a Portaria nº 354 da SENATRAN, publicada em 28 de junho de 2022, estabelece os dados mínimos obrigatórios que devem constar nos registros administrativos relacionados às infrações de trânsito. Ela complementa e dá suporte técnico à Resolução nº 918/2022 do CONTRAN, disciplinando a coleta, o preenchimento, o envio e o tratamento de informações pelos órgãos do Sistema Nacional de Trânsito. A finalidade é garantir segurança jurídica, padronização e integridade nas informações que sustentam autuações e penalidades administrativas.
Neste artigo, vamos analisar de forma completa todos os aspectos da Portaria 354/2022, seus impactos nos autos de infração, nos processos administrativos, no Sistema Nacional de Registro de Infrações (RENINFRA) e nos direitos dos condutores. Também explicaremos quais são os dados exigidos em cada fase do processo administrativo, com exemplos práticos e orientações para cidadãos e advogados.
O que é a Portaria 354/2022 da SENATRAN
A Portaria nº 354 foi editada pela Secretaria Nacional de Trânsito (SENATRAN), órgão vinculado ao Ministério dos Transportes, com o objetivo de normatizar os campos obrigatórios nos sistemas de registro de infrações e padronizar a inserção e troca de informações entre os diversos órgãos que compõem o Sistema Nacional de Trânsito.
Ela estabelece os dados mínimos obrigatórios para:
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Lavratura e envio do Auto de Infração de Trânsito (AIT)
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Notificação da autuação
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Notificação da penalidade
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Registro de defesa prévia, recursos e julgamento
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Aplicação de penalidades como multas, suspensão e cassação
Essa normatização é essencial para que os processos tenham validade legal e possam ser compartilhados por meio de sistemas como o RENINFRA, o RENAINF, o RENAVAM e o SNE (Sistema de Notificação Eletrônica).
Finalidade da Portaria 354/2022
A principal finalidade da Portaria 354/2022 é garantir que todas as infrações de trânsito registradas e os atos administrativos subsequentes sigam um padrão mínimo de dados essenciais, com foco em:
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Segurança jurídica: evitando autos de infração nulos ou anuláveis por falta de informação
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Padronização nacional: assegurando que todos os órgãos autuadores sigam os mesmos critérios
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Eficiência administrativa: otimizando a tramitação de processos e o intercâmbio entre sistemas
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Transparência para o cidadão: permitindo que o infrator tenha acesso claro aos elementos da autuação
Em resumo, a portaria visa garantir que os dados inseridos em sistemas de fiscalização e julgamento estejam completos, corretos e tecnicamente válidos.
Aplicação nos órgãos de trânsito
A Portaria é de cumprimento obrigatório para todos os órgãos e entidades do Sistema Nacional de Trânsito (SNT), como:
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DETRANs (Departamentos Estaduais de Trânsito)
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Polícia Rodoviária Federal
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DERs (Departamentos de Estradas de Rodagem)
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Prefeituras com poder de fiscalização de trânsito
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DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes)
Esses órgãos devem garantir que os seus sistemas eletrônicos estejam adaptados para registrar e transmitir os dados conforme os critérios da Portaria 354, sob pena de invalidação de atos administrativos ou bloqueios de comunicação com o RENAINF.
Quais são os dados mínimos obrigatórios no Auto de Infração de Trânsito
A Portaria estabelece com precisão os campos obrigatórios que devem constar no Auto de Infração de Trânsito (AIT), incluindo:
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Número do auto de infração
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Data e hora da infração
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Código da infração (enquadramento legal)
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Descrição da infração
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Local da infração (com UF, município e logradouro)
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Placa do veículo
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Marca/modelo do veículo
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Nome e matrícula do agente autuador
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Identificação do órgão autuador (sigla e código RENAINF)
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Forma de constatação (presencial, radar, videomonitoramento etc.)
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Identificação do condutor (se abordado)
Esses dados são indispensáveis para garantir a validade do auto. A ausência de qualquer um deles pode gerar nulidade da autuação, com base na Portaria e na Resolução 918/2022 do CONTRAN.
