Advertising to children and the (in)effective regulation and its inflow across the brazilian scenario
Salus Henrique Silveira Ferro[1]
Resumo: Diante do desenvolvimento e investimento relacionados à publicidade na sociedade contemporânea, sobretudo no ramo alimentício do qual detém em seu público-alvo a criança e adolescente à manutenção de seu capital, tem-se como preocupação uma análise mais aprofundada sobre os problemas e consequências tanto em âmbito jurídico quanto social na regulamentação da publicidade infantil no Brasil. Deste modo, o trabalho busca averiguar através de dados e pesquisas quantitativas e qualitativas a problemática em questão, com base nos indicadores, verificou-se que a fragilidade da legislação brasileira acerca da regulamentação infantil e do alto investimento publicitário pelos conglomerados do ramo, tendo sua transição aos dispositivos móveis, tornam-se barreiras limitadoras à proteção dos direitos da criança e do adolescente.
Palavras-chave: Criança e adolescente; Regulamentação; Publicidade.
Abstract: In the face of development and investment related to the publicity in the contemporary society, especially in the food industry that has as target public the children and teenagers to the maintenance of its capital, there the concern of a deeper analysis about the problems and consequences as well in legal scope as social in the regulation of the children’s advertising in Brazil. Thus, this work seeks to investigate through quantitative and qualitative data and researches the concerned, with basis on the indicators it was verified that the fragility of the Brazilian legislation towards the children’s regulation and the high publicity investment by the branch conglomerates, with its transition to mobile devices, are limiting barriers to the protection of children’s and teenagers’ rights.
Keywords: Children and teenagers; Regulation; Publicity.
Sumário: Introdução. 1. O desenvolvimento e a vulnerabilidade na publicidade. 2. A publicidade na indústria alimentícia e sua influência à criança e o adolescente. 3. Da regulamentação brasileira à publicidade infantil no ordenamento jurídico. Considerações Finais. Referências.
Introdução
A necessidade de um estudo mais amplo dos efeitos publicitários na criança e no adolescente, devido ao alto investimento pelas empresas na busca de um maior nicho de mercado, torna-se de extrema importância, principalmente pela carência de estudos sobre o tema. O trabalho procura suprir parcialmente esta lacuna, elencando dados e pesquisas, de modo a analisar a quantidade de investimento, o papel da criança e do adolescente à publicidade, e a demonstração da legislação que rege sobre o tema.
Diante dessas constatações, percebe-se que a publicidade em nossa sociedade de consumo é um instrumento paulatinamente mais utilizado para a obtenção de capital pelos grandes conglomerados do ramo, o tema torna-se relevante ao ser levado em consideração que o público alvo destes investimentos à publicidade é a criança e o adolescente, que por não deterem discernimento ao consumo tornam-se vulneráveis nessa tumultuosa relação. Ainda assim, vale destacar a precariedade de nossa legislação ao ser analisada quando comparada a outros países ditos ‘’desenvolvidos’’ acerca do tema, o que viabiliza maiores discussões acerca do tratamento e de uma eficaz regulamentação no seio do ordenamento nacional.
Dito isso, o presente trabalho tem por objetivo demonstrar a vulnerabilidade da criança e do adolescente frente ao consumo, utilizando-se da publicidade no ramo alimentício, de forma a demonstrar as consequências e a problemática legislação brasileira sobre o tema.
Para fins didáticos, o primeiro capítulo, apresenta o desenvolvimento da publicidade e sua natureza histórica, ao identificá-la como um fenômeno presente na nossa sociedade e que detém um papel influente no mercado.
Diante dessa explanação, o segundo capítulo busca por meio de dados e pesquisas, demonstrar a influência da publicidade às crianças e adolescentes tornando-os seu público alvo diante de uma vulnerabilidade cognitiva, demonstrando altos investimentos publicitários e de inovação para que esse ciclo de consumo seja mantido.
O terceiro e último capítulo evidencia por meio da legislação brasileira, a sua precariedade acerca do tema, utilizando-se de argumentos jurídicos e do ordenamento jurídico nacional, para entender a regulamentação e a proteção do menor de idade acerca do assunto e da problemática existente.
