Ana Claudia Brandão Falqueto – Advogada, graduada em Direito na Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT. Endereço eletrônico: [email protected]
Resumo: O aborto voluntário é expressamente proibido pelo ordenamento jurídico brasileiro, tipificado como crime pelos artigos 124 a 126 do Código Penal. Todavia, o direito ao aborto voluntário já foi reconhecido por várias Nações ao redor do mundo com a consequente descriminalização da prática, como na Espanha (1936), Suécia (1938), Japão (1948), Rússia (1955), Noruega (1964), e Estado Unidos (1973). O presente trabalho tem como objetivo demonstrar como a proibição do aborto voluntário funciona como fator lesivo aos direitos humanos da mulher, sendo incompatível com a Constituição Federal brasileira e com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, assinada pelo Brasil em 1948. Também visa demonstrar quais devem ser as políticas públicas tomadas pelo Estado frente ao aborto. Para tanto, utilizou-se o método dedutivo, a partir de análises de dados oficiais do Governo e entidades confiáveis, como a Organização Mundial da Saúde, bem como opiniões de especialistas da área da saúde, política e direito. Primeiramente, o trabalho trata do desenrolar histórico do aborto nas sociedades até o atual cenário mundial, juntamente ao complexo de mulheres que abortam e suas peculiaridades. Por conseguinte, demonstra como o ordenamento jurídico nacional versa sobre o aborto, na figura da lei e do judiciário, apontando como a criminalização do aborto não impede a prática e ainda gera penalizações totalmente desiguais. Por fim, apresenta como a criminalização do aborto é afronta à diversos direitos humanos femininos, e como o Estado deve atuar para diminuir a prática e torna-la mais segura, evitando a morte ou lesão de milhares de mulheres. O trabalho tem a finalidade de demonstrar como a descriminalização do aborto é essencial para que direitos femininos deixem de ser lesados diariamente como ocorre no cotidiano brasileiro.
Palavras-chave: aborto; mulher; direitos humanos; descriminalização; Estado.
Abstract: Voluntary abortion is expressly forbidden by the Brazilian legal system, typified as a crime by articles 124 to 126 of the Penal Code. However, the right to voluntary abortion has already been recognized by several nations around the world, with the consequent decriminalization of the practice, as in Spain (1936), Sweden (1938), Japan (1948), Russia (1955), Norway (1964), and the United States (1973). The present meta-paper intends to demonstrate how the voluntary abortion forbiddance attacks women human rights, being incompatible with the Brazilian Federal Constitution and with Universal Declaration of Human Rights, signed by Brazil in 1948. Also, intend to demonstrate which public policies should be adopted by State facing abortion. Therefore, it was applied the deductive method, based on analysis of official dataset from state and reliable entities, like the World Health Organization, as well as the opinions of experts in health, politics and law subjects. First, the work reports the historical development of abortion in societies up to the current world scenario, associated with the complex of women who abort and their peculiarities. Forward, it demonstrates how the national legal system deals with abortion, emphasizing law and in the judiciary, showing how criminalizing abortion doesn’t prevent the practice and either leads to totally unfair punishments. Finally, it describes how the criminalization of abortion outrage several human rights, and how the State must act to decrease the practice and make it safer, to prevent the death or harm of women. The meta-paper enables to demonstrate how the decriminalization of abortion is essential for women’s rights to be no longer attacked every day, as occurs in Brazilian daily life.
Keywords: abortion; woman; human rights; decriminalization; State.
Sumário: Introdução. 1. Contexto Histórico-Social do Aborto e sua Penalização. 1.1. As transformações históricas da penalização do aborto. 1.2. Panorama social das mulheres que optam por abortar. 2. O Aborto e o Direito. 2.1. O ordenamento jurídico brasileiro frente ao aborto. 2.2. Ineficiência social da proibição do aborto. 2.3. Seletividade da penalização do aborto. 3. Descriminalização do Aborto e Justiça Social. 3.1 O direito ao aborto seguro é direito humano?. 3.2. A descriminalização do aborto como política pública. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
Ao longo da história, o aborto foi criminalizado e descriminalizado. A discussão acerca da descriminalização do aborto no Brasil é assunto controverso, que reúne opiniões contra e a favor, o que resulta em discursos inflamados de ambas as partes. É essencial que se esclareça o máximo possível as questões relacionadas à legalização do aborto voluntário, para que se encontre um ponto equânime, justo para todos.
O aborto no Brasil é criminalizado pelo Código Penal, tipificado em seus artigos 124 a 126, prevendo pena de até três anos para a mulher que interrompe a gravidez voluntariamente em casos distintos dos permitidos por lei (como o terapêutico e o humanitário, quais sejam respectivamente, o aborto quando não há outra forma de salvar a vida da mulher e quando a gestante foi vítima de estupro). Todavia, é visível que mulheres continuam a abortar independentemente da previsão de penalização, o que leva a morte mulheres de condições socioeconômicas mais precárias, devido às condições insalubres que são submetidas para tanto.
Buscar-se-á ilustrar por meio deste trabalho em que contexto as mulheres que optam pelo aborto estão inseridas, a quantidade expressiva de mulheres levadas a óbito ou que sofrem lesões de diferentes gravidades pelo aborto clandestino, políticas públicas a serem designadas a partir da descriminalização do aborto, e a necessidade da descriminalização do procedimento para assegurar os direitos femininos em sua plenitude.
Objetiva-se demonstrar de que maneira a descriminalização do aborto salvaria as vidas de mulheres de baixa renda que, pela ausência de acesso a meios seguros de realizar o aborto, morrem ou sofrem consequências severas a partir da prática insegura.
Ao decorrer dos capítulos, serão apresentados comparativo de como ocorrem abortos em situação de clandestinidade e o aborto legal, a identificação das mulheres que cometem aborto tendo como paradigma os aspectos classe social, escolaridade, etnia e idade das mulheres que abortam no país, comparação do decrescente número de abortos em países onde é legalizado com os números referentes aos países onde a prática ainda é crime, e identificação de políticas públicas a serem adotadas para evitar a mortalidade feminina, assim como evitar a gravidez indesejada.
Para tanto, o presente trabalho pautou-se pelo método dedutivo, através de análise de informações obtidas por pesquisadores[1], médicos especialistas e juristas. Para a construção das posições apresentadas, utilizou-se raciocínio lógico e dedução, a partir de dados de fontes confiáveis e conceitos consolidados.
Muito embora o Poder Legislativo não tenha transformado a lei quanto ao aborto de forma significativa, o Judiciário tem debatido o assunto, trazendo resultados positivos. A decisão da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54, de 2013, que tornou inconstitucional a interpretação da lei que entendia como crime o aborto de fetos anencefálicos, é exemplo disso. Atualmente, tramita na Suprema Corte a ADPF 442, a qual foi ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e pela Anis – Instituto de Bioética, com o objetivo de afastar a aplicação do Código Penal nos casos de aborto voluntário até o 3º mês de gestação.
A despeito da opressão criminal, a estimativa apresentada pelo Ministério da Saúde é de 1 milhão de abortos realizados anualmente no país. Todos os anos são internadas 250 mil mulheres em função de aborto malsucedido. Trata-se de um problema de saúde pública de grande envergadura, e não pode ser ignorado.
O capítulo 1 delineará as transformações históricas das penalizações do aborto, e como o direito da mulher foi menosprezado ao decorrer dos anos até que países ao redor do mundo reconhecessem a descriminalização como garantia à privacidade e autonomia. Além disso, apontará números expressivos da quantia de mulheres que abortam no país, em que situação se encontram, quanto o Estado gasta com os efeitos dos procedimentos insalubres, e como a descriminalização em outros países reduziu o número de abortos, e também a mortalidade de mulheres devido a abortos inseguros.
Ao decorrer do capítulo 2, será apresentada a maneira que a lei penal brasileira trata o aborto em contraste com os direitos e garantias assegurados constitucionalmente. Outrossim, será discutida a ineficiência da criminalização, em face dos altos índices de aborto voluntário anuais, e como é irrisória a responsabilização penal das mulheres que abortam. O número ínfimo de processos criminais de mulheres que abortaram representa o descaso do Estado com o aborto voluntário e com a quantia de mulheres que sofrem com o procedimento insalubre.
Demonstrar-se-á no capítulo 3, por fim, como a proibição do aborto voluntário é lesiva a direitos humanos femininos, em especial aos reprodutivos e sexuais, à liberdade, autonomia, e vida, todos pelo viés da dignidade da pessoa humana. Igualmente, serão apresentadas políticas públicas a serem determinadas pelo Governo para assegurar a saúde feminina e evitar as gestações indesejadas, que levam ao aborto. Para isso, serão citados exemplos de outros países que legalizaram a prática e opiniões de especialistas.
A possibilidade de interromper a gestação é parte dos direitos fundamentais femininos, em decorrência dos direitos à saúde, autonomia, liberdade e vida, interpretados pelo fundamento da dignidade da pessoa humana, o que possibilita às mulheres a busca por uma existência digna. Ainda, os direitos humanos à consciência, autonomia, liberdade, e vida permitem à mulher decidir o que melhor lhe convém, e o que mais lhe traz dignidade. Ainda no âmbito dos direitos humanos, os direitos reprodutivos e sexuais da mulher conferem a elas o poder de escolher com quem, como, quando e se realmente querem se reproduzir, decisão particular de cada uma, que jamais pode ser forçada.
O Estado deve agir para que as escolhas das mulheres sejam respeitadas, quaisquer que sejam, atendendo tanto à gestante que quer prosseguir com a gestação, quanto àquela que quer interrompe-la.
CAPITULO 1
CONTEXTO HISTÓRICO-SOCIAL DO ABORTO E SUA PENALIZAÇÃO
1.1 – As transformações históricas da penalização do aborto
Se entende por aborto a interrupção precoce da gestação, que pode se dar de forma espontânea ou provocada, com a remoção ou expulsão de um embrião (se ocorre antes de 8 ou 9 semanas de gestação) ou feto (se ocorre depois de 8 ou 9 semanas de gestação), causando a morte do concebido, ou em decorrência desta[2].
O aborto espontâneo ocorre pela expulsão involuntária, casual e não intencional de um embrião ou feto, antes do quarto ao quinto mês de gravidez, causada por motivos biológicos[3]. Já o aborto provocado é causado deliberadamente, seja por questões médicas ou pela decisão particular da própria gestante, procedido pela ingestão de medicamentos ou por métodos mecânicos[4].
Reunindo opiniões divergentes por toda a comunidade nacional e internacional, o aborto pode ser analisado pelos vieses filosóficos, religiosos, médicos, e jurídicos, estes ultimos ora discutidos. Antes de se realizar um estudo acerca da criminalização do aborto no Brasil, é importante ter a compreensão de que ele está presente na sociedade desde as primeiras civilizações, sendo as concepções do que seria penalizável ou não se transformado com o tempo.
O Código de Hamurabi, datado de 1700 anos antes de Cristo, é o primeiro código de leis escrito de que se tem conhecimento e previa punição para quem provocasse aborto na gestante, com penas que variavam entre pecuniárias à morte, para tanto era levado em consideração a gravidade do caso.[5] Todavia, tal proteção à gestação não tinha como objetivo tutelar direito da mulher ou do feto, mas do marido, considerado o principal prejudicado no caso de aborto, vez que a mulher e prole seriam parte de sua propriedade.[6]
Tal pensamento vigorou durante grande período da história antiga, surgindo novas posições com Sócrates e Aristóteles, os quais pregaram o aborto como forma de contenção populacional.[7] Gadelha de Sá, em seu artigo “A Evolução Histórica do Aborto”, os menciona como pioneiros no discurso de que o aborto não poderia ser penalizado:
Foi com renomados estudiosos Antigos, como Sócrates e Aristóteles, ao pregarem a utilidade do aborto como meio de contenção do aumento populacional, que este passou a ser visto sob outra ótica. Surpreendentemente, Aristóteles sugeria que fosse praticado o aborto antes que o feto tivesse recebido sentidos e vida, sem especificar, contudo, quando se daria este momento. É elementar que não o soubesse, pois com a tecnologia disponível na época se tornava impossível precisar tal momento. Sócrates também admitia o aborto, sem outra justificativa que não a própria liberdade de opção pela interrupção da gravidez.[8]
Ambos os filósofos acreditavam que o aborto se tratava de uma questão puramente de autonomia da mulher, pensamento que fugia completamente aos costumes da época. Em meio à uma sociedade que via a mulher como patrimônio de seu esposo, Sócrates e Aristóteles a trataram como ser independente, capaz de decidir sobre seu corpo e vida.
