Hebert Henrique de Oliveira Melanias
RESUMO: O artigo tem como principal objetivo demonstrar os problemas de gestão da segurança pública vivenciada pelos policiais civis do Estado de Alagoas, sobretudo no que concerne a guarda e custódia de presos, evidenciando o desvio de função. No intuito de melhor apresentar o tema, abordar-se-á sobre a competência da polícia judiciária à luz das normas jurídicas e as atribuições restritas do sistema prisional de Alagoas, a fim de constatar o flagrante abuso praticado pela Administração Pública que, sem maiores contestações, viola o princípio da legalidade estrita ao compelir a polícia investigativa a exercer funções estranhas a qual foi destinada, como no caso, a custódia de presos. O artigo consiste também em apresentar o papel das instituições (Defensoria Pública, Ministério Público e a Magistratura) no combate ao abuso praticado corriqueiramente pela Administração Pública.
Palavras-Chave: Desvio de Função. Segurança Pública. Polícia Judiciária. Custódia de Presos.
ABSTRACT: The main objective of the article is to demonstrate the problems of public safety management experienced by the civil Police of the state of Alagoas, especially with regard to the custody and custodial of prisoners, highlighting the deviation of function. In order to better present the subject, it will address the jurisdiction of the judicial police in the light of the legal rules and the restricted assignments of the prison system of Alagoas, in order to establish the blatant abuse practiced by the public administration which, without Greater disputes, violates the principle of strict legality by compelling the investigative police to perform strange functions to which it was intended, as in the case, custody of prisoners. The article also consists in presenting the role of the institutions (Public Defender, prosecutor and magistrates) in the fight against abuse practiced routinely by the public administration.
Keywords: Deviation of Function. Public Safety. Judicial Police. Custodial of Prisoners.
Sumário: Introdução. 1. Competência da Polícia Judiciária de Alagoas à luz das normas jurídicas. 1.1. Uma análise da competência da Polícia Judiciária no âmbito da Constituição Federal de 1988 e da Constituição alagoana. 1.2. Lei Estadual nº 3.437/1975 e a competência estrita da Polícia Judiciária. 1.3. A Lei Federal nº 7.210/1984 e a competência legítima da custódia de presos. 2. A custódia de presos no âmbito da Polícia Judiciária de Alagoas e aspectos gerais sobre o sistema prisional alagoano. 2.1. Competência e atribuições da Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social – SERIS. 2.2 O flagrante desvio de função do policial civil em Alagoas e a atuação do Ministério Público e Defensoria Pública no combate as irregularidades. 3. Conclusão. Referências bibliográficas.
INTRODUÇÃO
A Segurança Pública é erguida pela Constituição Federal de 1988 como sendo um dever do Estado e responsabilidade de todos, escancarando a competência dos órgãos de segurança. A Lei Estadual nº 3.347, de 25 de junho de 1975, que dispõe sobre o Estatuto da Polícia Civil do Estado de Alagoas, divide os cargos e define suas atribuições. Com a alteração dada pela Lei Estadual nº 6.276, de 11 de outubro de 2001 e, por conseguinte, da Lei Estadual nº 6.788, de 27 de dezembro de 2006 ficou estruturada as Carreiras de Agente de Polícia Civil e de Escrivão de Polícia Civil, sendo revogadas as disposições em contrário, como os cargos anteriormente existentes de carcereiro, agente policial motorista etc.
O tema a ser desenvolvido no presente trabalho dará oportunidade de analisar a competência da Polícia Judiciária. O objetivo geral é demonstrar que com a obediência escorreita da aplicação das normas e na boa gestão do Poder Executivo Estadual, os policiais civis poderão apresentar um trabalho de excelência em sua atividade fim.
A abordagem se faz necessária, a fim de demonstrar que a Administração Pública, por meio das pastas da Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Secretaria de Estado da Ressocialização e Inclusão Social, estão sujeitas ao princípio da legalidade estrita, devendo estas afastar a custódia de presos da competência da polícia civil. No intuito de melhor abordar o tema e transpor o seu sentido amplo, se fez necessário uma pesquisa em livros e artigos. O método de abordagem hipotético-dedutivo e a fonte de pesquisa é do tipo exploratório. Assim, a monografia fora dividida em dois capítulos, a saber:
O Capitulo 2 (dois) traz considerações acerca da competência da polícia judiciária, tanto na Constituição Federal como na Constituição do Estado de Alagoas, além de abordar a Lei Estadual nº 3.437/1975 e a Lei Federal nº 7.210/1984, apontando a quem compete exclusivamente a custódia de presos, sobretudo os presos provisórios.