- O desenvolvimento e a vulnerabilidade na publicidade
A publicidade sempre foi um instrumento de importância em uma relação comercial, é a partir dela que o consumidor ultrapassa o desejo de necessidade do objeto para adquirir um bem que lhe foi influenciado, nesse sentido, na sociedade contemporânea de relação de consumo sua presença é fundamental dirigida direta e sabiamente ao público-alvo desejado. Nesse sentido, o objetivo do capítulo visa demonstrar a natureza histórica do desenvolvimento da publicidade, evidenciando à vulnerabilidade da criança e do adolescente que detêm parcela significativa de influência pelos meios publicitários.
O desenvolvimento histórico da publicidade deu-se como consequência da revolução industrial, na passagem do capitalismo comercial para o industrial (CAZZAROLI, 2011). As primeiras campanhas de marketing de massa começaram na segunda metade do século XIX, trabalhando mais com a publicidade do que com a marca como a compreendemos hoje[2]. Diante de um leque de produtos recentemente inventados, a publicidade servia ao invés de criar uma identidade à marca, à mudança do modo de vida, convencendo-os de sua necessidade.
No final da década de 1940, surgiu a “consciência corporativa’’, onde as marcas não eram apenas, um mascote, um slogan, ou uma imagem impressa no produto, mas uma identidade e sinônimo de qualidade, o que constituiu gradualmente uma familiarização da marca para com a vida das pessoas e sua cultura (KLEIN, 2002).
Dentro de uma faixa de preço, a marca pode ter mais valor para o consumidor do que o próprio preço do produto:
“Então chegou a mania do capital de marca, o brand equity dos anos 80, a hora da verdade, em 1988, quando a Philip Morris comprou a Kraft por US$ 12,6 bilhões – seis vezes o que a empresa valia no papel. A diferença de preço, aparentemente, estava no custo da palavra ‘’Kraft”. É claro que Wall Street sabia que décadas de marketing e favorecimento de marcas agregava muito mais valor a uma empresa o que seus ativos e vendas anuais totais. Mas com a compra da Kraft um imenso valor em dinheiro fora atribuído a algo que antes tinha sido abstrato e não quantificável – uma marca (KLEIN, 2002, p.17).’’
Assim, a propaganda deve comunicar valores, saudabilidade e confiança na empresa que alimenta sua família, bem como os rótulos devem comunicar, chamando a atenção do consumidor (SIDONIO; CAPANEMA; GUIMARÃES; CARNEIRO, 2013). Variadas marcas utilizam-se de metáforas publicitárias para transformá-la em algo pessoal, caloroso ou humano, a fornecendo um rosto comum, para que as próprias instituições tenham a confiança e o consumo do público, como bem destaca KLEIN (2002, p.16), no exemplo da General Motors no início dos anos 20: “começou a contar as histórias das pessoas que dirigiam seus carros – o pastor, o farmacêutico ou o médico rural que, graças a sua confiável sigla GM, chegou “ao leito de uma criança moribunda” a tempo de “trazê-la de volta à vida’’.
Os selos de qualidade e certificações de origem são importantes para atestar a excelência e inspirar a confiança no produto. Uma empresa sem essa competência complementar pode não ser bem-sucedida no lançamento de um produto inovador, enquanto outra com um bom departamento de marketing podem lançar o mesmo produto e obter resultados melhores (SIDONIO; CAPANEMA; GUIMARÃES; CARNEIRO, 2013).
Segundo Bianco (2008), é por isso que podemos ver em uma caixa de leite algo semelhante a uma bula de remédio, e é isso que faz com que as propagandas de alimentos sejam apresentadas não apenas por pessoas famosas e “bem sucedidas”, de acordo com os valores dominantes, mas também por cientistas, médicos, odontólogos, que seriam autoridades científicas que provariam a cientificidade das afirmações. Conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS), para cada dólar gasto pela OMS a fim de promover a nutrição saudável, 500 dólares são gastos pela indústria de alimentos na promoção de alimentos processados.
Essa promoção torna o público infantil o mais vulnerável e o maior alvo das estratégias de publicidade perante as empresas alimentícias, conforme destaca CAZZAROLI (2011, p. 07):
“Uma das consequências dessa exagerada exposição da criança frente aos inúmeros meios publicitários é a construção de hábitos alimentares não saudáveis. Como exemplo, a bebida láctea “Danoninho” ao laçar na década de 1980 a logo “Danoninho, que vale um bifinho”, tornando-se emblemático ou do Chocolate Batom quando o garotinho da propaganda induzia o telespectador a hipnotizar os pais com o lema “compre Batom, compre Batom”. Achocolatados, guloseimas e refrigerantes constituem a alimentação diária das crianças, substituindo alimentos como frutas e verduras’’.
