em regime aberto ou a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por sanções restritivas de direitos” (art. 44 do Código Penal) (2008, p. 223).
Importante mencionar que “(…) pela Lei n. 12.318/2010 (art. 6o, VII), a caracterização de ato típico de alienação parental (art. 2o, parágrafo único, I a VII) ou de qualquer conduta que dificulte a convivência da prole com o genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso, declarar a suspensão da autoridade parental” (DINIZ, 2013, p. 623-624).
Da necessidade de convivência com ambos genitores – o que faz com que a alienação parental seja penalizada – e da possibilidade de mesmo o genitor encarcerado continuar no exercício do poder familiar, nota-se a importância da convivência familiar para os filhos menores.
Neste sentido, o caput do art. 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente garante que “é direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral”. Conforme transcrito na introdução, o § 4o. deste dispositivo garante a convivência dos filhos menores com os pais encarcerados, independentemente de autorização judicial.
Apresentados os princípios que regem as relações paterno/materno-filiais, adiante aprofundar-se-á na garantia da convivência familiar em casos de pais e/ou mães encarcerados.
2 Da convivência de crianças e adolescentes com pais encarcerados
O sistema carcerário Brasileiro, é regido pela Lei n° 7.210/84, mais conhecida como Lei de Execuções Penais (LEP). De acordo com esta lei, o Estado irá garantir ao presos internos, assistência educacional, social, religiosa, material e jurídica.
O inciso X do art. 41 da Lei de Execuções Penais prevê que constitui direito dos presos a visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados, sendo esta garantia um meio de contato com o mundo exterior a facilitar, posteriormente, sua reinserção social quando retornar à liberdade.
Por sua vez, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5°, assegura a integridade física e moral dos presos (inc. XLIX) e a assistência da família (inc. LXIII), já que o Pacto de São José da Costa Rica, do qual o Brasil é país signatário, determina em seu art. 5° que “as penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial e reforma e a readaptação social dos condenados” (ORGANIZAÇÂO DOS ESTADOS AMERICANOS, 1969).
Assim, é intenção do legislador assegurar os vínculos familiares através das visitas periódicas, em atenção não só aos presos, mas às suas famílias.
Mais recentemente, o direito e visita foi estendido aos filhos menores através da Lei 12.962/2014.
Para Cayres e Sponchiado, “a presença da família e dos filhos podem ser um elemento paliativo das tensões do cotidiano dentro da prisão, pois a visita e o contato com os filhos são de um dos elementos que ajudam a manter o equilíbrio psicológico, bem como uma forma de acompanhá-la em seu desenvolvimento e crescimento. Ressalva-se , no entanto, que na opinião de alguns presos , esse contato poderia trazer aspectos negativos e ainda outros presos se sentiram envergonhados por terem seus filhos vendo-os naquela situação, ou sentiriam desespero em ter seu filhos dentro do sistema carcerário, por conta de risco em relação a segurança dos filhos” (2015).
De qualquer forma, as mesmas autoras concluem que “om a lei no 12.962/2014, o legislador pretendeu impedir o parâmetro muitas vezes utilizado pelos diretores dos estabelecimentos prisionais, os quais proibiam o direito de visita dos filhos menores, alegando a existência de risco à segurança e à integridade física, psíquica e moral dos mesmos. O legislador também teve intenção de prestigiar a ressocialização dos presos, lembrando que o pai ou a mãe preso tem o direito ao convívio familiar e isso facilitará sua reinserção na sociedade, tendo em vista que eles estão privados do direito de locomoção e não dos demais direitos, como por exemplo, o de manter o poder familiar, não suspenso ou destituído” (2015).
Ainda que privado do poder familiar em virtude te ter atentado contra a vida do próprio filho dolosamente, o pai e/ou a mãe não perdem a condição de genitores. Neste caso, subsistiria a garantia de convívio familiar através da visitação mesmo que o genitor encarcerado – e não o ambiente prisional – represente perigo para o filho menor? Acredita-se que não, pois “é dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente” (art. 70, ECA).