O Capítulo 3 (três), pondera sobre a regulamentação do sistema prisional alagoano e suas atribuições. Neste capítulo, fundamentalmente, fica demonstrado que cabe tão somente ao Sistema Prisional a guarda e custódia de presos.
Por fim, ainda no referido capítulo, serão revistas algumas decisões e o papel fundamental da Defensoria Pública, assim como do Ministério Público, face às decisões judiciais de interdição das delegacias no Estado de Alagoas.
1 COMPETÊNCIA DA POLÍCIA JUDICIÁRIA À LUZ DAS NORMAS JURÍDICAS
A Polícia Civil ou a Polícia Judiciária tem papel fundamental perante a sociedade no combate aos ilícitos penais. A Polícia Judiciária é órgão essencial a Justiça na busca efetiva da repressão dos ilícitos penais, sendo peças investigativas, em ampla análise, garantia de preservação dos direitos fundamentais do cidadão, in verbis:
“Tem a polícia judiciária − como parte do sistema repressivo estatal – importante papel a desempenhar na manutenção do Estado democrático de Direito. […] Não é permitido ao Estado sujeitar o cidadão ao processo-crime sem um mínimo de indícios que autorizem o início da ação penal. Eis o objetivo do inquérito policial: colher provas da existência do fato, da autoria e de suas circunstâncias, para que possa o dominus litis, formar sua convicção e promover a denúncia ou solicitar o arquivamento do fato perante o Estado-Juiz.” (CORRÊA, 2008)
Trata-se de uma polícia especializada responsável em dar início a persecutio criminis, ou seja, “a investigação policial, seguida do processo penal, revela-se como instrumento que legitima o uso da força do Estado e se consubstancia como verdadeiro freio ao poder punitivo, que precisa ficar amarrado a rígidos limites”. (CASTRO, 2015)
Da breve análise em epígrafe, passemos a abordar o que bem disciplina a Constituição Federal de 1988 e a Constituição do Estado de Alagoas, bem como o Estatuto da Polícia Civil e a Lei de Execuções Penais.
1.1. Uma análise da competência da Polícia Judiciária no âmbito da Constituição Federal de 1988 e da Constituição Alagoana
A Constituição Federal de 1988 no § 4º, do art. 144 aborda que compete à polícia civil as funções de polícia judiciária e à apuração de infrações penais, exceto as militares. Vejamos:
“Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
[…]
- 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.” (grifo nosso)
Com isso, define-se a Polícia Judiciária como órgão auxiliar da justiça, por meio do qual num procedimento extrajudicial, a Autoridade Policial apresenta elementos mínimos (autoria e materialidade) ao Ministério Público favorecendo a este a opinio delicti.
A Constituição do Estado de Alagoas não poderia ser diferente, tendo em vista o princípio da supremacia da constituição, não podendo nenhuma norma jurídica contrariar a Carta Magna, sob pena de ser declarada inconstitucional.
A Constituição alagoana, disciplina no inciso I, do § 1º, bem como no § 2º, do art. 244, a polícia judiciária como órgão competente na função investigativa, presidida e dirigida por um Delegado de Polícia. Ainda na Constituição alagoana tem-se que compete em Lei Estadual disciplinar a organização e o funcionamento da Polícia Civil, sendo as funções de polícia judiciária privativas dos integrantes das respectivas carreiras funcionais.
“Art. 245. A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de modo a garantir a eficiência de suas atividades.
- 1ºAs funções de Polícia Judiciária são privativas dos integrantes das respectivas carreiras funcionais.
- 2ºA lei organizará, em carreira, os cargos da Polícia Civil.”
A organização administrativa da polícia civil está disciplinada na Lei Estadual nº 6.441, de 31 de dezembro de 2003, alterada pela Lei Estadual nº 6.479, de 28 de maio de 2004. O caput do art. 6º e os incisos ali existentes apresentam os objetivos institucionais da Polícia Civil, ipsis litteris:
“Art. 6º São objetivos institucionais da Polícia Civil:
I – exercer o poder de polícia na investigação e apuração dos ilícitos penais em quaisquer de suas formas, na defesa da cidadania e das incolumidades das pessoas e do patrimônio;
II – apurar as infrações penais, exceto as militares, nos limites de sua competência constitucional;
III – auxiliar a Justiça na prestação da tutela jurisdicional, atendendo às requisições judiciais, como também dos membros do Ministério Público;
IV – apoiar, quando necessário, as medidas pertinentes à preservação da ordem pública, inclusive em situações excepcionais de emergências e calamidades;
V – respeitar os direitos do cidadão;
VI – empregar os recursos da inteligência, da persuasão e do diálogo como regra, utilizando-se da força apenas como recurso extremo;
VII – assegurar à sociedade o compromisso de a ela servir e defender no enfrentamento da violência e da criminalidade, através dos meios de ação do aparelho policial;
VIII – investir na qualificação profissional dos seus integrantes, visando a melhor servir a sociedade; e
IX – integrar-se às ações de segurança pública com os demais órgãos participantes da Célula de Justiça e Defesa Social, visando ao pleno exercício da cidadania.”