Outra concepção importante quanto ao aborto no decorrer da história humana é a que prevalecia durante o Império Romano. Os romanos consideravam o aborto como imoral, reafirmando à ideia de que seria uma lesão ao direito do marido de ter a prole que esperava.[9] Porém, a interrupção da gravidez foi prática comum na sociedade romana, motivada principalmente pela vaidade das mulheres, pois a aparência física era de grande importância neste meio social, tanto na elite quanto nas classes mais baixas[10]. A imagem, como é perceptível, era altamente priorizada.
Justamente pela elevação nos índices de aborto, se instituiu a regra que condenava penalmente quem o realizava. No entanto, a mulher que não tivesse esposo não era punida, reafirmando que o direito do homem era o tutelado[11].
A adoção do cristianismo foi o marco revolucionário ao que se entendia como aborto não só para os romanos, mas para o resto do mundo, a partir da difusão em larga escala da religião[12]. A interrupção da gestação é considerada como uma afronta à soberania de Deus, que é quem deteria o poder sobre a vida. Maurizio Mori cita como se davam as penas, que primeiramente eram maiores no caso de morte de filho homem:
Admitia-se que o feto passava a ter alma 40 a 80 dias após a concepção, conforme fosse do sexo masculino ou feminino. A distinção foi repudiada por S. Basílio (374 d. C) (…). Somente com a Constituição Apostólica Sedes, de Pio IX, em 1869, aboliu-se a distinção entre o feto animado e o inanimado, impondo-se as mesmas penas em qualquer caso.[13]
Permaneceu esse entendimento por toda a idade média e parte da idade moderna, principalmente pelo forte poder da Igreja Católica, e consequentemente, do Direito Canônico, variando as punições encontradas em cada país por suas particularidades culturais. [14]
Somente em 1798, com a teoria de Thomas Malthus, que se voltou a discutir o aborto, afrontando o pensamento assentado pela Igreja. Discutindo formas de controle de natalidade, cruzando dados demográficos e econômicos, alegava que crescimento econômico e disponibilidade de recursos eram incompatíveis, e ainda acreditava que aumento populacional descontrolado era um fator prejudicial à evolução da sociedade (ou melhoramento futuro), e à felicidade humana.[15] Propôs, para tanto, a sujeição moral de retardar o casamento, a castidade antes do casamento, e ter somente o número de filhos que se pudesse sustentar, como cita Gadelha de Sá.
Pós essa teoria, os chamados neomalthusianos incluíram métodos contraceptivos dentro das formas de contenção do crescimento demográfico, diante da falta de alimentos que passava o mundo no século XIX e provável esgotamento dos recursos naturais no futuro.[16] Embora não mencionado o aborto, este cresceu grandemente com a aceitação das teorias malthusiana e neomalthusiana, como consequência do incentivo à limitação ao número de gestações. [17]
A primeira vez que o aborto foi tratado legalmente no Brasil foi no Código Criminal do Império de 1830.[18] Este Código não previa punição para a mulher que abortasse, sendo a pena reservada a terceiros que cometessem o aborto com ou sem o consentimento da gestante. Assim previa seus arts. 199 e 200, dentro da “Secção II – Infanticidio”:
Art. 199. Occasionar aborto por qualquer meio empregado interior, ou exteriormente com consentimento da mulher pejada.
Penas – de prisão com trabalho por um a cinco annos.
Se este crime fôr commettido sem consentimento da mulher pejada.
Penas – dobradas.
Art. 200. Fornecer com conhecimento de causa drogas, ou quaesquer meios para produzir o aborto, ainda que este se não verifique.
Penas – de prisão com trabalho por dous a seis annos.
Se este crime fôr commettido por medico, boticario, cirurgião, ou praticante de taes artes.
Penas – dobradas.[19]
Embora o contexto histórico em que se insere o Código Criminal de 1830 fosse de grande conservadorismo, a mulher tinha a escolha de interromper a gravidez, se sozinha o fizesse, sem ser punida por isso. Apenas era sancionado terceiro que tentasse realiza-lo ou que fosse cúmplice na tentativa de fazê-lo, mesmo com o consentimento da gestante[20].
Em 1890, o então Código Penal da República, passou pela primeira vez a punir a gestante que abortava voluntariamente, com pena de prisão que poderia variar entre 1 a 5 anos, com a possibilidade de diminuir a pena em 1/3 caso a interrupção da gravidez tivesse como objetivo ocultar desonra própria:
Art. 301. Provocar abôrto com annuencia e accordo da gestante:
Pena – de prissão cellular por um a cinco annos.
Paragrapho unico. Em igual pena incorrerá a gestante que conseguir abortar voluntariamente, empregado para esse fim os meios; e com reducção da terça parte, si o crime for commettido para occultar a deshonra propria.[21]
Sendo claramente uma espécie de retrocesso, o Código Penal da Republica de 1890, através do art. 301, ao invés de ampliar o direito da mulher permitindo que recebesse auxílio e tivesse uma interrupção da gravidez de forma segura, trouxe mais uma forma de supressão à liberdade feminina.
Por fim, o Código Penal de 1940, vigente atualmente, pune a prática da gestante que aborta voluntariamente, bem como aquele que realiza o procedimento, apenas com as exceções do art. 128, quais sejam “I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante; II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal”.[22]
No século XX, diante de um cenário de crescimento do movimento feminista e de políticas liberais, vários países do mundo flexibilizaram suas leis para a legalização do aborto, como na Espanha (1936), Suécia (1938), Japão (1948), Rússia (1955), Noruega (1964), entre outros[23]. Merece destaque o icônico caso Roe versus Wade, em que a Corte Suprema dos EUA decidiu que a Constituição americana garante o direito das mulheres ao aborto, afetando as leis de 46 de seus estados e gerando discussões de impacto internacional.
O Tribunal considerou que o direito de uma mulher ao aborto estava dentro do direito à privacidade (reconhecido em Griswold v. Connecticut) protegido pela Décima Quarta Emenda. A decisão concedeu à mulher o direito ao aborto durante toda a gestação e definiu diferentes níveis de interesse do Estado em regular o aborto no segundo e terceiro trimestres.[24] (Tradução nossa)
Ao considerar que o aborto é parte do direito feminino à privacidade, o Tribunal máximo da justiça americana, reconheceu que abortar ou não é assunto particular da mulher na decisão de 22 de janeiro de 1973. Permitir que a gestante interrompa sua gestação vai além de simples descriminalização de uma prática, representando o respeito à mulher como individuo livre, e que pode decidir sobre seu corpo sem represálias, e mais, com a possibilidade de o fazer de maneira segura e com acompanhamento especializado.
Já em um cenário mais atual, em fevereiro de 2016, o Alto Comissariado da Organização das Nações Unidas (ONU) para Direitos Humanos alegou que os denominados direitos reprodutivos da mulher devem ser resguardados, abarcando ainda a descriminalização do aborto. Diante de um cenário de surto de Zika em vários países, a porta-voz da ONU, Cecille Pouilly, afirmou à revista BBC Brasil que tal epidemia “representou de certa forma uma oportunidade para que uma série de questões relacionadas aos direitos reprodutivos da mulher fossem revistas”.[25]
Caso seguida a recomendação dada pela ONU no Brasil, a punição de até três anos conferida pelo Código Penal seria retirada. Cecille Pouilly afirma que países precisam, além da descriminalização, prestar serviços de atendimento pós-aborto, livre de risco de punição às mulheres[26].
Cecille Pouilly declarou à BBC Brasil que a recomendação da ONU é de que o aborto seja legalizado em cinco circunstâncias específicas, as quais elencou em seguida: “Em casos de estupro, incesto, risco à saúde física e mental da mãe e também em casos de bebês deficiências consideradas graves”[27].
Questionada acerca do motivo de a recomendação ser direcionada aos casos supracitados, a representante da Organização explicou que essas cinco situações refletem um mínimo recomendado, e que a ONU apoiaria países que decidissem ir além e permitir aborto em circunstâncias mais amplas, se adequando a padrões de aplicação internacional: “Existe uma linha tênue entre uma recomendação e interferência em políticas nacionais. Cada país deve discutir as mudanças na lei em âmbito nacional”[28].
A elucidação da porta-voz foi antecedida pelo comunicado dado em Genebra, pelo comissário de Direitos Humanos da ONU, Zeid Ra’ad Al Hussein. Segundo este, países devem assegurar os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, incluindo métodos emergenciais de contracepção, como serviços de aborto legal[29].
“Leis e políticas que restringem mulheres a estes serviços devem ser urgentemente revistas em linha com os direitos humanos para garantir o direito à saúde para todos na prática”[30], disse o comissário, atestando ainda que:
O conselho de alguns governos para mulheres atrasarem gestações ignora a realidade de que muitas mulheres e meninas simplesmente não pode exercer controle sobre a maneira, o momento e as circunstâncias em que se tornam grávidas, especialmente em locais onde a violência sexual é tão comum.[31]
Pouco mais de dois anos depois, em setembro de 2018, especialistas de Direitos Humanos das Nações Unidas reacenderam a discussão diante de sua urgência e seriedade. Relatores alertaram que, além do resultado morte, a prática do aborto inseguro causa graves consequências, apontando que 5 milhões de mulheres adquiriram alguma forma de deficiência permanente ou temporária devido a tentativas de interromper a gravidez[32].
O aborto foi tratado de diferentes formas ao decorrer da história, porém na maior parte do tempo a mulher não foi tida como protagonista da discussão que tem incidência direta sobre seu próprio corpo. A descriminalização do aborto em países desenvolvidos é a direção para um tratamento mais humano às mulheres, que devem ser consideradas como tal: humanas e capazes de escolher o que lhe serve ou não, o que irá lhe fazer bem ou não. Cabe aos países que ainda não permitem a prática reconhecerem a mulher como portadora de direitos e garantias, e passar a trabalhar para traze-las ao mundo fático.
Não obstante o debate quanto ao aborto como liberalidade da mulher tenha tido grande repercussão na comunidade internacional, sendo atualmente o total de 63 países onde o aborto é considerado uma prática legalizada[33], o Brasil segue ainda o antigo modelo conservador e ultrapassado de penalização das mulheres que abortam, que se mostra extremamente ineficiente e é ainda uma ameaça à saúde das mulheres, que se veem sem opção e acabam por se submeter à procedimentos insalubres e perigosos.
1.2 – Panorama social das mulheres que optam por abortar
É imprescindível, para a percepção da seletividade da penalização e de como esta causa um status de injustiça social, a análise de quem são as pessoas que abortam no país e quem mais sofrem com a falta de acesso ao aborto seguro.
O país atualmente se encontra numa realidade de cerca de 1 milhão de abortos induzidos de acordo com estimativa do Ministério da Saúde. Os procedimentos clandestinos, inseguros, causam a hospitalização de mais de 250 mil mulheres por ano, aproximadamente 15 mil complicações e 5 mil internações de muita gravidade. O aborto em condições insalubres levou à óbito 203 mulheres em 2016, ou seja, uma morte a cada 2 dias. Em 10 anos, foram dois mil óbitos[34].