2.1 Das grávidas do cárcere
De acordo com o artigo 8º parágrafo único do Estatuto da Criança e do adolescente:
“É assegurado a todas as mulheres o acesso a programas e a políticas de saúde da mulher e de planejamento reprodutivo e, as gestantes, nutrição adequada, atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério e atendimento pré-natal integral no âmbito do Sistema Único de Saúde.(…)
§10º incumbe ao poder público garantir a gestante e à mulher com filho na primeira infância que se encontrem sob custódia em unidade de privação de liberdade, ambiência que atenda às normas sanitárias e assistências do Sistema Único de Saúde para o acolhimento do filho, em articulação com o ensino competente visando ao desenvolvimento integral da criança”.
O artigo 9° da referida lei garante que “o poder Público, as instituições e os empregadores propiciarão condições adequadas ao aleitamento materno, inclusive aos filhos de mães submetidas à medida privativa de liberdade.”
A Lei de Execuções Penais (LEP) , em seu art. 2o, dispõe que o § 2º do art. 83 e o art. 89 da Lei 7.210, de 11 de julho de 1984, passam a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 83. (…)
§ 2º Os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário, onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis) meses de idade.”
Art. 89. Além dos requisitos referidos no art. 88, a penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 (seis) meses e menores de 7 (sete) anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa.
Parágrafo único. São requisitos básicos da seção e da creche referidas neste artigo:
I – atendimento por pessoal qualificado, de acordo com as diretrizes adotadas pela legislação educacional e em unidades autônomas; e
II – horário de funcionamento que garanta a melhor assistência à criança e à sua responsável.”
Embora a lei preveja tais garantias, sabe-se que os estabelecimentos prisionais brasileiros, de uma forma geral, apresentam condições precárias para o cumprimento da pena e inviabilizam o cumprimento de tais garantias.
As estruturas dos estabelecimentos prisionais não são construídas de acordo com as necessidades femininas e, muitas vezes, o tratamento a elas dispensado é um tratamento dado a homens, havendo total falta de preparo. Ilustrando tal informação, segue transcrição desta realidade, por Queiros:
“Quando a polícia finalmente pôs as mãos em Gardênia, ela estava já com a gravidez avançada. Não que isso, em momento algum, tenha lhe rendido tratamento especial. Quando foi detida, Gardênia foi jogada com violência dentro da viatura e teve uma bolsa pesada atirada contra sua barriga. — Aiiii! — Tá reclamando do quê? Isso é só outro vagabundinho que vem vindo no mundo aí! Quatro dias depois de chegar à delegacia, a pressão emocional e as más condições adiantaram o parto em dois meses. Começou a sentir as contrações e pedir ajuda, mas os policiais alegaram que não havia viatura disponível para levá-la ao hospital. Dor, dor, dor. E foi só quando ela entrou mesmo em desespero e começou a gritar, a incomodar, que encontraram uma viatura para ela. A agonia era tanta que Gardênia até rasgou a farda do policial que a transportou até o carro. Entre uma contração e outra, ela foi observando a rua, as pessoas que olhavam o carro com medo, com curiosidade, com hipocrisia. A ninguém importava Gardênia ou o bebê que carregava. Eles eram o resto do prato daquela sociedade. O que ninguém quis comer. E seu filho já nascia como sobra. A dor foi esquecida por um momento quando Gardênia chegou ao hospital e, já na maca, conheceu a dra. Dariane. (…) Pediu que retirassem as algemas de Gardênia, perguntou se ela precisava de mais anestésico e disse que poderia ter o quanto quisesse. Fazia tempo que ela não era tratada assim que nem gente — principalmente por alguém que não “tirava cadeia” também. (…) Foi um nascimento prematuro, um parto rápido, e uma saída-relâmpago da sala — quase como se fosse um apêndice retirado. Não se deu ao luxo de descansar do esforço de nascer no colo da mãe. Não deixaram nem que Gardênia segurasse a filha. Só conseguiu, de relance, conferir que era menina, como havia anunciado a médica. “Até nisso é diferente a gente presa do que a gente solta. Solta, você pega seu filho, vê. E eu nem consegui olhar os dedos da mão e do pé, pra ver se não tava faltando nenhum”, ficou se repetindo. Logo depois dessa inspecionada