Para transferir um imóvel de pai falecido para o filho é necessário realizar o processo de inventário, que pode ser judicial ou extrajudicial, conforme o caso. Somente após a conclusão do inventário, com a partilha dos bens e o devido registro da escritura no cartório de registro de imóveis, é que a propriedade será formalmente transferida para o nome do herdeiro. Esse processo envolve questões documentais, fiscais e legais que precisam ser respeitadas para garantir a validade da transferência.
A importância do inventário
O inventário é o procedimento legal que serve para apurar os bens, direitos e dívidas da pessoa falecida, com o objetivo de transferir a titularidade dos bens aos herdeiros legais. Sem ele, nenhum bem do falecido pode ser vendido, transferido ou doado formalmente. Isso inclui imóveis, contas bancárias, veículos, participações societárias, entre outros.
O inventário pode ser feito por via judicial ou extrajudicial (em cartório), conforme os requisitos estabelecidos na legislação brasileira. A escolha da via depende de fatores como a existência de testamento, a concordância entre os herdeiros e a presença de herdeiros incapazes.
Diferença entre inventário judicial e extrajudicial
Inventário judicial
O inventário judicial é obrigatório nos seguintes casos:
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Quando houver herdeiros menores de idade ou incapazes
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Quando houver testamento
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Quando houver litígio entre os herdeiros
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Quando os herdeiros não concordam sobre a partilha
Neste caso, o procedimento é realizado perante o juiz, com a nomeação de um inventariante (normalmente um dos herdeiros), apresentação de documentos, manifestação do Ministério Público (se houver incapazes) e ao final, homologação da partilha. Após a sentença de partilha, o herdeiro poderá registrar o imóvel em seu nome.
Inventário extrajudicial
O inventário extrajudicial é mais rápido e simples, podendo ser feito em cartório, desde que preenchidos os seguintes requisitos:
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Todos os herdeiros sejam maiores, capazes e estejam de acordo
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Não exista testamento válido
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A escritura seja lavrada por um tabelião de notas com a presença de um advogado
Ao final do procedimento, é lavrada a escritura pública de inventário e partilha, que deve ser levada ao cartório de registro de imóveis para a transferência formal da propriedade.
Documentos necessários para inventariar o imóvel
Para realizar o inventário (judicial ou extrajudicial) e efetuar a transferência do imóvel, alguns documentos são indispensáveis:
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Certidão de óbito do pai falecido
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Documentos pessoais dos herdeiros (RG, CPF)
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Certidão de casamento (se aplicável)
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Comprovante de endereço dos herdeiros
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Certidão de nascimento dos filhos
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Documento do imóvel: escritura, matrícula atualizada, carnê de IPTU
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Certidões negativas de débitos federais, estaduais e municipais
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Certidão negativa de testamento (para inventário extrajudicial)
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Comprovante de pagamento do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação)
Esses documentos são apresentados ao cartório ou ao juízo competente para dar início ao processo de inventário e garantir a correta individualização e partilha dos bens.
Pagamento do ITCMD
O ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) é um tributo estadual que incide sobre a transferência de bens por herança. Cada estado tem sua própria alíquota, que geralmente varia entre 2% e 8% sobre o valor venal do imóvel.
Esse imposto deve ser pago pelos herdeiros antes da finalização do inventário. No inventário extrajudicial, a escritura só será lavrada após a apresentação do comprovante de pagamento. No judicial, o juiz determina o recolhimento antes da sentença de partilha.
Alguns estados oferecem isenção do ITCMD para heranças de pequeno valor, conforme regras específicas. É importante consultar a legislação estadual para verificar o valor de isenção e os procedimentos para o pagamento.
Como ocorre a transferência no cartório de registro de imóveis
Após a conclusão do inventário e a partilha dos bens, o herdeiro que recebeu o imóvel deve levar a escritura pública ou a carta de sentença (no caso judicial) ao cartório de registro de imóveis competente.
O cartório exigirá os seguintes documentos para realizar a averbação do imóvel em nome do novo proprietário:
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Escritura pública de inventário e partilha (ou carta de sentença)
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Documentos pessoais do herdeiro
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Comprovante do ITCMD quitado
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Certidão de matrícula atualizada do imóvel
Com esses documentos, o cartório procederá à averbação da transferência na matrícula do imóvel, tornando o herdeiro o legítimo proprietário do bem.
Valor venal x valor de mercado
Durante o processo de inventário, o valor do imóvel será considerado para cálculo do ITCMD. Há uma diferença importante entre valor venal e valor de mercado.
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Valor venal: é o valor utilizado pela prefeitura para cálculo do IPTU. Geralmente é inferior ao valor de mercado.
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Valor de mercado: é o valor real pelo qual o imóvel seria vendido.
A maioria dos estados utiliza o valor venal como base para o cálculo do ITCMD, mas é possível que o fisco estadual faça avaliação própria para evitar subavaliações. Caso o contribuinte discorde do valor arbitrado, pode apresentar impugnação com documentos comprobatórios, como avaliação imobiliária ou anúncios de imóveis semelhantes.
Inventário negativo
Se o falecido não deixou outros bens além do imóvel em questão, é possível fazer um inventário com partilha simples ou mesmo um inventário negativo (nos casos em que o imóvel era financiado e ainda não havia sido transferido formalmente).
O inventário negativo é utilizado para declarar oficialmente que a pessoa falecida não deixou bens, mas ele pode ser necessário, por exemplo, para fins de liberação de pensão por morte ou seguro. No caso do imóvel, mesmo que não existam outros bens, será preciso abrir inventário formal para legalizar a sucessão.
