Resumo: A redução da maioridade penal é um assunto muito discutido em nosso país, e sofre intenso debate no Legislativo, Judiciário e na própria sociedade, principalmente quando um adolescente comete um crime grave, de grande comoção social. Baseado nessa discussão o artigo analisará os posicionamentos favoráveis e desfavoráveis sobre o tema, visando, ainda, entender os anseios da sociedade na busca do combate à violência.
Palavras – Chaves: Estatuto da Criança e Adolescente; menoridade penal. Imputabilidade.
Abstract: The reduction of the legal age is a subject much discussed in our country, and suffers intense debate in the legislature, judiciary and society itself, especially when a teenager commits a serious crime, of great social upheaval. Based on this discussion, the article will analyze the favorable and unfavorable positions on this issue to also understand the aspirations of society in the pursuit of combating violence.
Key words: Statute of Children and Adolescents; criminal minority. Liability.
Sumário: Introdução; 1. Imputabilidade penal; 2. Argumentos favoráveis e desfavoráveis à redução da menoridade penal; 3. Consequência da Diminuição da menoridade penal; Considerações Finais; Referências.
INTRODUÇÃO
A redução da maioridade penal é um assunto muito discutido em nosso país, e sofre intenso debate no Legislativo, Judiciário e na própria sociedade, principalmente quando um adolescente comete um crime grave, de grande comoção social.
Nosso ordenamento jurídico, dispõe que a maioridade penal se dá aos 18 anos de idade. Resumidamente, essa previsão legal encontra-se, em três dispositivos legais: a) artigo 228 da Constituição Federal de 1988; b) artigo 104 do Estatuto da Criança e do Adolescente; e, c) artigo 27 do Código Penal Brasileiro.
Apesar da previsão legal, hoje, podemos dizer, que a doutrina, a jurisprudência e os parlamentares encontram-se dividido em duas correntes. A primeira corrente, defende a redução da menoridade penal para 16 anos, sob argumento de que com a evolução da tecnologia, os adolescentes possuem as mesmas condições de discernimento sobre o caráter lesivo de seus atos devendo ser julgados e punidos como adultos. Além disso, para essa corrente, o art.228 da Constituição Federal, não é cláusula pétrea, e deve ser modificado por Emenda Constitucional.
Estes defensores afirmam que, nos últimos anos, muitos crimes estão sendo cometidos por criança e adolescente, pois os mandantes (autores intelectuais) dos delitos se utilizam da inimputabilidade dos mesmos, atraindo-os com propostas sedutoras para integrarem o mundo do crime, aduzindo que eles não têm nada a perder, pois não vão ser mesmo punidos.
Para a segunda corrente, a redução da menoridade penal não é viável, vez que ofenderia o art.228 da Constituição Federal, que apesar de não constar no rol do art.5º, é cláusula pétrea, e não pode ser modificado nem por Emenda à Constituição. Os adeptos à essa corrente se subdividem em dois grupos: os que entendem que deve haver apenas uma modificação no Estatuto da Criança e Adolescente, para aumentar o tempo máximo de privação, pois é insuficiente; e outros que entendem que, o Estatuto da Criança e Adolescente não necessita de modificação, o que deve haver é a melhoria das políticas sociais básicas, para que a legislação seja aplicada da forma como prescreve.
Diante de todos esses argumentos, é que seguem, na Câmara e no Senado diversos projetos de lei que objetivam a redução da maioridade penal. Dentre eles, a Proposta de Emenda à Constituição 171/93, que foi aprovada em segundo turno pela Câmara dos Deputados em segundo turno no dia 19/08/2015.
Apesar de respeitada tal decisão, não se mostra viável. O Estado não possui aparato para tratar adolescente e adultos como iguais, principalmente pela precariedade e superlotação nos presídios.
2. Imputabilidade Penal
Antes de adentrarmos no mérito da imputabilidade penal devemos analisar a culpabilidade do ato e a culpabilidade do autor. No Direito Penal do fato só é analisado o fato praticado pelo agente, e não o agente do fato; já no direito penal do autor, o enfoque já não será o fato praticado pelo agente, mas sim o agente que cometeu o fato. Nesta última hipótese, é a pessoa do agente que é levada em consideração, a sua particular forma de ser.
