De modo geral, a CLT não garante, por lei federal, uma estabilidade automática de 30 dias ao empregado que retorna de um auxílio-doença comum (código B-31). Essa proteção existe apenas nas hipóteses de auxílio-doença acidentário (código B-91), caso em que o art. 118 da Lei 8.213/1991 assegura 12 meses de estabilidade a partir da alta previdenciária. Contudo, a estabilidade de 30 dias pode surgir de quatro fontes distintas:
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cláusula de convenção ou acordo coletivo;
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regulamento interno ou política corporativa;
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jurisprudência (em especial quando a dispensa logo após a alta revela discriminação);
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decisões liminares fundadas no princípio da função social do contrato.
A seguir, entraremos nos detalhes: como funciona cada fundamento, quais documentos e prazos observar, que indenização pedir se houver ruptura injusta, exemplos práticos, perguntas frequentes e como empregador e empregado podem se prevenir contra litígios.
fundamento legal da estabilidade após auxílio-doença
O núcleo normativo vem de cinco dispositivos principais:
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Art. 118 da Lei 8.213/1991: estabilidade de 12 meses após alta de auxílio-doença acidentário (B-91).
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Art. 7.º, I, CF: proibição de dispensa arbitrária, concretizada por convenções.
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Arts. 611-A e 611-B, CLT: prevalência do negociado sobre o legislado, podendo criar estabilidade convencional.
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Art. 9.º, CLT: nulidade de ato usado para fraudar direitos (dispensa discriminatória).
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Lei 9.029/1995: veda práticas discriminatórias relacionadas a deficiência ou predisposição genética.
Nada, entretanto, concede automaticamente 30 dias de estabilidade para quem recebe B-31. Essa garantia é criação de normas coletivas ou, em certos ramos (bancários, químicos, vigilantes), de jurisprudência pacificada em dissídios coletivos.
quem tem direito à estabilidade de 30 dias
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Empregados celetistas cujas convenções coletivas preveem período de estabilidade curto (15, 30 ou 60 dias) após retorno de auxílio-doença comum.
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Empregados de empresas cujo regulamento interno adote garantia suplementar.
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Empregados que comprovem doença grave e obtenham decisão judicial liminar com base na dignidade da pessoa humana.
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Trabalhadores reabilitados pelo INSS em nova função; muitos instrumentos coletivos lhes conferem 30 dias de proteção.
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Portadores de doença estigmatizante (câncer, HIV, esquizofrenia) cuja dispensa, segundo a Súm. 443/TST, é presumida discriminatória.
diferença entre auxílio-doença comum e acidentário
Fator | Comum (B-31) | Acidentário (B-91) |
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Carência | 12 contribuições | Dispensa |
Estabilidade | Só se houver previsão coletiva | 12 meses (art. 118) |
FGTS no afastamento | Suspenso | Recolhimento obrigatório |
CAT | Dispensável | Obrigatória |
Responsabilidade civil | Depende de culpa do empregador | Mais fácil provar nexo técnico |
FAP | Não impacta | Impacta (aumenta alíquota) |
como nasce a estabilidade de 30 dias
convenções coletivas
Exemplo real da cláusula 23.ª da Convenção dos Bancários 2024/2026:
“Fica assegurada estabilidade provisória de 30 (trinta) dias ao empregado que retornar de auxílio-doença de qualquer natureza.”
Para ser exigível, a norma deve:
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conter período definido;
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identificar beneficiários;
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estar vigente na data da dispensa.
regulamento interno
Regulamentos anexos a contrato individual integram o pactum. Se a empresa altera unilateralmente retirando a estabilidade, aplica-se a Súmula 51, I, TST: condição mais benéfica não pode ser suprimida.
jurisprudência
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Súmula 443 TST: dispensa de empregado portador de doença grave é presumidamente discriminatória, gerando reintegração ou indenização. Tribunais têm estendido a “grave” para afastamentos longos (> 30 dias) seguidos de alta.
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OIT, Convenção 159: reabilitados têm direito à inclusão — dispensa imediata viola a norma internacional, ensejando reintegração com estabilidade mínima de 30 dias, ainda que a convenção nacional silencie.
requisitos formais para o empregado
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Alta previdenciária: NB encerrado no INSS.