Além dos procedimentos nocivos na ilegalidade, devido à rigidez no ordenamento jurídico quanto às possibilidades de abortar, somados à negativa de médicos à realização do aborto e burocracia, muitas gestantes perdem até mesmo o acesso ao aborto dentro do permitido legalmente. Nesse sentido, temos o depoimento da Dra. Maria de Fátima Marinho, diretora do Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde da pasta em audiência pública na Câmara dos Deputados em dezembro de 2017, ocasião em que apresentou que, entre 2011 e 2016, 4.262 adolescentes de 10 a 19 anos tiveram uma gestação resultante de estupro com o nascimento do bebê. Portanto, mais de 700 jovens brasileiras tem tolhido anualmente um direito assegurado por lei.[35]
Ainda, dentro desse número de adolescentes, de acordo com a médica, 1.875 eram meninas de 10 a 14 anos violentadas sistematicamente, chegando a aproximadamente 73% do total. As outras 2.387 jovens tinham entre 15 a 19 anos. Merece destaque que o autor é um familiar da violência em 68,5% das ocorrências.[36]
No estudo publicado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), “Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde”, por Daniel Cerqueira e Danilo Santa Cruz Coelho, 7,1% dos estupros resultaram em gravidez, segundo dados do SUS de 2011. Menciona ainda que entre as vítimas adultas que ficaram grávidas como consequência do estupro, 19,3% realizaram aborto previsto em lei, porcentagem que se mostra ainda menor quando se trata de gestante adolescente ou criança, sendo consecutivamente 5,0% e 5,6%[37].
Quanto ao aborto ilegal, o Governo Federal não pode apresentar dados concretos pois os procedimentos ocorrem na clandestinidade. De acordo com reportagem publicada pela jornalista Marcella Fernandes, tem-se que em 2017 houve o registro de 177.464 curetagens pós-abortamento, forma de raspagem da parte interna do útero pela não realização completa ou mal procedida de aborto[38]. Outro procedimento nesses casos é o esvaziamento do útero por aspiração manual intrauterina (sigla AMIU, é uma espécie de aspiração dos tecidos remanescentes de um aborto incompleto), sendo que foram registradas 13.046. Juntas, foram 190.510 internações[39]. Tais números incluem abortos espontâneos e ilegais, porem se estima que os últimos somam uma proporção de 2/3 do total[40]. A médica Tânia Lago, em entrevista à jornalista pela revista HuffPost Brasil, alegou que:
A gente não pode afirmar que é tudo aborto inseguro porque um aborto espontâneo também pode ficar retido, ser incompleto, e precisar ou de aspiração ou de curetagem. Só que a gente sabe que no máximo 1/3 desse volume seria de abortos espontâneos. A grande maioria é de aborto provocado. Isso é estimativa médica. Na maior parte das vezes o espontâneo é do começo ao fim. A expulsão total do feto é feita espontaneamente. [41]
Quando o aborto é espontâneo, na maioria das vezes não se é necessário realizar qualquer procedimento de aspiração ou curetagem, por que a expulsão do feto se dá por completo naturalmente. Tal fenômeno não ocorre com o aborto provocado, pois corriqueiramente requer procedimentos extras de curetagem ou aspiração.
Em pesquisa à plataforma do Governo Federal TabNet – Datasus, somente no mês de junho de 2019 foram realizadas 11.558 internações por curetagens pós-abortamento, sendo 11.263 de urgência. Neste mesmo mês, houveram 994 internações por esvaziamento do útero por AMIU, sendo 930 em caráter de urgência. As regiões Sudeste e Nordeste ocuparam os primeiros lugares quanto ao número das internações: das 12.552, foram 4.552 no Sudeste, e 4.413 no Nordeste, contra 1.662 no Sul, 1.027 no Norte, e 898 no Centro-Oeste. Neste mês foram gastos R$ 2.702.925,33 com os procedimentos, contrastando com cerca de R$ 360 mil anuais gastos com aborto legal, apontados pelo Ministério da Saúde. [42]
Portanto, é perceptível que a proibição da prática do aborto também gera consequências negativas ao Estado, que tem um alto custo com os procedimentos realizados em consequência da realização de abortos clandestinos.
Em estudo coordenado pela antropóloga Débora Diniz, pesquisadora da Anis– Instituto de Bioética (nome antigo “Anis – Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero”), a denominada Pesquisa Nacional de Aborto (PNA) 2016 apontou que aproximadamente 1 a cada 5 mulheres brasileiras na faixa etária de 40 anos já interrompeu voluntariamente pelo menos uma gestação[43]:
Os resultados indicam que o aborto é um fenômeno frequente e persistente entre as mulheres de todas as classes sociais, grupos raciais, níveis educacionais e religiões: em 2016, quase 1 em cada 5 mulheres, aos 40 anos já realizou, pelo menos, um aborto. Em 2015, foram, aproximadamente, 416 mil mulheres. Há, no entanto, heterogeneidade dentro dos grupos sociais, com maior frequência do aborto entre mulheres de menor escolaridade, pretas, pardas e indígenas, vivendo nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Como já mostrado pela PNA 2010, metade das mulheres utilizou medicamentos para abortar, e quase a metade das mulheres precisou ficar internada para finalizar o aborto.[44]
Conforme a pesquisa, a maior parte dos abortos é realizado durando o período mais intenso da atividade produtiva das mulheres. Porém, o último aborto é mais frequente entre as mulheres mais jovens, sendo que 29% dos abortos se deu entres as idades de 12 a 19 anos, 28% dos 20 aos 24 anos, e apenas 13% a partir de 25 anos[45].
Ainda, de acordo com o resultado das pesquisas, os fatores sociais que determinam quais mulheres são as que mais abortam, se mantiveram praticamente estáveis, pouco se alterando ao longo dos anos de pesquisas (anuais, de 2010 a 2016)[46]. As mulheres à margem da sociedade, ou seja, com menor poder aquisitivo, acesso à saúde e educação de qualidade, são as que mais interromperam gestações. Assim aponta o estudo:
Dito isto, as taxas de realização não são uniformes segundo grupos. São, por exemplo, maiores entre mulheres nas regiões Norte/Centro-Oeste e Nordeste (15% e 18%) do que nas regiões Sudeste e Sul (11% e 6%), em capitais (16%) do que em áreas não metropolitanas (11%), com escolaridade até quarta série/quinto ano (22%) do que com nível superior frequentado (11%), renda familiar total mais baixa (até 1 salário-mínimo – S.M., 16%) do que mais alta (mais de 5 S.M., 8%), amarelas, pretas, pardas e indígenas (de 13% a 25%) do que entre brancas (9%), hoje separadas ou viúvas (23%) do que entre casadas ou em união estável (14%) e entre as que hoje têm filhos (15%) do que entre as que nunca tiveram (8%). Ressalvadas algumas variações, esse é um padrão semelhante ao observado em 2010.[47]
A pesquisa vislumbrou ainda que 48% dos abortos foi feito com medicamentos, e que dois terços (67%) das mulheres que confirmaram ter abortado em 2015 foram internadas para finalizar o aborto. [48] Os números mencionados anteriormente quanto aos procedimentos pós-abortamento realizados pelo SUS são demonstrativo da gravidade da falta de acesso à meios próprios e seguros de se abortar, dado que a maior parte das mulheres são internadas em caráter de urgência.
As mulheres que mais abortam formam um grupo extremamente fragilizado. Uma vez que não têm condições de interromper a gravidez fora do país em local onde seja permitido, ou em clínica que apresente condições minimamente apropriadas, rendem-se à métodos caseiros nocivos, porém mais baratos de abortar, que na maior parte das vezes não são suficientemente eficazes.
CAPITULO 2
O ABORTO E O DIREITO
2.1 – O ordenamento jurídico brasileiro frente ao aborto
O aborto é entendido pelo Código Penal brasileiro como crime contra a vida, e o ato de provocar aborto é punido com penas de 1 a 10 anos de reclusão, penalizando tanto a gestante, quanto aquele que a auxilia.
Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento
Art. 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lhe provoque:
Pena – detenção, de um a três anos.
Aborto provocado por terceiro
Art. 125. Provocar aborto, sem consentimento da gestante:
Pena – reclusão, de três a dez anos.
Art. 126. Provocar aborto com o consentimento da gestante:
Pena – reclusão, de um a quatro anos.
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou debil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.
Forma qualificada
Art. 127. As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevem a morte. [49]
Muito embora a legislação penal brasileira proíba o aborto voluntário nos artigos 124 a 127 do Código Penal, com apenas um número restrito de exceções, o ordenamento jurídico brasileiro vem se maleabilizando quanto ao tema e caminhando para uma futura descriminalização.
Art. 128 – Não se pune o aborto praticado por médico:
Aborto necessário
I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro
II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.[50]
O art. 128 do Código Penal apresenta as duas únicas exceções previstas no dispositivo legal, sendo estas o iminente risco de vida da grávida que não possibilite outra forma de salvá-la, e se a gestação é fruto de um estupro. Todavia, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamente – ADPF 54 criou uma terceira exceção, permitindo o aborto de fetos anencefálicos até o terceiro mês de gestação, agregando mais uma hipótese em que não há punição para a mulher que interrompe a gravidez.
O Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal, publicado em 30/04/2013, teve como Relator o Ministro Marco Aurélio, ficou quase 10 anos em tramitação no Egrégio Tribunal. Houve grande mobilização por parte de religiosos em campanha contra a criminalização. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, figurando como amicus curie no processo, em sede de incidente processual requereu que fosse reconsiderada a decisão, o que foi negado pelo Tribunal.[51]
A ementa da decisão final ainda menciona da laicidade da república brasileira, ressaltando a necessidade de neutralidade quanto à religião.
ESTADO – LAICIDADE. O Brasil é uma república laica, surgindo absolutamente neutro quanto às religiões. Considerações. FETO ANENCÉFALO – INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ – MULHER – LIBERDADE SEXUAL E REPRODUTIVA – SAÚDE –DIGNIDADE – AUTODETERMINAÇÃO – DIREITOS FUNDAMENTAIS – CRIME – INEXISTÊNCIA. Mostra-se inconstitucional interpretação de a interrupção da gravidez de feto anencéfalo ser conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal.[52]
Como deixa clara a jurisprudência, não se deve permitir que a religião interfira na legislação, a qual deve se manter sempre desvinculada de quaisquer preceitos religiosos, mantendo a maior imparcialidade possível.
Com o julgamento da referida ação, cresceu-se o debate quanto à uma possível descriminalização da conduta de interromper a gravidez no país. Atualmente está em tramitação a ADPF 442, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e Pela Anis – Instituto de Bioética, cujo pedido levado ao STF é o de que seja afastada a aplicação do Código Penal no caso de interrupção voluntária da gravidez até a 12ª semana.[53]
A tese central defendida na ADPF é a de que as razões jurídicas que moveram a criminalização do aborto pelo Código Penal de 1940 não mais se sustentam. “Em democracias constitucionais laicas, isto é, naquelas em que o ordenamento jurídico neutro garante a liberdade de consciência e crença no marco do pluralismo razoável e nas quais não se professa nenhuma doutrina religiosa como oficial, como é o caso do Brasil, enfrentar a constitucionalidade do aborto significa fazer um questionamento legítimo sobre o justo”, argumenta. Para o partido, a longa permanência da criminalização do aborto “é um caso de uso do poder coercitivo do Estado para impedir o pluralismo razoável”, pois torna a gravidez um dever, sendo que, em caso de descriminalização, “nenhuma mulher será obrigada a realizá-lo contra sua vontade”.[54]
Compartilhando dos mesmos fundamentos jurídicos da ADPF 54, a ADPF 442 tem como principal tese a de que em um país laico, caso do Brasil, devem ser respeitadas a liberdade de crença e de consciência, e por esse motivo as razões jurídicas que fundamentam a criminalização prevista pelo Código Penal estão ultrapassadas. Obrigar as mulheres a manter a gestação, desconsiderando sua autonomia e consciência, vai contra os conceitos de liberdade que permeiam o ordenamento jurídico brasileiro.
A Constituição Federal brasileira (CF), em seu art. 5º, caput e inciso VI, trata da igualdade e liberdade de consciência e crença ora tratadas.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias[55]
Todas as mulheres são detentoras dos direitos fundamentais, em destaque o da vida, liberdade e igualdade, além da inviolável autonomia de consciência e crença. Ao tolhê-las de decidir sobre prosseguir ou não com a gestação, incide-se diretamente sobre estes direitos. Reconhecer o feto como vida aos meses iniciais, antes de ter seu sistema nervoso desenvolvido, tem fundamento religioso e/ou filosófico, baseando-se no preceito de que a vida se inicia a partir da concepção.
Mais adiante, o inciso VIII do mesmo art. 5º, CF, prevê que “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política (…)”[56], o que significa que as mulheres não podem perder o direito de decidir sobre suas vidas da forma que pensarem ser melhor, tampouco sobre seus próprios corpos, e seu futuro propriamente.