rápida, Gardênia foi algemada à cama novamente. O procedimento é comum para presas que dão à luz. A ativista Heidi Cerneka, uma americana de português quase impecável e fala pausada, que há treze anos trabalha com a causa da mulher presa no Brasil na Pastoral Carcerária, faz brincadeira com esse protocolo: — Tem mulher que até dá à luz algemada na cama. Como se ela pudesse levantar parindo e sair correndo. Só homem pode pensar isso. Porque mesmo que ela pudesse levantar, qualquer policial com uma perna só andaria mais rápido que ela. Como Gardênia, ela viu muitas. Conta que, certa vez — em 2009, ela crê — uma das alas maternas exclusivas estava lotada ao ponto de mães e bebês terem que se acomodar no chão. — O berçário tinha 110 mulheres num espaço de quarenta e poucas. Tinha mãe que havia acabado de chegar do hospital, assim, pariu hoje de manhã, já recebeu alta no mesmo dia, e estava ali, dormindo no chão. E o bebê no chão junto com ela, claro. A caridade geral varia de lugar a lugar. Em alguns, vale a ordem de chegada para definir quem dorme na cama e quem não. Em outros, a hierarquia de poder é que conta. Em outros ainda, felizmente para as grávidas, existe um código de caridade que faz com que as presas cedam seus lugares para que elas durmam com mais conforto. Também é comum que não recebam tratamento pré-natal. A maioria das detentas grávidas já chega grávida na cadeia. Algumas, já no fim da gestação, nunca passaram por um obstetra pois eram pobres e desinformadas demais. Como em todo o país só existem 39 unidades de saúde e 288 leitos para gestantes e lactantes 2 privadas de liberdade, na maioria dos presídios e cadeias públicas, elas ficam misturadas com a população carcerária e, quando chega a hora do parto, geralmente alguém leva para o hospital. Já nasceu muita criança dentro do presídio porque a viatura não chegou a tempo, ou porque a polícia se recusou a levar a gestante ao hospital, já que provavelmente não acreditou — ou não se importou — que ela estava com as dores de parto. Em cinco dias, Gardênia ganhou alta, mas Ketelyn continuaria internada por mais quinze. Sem visitas. Gardênia pediu para se despedir da filha antes de voltar ao presídio. Os policiais a levaram para o vidro em frente ao berço da garota e disseram que devia dizer seu tchau dali. Chorou em silêncio, jogou um beijinho da janela e engoliu a vontade de abraçá-la. Ketelyn nasceu há dezessete anos e até pouco tempo atrás centenas de mulheres tiveram a mesma despedida fria e relâmpago de seus filhos. Só em 28 de maio de 2009, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei 11.942, que assegurava às presidiárias o direito de um período de amamentação de no mínimo seis meses e cuidados médicos aos bebês e a elas. A lei não foi, no entanto, acompanhada de meios para seu cumprimento. Existem apenas cerca de sessenta berçários e creches em todo o sistema carcerário feminino brasileiro. Quando não há vagas nesses locais, o procedimento é enviar as lactantes para berçários improvisados nas penitenciárias, onde elas podem ficar com o filho e amamentá-lo, mas não têm acesso a cuidados médicos específicos. O benefício não é estendido a todas as mulheres, sobretudo não às que cumprem pena em locais impróprios e precisam sujeitar os recém-nascidos às mesmas condições subumanas em que vivem. Quando são transferidas para presídios com berçários, em geral mais distantes, ficam afastadas dos outros filhos. Algumas delas tomam a dura decisão de abrir mão do período com o bebê. Como Rebeca, uma mulher que devolveu seu filho de quatro meses porque queria voltar para a cadeia pública (e superlotada) de Itapevi, onde ficaria perto dos demais ao menos nos dias de visita. As que conseguem completar os seis meses de direito, precisam dar o filho para o pai, um parente ou entregar para um abrigo. Neste último caso, quando terminam de cumprir sua pena, elas têm que pedir a guarda dos filhos de volta à Justiça. Nem todas conseguem. Para provar-se capaz de criar uma criança, é preciso ter comprovante de endereço e emprego. E esse é um salto muito mais difícil de ser dado pelas mulheres com antecedentes criminais. Quando um homem é preso, comumente sua família continua em casa, aguardando seu regresso. Quando uma mulher é presa, a história corriqueira é: ela perde o marido e a casa, os filhos são distribuídos entre familiares e abrigos” (2015, p. 35).