Por derradeira e sem muitas delongas, translúcida a competência e a função a ser desempenhada pela Polícia Civil, prevista explicitamente na Constituição Federal de 1988 e na Constituição do Estadual, sendo enfatizadas pela norma infraconstitucional em epígrafe, não podendo em nenhum momento se apor a outra função senão a de investigar.
1.2. Lei Estadual nº 3.437/1975 e a competência estrita da Polícia Judiciária
O Estatuto da Polícia Civil, regido pela Lei Estadual nº 3.437, de 25 de junho 1975, com a alteração dada pela Lei Estadual nº 6.276, de 11 de outubro de 2001 e, por conseguinte, da Lei Estadual nº 6.788, de 27 de dezembro de 2006, definiu as atribuições e a competência da Polícia Civil do Estado de Alagoas.
Atualmente, a Polícia Civil de Alagoas é dividida em 03 (três) categorias: (i) Delegado de Polícia; (ii) Agente de Polícia e (iii) Escrivão de Polícia. Cada categoria possui sua competência e sua finalidade, seguindo como base os ensinamentos do Estatuto da Polícia Civil.
O art. 15, da Lei Estadual nº 3.437/1975 assevera que ao Delegado de Polícia compete:
“[…] dirigir órgãos executivos de operações policiais, chefiar a execução ou executar investigações relacionadas com a prevenção e repressão de ilícitos penais; instaurar e presidir inquéritos policiais e processos contravencionais. Formalizar prisão em flagrante; informar pedidos de habeas-corpus; representar à autoridade judiciária sobre a necessidade ou ocorrência de prisão preventiva de indiciados em inquéritos; executar missões de caráter sigiloso e ações de interesse da segurança.”
Já o art. 18 expõe que cabe ao Escrivão de Polícia:
“[…] dar cumprimento às formalidades processuais; lavrar termos, autos e mandados; observar os prazos necessários ao preparo, ultimação e remessa de inquéritos processuais; preparar o expediente; preparar certidões; acompanhar a autoridade policial, quando determinado, nas diligências extras; executar a escrituração de livros.”
E, por fim, ao Agente de Polícia, nos termos do art. 19 compete:
“[…] investigar atos e a fatos que caracterizam ou possam caracterizar infrações penais; executar intimações, notificações a indiciados, vítimas, testemunhas, proceder busca de informações; executar atividades necessárias à prevenção e repressão de infrações penais; executar outras atividades julgadas necessárias ao esclarecimento de infrações penais; executar a segurança de autoridades.”
Depreende-se dos dispositivos supracitados que, em nenhum momento, as normas dispõem como competência da Polícia Judiciária a guarda e a custódia de presos.
1.3. A Lei Federal nº 7.210/1984 e a competência legítima da custódia de presos
De pronto mostra-se límpido que esta Instituição Policial não possui a obrigatoriedade e o dever de custodiar, escoltar, remover e/ou cuidar de presos, sendo tal responsabilidade atribuída, pelos princípios da especialidade e da legalidade, a Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social – SERIS, conforme disciplina a Lei Federal nº 7.210 de 11 de julho de 1984 (Lei de Execuções Penais), em especial em seu artigo 82 “os estabelecimentos penais destinam-se ao condenado, ao submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao egresso”. (grifo nosso)
Importante enaltecer o que bem leciona CASTRO (2016) ao abordar sobre o tema (obrigatoriedade da administração penitenciária a custódia de presos), onde explana cuidadosamente o papel do Sistema Prisional como único órgão que possibilita, dentro de seu quadro de pessoal, treinamento e capacitação na custódia e remoção de presos.
“[…] a Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal) norteia a atividade estatal de custódia de presos, incumbindo tal tarefa à administração penitenciária. […] O detido só deve ficar recolhido na unidade policial durante o tempo estritamente necessário para a finalização do flagrante (em até 24 horas — artigo 306, parágrafo 1º do CPP) ou para o cumprimento do mandado de prisão cautelar.” (grifo nosso)
Em Alagoas, como já abordado inicialmente, os estabelecimentos prisionais são geridos pela Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social – SERIS e, consequentemente, os seus servidores (agentes penitenciários) possuem a legitimidade de custodiar e remover presos. Assim, pensamento contrário e atitudes distintas ao que as leis dispõem configuram flagrante abuso de direito, passivo de penalidade aos responsáveis que contribuem omissiva ou comissivamente na arbitrariedade de se exigir da polícia judiciária o cuidado de presos.