Diante dessa exposição, ainda há uma fragilidade no conceito da criança e do adolescente, onde há uma distinção etária que desconsidera os indicadores psicológicos e sociais, vislumbrando o artigo 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que considera criança até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Contudo, vale salientar o conceito previsto no artigo 1º da convenção sobre os Direitos da Criança, promulgada no Brasil pelo decreto nº 99.710/90, determinando o limite etário para a fixação do conceito de criança, onde será considerado como criança todo o ser humano com menos de 18 anos de idade, a não ser que a maioridade seja alcançada antes em conformidade com a lei.
Deste modo, podemos perceber que o avanço e o desenvolvimento da publicidade estão intimamente ligados com a vulnerabilidade da criança e do adolescente, sobretudo nos dias de hoje, onde o avanço industrial e a fragilidade judiciária sobre o assunto contribuem para que este ciclo seja contínuo. Para um maior desenvolvimento à pesquisa, a publicidade do mercado alimentício servirá como exemplo devido as inúmeras fontes e o fato de se reconhecer a criança como o seu principal público alvo, sendo necessária uma maior abordagem que será apresentada no decorrer dos capítulos.
- A publicidade na indústria alimentícia e sua influência à criança e o adolescente
Diante do que já foi exposto acerca da publicidade como instrumento de influenciar o consumidor à determinada escolha, este capítulo busca evidenciar através de dados e pesquisas, as consequências à criança e o adolescente dentro dessa cadeia de consumo, utilizando dados referentes à indústria alimentícia que se utiliza desse instrumento de mercado à atração de seus produtos.
Os dados estatísticos da Organização das Nações Unidas (ONU), em comparação com o resto do mundo, evidenciam que em 74 países, o critério cronológico se fixa em 15 anos; em 10 países, em 16 anos; em 31 países, em 18 anos, e em 6 países, mais de 18 anos. Apesar da disparidade etária dos países, o importante é advertir para a necessidade de proteção desses seres humanos em fases de desenvolvimento.
Além do consumo exagerado, outro fator necessário a abordagem diz respeito às ofertas de prêmios atrelados aos alimentos[3] com embalagens elaboradas, semelhantes a embalagens de presentes, tornando-se a verdadeira razão da compra de produtos alimentícios, não porque há fome, mas para atender o desejo de recompensa da embalagem ou do brinquedo nela contido, explorando as crianças como verdadeiros consumistas. Amparado no artigo 37º do Código de Defesa do Consumidor (CDC) que disciplina a proibição de toda publicidade enganosa e abusiva, em 2012 o Procon-SP multou 18 marcas, incluindo Sadia, McDonald’s, Nestlé e Mattel por cometerem abusos na publicidade associando brindes na compra de lanches, demonstrados como exemplos de produtos na figura 1:
De acordo com a figura 1, podemos associa-la às afirmações de Baudrillard (2007, p.15), na qual explicita:
“À nossa volta existe hoje uma espécie de evidência fantástica do consumo e da abundância, criada pela multiplicação dos objetos, dos serviços, dos bens materiais, originando como uma categoria de mutação fundamental na ecologia da espécie humana. Antigamente bastava ao capital produzir mercadorias, o consumo sendo mera consequência. Hoje é preciso produzir os consumidores, é preciso produzir a própria demanda e essa produção é infinitamente mais custosa do que a das mercadorias’’.
Segundo a Associação Dietética Americana (ADA), a exposição das crianças por apenas 30 segundos aos comerciais de alimentos é capaz de influenciar suas escolhas alimentares[4]. Além disso, de acordo com as pesquisas realizadas em 2006 pelo Commercialisation of Childhood no Reino Unido, revelam que 70% das crianças de 03 anos de idade reconhecem o símbolo da rede, mas apenas metade sabe seu nome. Em outro estudo realizado pela Food Standard Agency, revela que as propagandas de produtos alimentícios influenciam tanto as preferências das crianças como suas decisões de compra e consumo de diferentes categorias e marcas.
