O Artigo 218, inciso III, do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) estabelece que transitar em velocidade superior à máxima permitida para o local em mais de 50% é uma infração gravíssima que acarreta a suspensão do direito de dirigir. O período de suspensão para essa infração varia de 2 a 8 meses. Em caso de reincidência (cometer a mesma infração dentro de 12 meses), o prazo de suspensão aumenta para 8 a 18 meses.
O Excesso de Velocidade e Suas Consequências no CTB: Uma Análise Aprofundada do Art. 218, III
O excesso de velocidade é uma das infrações de trânsito mais comuns e, ao mesmo tempo, uma das que mais contribuem para a gravidade dos acidentes. O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) trata esse tipo de conduta com diferentes níveis de rigor, dependendo do quanto o limite de velocidade é excedido. Dentre as previsões, o Art. 218, inciso III, destaca-se por aplicar a penalidade mais severa para o excesso de velocidade: a suspensão direta do direito de dirigir. Compreender a fundo esse artigo, suas implicações e os processos envolvidos é fundamental para todo condutor.
A Classificação das Infrações por Excesso de Velocidade no Art. 218
O Artigo 218 do CTB divide as infrações por excesso de velocidade em três incisos, cada um com suas próprias penalidades e naturezas:
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Art. 218, I: Transitar em velocidade superior à máxima permitida em até 20%.
- Natureza: Média
- Pontos: 4
- Multa: R$ 130,16
- Exemplo: Em uma via com limite de 60 km/h, o motorista é flagrado a 70 km/h (excesso de 10 km/h, que é 16,6% de 60 km/h).
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Art. 218, II: Transitar em velocidade superior à máxima permitida em mais de 20% até 50%.
- Natureza: Grave
- Pontos: 5
- Multa: R$ 195,23
- Exemplo: Em uma via com limite de 60 km/h, o motorista é flagrado a 80 km/h (excesso de 20 km/h, que é 33,3% de 60 km/h).
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Art. 218, III: Transitar em velocidade superior à máxima permitida em mais de 50%.
- Natureza: Gravíssima
- Pontos: 7 (mas não são contabilizados para suspensão por pontos, pois a suspensão é direta)
- Multa: R$ 293,47 multiplicada por 3 (fator multiplicador), totalizando R$ 880,41.
- Penalidade Adicional: Suspensão imediata do direito de dirigir.
- Medida Administrativa: Recolhimento do documento de habilitação.
- Exemplo: Em uma via com limite de 60 km/h, o motorista é flagrado a 91 km/h (excesso de 31 km/h, que é 51,6% de 60 km/h).
A progressão das penalidades reflete a crescente periculosidade do condutor. Exceder o limite em mais da metade é considerado uma conduta de alto risco, justificando a suspensão direta da CNH.
A Infração do Art. 218, III: Gravíssima e Autossuspensiva
A infração prevista no Art. 218, III, é classificada como gravíssima. Isso significa que, independentemente do histórico de pontos do condutor, a simples constatação dessa infração desencadeia um processo de suspensão do direito de dirigir. Ela é uma das chamadas “infrações autossuspensivas” ou “infrações mandatórias”, que por sua própria natureza já preveem a suspensão da CNH como penalidade, sem a necessidade de atingir um limite de pontos.
Outras infrações autossuspensivas incluem dirigir sob influência de álcool (Art. 165), recusar o teste do bafômetro (Art. 165-A), disputar racha (Art. 173), efetuar manobra perigosa (Art. 175), entre outras. A lógica por trás dessas infrações é que a conduta é tão perigosa que a penalidade de suspensão é imediatamente aplicável para tirar o condutor de risco da via.
O Período de Suspensão: De 2 a 8 Meses (e Reincidência)
A duração da suspensão do direito de dirigir para a infração do Art. 218, III, não é fixa. Conforme o Artigo 261, § 1º, do CTB, o período de suspensão para as infrações que preveem a penalidade de suspensão de forma direta (infrações autossuspensivas) é de 2 (dois) a 8 (oito) meses.