2 A CUSTÓDIA DE PRESOS NO ÂMBITO DA POLÍCIA JUDICIÁRIA DE ALAGOAS E ASPECTOS GERAIS SOBRE O SISTEMA PRISIONAL ALAGOANO
Em que pese à vasta legislação vigente, a Polícia Judiciária do Estado de Alagoas continua a custodiar presos, dentre os locais onde há grande incidência e superlotação de presos estão as Unidades de Igreja Nova, Novo Lino, Central de Flagrantes I, Central de Flagrantes II (CODE) e Central de Flagrantes (Arapiraca), além de outras unidades da polícia civil. O presente artigo dará ênfase à competência da SERIS no dever de cuidado dos presos, bem como tratará sobre o desvio de função de policial civil e falta de gestão na segurança pública em Alagoas.
2.1. Competência e atribuições da Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social – SERIS
Antes de possuir a sobredita denominação e converter-se em Secretaria, a SERIS passou por diversas transformações, inclusive, anteriormente, denominada pela Lei Delegada nº 44/2011 de Superintendência Geral de Administração Penitenciária (SGAP). Atualmente, em 11 de agosto de 2015, foi publicada no Diário Oficial do Estado de Alagoas a Lei Delegada nº 47, criando a Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social (SERIS) e tornando-a responsável pela administração penitenciária.
É no artigo 3º, do Decreto Estadual nº 49.051, de 22 de junho de 2016, que dispõe sobre o regimento interno da SERIS, que podemos vislumbrar sua competência e suas atribuições, ad litteram:
“Art. 3º A Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social – SERIS tem por finalidade:
I – administrar o Sistema Penitenciário do Estado de Alagoas;
II – assegurar o cumprimento da política nacional penitenciária e da legislação pertinente, no âmbito estadual, planejando, coordenando, controlando, gerindo e executando projetos e programas, com a finalidade de tornar o Sistema Penitenciário do Estado autossustentável;
[…]
V – desenvolver programas de educação e profissionalização do reeducando, objetivando seu reingresso na sociedade; e
VI – manter e administrar o Centro Psiquiátrico Judiciário, promovendo condições para garantir saúde, proteção e recuperação dos inimputáveis e dos toxicômanos do Sistema Penitenciário.”
Têm-se claramente, atrelado a Lei de Execuções Penais, que compete tão somente à SERIS/AL, a organização, administração e cuidado com os presos provisórios e já sentenciados, inclusive os presos cautelares.
Segundo informações dadas no sítio eletrônico oficial da SERIS, em seu organograma, o sistema prisional alagoano se divide em: (i) Penitenciária Masculina Baldomero Cavalcanti de Oliveira – PMBCO; (ii) Presídio Professor Cyridião Durval da Silva – PPCDS; (iii) Presídio do Agreste – PA; (iv) Presídio de Segurança Máxima – PreSM; (v) Colônia Agroindustrial São Leonardo – CASL; (vi) Casa de Custódia da Capital – CCC; e (vii) Centro Psiquiátrico Judiciário Pedro Marinho Suruagy, todos com o objetivo único de receber presos provisórios e condenados em definitivo.
Existem ainda 02 (duas) unidades destinadas a presos, sendo o Núcleo Ressocializador da Capital e o Presídio Desembargador Luiz de Oliveira Souza (Arapiraca), este último se encontra desativado.
2.2. O flagrante desvio de função do policial civil em Alagoas e a atuação do Ministério Público e Defensoria Pública no combate as irregularidades
Um dos maiores princípios que rege a Administração Pública e que tem como principal função orientar e garantir a perfeita execução da norma, é o princípio da legalidade estrita. Tal princípio representa absoluta subordinação e obediência do Poder Pública à norma jurídica.
Conforme já observado por MELLO (2000, p. 748), a violação de um princípio é muitas vezes mais gravoso do quer ir de contra a própria norma.
“Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico andamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.”