As grandes empresas alimentícias sabendo disso, a partir da década de 1980, infiltram-se nos colégios estadunidenses montando quiosques em seus refeitórios, competindo com as tradicionais cantinas. Depois de várias ponderações da OMC sobre a qualidade dos alimentos fast-food, que nada resultou, servindo somente à obesidade e ao consumo precoce (KLEIN, 2002, p. 75):
“A Subway abastece 767 escolas com sanduíches; a Pizza Hut monopoliza o mercado em aproximadamente 4.000 escolas; e atordoantes 20.000 escolas participam da “linha de produtos burritos congelados” da Taco Bell. Um guia da Subway sobre como entrar no mercado das escolas aconselha os franqueados a apresentar sua comida de grife às diretorias das escolas como uma forma de impedir os estudantes de sair furtivamente na hora do almoço e evitar que se metam em encrencas. Procure por situações em que a junta de educação local tenha uma política restritiva de almoço. Se tiverem, um bom argumento em favor do produto com marca será manter os estudantes nas instalações da escola’’.
O documento da OMS intitulado Marketing Food to Children: the Global Regulatory environment (2004)[5], fez a revisão das regulamentações mundiais sobre a publicidade e propaganda de alimentos à criança. Revelando que dos setenta e três países analisados, sessenta e dois deles possuem regulamentações sobre publicidade televisiva que fazem referência às crianças. Quarenta e seis países possuem regulamentações estatutárias e cinquenta e um possuem códigos de auto-regulamentação. Trinta e sete países possuem ambos os tipos de regulamentação: estatutário e auto-regulamentação e trinta e dois países possuem restrições específicas sobre a publicidade televisa às crianças[6].
Diante de maiores regulamentações governamentais perante a publicidade televisa, principalmente nos países desenvolvidos, houve a migração da publicidade para os dispositivos móveis, visto que possuem pouca regulamentação e é um setor em constante crescimento com usuários de todas as faixas-etárias[7]. Os dados da Interactive Adversing Bureau (IAB) de 2014, identificam que a publicidade na web ultrapassou a marca de investimentos na publicidade em redes de televisão em 2013 nos Estados Unidos, havendo um crescimento sucessivo de 17% em relação aos anos anteriores (SCN, 2006). Ao encontro dessa nova perspectiva de mercado, a pesquisa realizada pela consultoria internacional em publicidade Zenith, demonstra através do gráfico 1, as projeções e o acúmulo crescente dos gastos destinados em públicidade em dispositivos móveis:
Nesse sentido, fica evidente uma maior preocupação com o público infantil e com as regulamentações no que tange aos dispositivos móveis, devido a um maior investimento na área. A propaganda infantil, sendo ela geralmente relacionada com produtos alimentícios, tem-se importância o relatório desenvolvido sobre as empresas que mais investem em públicidade no mundo em 2015, cujas projeções e índices são vislumbrados até hoje. Dentre as 25 empresas que mais investem em públicidade no mundo, nove são empresas do ramo alimentício, sendo evidenciado de acordo com a tabela 1, seus respectivos gastos e sua posição no ranking mundial:
De acordo com a tabela, em quase sua totalidade, os gastos referentes ao investimento em publicidade até o ano de 2015, por parte das empresas alimentícias, aumentaram em comparação ao ano anterior, cuja tendência elevou-se a patamares superiores nos anos seguintes em cerca de 7%, de acordo com os relatórios da Adversiting Age. Ainda, os relatórios posteriores e o mais recente, datado do ano de 2020, destacam as posições de liderança que as empresas alimentícias exercem sobre a publicidade, em crescente aumento de recursos publicitários, destacando-se a empresa Unilever em segundo lugar no marketing geral dentre as empresas que mais investiram em publicidade no mundo.
Com todo o investimento proporcionado à publicidade, atualmente, ela já faz parte da vida das pessoas, estando presente nas emissoras de rádio, revistas, outdoors, computadores, entre outros. Além disso, consoante com a mudança da contemporaneidade, a utilização de algoritmos é incessamente administrada para que os produtos sejam direcionados a públicos específicos, bem como, aos menores de idade, que ao utilizarem de tais ferramentas coletam os dados para o aperfeiçoamento de uma dinâmica de mercado que destina uma ampla gama de ofertas, ao simples toque dos aparelhos móveis.
