Buracos na rua que causam danos a veículos geram responsabilidade do poder público e, sim, é possível buscar indenização. Quando um automóvel sofre prejuízos por conta de más condições de conservação de vias públicas, como buracos, depressões ou desníveis, o proprietário do veículo pode acionar judicialmente o município, o estado ou a União, dependendo de quem for o responsável pela via. Isso se deve à obrigação legal do Estado de manter a conservação adequada das vias públicas e garantir a segurança dos cidadãos.
Neste artigo, você vai entender em detalhes como funciona essa responsabilização, o que é preciso para pedir a indenização, os documentos necessários, os direitos do motorista, exemplos práticos, entendimentos dos tribunais e orientações para agir corretamente em caso de dano causado por buraco na rua.
Responsabilidade do poder público por danos causados por buracos
O poder público é responsável pela conservação das vias públicas, e a omissão nesse dever pode gerar o dever de indenizar. Quando um buraco ou qualquer outra irregularidade na pista causa dano ao veículo, o Estado — seja ele municipal, estadual ou federal — pode ser responsabilizado civilmente.
Essa responsabilização se dá com base na responsabilidade objetiva do Estado, prevista no artigo 37, §6º da Constituição Federal:
“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros (…)”
Dessa forma, não é necessário que o cidadão prove culpa ou dolo do agente público. Basta demonstrar três elementos:
O dano sofrido (prejuízo no carro)
O nexo de causalidade (ligação entre o buraco e o dano)
A omissão do ente público (falha na conservação da via)
Diferença entre responsabilidade subjetiva e objetiva nesse contexto
Diferentemente de particulares, cuja responsabilização exige prova de culpa (responsabilidade subjetiva), o poder público responde objetivamente por omissões ou falhas na prestação de serviços, inclusive conservação de vias. Isso significa que não é preciso provar que o Estado teve intenção ou foi negligente, basta comprovar que o dano ocorreu por uma omissão dele.
A exceção ocorre quando há culpa exclusiva da vítima — por exemplo, se o motorista estava em alta velocidade ou embriagado, o que pode afastar a responsabilidade estatal.
Quem pode ser responsabilizado pelo buraco
Para saber a quem direcionar um eventual pedido de indenização, é preciso identificar de quem é a via:
Vias municipais: responsabilidade da prefeitura
Rodovias estaduais: responsabilidade do Estado
Rodovias federais: responsabilidade da União, geralmente representada pelo DNIT
Rodovias concessionadas: responsabilidade da concessionária que administra a via (com base em contrato de concessão)
Esse ponto é essencial, pois a ação deve ser proposta contra o ente competente. Um erro na indicação da parte pode levar ao arquivamento ou demora no processo.
Quais danos podem ser indenizados
Os principais danos indenizáveis em casos de buraco na rua são:
Danos materiais: valores gastos com conserto de rodas, pneus, suspensão, alinhamento, guincho, entre outros.
Dano moral: pode ser cabível em casos de acidentes com lesões, abalo psicológico ou constrangimento excessivo.
Também é possível pedir ressarcimento de lucros cessantes, caso o veículo seja instrumento de trabalho (por exemplo, táxi ou motorista de aplicativo) e a pessoa fique impossibilitada de trabalhar por um período.
O que fazer imediatamente após o dano
Ao identificar que um buraco causou dano ao veículo, é importante tomar providências para registrar o ocorrido. Isso será fundamental para o processo de indenização.
As ações recomendadas são:
Parar o carro em segurança
Fotografar o local do buraco e a placa da rua, se possível
Tirar fotos dos danos no veículo
Chamar a polícia e solicitar um Boletim de Ocorrência (BO)
Se possível, chamar a perícia de trânsito ou um agente municipal para atestar o buraco e o dano
Recolher testemunhas, se houver
Guardar as notas fiscais de conserto e guincho
Esses documentos e provas serão utilizados no pedido administrativo ou judicial contra o poder público.