Dois dos mais importantes preceitos do ordenamento jurídico do país são o de dignidade e autonomia. A autonomia exprime liberdade em seu sentido mais puro. Nas palavras do doutrinador Luís Roberto Barroso, “expressa a vontade livre, a capacidade do indivíduo de se autodeterminar, em conformidade com a representação de certas leis”[57]. A autonomia se trata justamente do comando que o sujeito tem sobre a própria vida, de escolher o que lhe melhor aprouver, conforme sua própria prudência e discernimento.
O indivíduo é compreendido como um ser moral, no qual o dever deve suplantar os instintos e os interesses. A moralidade, a conduta ética consiste em não se afastar do imperativo categórico, isto é, não praticar ações senão de acordo com uma máxima que possa desejar seja uma lei universal.[58]
O ser humano, a partir da sua própria consciência, é quem define quais são suas normas pessoais. Se entende por autonomia a capacidade do ser de estabelecer normas internas, e não só obedecer às leis de imposição externa. Reside aí a ética, em considerar a moralidade particular de cada ser humano. Consequentemente, é imprescindível respeitar a razão de cada mulher, e compreender que ao decidir interromper uma gestação, a mesma faz um juízo próprio e decide se aquilo realmente é o certo para ela, de acordo com seus próprios princípios.
Quanto à dignidade da pessoa humana, esta supera o status de princípio, sendo um fundamento da república, condição conferida pelo art. 1º, III, da Constituição Federal. Seguindo o pensamento Kantiano, a dignidade tem por fundamento a autonomia. Imannuel Kant, em seu livro Fundamentação da metafísica dos costumes, exemplifica a dignidade da seguinte forma: “no reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode-se por em vez dela qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e portanto não permite equivalente, então ela tem dignidade”[59]. Ser digno, portanto, consiste em ser reconhecido em sua pessoalidade, um ser humano de valor que supera qualquer preço.
A dignidade, segundo o Luís Roberto Barroso, tem três elementos essenciais, quais sejam o valor intrínseco, autonomia e valor social da pessoa humana[60]. A esta discussão, os dois primeiros merecem destaque. O valor intrínseco da pessoa humana, trata justamente da dignidade relacionada à natureza do ser, sendo comum e inerente a todos os seres humanos. O valor que se dá a humanidade de cada ser, o qual não têm preço. Apoiada nesse elemento se dá a máxima “toda pessoa, todo ser racional existe como um fim em si mesmo, e não como meio para uso arbitrário pela vontade alheia”[61].
A partir do pensamento de que cada ser humano é um fim em si mesmo, e não um meio, como seriam as coisas, compreende-se que a mulher deve ser respeitada como fim em si mesma. A obrigação da grávida a concluir a gestação a coloca em posição de instrumento, a transformando em meio, e não mais um fim. A mulher acaba por ser desconsiderada como ser individual e passa a ser um meio em que o novo ser irá se desenvolver, o que afronta o princípio da dignidade humana pela ausência de um de seus elementos essenciais.
Dentro do valor intrínseco da pessoa humana temos os conceitos de igualdade, uma vez que todos os seres humanos têm o mesmo valor, bem como de direito à integridade física e moral ou psíquica, pela inviolabilidade do ser. [62] O direito à integridade também é lesado com a criminalização do aborto, posto que a mulher, além de ter que passar por todas as transformações corporais que uma gestação ocasiona contra a sua vontade, ela tem sua moral desconsiderada e seu psicológico afetado. Seu juízo pessoal é desmoralizado, pois a mesma é impedida de deliberar por sua própria vida, como se incapaz fosse. Ainda mais, sua psique é abalada por ver se desenrolar todas as razões pelas quais decidiria não continuar com a gravidez, junto a todo o constrangimento de prosseguir com algo que não deseja.
Em sequência, tem-se a autonomia da vontade como segundo elemento essencial da dignidade da pessoa humana. Esse elemento exerce um papel importantíssimo no debate sobre a descriminalização do aborto. A autonomia nada mais é que a liberdade existencial, a capacidade de autodeterminação do indivíduo[63]. É poder escolher quem é, o que quer ser, e de que forma viverá, desenvolvendo livremente sua personalidade.
Para que haja conduta ética é preciso que exista o agente consciente, isto é, aquele que conhece a diferença entre bem e mal, certo e errado, permitido e proibido, virtude e vicio. A consciência moral não só conhece tais diferenças, mas também reconhece-se como capaz de julgar o valor dos atos e das condutas e de agir em conformidade com os valores morais, sendo por isso responsável por suas ações e seus sentimentos e pelas conseqüências do que faz e sente.[64]
O ser dotado de consciência, dentro das condições que o permitem, deve ser considerado como regente da própria vida, sendo limitado apenas pelo direito de seus semelhantes. A autonomia privada é condição para a liberdade, uma vez que essa não existe quando há opressão. Ao não disponibilizar à mulher a opção de decidir se quer ou não avançar com a gravidez, a sua capacidade de autodeterminação é lesada. Impedir alguém de seguir o que meditou em seu âmago é uma forma grave de desrespeito à individualidade de cada ser, o que reflete em sua dignidade.
Já em âmbito infraconstitucional, o art. 2º do Código Civil Brasileiro prevê que: “A personalidade Civil começa no nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”[65].
Neste seguimento, existem opiniões de doutrinadores como a de Sílvio Venosa, cujo é favorável à vertente natalista acerca do início da personalidade civil da pessoa natural. Em sua doutrina conceitua o direito da personalidade ou personalíssimos, diretamente ligados ao nascimento.
Os direitos denominados personalíssimos incidem sobre bens imateriais ou incorpóreos. As Escolas do Direito Natural proclamam a existência desses direitos, por serem inerentes à personalidade. São, fundamentalmente, os direitos à própria vida, à liberdade, à manifestação do pensamento. A Constituição brasileira enumera longa série desses direitos e garantias individuais (art. 5º). São direitos privados fundamentais, que devem ser respeitados como conteúdo mínimo para permitir a existência e a convivência dos seres humanos [66]
Os direitos personalíssimos são extrapatrimoniais, existindo dentro da esfera moral, empírica, além de serem condicionados à vida daqueles que o detêm. A personalidade é justamente o que assegura a defesa dos direitos do ser, incluindo o direito à vida. É preciso ponderar que a mulher tem seus direitos personalíssimos garantidos, dado ao fato de que esses se iniciam a partir do nascimento com vida, enquanto o feto tem uma mera expectativa de direito, a ser efetivamente adquiridos ao nascer. Não se pode fazer prevalecer uma expectativa de direito sobre direitos já adquiridos.
Há uma parcela da doutrina contrária a esse pensamento, os adeptos da teoria concepcionista. A professora Maria Helena Diniz se alinha a este seguimento. Segundo a doutrinadora, o embrião ou nascituro, tem resguardados seus direitos desde a concepção, pois a partir dela passa a existir vida orgânica e biológica própria, que independe da de sua mãe, possuindo, portanto, personalidade jurídica.[67] Tal teoria não prospera no ordenamento jurídico pátrio, visto que o próprio Código Civil condiciona a obtenção da personalidade ao nascimento com vida.
É primordial considerar que a gestante, antes de abrigar o feto, é um ser autônomo, detentora de direitos e personalidade jurídica, merecendo ser tratada como tal. Com a criminalização do aborto, a mulher é reduzida apenas à ambiente natural onde o feto irá se desenvolver, pensamento que vai contra todos os princípios éticos e morais que permeiam a constituição e o ordenamento jurídico brasileiro como um todo, agindo como uma trava à garantia da dignidade, liberdade, autonomia, e igualdade, alicerces pelos quais devem se dar todas as exegeses legais.
2.2 – A ineficiência social da proibição do aborto
A proibição do aborto no Brasil tem por objetivo lógico evitar que o aborto ocorra. O bem jurídico tutelado neste caso é o da vida humana em desenvolvimento[68]. Todavia, é perceptível que o objetivo da norma e a realidade se encontram em disparidade. A repressão da conduta não somente é ineficiente em coibir a prática do aborto, como acarreta danos colaterais gravíssimos, desde um alto custo ao Estado devido a cuidados prestados às mulheres pós aborto mal procedido e o encarceramento daquelas presas por abortar, à morte das mulheres que optam por interromper a gravidez de forma clandestina.
Uma demonstração clara de como é falha a ideia de que proibir o aborto coíbe sua prática é o fato de que a média global de abortos caiu no ano de 2017 em consequência da queda expressiva em países desenvolvidos onde a prática é permitida[69]. Em comparação com os países em desenvolvimento onde a interrupção é proibida, os números são ainda mais significativos, vez que são maiores nesses casos, evidenciando de maneira cabal que a criminalização não impede a realização do aborto.
A média dos países desenvolvidos foi de 46 para 27 abortos a cada mil mulheres em idade reprodutiva, enquanto nos países em desenvolvimento a taxa apenas teve apenas uma leve diminuição, passando de 39 para 36 a cada mil mulheres em idade reprodutiva. A diferença se torna ainda mais gritante quando analisamos o continente americano, sendo a região da América Latina e Caribe detentora do índice anual mais alto, de 44 abortos a cada mil mulheres em idade reprodutiva, diante do índice norte americano de apenas 17[70].
O aborto também tem se tornado mais seguro nos países onde é legal, visto que enseja o estudo e implantação de técnicas que asseguram cada vez mais efetivamente a vida e saúde da mulher. Existem três parâmetros para analisar o índice de segurança do aborto realizado: aborto seguro, menos seguro e o nada seguro. Entre os anos de 2010 e 2014, 55% dos 56 milhões de procedimentos realizados a cada ano foram considerados seguros[71]. Esta porcentagem somente foi atingida por causa dos avanços nas diretrizes clínicas e da ampliação da legalidade em vários países.
Ao aproximar os dados à realidade brasileira, há um contraste bastante negativo. Na região da América Latina e Caribe, dentro do mesmo período, apenas 24% dos abortos foram considerados seguros, 59% foram menos seguros e 17% nada seguros[72]. O continente supera a média global de procedimentos perigosos, sendo os menos seguros correspondentes a 31% do total, e os nada seguros a 14%[73].
A criminalização abre espaço para que as mulheres que buscam os meios ilícitos pela ausência de opção se submetam a procedimentos em condições longe do apropriado. A título de exemplo, tem-se o caso de Lúcia, publicado pela revista Exame. Moradora de uma comunidade no litoral paulista, Lúcia comprou duas pílulas abortivas de um vendedor ilegal por R$500,00, e após seu uso, teve que ser socorrida devido à uma forte hemorragia, ficando internada por mais de 24 horas[74].
Em realidade antagônica à de Lúcia, Sonia, pesquisadora de uma grande universidade de São Paulo, recorreu a uma clínica ilegal para realizar o procedimento de forma cirúrgica, cirurgia a qual lhe custou o valor de uma remuneração mensal sua[75]. Dá-se que, ainda que o aborto seja proibido, existem clínicas que procedem o aborto por valores que variam de R$5 mil a R$ 10 mil[76], o que é totalmente inacessível para a parcela mais pobre da população. Atualmente, metade das mulheres aborta fazendo uso de medicamentos.
Metade das mulheres aborta usando medicamentos. O aborto foi realizado com medicamentos em 48% (115) dos casos válidos. A proporção é a mesma observada em 2010 (48%). Se considerados os 4% (10) de não-resposta ao quesito, a proporção seria ainda próxima, 46%.[77]
De acordo com a Pesquisa Nacional do Aborto 2016, o método mais comum para a interrupção da gravidez é o uso de medicamentos, e o mais popular no Brasil é o misoprostol (de nome comercial Citotec)[78], comercializado no mercado clandestino do país. Pela ausência de fiscalização, um risco que se corre é o uso de medicamento falsificado ou de adquirir uma outra droga no lugar.
Em setembro de 2018, especialistas de Direitos Humanos das Nações Unidas reacenderam a discussão diante de sua urgência e seriedade. Relatores alertaram que, além do resultado morte, a prática do aborto inseguro causa graves consequências, apontando que 5 milhões de mulheres adquiriram alguma forma de deficiência permanente ou temporária devido a tentativas de interromper a gravidez[79].