- Da regulamentação brasileira à publicidade infantil no ordenamento jurídico
Diante da problemática e do desenvolvimento que se coloca acerca da publicidade infantil, é necessário verificar no atual ordenamento jurídico os mecanismos que regulamentam o tema, colocando-os como forma de proteção da criança e do adolescente, e verificando em sua essência que há pouco para contribuir à proteção efetiva desse consumidor, sendo necessárias maiores políticas públicas e debates sobre o tema para que essa efetivação de direitos possa ser possível.
No Brasil, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) juntamente com a Lei 8.242/1991, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) é o responsável por formular, deliberar e controlar políticas públicas para a infância e a adolescência. O CONANDA é um conselho que dá suporte ao governo para criar, promover e executar as políticas públicas e diretrizes para a proteção das crianças e adolescentes, fiscalizando o cumprimento e a aplicação eficaz das normas de proteção.
A Resolução 163/14, aprovada pelo CONANDA dispõe sobre a abusividade do direcionamento da publicidade e de comunicação mercadológica à criança e ao adolescente, especificando-as conforme artigo 2º:
“Art. 2º: Considera-se abusiva, em razão da política nacional de atendimento da criança e do adolescente, a prática do direcionamento de publicidade e de comunicação mercadológica à criança, com a intenção de persuadi-la para o consumo de qualquer produto ou serviço e utilizando-se, dentre outros, dos seguintes aspectos:
I – linguagem infantil, efeitos especiais e excesso de cores; II – trilhas sonoras de músicas infantis ou cantadas por vozes de criança; III – representação de criança; IV – pessoas ou celebridades com apelo ao público infantil; V – personagens ou apresentadores infantis; VI – desenho animado ou de animação; VII – bonecos ou similares; VIII – promoção com distribuição de prêmios ou de brindes colecionáveis ou com apelos ao público infantil; e IX – promoção com competições ou jogos com apelo ao público infantil’’ (BRASIL, 2014).
Nesse mesmo sentido, o texto versa sobre a publicidade de qualquer publicidade e comunicação mercadológica no interior de creches e escolas de educação infantil e fundamental. Ainda assim, o Ministério da Educação (MEC), por meio da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI), elaborou a nota técnica visando à implementação da resolução 163/2014 do CONANDA em todas as unidades escolares das redes municipais e estaduais de ensino, cabendo ao aplicador da lei fiscalizar e coibir as ilegalidades com fundamento no Código de Defesa do Consumidor, aplicando as sanções nele previstas.
No entanto, a grande discussão doutrinária e jurisprudêncial que se tem discutido até hoje, é se a resolução 163/14 do CONANDA teria força normativa. Algumas associações que representam diversas categorias empresarias reconhecem somente o Poder Legislativo, exercido pelo congresso nacional como o único foro com legitimidade constitucional para legislar sobre publicidade comercial, além disso, o CONANDA não teria poder para aplicar qualquer tipo de penalidade (FREITAS, 2015). Por certo, essa corrente representada pela categoria empresarial tem um interesse comercial de limitar as atuações regulatórias e uma respectiva sanção desse obscuro cenário, uma vez que necessitam da publicidade para a obtenção concretude de seus desejos empresariais.
Portanto, observa-se um grande impasse na aplicação da resolução 163/14, resultando em mais um obstáculo para assegurar limites à publicidade infantil. Desse modo, é importante que os governos reconheçam a sua responsabilidade conjunta pela realização do direito de todas as pessoas, em particular aos mais jovens à alimentação adequada e ao padrão de saúde mais elevado possível.
Esses instrumentos tornam-se elementos fundamentais no padrão da concorrência das estruturas de mercados alimentares, já que as vantagens de spillovers (ou complementariedade) tecnológicas e de publicidade em linhas de produtos comuns, possibilitam à empresa ampliar potencialmente os retornos sobre os investimentos, bem como, fortalecer a posição concorrencial em produtos com maior valor agregado, não só em mercados domésticos, mas crescentemente nos mercados relevantes internacionalmente, selecionados para a trajetória de expansão das empresas (MARTINELLI, 1999).
Desse modo, com o crescente aumento publicitário por empresas do ramo alimentício, fazem-se necessárias políticas públicas restritivas às práticas empresarias, evitando o efeito nocivo sobre a sociedade, principalmente em seu público-alvo.