No entanto, há uma agravante: se o condutor for reincidente na mesma infração (Art. 218, III) em um período de 12 (doze) meses, o prazo de suspensão será de 8 (oito) a 18 (dezoito) meses. Essa reincidência demonstra um desprezo contínuo pelas normas de trânsito e pela segurança, justificando uma penalidade mais severa.
A definição do tempo exato dentro dessa faixa (2 a 8 meses ou 8 a 18 meses) é feita pela autoridade de trânsito responsável pelo processo administrativo de suspensão. Essa decisão deve ser motivada e considerar a gravidade da conduta, os antecedentes do infrator e outras circunstâncias relevantes.
O Processo de Suspensão do Direito de Dirigir
O processo de suspensão da CNH, no caso do Art. 218, III, é um processo administrativo que segue etapas bem definidas:
- Constatação da Infração: A infração é registrada por um radar ou por um agente de trânsito. É crucial que o radar esteja devidamente aferido pelo INMETRO, e que a notificação de autuação inclua os dados da aferição, bem como a velocidade medida e a velocidade considerada (já descontada a margem de erro).
- Notificação de Autuação: O proprietário do veículo recebe uma Notificação de Autuação, que informa sobre a infração cometida. A partir daí, abre-se o prazo para a Defesa Prévia.
- Defesa Prévia: É a primeira oportunidade de o condutor apresentar argumentos contra a autuação, contestando erros formais no auto de infração (ex: placa errada, local inexistente, falta de dados do radar).
- Notificação de Penalidade: Se a defesa prévia for indeferida ou não for apresentada, o condutor receberá a Notificação de Penalidade. Essa notificação informa sobre a imposição da multa e o início do processo de suspensão da CNH.
- Recurso à JARI (Junta Administrativa de Recursos de Infrações): Após receber a Notificação de Penalidade, o condutor tem um novo prazo para apresentar recurso à JARI. Nesse estágio, é possível aprofundar os argumentos, incluindo questões de mérito e a legalidade do processo de suspensão.
- Recurso ao CETRAN (Conselho Estadual de Trânsito) ou CONTRANDIFE: Se o recurso à JARI for indeferido, o condutor pode recorrer em última instância administrativa ao CETRAN (ou CONTRANDIFE, no Distrito Federal).
- Início do Cumprimento da Suspensão: Somente após esgotadas todas as vias recursais administrativas (ou se os prazos para recurso não forem observados), a penalidade de suspensão será efetivada. O condutor será notificado para entregar sua CNH ao órgão de trânsito. O período de suspensão começa a contar a partir da data de entrega da CNH.
- Curso de Reciclagem: Durante o período de suspensão, o condutor é obrigado a realizar um curso de reciclagem para condutores infratores. O curso tem carga horária de 30 horas/aula e aborda temas como legislação de trânsito, direção defensiva, noções de primeiros socorros e relacionamento interpessoal.
- Prova Teórica: Ao final do curso de reciclagem, o condutor deve ser aprovado em uma prova teórica aplicada pelo Detran.
- Restituição da CNH: Somente após cumprir integralmente o período de suspensão e ser aprovado no curso e prova de reciclagem, a CNH é restituída ao condutor.
Impacto da Margem de Erro do Radar
É fundamental entender que a velocidade considerada para fins de autuação sempre leva em conta a margem de erro do equipamento medidor (radar). Essa margem é definida pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO).
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Para velocidades de até 100 km/h: A margem de erro é de 7 km/h.
- Exemplo: Em uma via de 60 km/h, o motorista só será autuado pelo Art. 218, III, se a velocidade medida for acima de 90 km/h (60 km/h + 50% = 90 km/h). Com a margem de erro de 7 km/h, a velocidade considerada será 83 km/h. Portanto, para ser autuado pelo Art. 218, III, a velocidade medida no radar precisaria ser, na verdade, acima de 97 km/h (90 + 7).