Na conceituação de Roxin:
“por direito penal do fato se entende uma regulação legal, em virtude da qual punibilidade se vincula a uma ação concreta descrita tipicamente e a sanção representa somente a resposta ao fato individual, e não toda a condução de vida do autor quando a pena se vincula à personalidade do autor e seja a sua antissocialidade e o grau da mesma que determinem a sanção.”[1]
Percebe-se que, um direito penal punido exclusivamente pelo autor é um direito intolerável, porque não avalia o fato cometido e sim o que a pessoa é, ou seja, sua índole.
Atualmente, os moldes da concepção trazida pelo finalismo de Welzel, a culpabilidade é composta pelos seguintes elementos normativos: a) imputabilidade; b) potencial consciência da ilicitude; c) exigibilidade de conduta diversa. No entanto, tendo me vista que o presente trabalho de conclusão de curso, possui como tema específico a Menoridade Penal, debateremos apenas o primeiro elemento, qual seja, a imputabilidade, mas especificadamente a inimputabilidade por imaturidade penal.
Diante disso, podemos dizer que, a culpabilidade está ligada ao juízo de reprovação social que incidirá sobre o fato juntamente com o autor. Assim, para que o seja imputável, deve atuar com consciência potencial de ilicitude, bem como ter a possibilidade e a exigibilidade de atuar de outro modo, segundo as regras impostas pelo Direito.
A imputabilidade penal, não é definida pelo Código Penal, sendo estabelecida por exclusão, pois o art. 26 definem que as causas que a afastam. Nestes termos, a inimputabilidade se dá, “por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento” (art. 26, caput).
Para Rogério Greco[2], “a imputabilidade é a possibilidade de se atribuir, imputar o fato típico e ilícito do agente. A imputabilidade é regra; a inimputabilidade é exceção”.
A doutrina afirma que três são os critérios definidores da imputabilidade, quais sejam, biológico, psicológico e biopsicológico.
O sistema biológico condiciona a responsabilidade à saúde mental, à normalidade da mente. Se o agente é portador de uma enfermidade ou grave deficiência mental, deve ser declarado irresponsável, sem necessidade de ulterior indagação psicológica. O método psicológico não indaga se há uma perturbação mental mórbida: declara a irresponsabilidade se, ao tempo do crime, estava abolida no agente, seja qual for a causa, a faculdade de apreciar a criminalidade do fato (momento intelectual) e de determinar-se de acordo com essa apreciação (momento volitivo). Finalmente, o método biopsicológico é a reunião dos dois primeiros: a responsabilidade só é excluída se o agente, em razão de enfermidade ou retardamento mental, era, no momento da ação, incapaz de entendimento ético-jurídico e autodeterminação.[3]
Apesar de mencionarmos todas essas teorias, o Código Penal adota como regra o sistema biopsicológico e, como exceção, o sistema puramente biológico para a hipótese do menor de dezoito anos.
Para que seja reconhecida a existência da incapacidade de culpabilidade é suficiente que o agente apenas tenha a uma das duas capacidades (de entendimento ou de autodeterminação).
Em que síntese o que se tem é um aspecto intelectivo, que consiste na capacidade de entendimento, e outro volitivo, que é o controle e comando da própria vontade. Se faltar um desses elementos, o agente não será responsabilizado por sua conduta.
Em breve síntese, podemos afirmar que, a imputabilidade ocorrerá, todas as vezes que o agente apresentar condições de normalidade e maturidade psíquicas mínimas para que possa ser considerado como um sujeito capaz de ser motivado pelos mandados e proibições normativos. A falta de sanidade mental ou a falta de maturidade mental podem levar ao reconhecimento da inimputabilidade, pela incapacidade de culpabilidade.
Por fim, para completo entendimento do tema deve ser feita algumas diferenciações.