Sendo assim, essas ferramentas governamentais são cruciais para minimizar o impacto da publicidade, bem como, uma adequação às novas estratégias de ascensão, como a publicidade móvel que há poucas barreiras restritivas destinando-as um maior investimento.
Além disso, essas empresas são transnacionais, inserindo-se também nos mercados cuja legislação nacional é enfraquecida, tanto por ser um país periférico, quanto por pressão pelo próprio poder político dessas empresas, através do Lobby, tendo dificuldades de uma regulação homogênea nos países, principalmente quando os interesses da indústria e da nação são distintos.
Considerações Finais
O presente trabalho apresentou a problemática contemporânea acerca da publicidade e sua influência à criança e ao adolescente, evidenciando através do ordenamento jurídico brasileiro a fragilidade jurídica da relação, restringindo-se a reunir informações tanto qualitativas quanto quantitativas sobre toda a consequência gerada a partir dessa relação.
A publicidade foi analisada desde o seu desenvolvimento através de um prisma histórico que possibilitou entender que a mesma constitui um mecanismo utilizado com fundamental importância e frequência no âmbito mercadológico, sobretudo numa contemporânea sociedade de consumo. Devida toda essa influência, a publicidade passa a ser investigada no ramo alimentício, no qual serve de parâmetro à pesquisa, visto que é um ramo onde o seu principal público-alvo é justamente o público infantil, cabendo ressaltar o papel prejudicial dessas propagandas à própria saúde de seus consumidores, utilizando de dados e pesquisas foi possível demonstrar a importância da criança e do adolescente para a manutenção dessa relação de consumo, onde há um grande investimento e pesquisas que corroboram para a problemática dessa relação.
Contudo, é extremamente importante salientar que em meio às estratégias dessas empresas para uma maior parcela de mercado visando a publicidade, o investimento na publicidade em aparelhos móveis é crescente, onde o ambiente virtual torna-se de fácil acesso e de pouca regularização à criança e adolescente. Esse apresenta-se como um fenômeno em expansão no âmbito internacional, visto que, em um primeiro momento, não diferencia a situação econômica e regulatória de um país sobre o assunto, por se tratar de um fenômeno contemporâneo, ainda que se apresentem discussões a este respeito no âmbito da proteção de dados pessoais.
O ordenamento jurídico brasileiro, que serviu como diretriz de uma proteção brasileira acerca do tema é ainda muito frágil, como o caso da resolução 163/14 do CONANDA, onde a resolução além de ser discutida pela suposta força normativa que a regula, não tem poder para aplicar penalidades, sendo uma barreira aos limites da publicidade infantil brasileira.
O trabalho em um primeiro momento tenta demonstrar a problemática da situação atual brasileira, tanto numa perspectiva jurídica como social, o que leva ao trabalho diversas pesquisas e dados que pouco tem a ver com o ordenamento em si, mas que podem auxiliar – assim como a comparação sobre a regulamentação etária apresentada de outros que tornam-se exemplos -, para uma nova diretriz e pensamento acerca do tema.
Por fim, o trabalho coloca em xeque o assunto da regulamentação da publicidade infantil no Brasil, ao mesmo tempo em que tenta demonstrar através dessas fragilidades uma forma de concepção mais crítica acerca do assunto. Demonstra-se que os meios publicitários, apesar de ser um instrumento fundamental ao mercado, e com capacidades de se adequar a novas ferramentas de inclusão, como é o caso dos dispositivos móveis, são através de políticas públicas, que a estrutura judiciária pode ter meios de regulamentação e capacidade efetiva de penalização àqueles que induzem e contribuem para que esse ciclo de consumo visando a criança e ao adolescente seja contínua.
Referências
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BAUDRILARD, Jean. A sociedade de consumo. Tradução: Artur Morão. Lisboa: 70 Edições, 2007
BIANCO, A. L. A construção das alegações de saúde para alimentos funcionais. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). Brasília: 2008.
BRASIL. Lei nº 8.242 de 12 de outubro de 1991. Cria o Conselho Nacional dos Direitos da criança e do adolescente (CONANDA). In: Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8242.htm>. Acesso em: 08 jan. 2021.
______. Resolução 163/14 do CONANDA. Dispõe sobre o regimento interno do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. In: Diário Oficial da República Federativa do Brasil Brasília. Disponível em: < http://dh.sdh.gov.br/download/resolucoes-conanda/res-1-a-99.pdf>. Acesso em: 29 jan. 2021.