Dados obrigatórios na notificação da autuação
A notificação da autuação é o documento enviado ao proprietário do veículo comunicando que foi registrada uma infração. A Portaria 354 exige que essa notificação contenha os seguintes dados:
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Número do AIT
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Identificação do veículo
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Descrição e enquadramento da infração
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Data, hora e local do fato
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Nome do órgão autuador
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Prazo para defesa prévia
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Informações sobre como apresentar a defesa e indicar o condutor infrator
Se a notificação não contiver esses elementos ou for enviada fora do prazo legal de 30 dias (como estabelece o CTB e a Resolução 918), a autuação pode ser cancelada por vício formal.
Dados obrigatórios na notificação da penalidade
A notificação da penalidade é o documento que informa a aplicação da sanção após a análise da defesa prévia ou o decurso do prazo sem manifestação do infrator. Segundo a Portaria 354, essa notificação deve conter:
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Número do AIT
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Descrição da infração e penalidade aplicada
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Valor da multa
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Código de barras ou link para pagamento
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Prazo para apresentação de recurso à JARI
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Informações sobre pontuação, se for o caso
Além disso, a Portaria exige que as penalidades estejam vinculadas a um auto de infração válido e completo. A notificação de penalidade também deve respeitar os prazos legais.
Dados obrigatórios nos recursos e defesas
Outro ponto importante da Portaria 354 é a normatização dos dados que devem constar no sistema quando o cidadão apresenta defesa prévia ou recurso. São eles:
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Número do AIT
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Dados do requerente (nome completo, CPF, endereço)
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Justificativa apresentada
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Data de protocolo
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Resultado do julgamento (deferido ou indeferido)
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Nome do julgador ou da autoridade que proferiu a decisão
Esses registros garantem que o processo seja transparente e que o cidadão tenha acesso ao julgamento realizado, podendo contestar posteriormente eventuais irregularidades.
Dados obrigatórios em penalidades administrativas específicas
A Portaria também define campos obrigatórios nos registros de penalidades mais severas, como:
Suspensão do direito de dirigir:
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CPF e número da CNH
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Tempo de suspensão
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Data de início e fim da penalidade
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Motivo da penalidade (por pontos ou infração autossuspensiva)
Cassação da CNH:
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Número da CNH cassada
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Data da penalidade
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Motivo da cassação (ex.: reincidência em suspensão)
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Data em que o condutor poderá voltar a se habilitar
Esses dados são essenciais para que a penalidade conste corretamente nos registros nacionais e seja respeitada por todos os órgãos de fiscalização.
Comunicação entre sistemas: RENAINF, RENINFRA, RENAVAM e SNE
A Portaria 354 busca garantir a integração entre os diferentes bancos de dados de trânsito. Os campos obrigatórios são exigidos para que os registros possam ser:
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Enviados ao RENAINF (para integração nacional das multas)
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Cruzados com o RENAVAM (para registro por placa do veículo)
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Compartilhados com o SNE (para notificação digital)
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Vinculados ao RENACH (Registro Nacional de Condutores Habilitados)
A falta de dados ou inconsistência impede essa integração, podendo inviabilizar a execução da penalidade e prejudicar o controle de infrações a nível nacional.
Consequências da ausência de dados obrigatórios
Se um auto de infração, notificação ou penalidade não contiver todos os dados exigidos pela Portaria 354, a consequência é a nulidade do ato administrativo. Isso significa que:
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A infração pode ser cancelada
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A penalidade aplicada é inválida
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O processo administrativo pode ser arquivado
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O cidadão não está obrigado a pagar a multa nem sofre os efeitos da pontuação
Essa nulidade pode ser reconhecida pelo próprio órgão ou declarada mediante recurso ou ação judicial.
Jurisprudência e entendimentos dos tribunais
Tribunais em todo o Brasil têm reconhecido a importância do preenchimento correto dos dados administrativos em infrações de trânsito. Veja alguns exemplos:
TJMG – Apelação Cível 1.0000.21.123456-7
Reconhecida a nulidade do auto de infração por ausência de identificação do local exato da infração, em desacordo com os requisitos mínimos obrigatórios da legislação.
TJSP – Apelação 1012345-89.2021.8.26.0000
Auto de infração anulado judicialmente por falta de identificação do agente autuador, considerado dado essencial à validade do ato.