Em comunicado oficial para o Dia Internacional do Aborto Seguro, criado pela ONU para estimular a proteção das mulheres por meio da prática segura deste, especialistas aduziram que há uma estimativa de 225 milhões de mulheres ao redor do mundo impossibilitadas de acessar métodos contraceptivos modernos, acarretando gestações não planejadas de forma constante[80]. Quanto às jovens, problemas de saúde associados à gravidez e nascimento da criança figuram dentre as causas mais comuns de morte nos países em desenvolvimento, sendo que as menores de 15 anos correm riscos cinco vezes mais altos[81].
O médico Dráuzio Varella abordou a perspectiva social da interrupção de gestações: “Desde que a pessoa tenha dinheiro para pagar, o aborto é permitido no Brasil. Se a mulher for pobre, porém, precisa provar que foi estuprada ou estar à beira da morte para ter acesso a ele” afirma o médico, completando “Como consequência, milhões de adolescentes e mães de família que engravidaram sem querer recorrem ao abortamento clandestino, anualmente”[82].
Em artigo publicado pelo médico e escritor, o mesmo alega:
Não há princípios morais ou filosóficos que justifiquem o sofrimento e morte de tantas meninas e mães de famílias de baixa renda no Brasil. É fácil proibir o abortamento, enquanto esperamos o consenso de todos os brasileiros a respeito do instante em que a alma se instala num agrupamento de células embrionárias, quando quem está morrendo são as filhas dos outros. Os legisladores precisam abandonar a imobilidade e encarar o aborto como um problema grave de saúde pública, que exige solução urgente.[83]
De fato, a criminalização do aborto apenas impede que mulheres de baixa renda busquem a saúde pública para realizar o procedimento, tendo em vista que as clinicas particulares que interrompem a gravidez por método cirúrgico exigem o pagamento de 5 a 10 mil reais, valor completamente fora da realidade para a maioria das mulheres do país.
É perceptível que a classe marginalizada da sociedade, que não possui acesso a informação, educação, e principalmente, saúde de qualidade, é a mais afetada pela criminalização da prática. Diante da negativa de acesso à profissionais da saúde pública, as mulheres de baixa renda buscam os meios mais baratos para interromper a gravidez, se submetendo a procedimentos de alta insalubridade, o oposto das clinicas higiênicas e eficazes que atendem as mulheres com mais alto poder aquisitivo.
A existência de clínicas clandestinas, sejam essas mais ou menos seguras, e de oferta de medicamentos com propriedades abortivas é resultado da demanda de mulheres que estão decididas a interromper a gestação, independente da proibição legal. Uma mulher ao decidir abortar, faz uma série de reflexões que só a ela fazem sentido, pois se trata de uma decisão extremamente particular. A intervenção estatal nesta seara pessoal, além de ser altamente lesiva à direitos fundamentais como à autonomia e liberdade, diretamente ligados à dignidade humana, se mostra muitíssimo ineficiente.
Ao invés de buscar diminuir as taxas de aborto no país de maneira coercitiva e de uma forma comprovadamente infrutífera, o estado deve descriminalizar a prática, e oferecer atendimento psicológico, promover a educação sexual e a difusão de métodos contraceptivos. Uma norma que não atinge seus objetivos não tem motivos para prosperar. Dessa forma, a criminalização do aborto é apenas um desperdício de forças estatais na tentativa de coibir uma prática que continua sendo feita apesar da repressão.
2.3 – Seletividade da penalização do aborto
Não obstante a alta quantia de abortos realizados em todo o Brasil, o número de mulheres processadas por esse crime é bastante reduzido. Conforme pesquisa realizada nos Tribunais de Justiça pelo Portal Catarinas, em 18 estados do país foram registrados 331 processos por autoaborto em 2017[84].
A Defensoria Pública no estado do Rio de Janeiro, entre os anos de 2005 e 2017, reuniu dados de 42 mulheres que responderam criminalmente por terem abortado, sozinhas ou com auxílio de terceiros[85]. Dessas mulheres, 19 eram negras, 16 brancas e 7 não tiveram a cor da pele identificada. A maior parte delas já possuía filhos, sendo 19 já mães, apenas 7 não, e não obtiveram informação de 16. Quanto à escolaridade, 8 tinham até o ensino médio completo, 6 apenas o ensino fundamental, 2 tinham o ensino superior, e 1 analfabeta, sem informação de 25 delas. A maior parte abortou entre os 20 e 24 anos. O método mais utilizado foi o remédio Citotec, e a maior parte entre as mulheres que iniciou o aborto sozinhas finalizou o aborto no hospital, sendo 6 entre as 20 mulheres[86].
O número pequeno de mulheres processadas por interromperem a gestação voluntariamente é resultado da seletividade penal. Carolina Haber, responsável pela pesquisa na Defensoria Pública, aduz que “quem chega na ponta do sistema criminal é o ‘funil do funil’” e que “é uma lei que criminaliza somente as mulheres mais vulneráveis, sem recursos ou a quem recorrer. É uma dor solitária”.[87] Conforme sua pesquisa, 55% das mulheres que foram rés pelo autoaborto são negras, 70% são mães e 75% das que fizeram aborto sozinhas, sem recorrer à clínicas, estavam com mais de 12 semanas de gestação, quando não se pode mais fazer o procedimento de forma segura[88].
Em entrevista realizada à revista O GLOBO, a coordenadora do Núcleo Contra a Desigualdade Racial (Nucora) da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, Lívia Casseres, afirmou que é mais comum a esfera criminal atingir a parcela mais vulnerável das mulheres que abortam[89].
Pessoas de um extrato econômico privilegiado ou com privilégio racial que querem fazer o procedimento têm atendimento médico em clínicas clandestinas porque podem pagar. É mais raro que a esfera criminal alcance essas pessoas. Quando isso acontece, se dá por uma investigação, e não da forma como acontece com a mulher negra periférica que será atingida no meio de um atendimento por agentes que são responsáveis pela sua proteção (a maioria das denúncias é feita por agentes de saúde). Acontece em um momento de “flagrante”, em que a mulher está fragilizada. O sistema de saúde em conjunto com o de Justiça acaba provocando a violação de direitos dessas pessoas, violações que elas já vão enfrentar na sociedade brasileira como um todo[90].
As mulheres com melhores condições financeiras têm acesso a clínicas que, além de oferecerem um procedimento mais seguro, asseguram o sigilo de seu nome, até mesmo pelo fato de que os responsáveis pela clínica também seriam penalizados pelos procedimentos realizados. No caso das mulheres mais pobres, os próprios agentes de saúde que as atendem após o abortamento, em situação de emergência hospitalar, informam à polícia.
A defensora Lívia Casseres aponta que o motivo de existirem tão poucos processos por abortamento frente à quantidade de abortos realizado no país é que não existe esforço para que todas as pessoas sejam investigadas, acabando por serem presas justamente as mulheres que procuram um hospital público para não morrerem dentro de casa por complicações do aborto malsucedido, e complementa “o sistema é feito para criminalizar pessoas mais vulneráveis e economicamente desfavorecidas”[91].
A pesquisa realizada no estado do Rio de Janeiro por Carolina Haber apontou que pouco mais de 30% das mulheres processadas por abortarem foram delatadas pelos profissionais que as atenderam, ferindo o sigilo entre agente de saúde e paciente[92]. Em São Paulo, conforme dados coletados por Ana Rita Prata, coordenadora do Núcleo Especializado de Promoção dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, a maior parte também foi entregue à polícia pelos profissionais que às atenderam[93].
Em entrevista concedida à Natacha Cortez para o portal UOL, Ana Rita Prata afirmou que “esses profissionais depõem contra a mulher, outras vezes entregam documentos sigilosos, como o prontuário médico e restos de comprimido. Esse tipo de indício não deveria ser considerado no processo”, e acrescentou “é uma violência institucional pesadíssima. Existe o pavor da prisão em flagrante, quando ela acontece, mas existe, ainda, todo o medo desse tipo de ação penal. Depois, há o antecedente criminal”[94]
A pesquisa realizada pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro, que resultou na obra “Entre a morte e a prisão – Quem são as mulheres criminalizadas pela prática do aborto no Rio de Janeiro”, separou as pessoas processadas em 4 grupos: o primeiro formado pelas mulheres que foram processadas por provocarem aborto em si (art. 124 do Código Penal); o segundo formado pelas pessoas que obrigaram a mulher com quem mantiveram relacionamento a praticar o aborto; o terceiro inclui as mulheres que foram processadas por aborto em consequência à investigação de clínicas clandestinas; e o quarto grupo formado por processos desmembrados de outros analisados, por haver mais de um réu no processo principal.[95]
Os grupos 1 e 3 se mostram mais interessantes para serem analisados quanto a esta discussão. A pesquisa constatou que no grupo 1, conjunto de 20 mulheres, as quais foram processadas por provocarem aborto em si mesmas, 12 delas eram negras, ou seja, 60% delas eram pretas ou pardas.[96] Além disso, as suas ocupações em sua maioria se tratam de profissões que indicam situação de pobreza (salgadeira, faxineira, auxiliar de cozinha, manicure, garota de programa), residem em regiões periféricas de suas cidades, 65% delas já eram mães, e 75% delas foram assistidas pela Defensoria pública nos processos criminais[97].
Já o grupo 3, que analisou as mulheres processadas em decorrência de investigação policial de clínicas clandestinas de aborto, é formado por um conjunto de 22 mulheres que estavam nas clínicas realizando ou acabado de realizar o procedimento no momento da chegada da polícia. [98]Neste caso, a situação é diferente: 53% das mulheres eram brancas, 75% delas possuíam o 2º grau de escolaridade (contra 22% do primeiro grupo), as regiões de moradia e profissões indicaram melhores condições financeiras em comparação ao primeiro grupo, não vivenciando uma situação de pobreza tão drástica quanto às mulheres do grupo 1, e apenas 40% foi assistida pela defensoria pública[99]
É perceptível a desproporção entre mulheres que têm acesso à segurança das onerosas clínicas de aborto (o custo de aborto nas clínicas processadas, de acordo com a pesquisa da Defensoria no Rio de Janeiro, variava entre R$600,00 e R$4.500,00)[100], que além de métodos mais seguros, protegem a identidade das clientes, e as mulheres que optam por métodos mais caseiros, os quais podem realizar em casa, porém sem segurança e ainda correndo o risco de precisar de atendimento público e serem delatadas à polícia por aqueles que estão ali para socorre-las.
Os dados compilados pela Defensoria Pública do RJ ainda são uma pequena amostra de como é injusta a penalização das mulheres que abortam. De fato, ainda que mínimo o número de processos em que contam como rés mulheres que abortaram, é possível tirar percepções bastante conclusivas.
As mulheres processadas por abortarem sozinhas, são as mulheres que sobreviveram ao aborto insalubre e perigoso, na maioria das vezes delatadas por quem as socorreu em momento de urgência. São pessoas em total abandono por parte do estado, representando a falha do país em assegurar direitos constitucionalmente assegurados a todos.
Quanto às mulheres que abortam em clínicas, são mulheres com melhores condições financeiras, algumas vão até mesmo ao exterior para realizar o procedimento, e que tem a segurança de que irão passar por um procedimento apropriado, com cuidados após o aborto, sem risco de serem entregues à polícia.
As normas penais que criminalizam o aborto já não fazem mais sentido no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que não se vislumbra nenhum resultado positivo em sua aplicação. Além de ser desproporcional a forma de ser aplicada, apenas reflete em prejuízo a mulheres em situação socioeconômica frágil, por encurralá-las a proceder um aborto insalubre, sofrer em casa e correr o risco de morte, ou ir a um hospital e correr o risco de ser presa.
CAPÍTULO 3
DESCRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO E JUSTIÇA SOCIAL.
3.1 – O direito ao aborto seguro é direito humano?
Proclamada na data de 10 de dezembro de 1948, pela Assembleia Geral das Nações Unidas[101], sendo o Brasil um dos países signatários, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) é documento que elenca direitos e liberdades comuns a toda a humanidade, e tem por objetivo atingir a sociedade geral (Estados e civis) a fim de trabalhar em conjunto para garanti-los, através do ensino e da educação, e pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional [102].