Primeiro, é importante dizer que, a imputabilidade não se confunde com a responsabilidade. Isso porque, a imputabilidade é mais ampla, pois é a capacidade de culpabilidade. Ela abrange a responsabilidade, ou seja, o sujeito poderá ser imputável, mas não responsável pela infração praticada, quando não tiver a possibilidade de conhecimento do injusto ou quando dele for inexigível conduta diversa. A responsabilidade funda-se no princípio de que toda pessoa imputável
Além disso, não se deve confundir a capacidade com a imputabilidade. A capacidade é gênero do qual a imputabilidade é espécie. Com efeito, capacidade é uma expressão muito mais ampla, que compreende não apenas a possibilidade de entendimento e vontade (imputabilidade ou capacidade penal), mas também a aptidão para praticar atos na órbita processual, tais como oferecer queixa e representação, ser interrogado sem assistência de curador etc. (capacidade processual). A imputabilidade é, portanto, a capacidade na órbita penal. Tanto a capacidade penal (CF, art. 228, e CP, art. 27) quanto a capacidade processual plena são adquiridas aos 18 anos.[4]
Com relação a menoridade, o art. 27 do Código Penal, estabelece que: “os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial”. Esse artigo foi reformado em 1984, que fixou este patamar etário, sendo seguido pelo constituinte, no artigo 228 da Constituição Federal de 1988:
“Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial. Para muitos, a menoridade constitucionalmente prevista retrata garantia constitucional dos jovens, não podendo ser diminuída, sequer por meio de emenda constitucional (cláusula pétrea)”.
Nota-se, nesse sentido que, o critério adotado para imputabilidade por imaturidade natural foi estritamente legal, em por questão de política criminal – e não por critério científico – dispôs o ordenamento jurídico que os menores de 18 anos não gozam de plena capacidade de entendimento que lhes permita imputar a prática de um fato típico e ilícito.
Adotou-se, assim, o critério biológico, levando-se em conta apenas a idade ou desenvolvimento mental do acusado, independente de, se ao tempo da ação ou omissão, tinha ele a capacidade de entendimento e autodeterminação, motivo pelo qual deve ser submetido ao Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, conforme previsto no art.104:
“Art. 104. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei. Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do adolescente à data do fato.”
A imputabilidade em razão da imaturidade penal há de ser verificada no momento da conduta, e não no da produção do resultado. Em se tratando de delito permanente, a sua imputabilidade deverá ser aferida no momento em que cessa a prática delituosa.
Ademais, se o menor foi emancipado, isso não gerará repercussão no âmbito penal, pois o Código Penal prevê a idade cronológica.
A prova da menoridade penal deve ser feita por certidão de nascimento expedida pelo registro civil ou documento hábil que lhe substitua, conforme determina o parágrafo único do art.155 do Código de Processo Penal e Súmula 74 do STJ. Assim, uma vez constatada a imputabilidade do agente à época do fato criminoso, este sujeitará a legislação especial (ECA).
O Código Penal Militar, no art. 50, estabelece que o menor de dezoito anos é inimputável, mas, se, aos dezesseis anos, revelar suficiente desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito do fato e determinar-se de acordo com este entendimento, será penalmente responsável, diminuindo-se a pena de um terço até a metade. No entanto, tendo em vista que a Constituição Federal de 1988, anunciou a maioridade aos dezoito anos, esta regra de direito penal militar não foi recepcionada.
3. Argumentos favoráveis e desfavoráveis à redução da menoridade penal
A doutrina há bastante tempo vem discutindo sobre a possibilidade da diminuição da maioridade penal, e qual seria o instrumento necessário para tanto, visando considerar imputáveis as pessoas a partir de idade inferior a 18 anos.
A questão tem suscitado calorosos debates de todos os ângulos, tais como, o direito de votar e a aceleração do desenvolvimento psíquico dos adolescentes nos dias atuais são argumentos rotineiros no debate, que gradativamente se robustece.
No que toca à incongruência legislativa supostamente existente na possibilidade de o adolescente votar ao completar dezesseis anos e na paralela impossibilidade deste mesmo jovem responder pelos seus atos perante o Direito Penal, vê-se que este raciocínio é frágil porque não avalia a questão com toda a amplitude necessária.[5]
A discussão gera ainda mais polêmica, tendo em vista que para alguns, as crianças e adolescentes na atualidade possuem capacidade de desenvolverem precocemente diante do avanço tecnológico e da velocidade com que recebem todo tipo de informações.