Neste contexto, o princípio da legalidade implica em afirmar que:
“[…] o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeitos aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil, criminal, conforme o caso.” (MEIRELLES, 2009, p. 89)
Ainda sobre o tema ROSA (2003, p. 11) exorta que:
“Ao particular é dado fazer tudo quanto não estiver proibido; ao administrador somente o que estiver permitido pela lei (em sentido amplo). Não há liberdade desmedida ou que não esteja expressamente concedida. Toda a atuação administrativa vincula-se a tal princípio, sendo ilegal o ato praticado sem lei anterior que o preveja […] Do princípio da legalidade decorre a proibição de, sem lei ou ato normativo que permita, a Administração vir a, por mera manifestação unilateral de vontade, declarar, conceder, restringir direitos ou impor obrigações.”
Dadas as breves explanações temos que a Polícia Judiciária do Estado de Alagoas vive praticando constantemente ilegalidades, mormente pela imposição do Governo do Estado e suas Secretarias, criando como método paliativo e danoso às atividades típicas da polícia civil, a obrigatoriedade da custódia de presos.
Há um flagrante desvio de função do policial civil em Alagoas que a todo instante se vê compelido a exercer funções estranhas ao seu cargo, colocando os membros da instituição numa situação de perigo ante as condições e a ausência de treinamento para custodiar presos de grande periculosidade. Os órgãos da Justiça, dentre eles a Defensoria Pública e o Ministério Público vêm atuando energicamente no combate a essas imposições ilegais, por meio de ações judiciais (Ação Civil Pública), angariando êxito no Poder Judiciário.
Numa ação, tombada sob o nº 0800006-50.2018.8.02.0021, proposta pelo Ministério Público do Estado de Alagoas junto ao Juízo de Direito da Vara do Único Ofício de Maribondo – Alagoas, o Magistrado Bruno Araújo Massoud decidiu pela interdição da Delegacia de Maribondo expondo, acertadamente que:
“[…] é cediço que a custodia de presos não pode ser realizada pela polícia judiciária; dado que a Constituição Federal e o Código de Processo Penal não lhe atribuíram o exercício da atividade penitenciária. […] a LEP, em seu título quarto, ao dispor sobre os estabelecimentos penais não inclui as delegacias de polícia; tendo em que vista que evidentemente não são ambientes destinados à permanência de presos ainda que provisórios.” (grifo nosso)
O Juiz de Direito da Comarca de Minador de Negrão – Alagoas, Edivaldo Landeosi, nos autos da Ação Civil Pública – ACP nº 0000727-90.2012.8.02.0006, promovido pelo Ministério Público registrou, in verbis:
“[…] delegacia de polícia não é local adequado a permanência de presos, ainda que provisórios […] Ora, o Estado só pode combater exitosamente as organizações criminosas ou até mesmo os pequenos delitos tão costumeiros na sociedade alagoana mediante a adoção de políticas públicas e de investimentos nas áreas de logística e infra-estrutura capazes de dotar a polícia judiciária de condições de trabalho que lhe possibilite pôr em prática as suas capacidades intelectuais.” (grifo nosso)
Da mesma forma, na ACP n° 0000103-20.2012.8.02.0013 de autoria da Defensoria Pública, a Juíza de Direito da Vara do Único Ofício de Igaci – Alagoas, Marina Gurgel da Costa, determinou a interdição imediata das celas da Delegacia de Igaci, em razão das “condições gravíssimas que afetam, de forma avassaladora, aquele recinto, inviabilizando, sobremodo, a garantia de custódia dos presos”.
Assim, conforme abalizado no capítulo anterior e enfatizado pelo Judiciário, compete ao Sistema Prisional, por meio da SERIS, a gerência e a custódia de presos.
CONCLUSÃO
É patente que a dificuldade enfrentada pela Polícia Judiciária de Alagoas não se dá pela ausência de norma regulamentadora, mas sim em razão de políticas públicas e institucionais que protelam na solução do problema. Não se pode permitir a custódia de presos pela Polícia Judiciária, tanto pelo que preestabelece a norma constitucional e infraconstitucional, como pela ausência de preparo técnico por parte dos policiais que corresponde a um verdadeiro risco a vida dos presos e do policial civil.
Assim, entende-se que a custódia de presos a cargo dos policiais civis releva-se inconstitucional e imoral, que se constituindo em uma reiterada anomalia praticada pela gestão estatal pode e deve ser corrigida com a criação de novos estabelecimentos prisionais e a realização de concurso público para o cargo de agente penitenciário.
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Hebert Henrique de Oliveira Melanias: Escrivão de Polícia Judiciária do Estado de Alagoas; Assessor Jurídico da Delegacia Geral de Polícia Civil do Estado de Alagoas; Avenida General Luiz de França Albuquerque (Rodovia AL 101 Norte), Jacarecica, Maceió/AL, CEP: 57038-650; [email protected].