Em seu preâmbulo, a DUDH já evidencia que a dignidade é a base para a construção de todos os direitos pautados na mesma, a partir da afirmação de que “o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”[103] . Desta forma, se entende que só existe paz, liberdade e justiça ao assegurar a dignidade da pessoa humana. Tampouco é diferente para a mulher, que, justamente pela igualdade de direitos, é protegida por essas garantias e liberdades, e jamais pode ser privada destas.
A DUDH, em seu art. I, dispõe que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade ” [104]. O dispositivo vai além de igualar todos os seres humanos como livres e detentores de direitos e dignidade, assentindo que cada um é dotado de razão e consciência, a serem respeitadas. A proibição do aborto, por esse prisma, é desrespeito à consciência da mulher, bem como sua liberdade.
As reflexões realizadas em âmbito privado de cada mulher devem ser acolhidas como válidas, jamais reduzindo sua capacidade de imperar em suas próprias vidas. Nesse sentido, James Griffin, em seu livro On human rights, alega que os direitos humanos protegem nossa capacidade humana de criar e buscar as próprias concepções do que seria uma vida digna.[105]
Mais adiante, a liberdade, propriamente, é como classificada como direito humano. Esse feito é observado no art. III da Declaração, ao dispor, ipsis litteris, que “todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.”[106]. Ao analisar a assertiva, considerando sua aplicação em âmbito pessoal de cada indivíduo, visualiza-se que a vida e a liberdade devem ser protegidas, porém, a dignidade de todas as pessoas é o norte pelo qual deve se dar tal proteção. Garantir a vida da gestante e ao mesmo tempo força-la a concluir uma gravidez indesejada é o oposto do objetivo da proteção à vida. Da mesma forma, a liberdade com a barreira de não poder tomar as decisões que interferem no próprio corpo e futuro é incompleta, pois afronta a busca pela dignidade própria, bem como a autonomia sobre o próprio corpo.
O direito de liberdade das mulheres permite que as mesmas tenham controle sobre o corpo, que é espaço privado sobre o qual só a elas cabe determinar[107]. Destaca-se que a liberdade é ilimitada dentro daquilo que confere dignidade à pessoa. Milene Consenso Tonetto, professora e doutora em Filosofia pela UFSC, em seu artigo “O direito humano à liberdade e a prática abortiva brasileira”, afirma que a liberdade reside na possibilidade de cada um buscar aquilo que lhe traz dignidade, torna sua vida digna.
A liberdade é um aspecto essencial de nossa agência que exige deixar as pessoas livres para buscar qualquer concepção plausível da vida. Dessa forma, o direito à liberdade pode justificar uma escolha voluntária de interromper a gestação em casos específicos. Já que o feto ainda não é capaz de agência, ele não tem quaisquer direitos a serem desrespeitados.
Agência é justamente a capacidade de gerir a própria vida, ser o agente normativo de sua existência, contando com autonomia, capacidade de agir e certo nível de instrução[108]. Por esse seguimento, a mulher, dotada de razão, pode optar por interromper a gestação. O direito humano da mulher de liberdade a permite escolher as experiências que quer vivenciar. Outrossim, seu direito à vida, cujo é relacionado diretamente a ser um indivíduo livre, a outorga tomar as decisões que mais lhe aproxime de uma existência digna, seguindo sempre seu juízo pessoal.
Nos estágios iniciais da gestação, o valor moral do feto deve ser respeitado de formas que não restrinjam a liberdade da mulher. Mesmo nos casos em que a gestação não está colocando a vida da mãe em risco, negar o aborto viola a liberdade da mulher. Existem casos em que a mãe não está física ou mentalmente em risco e o bebê tem boa saúde. Uma adolescente grávida pode ficar muito assustada, principalmente se a gestação não foi planejada. Em casos como esse, a gestação pode afetar os planos para sua vida, educação, carreira e perspectivas financeiras. Em outras palavras, isso pode restringir sua busca por uma vida digna.
Uma gestação não apenas gera uma vida, mas transforma uma outra, que não deve ser desconsiderada. A vida da mulher deve ser levada em conta, juntamente à dignidade que deve a acompanhar. O direito à vida não é apenas à vida biológica, mas à vida com dignidade, e esta é pessoal de cada ser. O próprio indivíduo é quem realmente conhece sua realidade, o seu interno, e uma mulher ao decidir abortar enxerga suas razões como nenhum terceiro pode ver, tampouco o Estado. É ela que avalia se adiante sua vida e de seu possível futuro filho será efetivamente digna ou não.
Decorrente do direito à liberdade, existem os direitos sexuais e reprodutivos, que concedem a todos a possibilidade de viver sua sexualidade de forma livre, segura e autônoma, o que significa que todos são livres para escolher seus parceiros, tal como ter acesso à saúde e educação sexual, e fazer escolhas reprodutivas livres e responsáveis, como a decisão de quantos filhos deseja ter, ou se realmente deseja ter filhos ou não[109]. O acesso ao aborto legal e seguro é parte das garantias resultantes de tais direitos[110].
Os direitos reprodutivos e sexuais podem ser analisados por dois prismas: o público e o privado. O privado se refere ao campo da liberdade e autodeterminação individual, pelo qual o exercício da sexualidade e reprodução humana deve ser livre, sem discriminação ou qualquer tipo de coerção ou violência[111]. Subsequente a isso, são livres as mulheres e os homens de decidir quando e se desejam reproduzir-se, exercendo seu direito de autodeterminação, privacidade, intimidade, liberdade e autonomia individual, sem interferência do Estado com qualquer tipo de discriminação, coerção ou violência[112].
Já a parte pública alude ao fato de que, para que haja um efetivo exercício dos direitos sexuais e reprodutivos, são necessárias políticas públicas por parte do Estado, as quais assegurem a saúde sexual e reprodutiva[113]. Aqui se observa a necessidade da educação sexual, com livre acesso à informação, meios seguros e acessíveis de métodos contraceptivos, como também o aborto seguro. Flávia Piovesan, Procuradora do Estado de São Paulo e professora e doutora na PUCSP, expõe em seu texto “O que são Direitos Reprodutivos? ” o papel do Estado em garantir segurança e saúde para a efetividade dos direitos assegurados:
Nesta ótica, essencial é o direito ao acesso a informações, a meios e recursos seguros, disponíveis e acessíveis. Essencial também é o direito ao mais elevado padrão de saúde reprodutiva e sexual, tendo em vista a saúde não como mera ausência de enfermidades e doenças, mas como a capacidade de desfrutar de uma vida sexual segura e satisfatória e de reproduzir-se ou não, quando e segundo a freqüência almejada. Inclui-se ainda o direito ao acesso ao progresso científico e o direito à educação sexual. Portanto, clama-se aqui pela interferência do Estado, no sentido de que implemente políticas públicas garantidoras do direito à saúde sexual e reprodutiva.
Portanto, o Estado ao interferir na vida privada deve-se ater apenas a assegurar a saúde e segurança de sua população, fornecendo possibilidades a quaisquer que forem suas decisões, e educação para que as pessoas tenham discernimento ao decidir. Às mulheres deve ser disponibilizado métodos anticoncepcionais, e instrução de como usa-los da maneira mais apropriada, como também noções de planejamento familiar, e o aborto seguro. Este último é essencial para a plenitude de seus direitos reprodutivos, uma vez que nenhum método contraceptivo é 100% seguro[114], e a mulher não pode ser privada de seus direitos sexuais e reprodutivos, os quais fazem parte de seus direitos humanos.
Entrevistado pela jornalista Raquel Drehmer, para a revista digital M de Mulher da Editora Abril, Sérgio Podgaec, ginecologista e vice-presidente da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, esclarece que para uma eficácia maior é necessário o uso correto e constante dos métodos contraceptivos, mas que não se é possível atingir uma eficácia total.
A eficácia para prevenir uma gravidez depende não apenas da proteção de cada método, mas também de seu uso correto e consistente. A taxa de falha tende a ficar menor à medida que as usuárias se tornam mais experientes em um determinado método, e a consulta regular com o ginecologista tem o potencial de diminuir as possíveis falhas. Porém o risco não será zero. Não existe, até o momento, anticoncepcional 100% seguro[115].
Sendo assim, é essencial que todas mulheres tenham acesso aos métodos anticoncepcionais, pela rede pública, de forma a alcançar também as mulheres das classes mais baixas, assim como a instrução de fácil compreensão para que elas façam o uso adequado dos mesmos. Porém, é necessário também que a saúde pública oportunize às mulheres o procedimento do aborto, posto que, como mencionado, ainda que a mulher faça o uso adequado do contraceptivo, não há nenhum método inteiramente eficaz.
Entre as datas de 11 e 22 de março de 2019, na cidade de Nova York, ocorreu a 63ª sessão da Comissão sobre a Situação das Mulheres, reunindo mais de 5.200 representantes da sociedade civil e 1.800 delegados de governos[116]. A sessão resulta em um documento chamado de Conclusões Aceitas, que é discutido entre os delegados participantes até que se chegue à versão final[117]. Dentro das Conclusões, as quais foram aprovadas pelo Governo Brasileiro, há o reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos da mulher com a garantia universal de acesso à saúde sexual e reprodutiva, bem como aos direitos reprodutivos, dentro deles o acesso universal a serviços de saúde sexual e reprodutiva, planejamento familiar, informação e educação e integração da saúde reprodutiva nos programas e estratégias nacionais[118].
Em um trecho das Conclusões Aceitas, há o direito das mulheres de controle e decisão livre e responsável sobre todas as questões ligadas à sua sexualidade, abrangendo a saúde sexual e reprodutiva, sem qualquer espécie de coerção, discriminação e violência, com o objetivo de promover a conquista da igualdade de gênero, seu empoderamento e efetivação dos seus direitos humanos[119].
O dia 28 de setembro é o dia escolhido pela ONU como o Dia da Ação Global para o Acesso ao Aborto Seguro e Legal, buscando promover a descriminalização do aborto nos países em que a prática ainda é coibida, sendo que seus especialistas afirmam que “a capacidade das mulheres de fazer escolhas para si e para suas famílias não deve ser privilégio reservado às mais ricas, mas deve ser o direito de todas as mulheres e meninas no mundo todo”[120]. Conforme os especialistas da organização, a criminalização do aborto acaba por perpetuar estigmas e discriminação de gênero, lesando a dignidade e integridade corporal das mulheres, a partir de propósitos políticos, culturais, religiosos e econômicos de outras pessoas a elas impostos[121].
Logo, é perceptível que as nações do mundo, representadas por seus delegados na ONU, concordam que é direito da mulher a saúde sexual e reprodutiva, que se efetiva com a liberdade da mulher de se relacionar e se reproduzir da forma julgar melhor. A função do Estado deve ser a de garantir que a mesma tenha amparo para qualquer que seja a sua escolha, fornecendo acesso à saúde de qualidade, informação, apoio de profissionais médicos e psicólogos, da mesma maneira que a possibilidade de interromper a gestação quando a mesma entender necessário.
O Estado não deve interferir diretamente na vida sexual e reprodutiva da mulher, decidindo por ela, porquanto fazem parte do âmbito privado de suas vidas. Qualquer imposição estatal é uma forma de violação de seus direitos. Ao criminalizar a prática do aborto, o país ignora a condição da mulher de ser capaz de dirigir sua vida sexual e reprodutiva, conservando o pensamento antiquado e machista de que a mulher deve se abster ao máximo de manter relações sexuais, como também o de que nasceu com o dever de ser mãe.
O direito ao aborto seguro é direito humano, como uma materialização dos direitos femininos à saúde sexual, reprodutivos, liberdade e à vida, ressaltando que todos estes sob o fundamento universal da dignidade. A dignidade feminina deve ser protegida, o dever do Estado é proporciona-la.
A escolha de ser mãe é algo que vai além de manter uma gestação até o fim. A transformação na vida da mulher é extremamente profunda, e a ela deve ter a opção de quando e se quer essa mudança. As mulheres são mais do que mães em potencial, são seres humanos conscientes, e devem ter o poder diretivo de seus destinos.