Hoje, basicamente, temos duas correntes sobre o assunto. A primeira afirma que, a redução da maioridade penal somente será possível com a promulgação de uma nova Constituição Federal. Isso porque, o art.228 da Constituição Federal, constitui cláusula pétrea implícita, referente ao direito fundamental de todo menor de 18 anos de não ser processado, julgado e condenado pela Justiça comum.
Para esta corrente, não há dúvida de que os princípio e regras previstos na Constituição Federal de 1988, tende a configurar um modelo de proteção de ordem constitucional e infraconstitucional de modo que não pode ser modificado para piorar a situação da criança ou adolescente.
Neste sentido, Luís Fernando Camargo de Barros Vidal, afirma que, “a inimputabilidade etária, muito embora tratada noutro capítulo que não aquele das garantias individuais, é, sem dúvida, um princípio que integra o arcabouço de proteção da pessoa humana do poder estatal projetado naquele, e assim deve ser considerado cláusula pétrea.”[6]
Assim, levando-se em conta que nossa Constituição Federal é rígida, o texto para ser modificado depende de um procedimento rigoroso e traça limites no que tange à redução de garantias já asseguradas. Nesse sentido, é o art. 60 da Constituição Federal da República Federativa:
“Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e garantias individuais”.
Nota-se que, a modificação da menoridade penal de 16 para 18 anos, restringiria direitos e garantias individuais atinentes ao adolescente. Assim, entende René Ariel Dotti:
“A inimputabilidade assim declarada constitui uma das garantias fundamentais da pessoa humana, embora topograficamente não esteja incluída no respectivo Título (II) da Constituição que regula a matéria. Trata-se, pois de um dos direitos individuais inerentes à relação do art. 5º, caracterizando, assim, uma cláusula pétrea. Consequentemente, a garantia não pode ser objeto de emenda constitucional visando à sua abolição para reduzir a capacidade penal em limite inferior à idade penal – dezesseis anos, por exemplo, como se tem cogitado. A isso se opõe a regra do § 4º, IV, do art. 60 da CF.”[7]
O paradigma adotado na legislação nacional especial, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no bojo de um inegável processo de constitucionalização do Direito da Criança e do Adolescente, põe em evidência o tratamento constitucional conferido aos adolescentes. Por isso, perverter a racionalidade e a principiologia constitucional, através dos intentos em modificar o sistema, admitindo-se que maiores de 16 (dezesseis) anos, ou abaixo disso, recebam as mesmas penas cominadas aos adultos, consistiria em retrocesso jurídico, além de afronta às garantias constitucionais, já asseguradas no Estado Democrático de Direito.[8]
Dessa forma, adolescentes que comentem infrações penais, não podem ser igualadas pelo Direito, devendo o ordenamento jurídico, proteger a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Assim, se estivermos diante do cometimento do delito por menor de idade, devemos buscar como resposta a compatibilidade da sanção em relação ao agente que o cometeu, e não a defesa da impunidade ou a indiferença penal.
Para esta corrente, no entanto, qualquer alteração que visa extinguir ou reduzir direitos fundamentais, serão inconstitucionais, pois está amparada na constitucionalização do Direito da Criança e do Adolescente no âmbito do Estado Democrático de Direito, limitada por disposição constitucional.
Para a segunda corrente, a redução da menoridade penal, pode ser estabelecida por uma emenda constitucional, uma vez que, não se trata de cláusula pétrea, mas de norma constitucional inserida no capítulo inerente à família, à criança, ao adolescente e ao idoso. A propósito, já foram apresentadas diversas propostas de Emenda Constitucional nesse sentido, mas até agora apenas uma foi aprovada em segundo turno.
Nesse sentido, afirma Rogério Greco que:
“apesar do texto de nossa Constituição Federal referente à maioridade penal, tal fato não impede, caso haja vontade política para tanto, de ser levada a efeito tal redução, uma vez que mencionado art.228 não se encontra entre aqueles considerados informáveis, pois não se amolda no rol das cláusulas pétreas elencadas nos incisos I a IV, do §4º, do art.60 da Carta Magna.”[9]
Os adeptos a essa teoria, afirmam que a menoridade penal, não é um direito fundamental em sentido material e muito menos formal. Assim, não haverá qualquer impedimento para uma Emenda Constitucional suprimir ou modificar o art.228 da Constituição Federal.