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Comparecimento à empresa: exame de retorno ao trabalho (NR 7).
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Apresentar CAT (se acidente) ou carta de concessão (B-31).
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Cumprir readaptação: se médico ocupacional declarar inapto, empresa deve remeter ao INSS ou readaptar.
exame de retorno e riscos para a empresa
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NR 7, item 7.5.9: obrigatório após ausência > 30 dias por doença.
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Médico do trabalho pode:
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declarar apto — empregado retorna.
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declarar apto com restrições — empresa adequa função.
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declarar inapto — suspende retorno, faz nova CAT e reencaminha ao INSS.
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Dispensa sem exame é nula (TST, AIRR 687-46.2017).
consequências da dispensa dentro do período de 30 dias
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Reintegração imediata com pagamento de salários vencidos;
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Indenização substitutiva: remuneração do período + FGTS 8 % + 40 % + reflexos;
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Dano moral se comprovada discriminação (valores de R$ 10 000 a R$ 50 000, a depender da gravidade);
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Multa do art. 477, § 8.º, CLT por atraso na quitação — jurisprudência entende que não incide se pagamento efetuado na rescisão original.
ação judicial: qual vara e rito
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Valor até 40 salários-mínimos → Rito sumaríssimo (arts. 852-A ss., CLT).
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Pedido de reintegração + salários → Tutela de urgência (CPC 300) demonstrando fumus e periculum.
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Prazo prescricional: 2 anos a partir da dispensa; parcelas vencidas prescrevem em 5 anos.
cálculo de indenização substitutiva
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Salários devidos: meses faltantes para completar 30 dias + diferença até conseguir novo emprego (limite fixado em sentença).
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13.º e férias proporcionais.
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FGTS sobre cada parcela.
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Multa de 40 % sobre FGTS.
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Horas extras habituais incorporadas.
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Juros (0,5 % a 1 % a.m.) + correção (IPCA-E).
exemplos práticos
caso A — convenção garante 30 dias
Empregado afastado 45 dias (B-31), alta em 10/jun. Convenção dos Metalúrgicos prevê 30 dias. Empresa dispensa em 20/jun. Empregado ajuíza ação: reintegração + R$ 5 000 de dano moral. Juízo concede liminar; estabilidade expira em 10/jul, mas salários são pagos até essa data.
caso B — sem cláusula, mas dispensa discriminatória
Vendedora diagnosticada com lupus, afastada 6 meses. Dispensa no 15.º dia pós-alta. Tribunal presume discriminação; condena empresa a reintegrar e pagar R$ 30 000 de danos morais.
caso C — afastamento acidentário
Operador fratura a mão (B-91), alta em 1º/fev/25. Dispensa em 5/fev/25. Estabilidade legal de 12 meses: reintegração + indenização alternativa (12 salários).
perguntas e respostas
A estabilidade de 30 dias é obrigatória em todo o país?
Não. Só existe se convenção ou regulamento prever ou se configurada dispensa discriminatória reconhecida em juízo.
A empresa pode pagar em vez de reintegrar?
Sim, desde que o empregado aceite ou o juízo converta reintegração em indenização substitutiva.
Suspensão imediata do contrato pós-alta viola estabilidade?
Sim. Suspensão para aguardar perícia particular é ato obstativo.
Gestante afastada por auxílio-doença acumula duas estabilidades?
Sim: estabilidade gestante (do início da gravidez até 5 meses pós-parto) e, se for B-91, mais 12 meses.
Estabilidade vale para doméstica?
Caso exista convenção expandindo à categoria, sim. A Lei 150/2015 não prevê.
conclusão
A “estabilidade de 30 dias” após retorno de auxílio-doença é instituto derivado do poder normativo coletivo e da jurisprudência contra dispensas discriminatórias. Para o empregado, conhecer a convenção aplicável e guardar toda a documentação de alta médica é vital. Para o empregador, cumprir o exame de retorno, checar instrumentos coletivos e adotar políticas claras de reinclusão evita litígios custosos. Quando bem compreendida, a regra equilibra a proteção da saúde do trabalhador com a flexibilidade empresarial, concretizando o princípio da dignidade da pessoa humana no contrato de trabalho.