Quando há mais de um herdeiro
Quando há mais de um filho ou herdeiro, o imóvel deixado pelo pai falecido pode ser:
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Partilhado em comum entre os herdeiros, com registro da copropriedade
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Vendido e o valor dividido entre os herdeiros
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Transferido para um dos filhos, com compensação aos demais por meio de outros bens ou pagamento de valores
A partilha é feita conforme o acordo entre os herdeiros e pode ser formalizada na escritura pública ou na sentença judicial. É possível também que todos os herdeiros cedam seus direitos hereditários para um único herdeiro, mediante doação ou venda, desde que documentado formalmente.
Transferência por cessão de direitos hereditários
Antes mesmo de finalizar o inventário, os herdeiros podem transferir sua parte na herança por meio da cessão de direitos hereditários. Esse instrumento permite que um herdeiro ceda sua parte a outro herdeiro ou mesmo a terceiros, mediante pagamento ou não.
A cessão de direitos pode ser feita em cartório, com escritura pública, e deve ser homologada no inventário. O imóvel, no entanto, só poderá ser transferido formalmente ao cessionário após a conclusão do inventário e o devido registro no cartório de imóveis.
Procedimento se o imóvel ainda estiver financiado
Se o imóvel herdado ainda estiver sob financiamento, o inventário deve reconhecer essa condição. O herdeiro que receber o bem poderá:
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Assumir o saldo devedor junto ao banco
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Quitar a dívida com recursos próprios
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Vender o imóvel e utilizar o valor da venda para quitar o financiamento
É fundamental informar à instituição financeira sobre o falecimento do mutuário e verificar se há cláusula de seguro habitacional que possa quitar o financiamento. Caso exista, o imóvel poderá ser transferido livre de dívida.
Consequências da ausência de inventário
A falta de inventário impede a regularização da propriedade do imóvel. Mesmo que o herdeiro ocupe o bem, ele não será considerado proprietário legal enquanto o imóvel estiver em nome do falecido.
Essa situação traz várias consequências:
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Impossibilidade de vender ou transferir o imóvel
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Impossibilidade de obter financiamento sobre o bem
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Risco de disputas entre herdeiros ou terceiros
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Problemas com dívidas ou impostos em nome do falecido
Portanto, mesmo que haja custos e burocracia, é essencial regularizar a situação do imóvel com a abertura do inventário e a transferência formal.
Transferência do imóvel com testamento
Se o pai deixou testamento, o procedimento será necessariamente judicial, mesmo que todos os herdeiros estejam de acordo. O testamento deverá ser validado judicialmente antes da partilha e a vontade do falecido será observada conforme o texto do testamento.
O juiz analisará se o testamento respeita os direitos dos herdeiros necessários (como filhos, cônjuges e pais) e dará validade ao documento. Após isso, a partilha poderá ser feita com base na disposição testamentária.
Situações especiais: união estável, cônjuge sobrevivente e meação
Além dos filhos, o cônjuge sobrevivente ou companheiro pode ter direito à meação (50% dos bens adquiridos durante o casamento ou união estável) e à herança, dependendo do regime de bens.
A meação não entra na herança, pois não pertence ao falecido, e sim ao cônjuge. Apenas a parte do falecido será objeto de partilha. É necessário analisar o regime de bens para saber se o cônjuge será apenas meeiro ou também herdeiro.
Nos regimes de comunhão parcial de bens e universal, o cônjuge é meeiro e pode ser também herdeiro. Já no regime de separação obrigatória, o cônjuge pode não ter direito à herança, dependendo do entendimento do tribunal.
Perguntas e respostas
É possível transferir imóvel do pai falecido diretamente para o filho sem inventário?
Não. O inventário é obrigatório para que a propriedade do imóvel seja transferida legalmente. Sem ele, a posse pode ser exercida, mas não há direito de propriedade registrado.
Posso fazer o inventário sozinho, sem advogado?
No inventário extrajudicial é obrigatória a presença de um advogado, mesmo que seja um único herdeiro. No judicial, também é necessário estar representado por advogado.
O que acontece se eu não fizer o inventário dentro do prazo?
O inventário deve ser iniciado em até 60 dias após o falecimento. Após esse prazo, há multa sobre o ITCMD. Além disso, a ausência de inventário impede a transferência formal do bem.
Preciso pagar imposto para herdar o imóvel?
Sim. O herdeiro deve pagar o ITCMD, que é estadual. A alíquota varia conforme o estado, geralmente entre 2% e 8% do valor do imóvel.
Imóvel financiado entra na herança?
Sim. Mesmo que o imóvel ainda não tenha sido quitado, ele integra a herança. A dívida também pode ser herdada, ou ser quitada por seguro habitacional.
O imóvel pode ser partilhado entre todos os filhos?
Sim. Todos os herdeiros têm direito à herança. O imóvel pode ser registrado em nome de todos ou um deles pode ficar com o bem, compensando os demais.
É possível doar minha parte da herança para meu irmão?
Sim. Isso pode ser feito por cessão de direitos hereditários, mediante escritura pública e registro no inventário.
Quanto tempo demora para transferir o imóvel?
Depende do tipo de inventário. O extrajudicial pode levar de 30 a 90 dias. O judicial pode durar de alguns meses a mais de um ano, dependendo da complexidade do caso.
Conclusão
A transferência de um imóvel de pai falecido para o filho exige a realização do inventário, seja judicial ou extrajudicial. O processo envolve aspectos legais, fiscais e documentais que precisam ser observados com atenção para garantir que o bem seja transferido de forma segura e regular. Sem o inventário, não há como formalizar a propriedade do imóvel no nome do herdeiro. É importante também compreender os direitos dos demais herdeiros, a eventual existência de testamento, o pagamento do ITCMD e as condições do imóvel, especialmente se estiver financiado. Contar com a assessoria de um advogado durante todo o procedimento é altamente recomendável para evitar erros e garantir uma partilha justa e eficiente.