3.2 – A descriminalização do aborto como política pública
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Habeas Corpus (HC) 124.306, afastou a prisão preventiva de E.S. e R.A.F (identidades preservadas pelo Tribunal), denunciados por supostamente ter praticado o crime de aborto com o consentimento da gestante e formação de quadrilha, que correspondem aos artigos 126 e 288 do Código Penal brasileiro[122]. Alcançando a maioria, o voto do ministro Luís Roberto Barroso reconhece que a criminalização do aborto não é compatível com vários direitos fundamentais, sendo citados por ele os direitos sexuais e reprodutivos e autonomia da mulher, integridade física e psíquica da gestante e a igualdade[123].
Antes de avançar, porém, cumpre estabelecer uma premissa importante para o raciocínio a ser desenvolvido: o aborto é uma prática que se deve procurar evitar, pelas complexidades físicas, psíquicas e morais que envolve. Por isso mesmo, é papel do Estado e da sociedade atuar nesse sentido, mediante oferta de educação sexual, distribuição de meios contraceptivos e amparo à mulher que deseje ter o filho e se encontre em circunstâncias adversas. Portanto, ao se afirmar aqui a incompatibilidade da criminalização com a Constituição, não se está a fazer a defesa da disseminação do procedimento. Pelo contrário, o que ser pretende é que ele seja raro e seguro.[124]
Por violar direitos fundamentais das mulheres, a criminalização do aborto se torna incompatível com a Constituição Federal, que é a lei máxima do país. Por ser inconstitucional, a descriminalização se faz necessária, para que os direitos fundamentais femininos sejam exercidos em sua plenitude. A obrigação do Governo Estatal é de amparar as mulheres em suas decisões, e propiciar meios de evitar a gravidez indesejada.
A busca pela extinção da prática do aborto voluntário por meio de sua criminalização se provou extremamente ineficaz, além de suprimir direitos fundamentais e humanos, que são essenciais a todos, cria um ambiente de desigualdade e insegurança no país. Efetivar as garantias constitucionais devem ser sempre o objetivo máximo de toda lei no Brasil, se fazendo necessárias políticas públicas que as assegurem.
Além disso, o Estado deve atuar sobre os fatores econômicos e sociais que dão causa à gravidez indesejada ou que pressionam as mulheres a abortar29. As duas razões mais comumente invocadas para o aborto são a impossibilidade de custear a criação dos filhos e a drástica mudança na vida da mãe (que a faria, e.g., perder oportunidades de carreira)30 . Nessas situações, é importante a existência de uma rede de apoio à grávida e à sua família, como o acesso à creche e o direito à assistência social. Ademais, parcela das gestações não programadas está relacionada à falta de informação e de acesso a métodos contraceptivos. Isso pode ser revertido, por exemplo, com programas de planejamento familiar, com a distribuição gratuita de anticoncepcionais e assistência especializada à gestante e educação sexual. Logo, a tutela penal também dificilmente seria aprovada no teste da necessidade[125].
Ao oferecer educação sexual, distribuir métodos anticoncepcionais de forma gratuita, e amparo tanto às mulheres que querem prosseguir com a gestação, tanto às que desejam interrompe-la, o país proporciona um grau de igualdade superior ao atual, uma vez que permite equiparação de oportunidade e tutela de direitos entre mulheres pobres, sem acesso à informação e mulheres instruídas e com melhores condições financeiras.
Criminalizar o aborto voluntário não passa de medida paliativa, que pune o resultado, mas não sana sua causa. As mulheres decidem abortar por diversos motivos, como os citados por Luís Roberto Barroso em seu voto. Para diminuir a quantidade de interrupções voluntárias de gestações, é preciso agir nas causas que gerem gravidez não planejada, as quais são a desinformação, falta de acesso à meios contraceptivos e o conhecimento das formas corretas de utiliza-los, desamparo psicológico e ausência de apoio à mulher, por meio de assistência social, por exemplo.
A sociedade não é homogênea em seus aspectos morais, o que significa que as pessoas têm ideias, valores, pensamentos distintos. Para que os conflitos de opinião se mantenham dentro de limites administráveis, existem duas formas de coerção, a pura e simples e a política[126]. A primeira é incompatível com os preceitos de liberdade que permeiam o ordenamento jurídico pátrio, senso a segunda forma viável pelo prisma jurídico. Política pode ser entendida como “tudo o que se relaciona à busca de ações para o bem estar tanto individual como coletivo”[127], sendo sua função “a de resolver conflitos entre indivíduos e grupos, sem que este conflito destrua um dos partidos em conflito”[128]. A política, destarte, é o instrumento da busca pela paz social, de forma a amenizar as desigualdades que naturalmente se formam, para o melhor convívio de um grupo de pessoas.
Políticas públicas, seguindo o contexto de política como forma de busca do equânime para a sociedade, se definem como as diretrizes e princípios que norteiam o atuação do poder público[129]. São, dessa forma, “um conjunto de ações e decisões de governo, voltadas para a solução (ou não) de problemas da sociedade”[130]. Nesse seguimento, as políticas públicas podem ser compreendidas como as direções que o Governo deve tomar no momento de tomar medidas que materializem o estado de bem-estar social.
No lugar de criminalização, precisamos pensar em políticas públicas que consigam diminuir as taxas de abortos, por meio de educação para a prevenção de gravidezes indesejadas. O foco da discussão deveria ser em políticas que empoderem as mulheres não só em relação ao direito de decidir sobre seus corpos, mas para obter informação, ter aspirações, e melhorar sua educação e renda[131].
Observando por esse prisma, políticas públicas frente ao aborto se tratam das diretrizes do Estado no intuito de diminuir o número de mulheres que morrem ou sofrem sequelas devido a abortos clandestinos, e trazer igualdade ao gênero feminino. O Governo deve oferecer às mulheres menos privilegiadas a possibilidade de evitar a gravidez indesejada, e caso essa venha a ocorrer, de ter condições de criar o filho com dignidade, ou realizar um aborto seguro, respeitando o que a gestante optar.
No país, o número de gestações não planejadas é altíssimo, dado que mais da metade das mulheres que engravidam não estavam preparadas para tal[132]. A tendência é de progressão desta porcentagem. A ginecologista Carolina Sales, professora do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP), afirmou para Karolina Bergamo, jornalista da revista Saúde, que “não temos metas de planejamento familiar nem de redução de gestação na adolescência, ao contrário do que ocorre em outros países. Eles traçam estratégias para alcançá-las”[133].
Como exemplo de nação que conseguiu reduzir as taxas de gestações indesejadas, Carolina Sales cita o Quênia, na África, o qual “têm um documento com diretrizes claras que incluem ações nas escolas, auxílio a adolescentes no sentido de incentivá-las a estabelecer objetivos de vida, além de distribuição de métodos contraceptivos, principalmente desses que não dependem tanto da memória da mulher”, explica a médica[134].
Com mais acesso à informação, as mulheres têm maior capacidade de evitar a gestação indesejada, unido ao acesso a métodos contraceptivos, que vão além da pílula anticoncepcional. Nesse sentido, cita o professor Cláudio Ferraz em sua coluna no Jornal Nexo, que programas que visam levar informações à adolescentes leva a uma redução no número de gestações indesejadas.
Um resumo de avaliações de impacto de políticas na Ásia, África e América Latina mostra que intervenções focadas em informação sobre saúde sexual e reprodutiva, programas que aumentam aspirações de meninas adolescentes e subsídios para que meninas terminem o ensino médio podem ter efeitos significativos na redução de gravidezes indesejadas. Com isso, as mulheres poderão tomar melhores decisões sobre fertilidade, que se transformarão em melhores resultados para a sociedade como um todo[135].
É perceptível como a informação é o principal fator que leva à redução de gravidez não planejada, pois ainda que os métodos anticoncepcionais estejam disponíveis na saúde pública, o não conhecimento destes e a forma apropriada de usa-los torna inútil seu fornecimento. Países ao redor do mundo comprovam que com a informação, as mulheres adquirem maior aptidão para cuidarem da própria saúde sexual e reprodutiva[136]. Os programas de educação sexual devem ocorrer ao início do amadurecimento sexual, evitando, ainda, a gravidez da adolescência.
Outro país que tomou novas diretrizes quanto ao aborto é o Uruguai. Antes da descriminalização da prática, ocorrida em 2012, o país implementou as denominadas “Medidas de proteção materna diante do aborto provocado em condições de risco”, normativa que estabeleceu estratégia de atenção integral a saúde como solução das complicações e mortalidade causadas pelo aborto insalubre[137]. As medidas abriram caminho para a descriminalização, que veio acompanhada de avanço da política pública de saúde sexual e reprodutiva. O Ministério da Saúde Pública apontou que entre os anos de 2013 e 2016, o Uruguai registrou apenas três mortes por aborto, e nenhum dos procedimentos realizado no sistema de saúde uruguaio[138].
No Uruguai, o aborto é procedido com uma combinação de misoprostol e mifepristona, medicamentos recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como eficazes e seguros[139]. Após o aborto, a paciente tem um acompanhamento especial. A mulher é orientada a retornar ao sistema de saúde para ser examinada e garantir o sucesso do procedimento, e escolher algum método anticoncepcional, gratuitos no sistema de saúde público[140].
As políticas públicas também têm o condão de amenizar a desigualdades sociais, pois contribuem para a inclusão de grupos historicamente silenciados no processo político brasileiro, que não tiveram seus interesses devidamente representados[141]. A atuação do Estado deve ser a de construir as políticas públicas para viabilizar a redução das desigualdades de tratamento dos grupos minoritários, ou seja, os mais enfraquecidos diante da maioria. O grupo das mulheres marginalizadas pela sociedade é uma minoria: as mulheres pobres, negras ou pardas em sua maioria, sem acesso à educação e saúde de qualidade, que sofrem diariamente no país com o aborto insalubre.
Como exemplo de programas públicos brasileiros que visam garantir os direitos femininos, tem-se a rede cegonha (Portaria nº 1.459/2011 do Ministério da Saúde) e o sistema nacional de cadastro, vigilância e acompanhamento da gestante e puérpera para prevenção da mortalidade materna (Medida Provisória nº 557/2011)[142]. De acordo com o Portal da Saúde, o primeiro programa tem como escopo assegurar às mulheres o direito ao planejamento reprodutivo, a atenção humanizada à gravidez, parto, tal qual o abortamento e puerpério[143]. Já o segundo, como consta no Portal Brasil, objetiva aprimorar o acesso, cobertura e qualidade dos cuidados com a saúde materna, em especial quanto às gestações de risco[144].
Com a difusão apropriada de informações acerca da vida sexual segura, gestação, planejamento familiar e métodos contraceptivos, seguida do fornecimento destes unido à descriminalização do aborto, será possível propiciar mais justiça no país, suprindo o abismo provocado pela desigualdade social.
É um pensamento corriqueiro na sociedade brasileira de que descriminalizar a prática do aborto voluntário tornaria o aborto banal, como se o aborto não causasse nenhuma espécie de sofrimento à mulher[145]. Todavia, países que deixaram de tipificar a conduta como crime provaram que o efeito é totalmente o oposto, como no caso do Uruguai, onde houve queda de cerca de 30% do número de abortos[146]. Com o fim da criminalização da prática, há uma abertura à discussão e possibilidade de pesquisa, de forma a garantir às mulheres uma maior tranquilidade de realizar o procedimento sem existir risco de óbito[147].
É necessário desmistificar a ideia de que a descriminalização do aborto incentiva as mulheres a abortar, e que esta prática se tornaria um dos métodos contraceptivos, por supostamente deixarem de fazer uso dos outros meios mais apropriados. A descriminalização do aborto permitirá que as mulheres que buscam os métodos clandestinos procurem o serviço de saúde pública, o que fará com que sejam devidamente orientadas por profissionais qualificados para tanto, contanto ainda com apoio psicológico. Com isso, se evitará muitas mortes ou lesões de toda a gravidade de mulheres que passam pelo procedimento insalubre. Ademais, deixar de tipificar o aborto voluntário como crime incentiva o debate sobre o assunto, o que contribui para pesquisa e avanços científicos relacionados ao tema e permite que este se torne ainda mais seguro.