- Importante: o sistema de cálculo do órgão já faz essa dedução. A velocidade considerada é a velocidade aferida menos a margem de erro. O que se compara com o limite da via é a velocidade considerada.
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Para velocidades acima de 100 km/h: A margem de erro é de 7%.
- Exemplo: Em uma via de 110 km/h, o motorista só será autuado pelo Art. 218, III, se a velocidade considerada for acima de 165 km/h (110 km/h + 50% = 165 km/h). Com a margem de erro de 7%, a velocidade medida no radar precisaria ser de aproximadamente 177,4 km/h para que a velocidade considerada fosse 165 km/h.
Essa margem de erro é uma garantia para o condutor, mas não anula a infração em si. Ela apenas assegura que a penalidade seja aplicada com base em uma medição precisa.
Consequências Adicionais e Riscos
Além da multa elevada e da suspensão da CNH, a infração do Art. 218, III, traz outras consequências e riscos:
- Registro no Prontuário: A infração fica registrada no prontuário do condutor, o que pode influenciar em processos futuros e no cálculo do seguro automotivo.
- Aumento do Risco de Acidentes: O principal objetivo da legislação é coibir o comportamento perigoso. Excesso de velocidade acima de 50% aumenta drasticamente o risco de acidentes graves, com lesões ou mortes.
- Responsabilidade Civil e Criminal: Em caso de acidente com vítimas, o condutor que estava em excesso de velocidade pode ser responsabilizado civilmente (por danos materiais e morais) e criminalmente (por lesão corporal culposa ou homicídio culposo no trânsito), com penas de prisão.
- Cassação da CNH: Se o condutor for flagrado dirigindo com a CNH suspensa, ele comete uma nova infração gravíssima (Art. 162, II do CTB) e sua CNH pode ser cassada por um período de 2 anos, sendo necessário refazer todo o processo de habilitação (exames médicos, psicotécnicos, aulas teóricas, provas, aulas práticas, etc.) após o cumprimento do prazo de cassação.
Como Se Defender de uma Multa do Art. 218, III
A defesa contra uma multa de excesso de velocidade por mais de 50% deve ser elaborada com critério e conhecimento técnico. Algumas das linhas de defesa mais comuns e eficazes incluem:
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Vício no Auto de Infração:
- Falta de dados obrigatórios: Ausência da data da aferição do radar pelo INMETRO, número de série do equipamento, ou identificação do agente.
- Inconsistência de dados: Placa errada, local da infração genérico ou impossível, descrição vaga da infração.
- Notificação fora do prazo: Se a Notificação de Autuação for expedida mais de 30 dias após a data da infração.
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Irregularidades no Equipamento:
- Radar sem aferição periódica: Os radares precisam ser aferidos pelo INMETRO a cada 12 meses. A ausência ou vencimento dessa aferição torna a medição inválida.
- Não observância da margem de erro: Embora raro, pode haver equívocos no cálculo da velocidade considerada após a dedução da margem de erro.
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Sinalização Inadequada:
- Ausência de sinalização de velocidade: A via precisa estar devidamente sinalizada com a velocidade máxima permitida. Se não houver placa, o condutor pode alegar desconhecimento.
- Placa encoberta ou ilegível: Se a sinalização estiver danificada, pichada, ou encoberta por vegetação ou outros obstáculos, dificultando a visualização pelo condutor.
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Não Identificação do Condutor:
- Se o proprietário do veículo não for o condutor no momento da infração, ele deve indicar o real infrator dentro do prazo estabelecido. Isso evita que os pontos sejam atribuídos à sua CNH, embora a multa continue sendo de responsabilidade do proprietário. No caso do Art. 218, III, mesmo com a indicação do condutor, o processo de suspensão da CNH será aberto contra o real infrator.