Como pedir a indenização administrativamente
Antes de ingressar com uma ação judicial, é possível tentar um pedido administrativo de indenização junto ao órgão responsável pela via. Cada prefeitura ou governo estadual/federal possui seus canais próprios para isso, normalmente por meio de ouvidorias ou secretarias de transportes.
É necessário apresentar:
Cópias de documentos pessoais
Cópia do CRLV do carro
Fotos do buraco e do dano
BO (quando possível)
Notas fiscais e orçamentos
Relatório mecânico, se disponível
Esse pedido é analisado pelo setor jurídico do órgão, que pode deferir ou negar a indenização. O prazo para resposta varia, mas em geral leva entre 30 a 90 dias.
Quando e como entrar com ação judicial
Se o pedido administrativo for negado ou ignorado, o próximo passo é ingressar com uma ação judicial de indenização por danos materiais e morais. Essa ação pode ser ajuizada no Juizado Especial da Fazenda Pública (para valores até 60 salários mínimos) ou na Justiça Comum, dependendo do valor e da complexidade do caso.
Não é obrigatório ter advogado no Juizado Especial até esse limite de valor, mas contar com um profissional aumenta as chances de êxito, especialmente se o caso envolver dano moral ou perda de faturamento.
A petição inicial deve conter:
Qualificação das partes
Narração dos fatos
Provas documentais (fotos, BO, orçamentos)
Pedido de indenização (com valores)
Pedido de citação do ente público
Fundamentos legais (responsabilidade objetiva)
Exemplos práticos de decisões favoráveis
Diversas decisões judiciais já reconheceram o dever de indenizar nesses casos. Por exemplo:
TJSP – Apelação Cível nº 1009780-70.2022.8.26.0032: Município condenado a pagar R$ 1.200 pelos danos causados por buraco em via pública.
TJMG – Apelação Cível nº 1.0702.19.080250-1/001: Indenização por danos materiais e morais devido a acidente em buraco sem sinalização.
TJRJ – Processo nº 0038993-95.2017.8.19.0001: Município do Rio de Janeiro condenado a pagar conserto de suspensão de carro danificado por buraco.
Esses exemplos mostram que, quando bem fundamentados, os pedidos são acolhidos pelo Judiciário.
O que pode impedir ou dificultar a indenização
Existem situações que dificultam ou até impedem a responsabilização do Estado:
Ausência de provas: não conseguir comprovar o buraco ou o dano
Culpa exclusiva da vítima: dirigir em velocidade acima do permitido, embriaguez, distração
Falta de nexo causal: se o dano não for compatível com o suposto impacto
Prescrição: ações contra o poder público prescrevem em 5 anos (prazo contado da data do dano)
É fundamental reunir provas no momento do fato para evitar problemas posteriores.
E se o buraco causar um acidente grave?
Se o buraco provocar um acidente com capotamento, colisão ou atropelamento, os danos podem ser maiores, envolvendo feridos ou vítimas fatais. Nesse caso, o Estado pode ser responsabilizado civil e penalmente por sua omissão.
Além da ação de indenização por danos materiais e morais, os familiares de vítimas fatais podem ajuizar ações por danos morais e pensão por morte, com base no artigo 948 do Código Civil.
Se ficar comprovado que o buraco já existia há muito tempo e que houve omissão do poder público, inclusive após reclamações anteriores, pode-se argumentar até mesmo por responsabilidade subjetiva agravada.
O papel das concessionárias de rodovias
Em rodovias com pedágio, a responsabilidade pela conservação e manutenção é da empresa concessionária. Nesses casos, o motorista deve acionar a concessionária diretamente — tanto na esfera administrativa quanto judicial.
Como essas empresas assumem a obrigação de manter as estradas em boas condições, inclusive com sistema de atendimento emergencial, a falha na prestação do serviço justifica a responsabilização objetiva com base no Código de Defesa do Consumidor.
A jurisprudência é firme nesse sentido. Um exemplo é o REsp 1.119.013/SP (STJ), que reconheceu a responsabilidade de concessionária por acidente causado por má conservação da pista.