CAZZAROLI, A. R. Publicidade infantil: o estímulo ao consumo excessivo de alimentos. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, nº 92, setembro de 2011. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leura&artigo_id=10235>. Acesso em: 18 jan. 2021.
COMITE PERMANENTE DE NUTRIÇÃO DO SISTEMA DAS NAÇÕES UNIDAS (SCN). Declaração preliminar do Grupo de Trabalho sobre Nutrição, Ética e Direitos Humanos e Nutrição ao longo do ciclo da vida. Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos. 9ª versão preliminar. Brasília: 14 de março de 2006. Disponível em:<https://fanut.ufg.br/up/128/o/DIREITOS_HUMANOS_CRIANCA_ADOLESCENTE.pdf>. Acesso em: 20 jan. 2021.
FERRO, Salus Henrique Silveira. A Concentração E A Centralização Da Indústria Alimentícia: Considerações Sobre Processo De Fusões E Aquisições. Monografia apresentada para a Universidade Federal de Santa Maria para obtenção do grau de Bacharel em Relações Internacionais. Santa Maria, 2015.
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KLEIN, Naomi. Sem logo: A tiranias das marcas em um planeta vendido. Rio de Janeiro: Record, 2002.
MARTINELLI JR, O. A globalização e a indústria alimentícia: Um estudo a partir das Grandes Empresas. Marília, FAPESP, 1999.
MIRANDA, N. M. J. Dominação pela fome. Economia política do abastecimento. Rio de Janeiro: Forense, 1988.
SIDONIO, L. et al. Inovação na indústria de alimentos: importância e dinâmica no complexo agroindustrial brasileiro. BNDES Setorial Agroindústria, v. 37, p. 333-370. Março de 2013.
[1] Advogado e Internacionalista. Mestrando em Direito e Ciência Jurídica e Pós-graduando em Direito Intelectual, pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL); Especialista em Derechos de Daños pela Universidad de Salamanca (USAL). E-mail: [email protected].
[2] É útil voltar um pouco no tempo e observar onde o conceito de marca teve início. Embora o uso dessas palavras seja com frequência intercambiável, marca e publicidade não representam o mesmo processo. A publicidade de qualquer produto é apenas uma parte do grande plano de branding, ou gestão de marca, assim como o patrocínio e o licenciamento do logotipo. Pense na marca como o sentido essencial da corporação moderna, e na publicidade como um veículo utilizado para levar esse sentido ao mundo.
[3] Para saber mais, acessar: http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI159558,101048-Procon+multa+Nestle+Habibs+e+mais+tres+por+publicidade+infantil
[4]Disponível em: http://www.alana.org.br/CriancaConsumo/NoticiaIntegra.aspx?id=7761&origem=23.
[5] Disponível em:< http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/42937/1/9241591579.pdf>. Acesso em: 21 ago. 2017.
[6] De acordo com a pesquisa de CAZZAROLI (2011, p. 19): “Podem-se citar alguns exemplos, como: Noruega e Suíça proíbem veiculação de qualquer comercial de televisão para crianças abaixo de 12 anos de idade; Áustria e Bélgica proíbem comerciais antes e depois de programas infantis; Dinamarca fez restrições quanto à utilização de figuras e animais de programas infantis nos comerciais; Itália apresenta um código de auto-regulamentação com restrições específicas, incluindo previsão de penalidades financeiras; Austrália proíbe comerciais durante programas para crianças em idade pré-escolar e restringe quantidade e frequência de comerciais durante a programação infantil; Em 10 dos 15 países avaliados na Ásia, existe alguma forma de regulamentação; Malásia, Paquistão e Tailândia existem sistema de pré-avaliação e aprovação dos comerciais; A África possui tanto países com regulamentação estatuária, como com auto-regulamentação; Nos Estados Unidos a auto-regulamentação predomina com um código muito detalhado; No Canadá a publicidade para crianças está sujeita à forte regulamentação, com restrições à utilização de técnicas subliminares e comerciais que diretamente induzam a criança adquirir o produto, em Quebec os comerciais para crianças abaixo dos 13 anos foram banidos”.
[7] Disponível em: http://codigofonte.uol.com.br/noticias/gastos-em-publicidade-na-web-superam-os-da-televisao-nos-eua.