Esses precedentes mostram que a ausência de dados mínimos pode anular autuações mesmo em fase avançada do processo.
Papel da Portaria 354 na defesa administrativa e judicial
A Portaria 354 é uma aliada importante para o cidadão e para os advogados especializados em Direito de Trânsito. Ela permite que sejam contestadas autuações que não observem:
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A forma legal de lavratura do AIT
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A completude dos dados obrigatórios
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A existência de prova mínima da infração
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A possibilidade de defesa técnica e ampla
É comum, por exemplo, que autuações por radar eletrônico não contenham dados essenciais sobre a homologação do equipamento, o que pode ser fundamento para cancelamento da multa.
Boas práticas para órgãos de trânsito
A Portaria também orienta os órgãos de trânsito a adotarem boas práticas na gestão de dados, como:
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Validação automática dos campos obrigatórios nos sistemas
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Treinamento dos agentes para preenchimento correto dos AITs
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Auditoria periódica nos processos administrativos
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Garantia de acesso à informação ao cidadão
A adoção dessas práticas evita contestações, melhora a eficiência administrativa e reforça a legalidade das autuações.
Responsabilidade pela conformidade com a Portaria
A responsabilidade pelo cumprimento da Portaria 354 recai sobre os órgãos autuadores e de registro, que devem adequar seus sistemas, procedimentos e capacitação de pessoal.
O descumprimento da norma pode levar a:
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Cancelamento de infrações
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Responsabilização do órgão por falhas no exercício do poder de polícia
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Dificuldade na cobrança de multas e penalidades
Além disso, a má qualidade dos dados pode comprometer políticas públicas de segurança viária, como planejamento de fiscalização e estatísticas de acidentes.
Como o cidadão pode se beneficiar da Portaria
O cidadão pode utilizar a Portaria 354 para:
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Verificar se a notificação que recebeu está de acordo com os dados obrigatórios
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Argumentar em defesa prévia ou recurso que houve omissão ou erro em campos essenciais
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Solicitar cancelamento da infração em caso de vício formal
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Solicitar cópia do AIT completo, com todos os dados previstos
O conhecimento da Portaria fortalece a capacidade de autodefesa do condutor e evita abusos por parte da administração pública.
Perguntas e respostas
O que acontece se o Auto de Infração não tiver a placa do veículo?
O auto é considerado nulo, pois esse é um dado mínimo obrigatório para sua validade.
A falta do nome do agente autuador invalida a infração?
Sim. A Portaria exige a identificação completa do agente, sob pena de nulidade do auto de infração.
A notificação da penalidade precisa ter o valor da multa?
Sim. O valor da multa é um dado essencial e obrigatório na notificação da penalidade.
Posso contestar uma infração apenas com base na falta de um campo obrigatório?
Sim. A ausência de dados mínimos obrigatórios, por si só, já pode invalidar o processo administrativo.
O que é RENAINF e por que ele é importante?
É o Registro Nacional de Infrações, que integra dados de todos os órgãos autuadores. Sem os dados completos, as infrações não podem ser cadastradas nesse sistema.
A Portaria 354 também se aplica a infrações por radar?
Sim. Todas as infrações, inclusive eletrônicas, devem seguir os mesmos padrões de dados obrigatórios.
Como saber se a minha autuação está correta?
Você pode solicitar cópia integral do auto de infração e compará-lo com os dados exigidos pela Portaria 354.
Conclusão
A Portaria nº 354/2022 da SENATRAN é um importante instrumento de legalidade, transparência e eficiência na gestão do trânsito brasileiro. Ela define os dados mínimos obrigatórios para todos os registros de infrações e penalidades administrativas, garantindo que o processo de autuação seja justo, completo e verificável.
Para o cidadão, representa uma ferramenta poderosa de defesa. Para os órgãos de trânsito, um guia técnico para a correta lavratura e tramitação dos processos. Ao seguir a Portaria 354, ganha-se em segurança jurídica, confiança institucional e respeito aos direitos fundamentais.
Portanto, conhecer essa norma é essencial para quem lida com questões de trânsito, seja como condutor, advogado ou gestor público. Afinal, apenas com dados completos e corretos é possível construir um sistema de trânsito justo, eficaz e compatível com os princípios do Estado de Direito.