Indenização por lucros cessantes
Nos casos em que o veículo danificado é essencial para o trabalho — como táxis, ambulâncias, caminhões de transporte ou carros de motoristas de aplicativo — o proprietário pode pleitear indenização por lucros cessantes, ou seja, pelo valor que deixou de ganhar durante o período em que ficou sem o veículo.
É importante demonstrar:
Que o veículo era utilizado para trabalho
O tempo em que ficou sem poder utilizá-lo
A média de ganhos mensais ou diários
Documentos comprobatórios (extratos, recibos, relatórios de corrida)
Os tribunais costumam acolher esses pedidos quando bem documentados.
O que é necessário provar para ter direito à indenização
De forma prática, para obter uma indenização pelos danos causados por buraco na via, é preciso reunir os seguintes elementos:
Prova do dano: fotos, laudos, notas fiscais de reparo
Prova do buraco: imagens do local, testemunhas, BO, geolocalização
Prova do nexo de causalidade: que o dano foi diretamente causado pelo buraco
Ausência de culpa exclusiva da vítima
Documentação completa do veículo e do proprietário
Quanto mais completos forem os documentos e mais clara a narrativa dos fatos, maiores as chances de sucesso na reparação judicial ou administrativa.
É possível denunciar buracos para prevenir novos danos?
Sim. Cidadãos podem e devem comunicar buracos ou falhas na via para os canais oficiais dos órgãos públicos responsáveis, como:
Prefeituras (Secretaria de Obras ou Transporte)
Ouvidorias municipais ou estaduais
Sites e aplicativos como 1746 (no Rio), SP156 (São Paulo)
Concessionárias de rodovias (telefone de emergência ou SAC)
Fazer esse tipo de denúncia não apenas contribui com a segurança pública, mas também cria um histórico que pode ajudar a comprovar a omissão do poder público em caso de futuro processo.
Perguntas e respostas
O que fazer se um buraco danificar meu carro?
Pare em segurança, fotografe o local e os danos, registre um boletim de ocorrência, guarde notas fiscais e, se possível, acione um agente público.
Posso processar o governo por causa disso?
Sim, é possível ajuizar ação de indenização contra o poder público responsável pela via com base na responsabilidade objetiva.
É preciso provar que o Estado teve culpa?
Não. Basta demonstrar o dano, o buraco e o nexo entre eles.
A indenização cobre apenas o conserto?
Não. Pode incluir guincho, lucros cessantes e até dano moral, dependendo do caso.
Vale a pena entrar com processo judicial?
Sim, especialmente quando o dano é alto e bem documentado. O Judiciário tem reconhecido esses direitos com frequência.
Posso pedir indenização se o carro for alugado?
Sim, desde que você comprove que foi o responsável pelo veículo no momento e que arcará com o prejuízo.
E se o buraco estiver em uma estrada com pedágio?
Nesse caso, a responsabilidade é da concessionária da rodovia.
Qual o prazo para entrar com o processo?
O prazo prescricional é de 5 anos a partir do fato.
Preciso de advogado?
Para causas até 60 salários mínimos, é possível entrar sem advogado no Juizado Especial. No entanto, o acompanhamento jurídico é altamente recomendável.
Conclusão
Danos causados por buracos em vias públicas são de responsabilidade do poder público ou da concessionária responsável, e o cidadão tem direito à reparação. A Constituição e o Código Civil asseguram esse direito por meio da responsabilização objetiva, dispensando a prova de culpa.
Para garantir a indenização, é necessário agir corretamente desde o momento do incidente: registrar provas, obter documentos, identificar o responsável pela via e, se necessário, buscar a via judicial. O Judiciário tem se mostrado sensível a essas demandas, reconhecendo o dever de indenizar sempre que comprovada a omissão estatal e o nexo de causalidade com os danos sofridos.
Se você teve seu carro danificado por um buraco, saiba que não está desamparado. Seus direitos são garantidos por lei — e cabe a você exercê-los de forma adequada.