Essa corrente vem prevalecendo, uma vez que, no âmbito do legislativo há inúmeras propostas de Emendas Constitucionais, tais como a PEC 20/99, desarquivada no dia 05 de abril de 2011, objetiva alterar o art. 228 da Constituição Federal. Também a PEC 171/93, atualmente pronta para a pauta, que busca reduzir a menoridade penal para 16 anos a idade, já votada em segundo turno no dia 19/08/2015 pela Câmara dos Deputados:
“A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (19) em segundo turno, por 320 votos a favor, 152 contra e 1 abstenção, a proposta de emenda à Constituição (PEC) que reduz maioridade idade penal de 18 para 16 anos no caso de crimes de homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte e crimes hediondos, como o estupro. O texto segue agora para o Senado, onde precisará passar por duas votações para ser promulgado. (…) A matéria foi aprovada em primeiro turno no início de julho, com 323 votos favoráveis e 155 contra, sob protestos de deputados contrários à mudança constitucional. Um texto um pouco mais abrangente havia sido rejeitado pelo plenário na véspera, mas após uma manobra regimental, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), colocou o tema novamente em votação e o texto acabou passando. Após a sessão desta quarta, Cunha disse que o resultado era esperado. “Eu disse que ninguém mudaria o voto. Eu achei que daria até um pouco menos, pelo tamanho do quórum que tinha. Acabou dando mais votos [que no primeiro turno]”, afirmou o peemedebista, que é defensor da redução da maioridade. (…) Pela proposta aprovada pela Câmara, os jovens de 16 e 17 anos terão que cumprir a pena em estabelecimento penal separado dos menores de 16 e maiores de 18. Após completar 18 anos, eles irão para presídios comuns. A votação ocorreu sem a presença de manifestantes no Salão Verde e com as galerias do plenário vazias. (…)” [10]
No entanto, para essa corrente, a única implicação prática da previsão da inimputabilidade penal, é que se for reduzida deve ser feita por Emenda à Constituição e não por simples lei ordinária.
4. Consequência da Diminuição da menoridade penal
Conforme já repisamos várias vezes, a idade penal estabelecida no patamar de 18 anos, não tem o condão de convencer a sociedade, que cada dia pugna pela redução da menoridade penal para 16 anos.
Contudo, essa redução não resolveria o problema, tendo em vista que, não há dados que comprovem que o rebaixamento da idade penal reduz os índices de criminalidade juvenil.
Observa-se que, foi a vulnerabilidade do adolescente no sentido da sociabilização que determinou a idade legalmente fixada. Assim, levou-se em conta, que a chegada à idade adulta que proporciona maturidade de idéias e de personalidade de molde a dificultar sobremaneira o alcance do Poder estatal de redirecionar o comportamento do indivíduo sob o ângulo pedagógico.
Não devemos basear somente maturidade ou discernimento para a prática do crime. Cabe aqui examinar a modificabilidade do comportamento do adolescente, e sua potencialidade para beneficiar-se dos processos pedagógicos, dada sua condição de pessoa em desenvolvimento.
É imprescindível uma construção dogmática acerca da responsabilidade penal de adolescentes, que tome em consideração os principais elementos da responsabilidade penal e a eles agregue os aspectos de uma teoria particular fundada nos princípios que informam o Sistema especializado destinado à adolescência em conflito com a lei.