A elaboração de um recurso eficaz exige conhecimento da legislação de trânsito, das resoluções do CONTRAN e da jurisprudência. Por isso, a consulta a um especialista em direito de trânsito é altamente recomendada.
Educação e Conscientização
A repressão através de multas e suspensão da CNH é uma ferramenta importante, mas a educação e a conscientização são igualmente cruciais para mudar o comportamento dos motoristas. Campanhas educativas sobre os perigos do excesso de velocidade, o impacto nos acidentes e as consequências legais podem ajudar a reduzir a incidência da infração do Art. 218, III, e tornar o trânsito mais seguro. A velocidade excessiva diminui o tempo de reação, aumenta a distância de frenagem e potencializa a energia de um impacto, transformando um incidente menor em uma tragédia.
Perguntas e Respostas
A multa do Art. 218, III, gera quantos pontos na CNH?
Embora a infração seja gravíssima e, por padrão, as infrações gravíssimas gerem 7 pontos, no caso do Art. 218, III, esses pontos não são contabilizados para o limite de pontuação que leva à suspensão da CNH. Isso ocorre porque o Art. 218, III, é uma infração autossuspensiva, ou seja, a suspensão do direito de dirigir é uma penalidade direta da infração, independentemente do número de pontos acumulados pelo condutor.
Posso continuar dirigindo enquanto o processo de suspensão está em andamento?
Sim, você pode continuar dirigindo enquanto o processo administrativo de suspensão não for concluído e você não for oficialmente notificado para entregar sua CNH. O direito de dirigir só é suspenso após o trânsito em julgado do processo administrativo, ou seja, quando não há mais recursos possíveis ou quando você não os apresentou dentro dos prazos.
O valor da multa do Art. 218, III, é fixo em R$ 880,41?
Sim, o valor da multa para a infração do Art. 218, III, é fixo em R$ 880,41. Esse valor é resultado da multiplicação por três do valor base de uma infração gravíssima (R$ 293,47 x 3). Em caso de reincidência na mesma infração em até 12 meses, não há multiplicação do valor da multa novamente, apenas o agravamento do período de suspensão da CNH.
O curso de reciclagem é obrigatório para reaver a CNH suspensa pelo Art. 218, III?
Sim, o curso de reciclagem para condutores infratores é obrigatório em todos os casos de suspensão do direito de dirigir, seja por acúmulo de pontos ou por infração autossuspensiva. Além de frequentar o curso, o condutor deve ser aprovado em uma prova teórica no Detran para ter sua CNH restituída.
Se eu for pego dirigindo com a CNH suspensa, o que acontece?
Se você for flagrado dirigindo com a CNH suspensa, você comete uma nova infração gravíssima (Art. 162, II do CTB). A penalidade para essa conduta é a cassação da CNH por um período de 2 anos. Após esse período, para reaver o direito de dirigir, você terá que refazer todo o processo de habilitação, como se nunca tivesse tido CNH, incluindo exames médicos e psicotécnicos, aulas teóricas e práticas, e as respectivas provas.
Conclusão
O Artigo 218, inciso III, do Código de Trânsito Brasileiro é uma ferramenta legal essencial para coibir um dos comportamentos mais perigosos no trânsito: o excesso de velocidade em mais de 50% do limite permitido. A classificação como infração gravíssima e a imposição da suspensão direta do direito de dirigir por um período que varia de 2 a 8 meses (e até 18 meses em caso de reincidência) refletem a seriedade com que a legislação trata a vida e a segurança nas vias.
A compreensão plena desse dispositivo legal, que abrange desde o processo de autuação até o cumprimento da penalidade, é crucial para todos os condutores. Mais do que temer a multa ou a suspensão, a conscientização sobre os riscos inerentes à velocidade excessiva e o respeito às normas de trânsito são os verdadeiros pilares para um ambiente viário mais seguro e humano para todos. Dirigir com responsabilidade é um compromisso contínuo com a vida.