Esse despreparo e descaso no trato das detentas gestantes é mais perigoso ainda quando as mesas são soropositivas, acarretando problemas para o bebê.
Após o parto, considerando que a maioria esmagadora dos presídios não possui espaço destinado a amamentação, berçário e creche, a criança passa a viver em condições insalubres e em grande situação de risco, o que fere sua dignidade, integridade física e moral, e os preceitos legais que garantem a proteção integral do menor.
Segundo Stella, em alguns estabelecimentos prisionais “os bebês ficam com suas mães em uma ala da enfermaria do presídio. A mãe fica 24 horas com o bebê e é de sua responsabilidade os cuidados básicos com a criança (dar banho, trocar, alimentar). A ala é equipada com celas individuais com banheiro e fica separada (isolada) dos outros pavilhões da penitenciária, com acesso proibido para as outras presas, com exceção daquelas que realizam o serviço de limpeza. O acompanhamento pediátrico e as vacinações são realizadas externamente ao presídio, no posto de saúde mais próximo” (2006, p. 75-76).
Diante de tais informações, há discordância com relação à permanência das crianças após o período de amamentação no interior do cárcere, pois muitos acreditam que a restrição do direito de ir e vir não é benéfico para a criança – pessoa em peculiar situação de desenvolvimento de sua personalidade –, chegando a afetá-la psicologicamente. Isso porque o ambiente institucional propicia uma estimulação ambiental muito precária se comparada ao ambiente domestico, com a presença materna (BRONFENBRENNER apud STELLA, 2006, p. 46).
Isso sugere que, para a criança, as condições que a prisão oferecem tendem a prejudicar seu bom desenvolvimento, pois os presídios femininos, “assim como os masculinos, não foram desenvolvidas para propiciar o vínculo familiar, especialmente entre mãe e filhos, muito menos promover uma ambiente adequado para o desenvolvimento infantil” (STELLA, 2006, p.18).
Sobre este contexto, Santos destaca que não apenas o preso cumpre sua pena, mas toda a sua família, inclusive a criança e o adolescente, filhos do mesmo:
“Pena solidária. Como ponto coincidente, percebemos que toda dinâmica familiar é alterada, e passa a fluir tendo, como ponto central, o genitor encarcerado. De obrigações assumidas até constrangimentos morais, passam a fazer parte de um período que todos esperam terminar com a saída do cônjuge da prisão. Podemos dizer que o período de cumprimento da pena será marcado pela entrada de todos os familiares no mundo do cárcere. (…) Passar por situações tão constrangedoras tem levado as crianças a um comportamento inesperado para os pais. Elas dormem no momento do encontro. Apesar de ser tão esperado, o desgaste psíquico a que são expostas, aliado à falta de diálogo, traduz o comportamento de sonolência como uma forma de preservação do organismo” (p. 598-600).
Desta forma, quando o legislador aprovou a lei nº 12.962/2014, resguardando o princípio da convivência familiar mesmo em caso de pais encarcerados, cabia ao Estado ter propiciado condições suficientes para que os direitos dos filhos menores não fossem violados e a preservação dos vínculos fosse mantida, uma vez que, tanto a família quanto o preso precisam deste elo, que ajuda tanto no desenvolvimento da personalidade da criança e do adolescente quanto serve de estímulo à reinserção do preso na sociedade.
3 A convivência familiar a qualquer preço? – direito à convivência familiar versus proteção integral do menor
Na Antiguidade, a criança era vista dentro do seio familiar como propriedade do patriarca, sem possuir nenhum direito, devendo seguir todas as ordens do mesmo, que detinha poder ilimitado de decisão sobre o destino dos filhos.
Em 1927, a entrada em vigor do Decreto 17.943-A, também conhecido como Código Mello Matos, teve como objetivo conduzir o destino dos menores “infratores”, sendo estes a principal preocupação social da época com relação às crianças e adolescentes. A figura do Juiz de menores tirava o papel da família como fonte primordial para o desenvolvimento destes e os recolhia como forma de proteger a sociedade, resolvendo a questão das infrações por eles cometidas.