Sobre a matéria o CONANDA (CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE), em 2007, expediu uma nota pública, afirmando não ser viável a redução da menoridade penal. A referida nota segue abaixo transcrita:
“CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – NOTA PÚBLICA. O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), principal órgão do sistema de garantias dos direitos da infância e juventude do país, vem expressar sua solidariedade com a família do menino João Hélio Fernandes Vieites, de 6 anos, brutalmente assassinado no Rio de Janeiro. Repudiamos totalmente a violência que vitimou a criança, sua família, o Estado e toda a sociedade brasileira. Preocupado com o debate que cresce no país para discutir a redução da idade penal, o CONANDA se insere nessa discussão, destacando alguns pontos para reflexão pela sociedade brasileira:
(…)Não há dados que comprovem que o rebaixamento da idade penal reduz os índices de criminalidade juvenil. Ao contrário, o ingresso antecipado no falido sistema penal brasileiro expõe os adolescentes a mecanismos reprodutores da violência, como o aumento das chances de reincidência, uma vez que as taxas nas penitenciárias ultrapassam 60% enquanto no sistema socioeducativo se situam abaixo de 20%;
A maioria dos delitos que levam os adolescentes à internação não envolve crimes contra a pessoa e, assim sendo, utilizar o critério da faixa etária penalizaria o infrator com 16 anos ou menos, que compulsoriamente iria para o sistema penal, independente da gravidade do ato;
A redução da idade penal não resolve o problema da utilização de crianças e adolescentes no crime organizado.
Se reduzida a idade penal, estes serão recrutados cada vez mais cedo;
É incorreta a afirmação de que a maioria dos países adota idade penal inferior a 18 anos. Pesquisa realizada pela ONU (Crime Trends) aponta que em apenas 17% das 57 legislações estudadas a idade penal é inferior a 18 anos; Por outro lado, é errônea a idéia de que o problema da violência juvenil em nosso país é mais grave uma vez que a participação de adolescentes na criminalidade é de 10% do total de infratores (pesquisa do ILANUD). No Brasil, o que se destaca é a grande proporção de adolescentes assassinados (entre os primeiros lugares no ranking mundial), bem como o número elevado de jovens que crescem em contextos violentos. Todavia, ciente de que as regras do Estatuto da Criança e do Adolescente em matéria infracional eram insatisfatórias para dar conta das novas demandas, o CONANDA aprovou em 2006, após um longo debate, duas novas referências. De um lado, temos hoje o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), que prevê novas diretrizes de funcionamento para a internação e cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto. De outro, foi elaborado o Projeto de Lei de Execução de Medidas Socioeducativas, em análise no Executivo.
Sendo assim, o CONANDA propõe:
a) a urgente apreciação do Projeto de Lei de Execução de Medidas Socioeducativas no Executivo e, a seguir, no Parlamento;
b) a garantia dos esforços dos governos em seus diferentes níveis na implementação do SINASE, em especial na devida dotação orçamentária para as ações de reordenamento das unidades de internação a fim de atender aos novos parâmetros pedagógicos e arquitetônicos, além da ênfase na descentralização e na municipalização das medidas socioeducativas em meio aberto;
c) o reforço das políticas públicas da infância e da adolescência, através do não contigenciamento de orçamentos na área e da urgente ampliação orçamentária nos Planos Plurianuais de cada nível do governo com vistas à efetivação do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Acima de tudo, o Conanda defende o debate ampliado para que o Brasil não conduza mudanças em sua legislação sob o impacto dos acontecimentos e das emoções. Neste sentido, o Conselho instituiu uma comissão para acompanhar as propostas que tramitam no Congresso Nacional e estará realizando uma Assembléia Extraordinária nos próximos dias para analisar alternativas legais, colocando-se à disposição do Parlamento e de toda a sociedade brasileira para aprofundar esta reflexão.
Brasília, 16 de fevereiro de 2007”
Somado, a esse entendimento, nota-se que, a educação básica, nos termos em que dispõe o art. 21, inciso I da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96), compreende a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio. Assim, nota-se que, a idade de regular conclusão do ensino médio é de dezoito anos incompletos, o que está em perfeita sintonia com a idade prevista para a possibilidade de ingerência do sistema socioeducativo.
Assim, tendo em vista que, a legislação considera que o sujeito ainda é passível de ser educado até os 18 anos incompletos e não 16, logicamente também precisa conferir-lhe ensejo para o recebimento de medida que possua caráter predominantemente pedagógico.