Não havia uma política de proteção à criança e ao adolescente, mas a proteção da própria sociedade contra infrações cometidas pelos mesmos. Desta forma, os menores considerados “problemáticos” aos olhos da sociedade deveriam ser arrancados do seio familiar e social.
A doutrina da proteção integral da criança – consagrada na Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959), pela Constituição Federal da República Federativa do Brasil de1988, pela Convenção Internacional Sobre os Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas (1989) e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) – reconheceu a criança e o adolescente como sujeitos de direitos.
A teoria da proteção integral está expressa no art. 227 da Constituição Federal de 1988 e inspira normas que tratam os menores como cidadãos, considerando, acima de tudo, a dignidade da pessoa humana. Assim, “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar a criança e ao adolescente com absoluta prioridade, o direito a vida, a saúde ,à alimentação , á educação ,ao lazer, à profissionalização,á cultura, á dignidade, ao Respeito , á liberdade, e a convivência familiar e comunitária,além de colocá-lo a salva de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (…)”.
Segundo Cury, Paula e Maçura, “A proteção integral tem como fundamento a concepção de que crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, frente à família, à sociedade e ao Estado. Rompe a idéia de que sejam simples objetos de intervenção no mundo adulto, colocando-os como titulares de direitos especiais decorrentes da condição peculiar de pessoas em processo de desenvolvimento.(…) Deve-se entender a proteção integral como conjunto de direitos que são próprios apenas dos cidadãos imaturos, estes direitos, diferentemente daqueles fundamentais reconhecidos a todos os cidadãos, concretizam-se em pretensões nem tanto em relação a um comportamento positivo por parte da autoridade pública e dos outros cidadãos”. Em força de proteção integral, criança e adolescentes tem direito de que os adultos façam alguma coisa em favor deles” (2002, p. 21).
Assim, pode-se dizer que se a proteção integral é violada, conseqüentemente também é violada a dignidade da pessoa humana.
Além dos dispositivos constitucionais aqui transcritos, o Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente da seguinte forma:
“Art. 3º A crianças e o adolescente, gozam de todos os direitos fundamentais inerentes a pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros, meios, todas as oportunidade e facilidades, a fim de lhe facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.
Art. 4º É dever da família, da comunidade da sociedade em geral e do poder público, assegurar com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) Primazia de receber proteção e socorro em qualquer circunstância
b) Precedência do atendimento nos serviços públicos ou de relevância públicas
c) Preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas
d) Destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção a infância e juventude”.
Se, por um lado, a lei prescreve o direito à convivência familiar como fundamental ao desenvolvimento sadio dos menores e, inclusive, garante a efetivação de tal direito se os pais estiverem encarcerados, fato é que o legislador não considerou as condições do sistema prisional brasileiro.
Desta forma, diante da calamidade em que este se encontra, surge o embate entre o direito à convivência familiar e a dignidade da pessoa do menor.
Neste sentido, caso a caso, tal situação vem sendo decidida pelo Poder Judiciário, havendo posicionamentos discrepantes entre si, conforme se observa abaixo:
“MANDADO DE SEGURANÇA. MENORES IMPÚBERES. PEDIDO DE VISITA A FAMILIAR PRESO. JUIZADO DA INFÃNCIA E DA JUVENTUDE. AUSÊNCIA DE PRÉVIA AVALIAÇÃO POR EQUIPE INTERDISCIPLINAR. DIREITO À PROTEÇÃO DO ESTADO QUE SE SOBREPÕE AO DO CONVÍVIO FAMILIAR. 1. Os pedidos de visitação a familiar preso, quando formulado por criança ou adolescente, deve ser apresentado junto ao Juizado da Infância e da Juventude, porquanto, na hipótese, busca-se aferir a conveniência da medida e assegurar o interesse do menor e não o direito do preso em receber a visita de familiares (art. 41, X, da LEP). 2. Por outro lado, ao direito de convivência familiar sobrepõe-se o similar, à proteção do Estado às crianças e adolescentes, também de matiz constitucional. Sendo assim, considerando serem os menores impetrantes de tenra idade, bem como as precárias condições morais e de segurança que permeiam os estabelecimentos prisionais do país, inviável o deferimento do pedido de visitação a familiar (pai e padrasto) preso, sem a realização de prévia avaliação por equipe interprofissional, destinada a averiguar os reais benefícios da medida, bem como minimizar possíveis riscos”. (TJRS. 3a. Câmara Criminal. Mandado de Segurança Nº 70012183554, Relator Des. Danúbio Edon Franco, Julgado em 08/09/2005)”.
“EMENTA: CIVIL E CONSTITUCIONAL. AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. VISITAS DOSFILHOS À MÃE ENCARCERADA. DIREITO DA PRESA. DIREITO FUNDAMENTALDAS CRIANÇAS. TEMPERAMENTO DE VALORES. DICOTOMIA ENTRE PROTEÇÃO DA INTEGRIDADE E O DIREITO DE MANTER CONTATO COM A MÃE. PREVALÊNCIA DO ÚLTIMO. SENTENÇA MANTIDA. – É apenas aparente o embate de normas e valores relativos ao direito da mãe – que se encontra presa em estabelecimento penal de receber a visita dos filhos em contraposição à necessidade de preservação da integridade física e psíquica das crianças que desejam estar com ela nos dias de visitação. – Se ponderada a questão sob a ótica dos filhos terem o direito de manter o vínculo com sua mãe, independentemente da condição em que se encontre, a aparente contrariedade de normas se vai, restando a proteção ao vínculo familiar, ao contato afetivo com o amor materno (TJMG. 1a. Câmara Cível. Apelação Cível 1.0439.13.008377-7/001, Relator Des. Alberto Vilas, julgamento em 25/02/2014, publicação da súmula em 10/03/2014)”.
“AGRAVO EM EXECUÇÃO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DO PEC. NÃO CONHECIMENTO. DIREITO À VISITA DE PARENTES. FILHA MENOR. DESACONSELHÁVEL. IMPROVIMENTO. Não tendo sido aventada na decisão recorrida, a preliminar de nulidade do PEC, inviável a apreciação do recurso, nesta parte, sob pena de supressão de um grau de jurisdição. Embora a visita de parentes constitua-se um direito do preso, conforme previsão do art. 41, inciso X, da LEP, não é absoluto. Em se tratando de criança, é desaconselhável a submissão da mesma a situações constrangedoras,como a revista, obrigatória nos estabelecimentos prisionais. Agravo parcialmente conhecido e, na parte apreciada, improvido (TJRS, 4a. Câmara Criminal. Agravo N. 70035385954, Relator Des. Gaspar Marques Batista, Julgado em 24/06/2010)”.
Sabe-se que a estrutura do sistema prisional brasileiro é precária e por isso, o Estado deve por meio de políticas públicas, fornecer meios e espaço suficiente para que a dignidade da pessoa humana do preso e de seus familiares não seja violada, bem como a proteção integral da Criança e do Adolescente.
Se há lei, esta deve ser cumprida. Se foi colocada em vigor, cabe ao Estado promover o bem estar social.
Conclusão
A presa gestante tem o direito de permanecer com seu filho no período de até seis meses e, independentemente do local onde estiver encarcerada, é inconcebível que permaneça em estado sub-humano, colocando em risco sua vida e a do filho menor.
Em relação às visitas dos pais encarcerados pelos filhos menores, as revistas são consideradas, sim, necessárias, porém, como já abordado, a criança e o adolescente são pessoas peculiares, cuja personalidade encontra-se em desenvolvimento, devendo ser tratados com cuidado e respeito.
O Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente deve exercer seu papel junto ao órgão competente como a Vara da Infância e Juventude, supervisionando, juntamente com os conselhos Tutelares (que são órgão que zelam pelos direitos da criança e do Adolescente) o sistema prisional em dia de visitas.
Não se pode negar que privar o filho do direito ao convívio familiar viola o principio do melhor interesse da criança, mas, também, não se pode colocá-la em risco. Por isso tal situação exige que o sistema prisional se adéqüe à nova lei para que possa garantir segurança.
Informações Sobre o Autor
Sara Aparecida Coelho
Acadêmica de Direito pela Faculdade Doctum de Juiz de Fora