Acerca do assunto, João Batista Costa Saraiva pondera que:
“outro ponto objeto da argumentação pelo rebaixamento diz respeito ao discernimento. De que o jovem de hoje, mais informado, amadurece mais cedo. Ninguém discute a maior gama de informações ao alcance dos jovens. A televisão hoje invade todos os lares com suas informações e desinformações, trazendo formação e deformação. (…)”[11]
O que se percebe é que, historicamente, os argumentos com relação a redução da menoridade penal sempre foram frágeis, uma vez que não, os argumentos são apenas superficiais. Com isso, não de se discute a construção jurídico-penal voltada a explicar e fundamentar a intervenção punitiva sobre adolescentes autores de infração penal, deixando-se prevalecer argumentos e fundamentos extrajurídicos na operacionalização do sistema.
Dessa forma, um sistema ou Teoria da Responsabilidade Penal de Adolescentes exige, em primeiro lugar, reconhecer que a inimputabilidade penal etária não exclui as possibilidades de definir regras de atribuição ou imputação do ato antinormativo ao sujeito e, por consequente, de desenhar uma culpabilidade específica aos adolescentes.[12]
Cumpre ainda dizer que, o menor de 18 anos não deixa de cumprir uma sanção penal. A este são aplicáveis sanções, de caráter predominantemente educativo, previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente.
A superação da categoria de menoridade, como desqualificação e inferiorização de crianças e jovens, agora em condições de igualdade perante a lei, a incorporação do devido processo legal e dos princípios constitucionais como limites objetivos ao poder punitivo sobre jovens em conflito com a lei e o caráter predominantemente educativo das sanções aplicáveis denotam que o modelo adotado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente impõe que as garantias do Direito Penal sejam transladadas ao terreno do Direito penal de adolescentes, favorecendo, dada a sua essência, invocar e construir as bases de um Direito penal juvenil mínimo.[13]
A imputabilidade em razão da idade, não significa que o indivíduo não será responsabilizado pelas consequências do fato a que deu causa. Assim como o maior imputável tem a pena como resposta pela conduta praticada e o maior inimputável tem a medida de segurança, ao menor de 18 anos será aplicado a medida socioeducativa.
Adultos, crianças e adolescentes, sendo pessoas diferentes entre si, não podem ser tratadas de igual maneira pelo Direito. Deve-se obedecer à isonomia e à proporcionalidade, respeitando-se o Princípio da Culpabilidade, da Proteção Integral e, principalmente, da Condição Peculiar de Pessoa em Desenvolvimento. Dessa maneira, diante do cometimento do delito por menor de idade, busca-se como resposta não a defesa da impunidade ou a indiferença penal, mas a compatibilidade da sanção em relação ao agente que o cometeu, inclusive por imperativo de ordem político-criminal.[14]
Conclui-se, no entanto, que não pode existir educação para a cidadania sem o respeito aos mais elementares direitos de cidadão, donde se destaca o de ser sujeito responsável por seus atos, na proporcionalidade que a lei determina.
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Muitos ainda acreditam que a redução da menoridade penal é a solução para diminuição dos delitos, o que não é verdade. Nota-se, que para o legislativo, a redução da criminalidade é uma discussão de cunho muito mais político do que científico.
Essas políticas imediatistas, que visam reduzir a menoridade, diante do acontecimento de crimes de grande repercussão social, não tendem a prosperar. Ao invés dessa discussão, as entidades governamentais e a sociedade deveriam buscar a promoção da dignidade da pessoa humana, através de investimentos em políticas-públicas, no sentido de assegurar ao adolescente o pleno desenvolvimento.
Ademais, tratar da mesma forma adultos e adolescentes, seria um erro inaceitável, pois ocorreria o abarrotamento do presídios que já se encontram falidos e sem as mínimas condições de uso.
Nesse passo, um jovem de 16 anos de idade, jamais estará preparado para suportar a superlotação carcerária, podendo se tornar, criminosos mais perigosos, depois de saírem da cadeia.
A simples mudança da lei não irá fazer com que a violência seja reduzida. A mudança social só ocorrerá através da criação de uma política e prevenção e não com simples punição.
Dessa forma, o que se conclui é que a redução da maioridade penal, violaria vários princípios, tais como, o da não vedação do retrocesso social e da proteção integral à criança e ao adolescente firmados pelo Brasil em convenções internacionais e consagrado na Constituição de 1988.
Informações Sobre o Autor
Camilla Pires Gonçalves dos Santos
Advogada e pós graduada em Direito Ambiental pela Universidade Cândido Menezes