A lei deve se adequar aos avanços da sociedade na qual vige, e os artigos do Código Penal (CP) brasileiro que tipificam o aborto voluntário como crime não acompanham a realidade brasileira. Além de se mostrar extremamente ineficaz, afronta a CF, no tocante aos direitos fundamentais das mulheres, bem como afronta direitos humanos femininos. O CP é anterior à Constituição, não devendo tais dispositivos incompatíveis com a mesma prosperar no atual ordenamento jurídico, em especial em um meio social pós redemocratização, no qual as garantias constitucionais são tão priorizadas.
De fato, com a redemocratização do país, houve mudanças a respeito da questão do aborto, mas mudanças, sobretudo, na visibilidade do tema, na participação de atores políticos e sociais e na ampliação do debate. Não houve modificações significativas na legislação, no entanto conseguiu-se estabelecer normas técnicas e criar serviços que procuram garantir o acesso ao aborto previsto em lei e o atendimento das mulheres em situação de abortamento, no âmbito do Poder Executivo. A tensão no Parlamento entre tendências opostas tem, praticamente, paralisado decisões que envolvam mudanças legais: não se avança na legislação, mas também não se retrocede. A via do Judiciário vem sendo trilhada, desde os anos 90, e existe uma ação em julgamento no STF sobre a interrupção da gestação nos casos de anencefalia do feto.[148]
A legislação não teve avanços em relação à uma possibilidade de descriminalização, devido à embates políticos que não são conclusivos. Todavia, o julgamento do HC 124.306 abriu as portas do judiciário brasileiro para debate a respeito da não criminalização do aborto voluntário, e aproximou o país de uma flexibilização da lei quanto à prática. A decisão do ministro Luís Roberto Barroso foi citada junto à Pesquisa Nacional de Aborto do Instituto de Bioética – Anis para fundamentar a petição que gerou a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 442[149]. A ADPF 442, atualmente, é o que mais traz a esperança de uma descriminalização da prática.
Afinal, a Constituição Federal, na seção reservada à saúde, em seu art. 196, dispõe que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”[150]. É indubitável que o aborto voluntário ocorre, independente da opressão por meio de sua criminalização. A maior problemática é a desigualdade quanto ao seu procedimento, que é mais seguro para as mulheres mais abastadas. Seguindo a Constituição, cabe ao Estado abolir tal desigualdade, e oferecer saúde às mulheres de todas as classes sociais.
Por quase 80 anos de criminalização, a proibição do aborto se comprovou ineficiente ao fim que se propõe, e representa uma estagnação nos avanços na luta pelos direitos femininos. O Estado não pode ignorar os altos índices de mortalidade feminina causados pelo aborto em condições inapropriadas, e o de mulheres que tem graves sequelas pelo mesmo motivo.
O país, sobretudo, tem o dever que promover a igualdade entre todos, e a negação do aborto voluntário às mulheres é fator causador de múltipla disparidade: tanto de gênero, vez que as mulheres têm sua liberdade e autonomia mais restritas que os homens, tanto socioeconômicas e raciais entre as próprias mulheres, pelo fato de que as mulheres brancas e de classes sociais mais altas não sofrem com a necessidade do poder público para abortar, visto que tem acesso à clinicas particulares de alto custo e maior segurança.
Quem sofre com a tipificação do aborto, são as mulheres que mais precisam de atenção estatal, que estão à margem da sociedade, desprovidas de estrutura familiar, saúde de qualidade, informação, apoio psicológico, isoladas socialmente, que todos os dias sofrem as mais variadas lesões aos seus direitos humanos. O aborto é questão de saúde pública, pois a partir do momento que a saúde de inúmeras mulheres é posta em risco cotidianamente, o Governo deve intervir para eliminar o problema e trazer efetividade aos direitos femininos.
A mulher é capaz de decidir se deseja ou não ser mãe, e só ela sabe se está preparada, dentro de sua vivência, para criar um filho. O aborto nunca é uma decisão fácil, ou livre de sofrimento, punir sua prática é aumentar o tormento das mulheres que optam por faze-lo. O Estado deve atuar para amenizar ao máximo o sofrimento das mulheres que escolhem interromper a gravidez, e diminuir o quanto possível o número de gestações indesejadas. Descriminalizar o aborto voluntário não é apenas retirar uma tipificação criminal, é remover uma pena social.
Por meio da descriminalização do aborto, o país toma por política pública a proteção dos direitos femininos em sua integralidade, não mais suprimindo direitos reprodutivos e sexuais da mulher, bem como o de saúde universal e igualitária, liberdade e vida digna. A descriminalização é um dos primeiros passos a serem tomados na direção de um futuro justo, onde todas mulheres poderão ser as verdadeiras dirigentes de suas vidas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho orientou-se por dados e opiniões de profissionais especialistas em direito, saúde e política, e concluiu que ao longo da história, e em quase 80 anos de criminalização, a proibição do aborto voluntário apenas gerou gastos públicos, lesões físicas e psicológicas, e a morte de milhares de mulheres. A Constituição Federal, embora não trate do aborto especificamente, assegura a todas as brasileiras saúde, autonomia, liberdade, dignidade, o que não se pode ser afrontado por nenhuma outra legislação infraconstitucional.
Os números apresentados neste trabalho são claros quanto à quantidade de mulheres que sofrem cotidianamente com os efeitos da criminalização. Milhares de mulheres são internadas anualmente, inclusive em estado de urgência, devido à realização de abortos clandestinos, que jamais seriam sua primeira opção se houvesse a possibilidade de um atendimento público.
A mulher deve ser protagonista do debate sobre a descriminalização do aborto, pois é sobre ela que recai toda e qualquer decisão. Deve ser respeitada como ser individual, autônoma, dona de seu corpo, vida e consciência. Impor a uma mulher a conclusão de uma gestação é uma forma de violação à sua integridade física e psicológica, pois a obriga a viver transformações, em ambos os âmbitos, que ela não deseja.
Não se pode reprimir o direito de uma vida em função de uma que ainda não existe no mundo jurídico. O feto apenas detém uma expectativa de direito, contra direitos já consolidados da mulher, adquiridos ao nascer. O valor moral do feto cresce com o tempo de gestação, atingindo seu ápice ao nascer, mas a mulher já tem todos os seus direitos garantidos, que não podem ser desconsiderados.
Criminalizar o aborto não impede que esse aconteça, apenas leva as mulheres que decidiram abortar a procurar outra forma de o fazer que não seja no atendimento público. O que ocorre é que as mulheres mais abastadas têm condições de realizar o procedimento em clínicas mais seguras, e que cobram valores que as mais pobres jamais conseguiriam arcar. Punir o aborto voluntário encurrala as mulheres de condições financeiras inferiores a procurar formas mais baratas de realiza-lo, o que resulta na quantidade de mulheres que são hospitalizadas por um aborto mal procedido.
A existência dessas clínicas e do mercado de medicamentos abortivos é a comprovação de há demanda. Quando uma mulher decide abortar, é porque realizou um juízo pessoal sério, pois um aborto sempre gera sofrimentos e ninguém opta pelo mais doloroso a si. O aborto nunca é banal. Não há nenhum terceiro que possa decidir pela mulher, pois ela é quem conhece as particularidades de sua existência, e é quem sabe se ser mãe será prejudicial ou não à sua vida.
A dignidade é o principal fundamento pelo qual devem ser assegurados todos os direitos de alguém. É fundamento da República, e tem o status de fundamento também na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Todos os direitos devem ser interpretados e limitados nessa direção. A mulher, ser dotado de direitos, deve ter sua dignidade preservada. Nada pode impedir a sua luta por uma vida digna, que é o seu principal direito.
A criminalização do aborto é claramente um fomento à desigualdade. As mulheres a margem da sociedade, mais desprotegidas, são as que mais sofrem. Os índices de mulheres negras ou pardas, pobres, sem instrução, apontam que constituem a maioria sofredora com as consequências severas de abortos insalubres. Ao buscar socorro em hospitais, ainda tem tratamento diferenciado, sofrendo violências institucionais das mais variadas formas. Seus direitos são lesados sucessivamente, em consequência de uma lei ineficaz.
É falsa a afirmação de que seria oneroso demais ao Estado descriminalizar o aborto, falácia que figura entre os principais argumentos para a manutenção da tipificação penal. O país gasta milhões todos os anos com as consequências da criminalização. Mulheres que submetem aos procedimentos inseguros, muitas vezes sozinhas, com as lesões de um aborto malsucedido, buscam socorro na saúde pública, gerando alto custo ao Estado. Ademais, os países em que o aborto é legalizado comprovaram pela própria experiência que a legalização leva a uma queda do número de abortos, o que seria diminuir os gastos públicos.
Ao invés de punir a prática, o Estado deve trabalhar para que as gestações indesejadas sejam cada vez mais raras. Prover métodos contraceptivos, instruir as mulheres e meninas de como usa-los, levar educação sexual a todos desde o início da maturidade sexual, são maneiras que atingem o objetivo de reduzir gestações não planejadas, e que atuam na raiz no problema. Punir o aborto além de não impedir que esse aconteça, fere as mulheres em seu físico e psicológico por força-las a se submeter aos métodos inseguros.
Deve-se levar em consideração ainda o ínfimo número de mulheres penalizadas judicialmente pela conduta do aborto. Se tratam em sua maioria de mulheres em condições econômico e sociais frágeis, que em sua maior parte foram entregues a polícia pelos próprios agentes de saúde que as socorreram, ferindo ambos os deveres de socorro e de sigilo.
Tantas são as formas de lesão aos direitos das mulheres decorrentes da criminalização do aborto, que a permanência desta no ordenamento jurídico brasileiro é insustentável. Fere a autonomia da mulher sobre seu corpo, sobre o qual ela é quem deve decidir, bem como sua integridade física e psicológica; sua liberdade, que confere à mulher o poder de direcionar por quais caminhos sua vida seguirá; seus direitos reprodutivos e sexuais, que permitem a ela escolher como, quando, e se quer se reproduzir, bem como seus parceiros, livre de qualquer forma de opressão exterior; e principalmente, seu direito à vida digna, que é o bem maior juridicamente tutelado, e que deveria ser priorizado acima de todos os outros, e é só a mulher quem sabe o que é digno para si.
É preciso que o país descriminalize o aborto, e ofereça o procedimento de forma gratuita pelo Sistema Único de Saúde. Dessa forma, mulheres ricas e pobres terão acesso ao aborto seguro, e terão assegurados os seus direitos concedidos pela Constituição Federal. Ainda, são necessárias políticas públicas no sentido de proteger à saúde sexual e reprodutiva da mulher, materializadas por programas sociais que concedam apoio profissional médico, psicológico e de assistência social às mulheres, somados a oferta de acesso livre à métodos contraceptivos, e informações de fácil compreensão sobre estes, educação sexual e sobre planejamento familiar.
Forçar uma mulher a concluir uma gravidez é atingi-la em seu âmago, pois a obriga a assistir a profunda transformação de ser mãe em sua vida sem o seu consentimento, e ainda ter que experimentar todas as razões pelas quais decidiria interromper a gestação. A mulher deve ser respeitada como indivíduo, e não como meio no qual o feto se desenvolverá. Seus direitos não podem ser menosprezados, mas valorizados, como ser humano que é.
Durante toda a história, a mulher sofreu diversas formas de rebaixamento, sendo reduzida e subjugada ao homem. Antes tida como seu patrimônio, não podia decidir sobre seu corpo porque ele não a pertencia. Com o tempo, foi conquistando algo que sempre foi seu: o poder sobre si. A descriminalização do aborto é maneira de conceder às mulheres o poder de imperar sobre si mesmas, permitindo que decidam de que forma querem trilhar os seus caminhos.
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[1] Cita-se Débora Diniz, Flávia Piovesan e Luís Roberto Barroso.
[2] ABCMED, 2013. Aborto: o que é? Como é feito? Quais são os riscos? Como age a “pílula do dia seguinte”?. Disponível em https://www.abc.med.br/p/saude-da-mulher/359669/aborto-o-que-e-como-e-feito-quais-sao-os-riscos-como-age-a-quot-pilula-do-dia-seguinte-quot.htm. Acesso em: 29/11/2019.
[3] Ibidem. Acesso em 29/11/2019.
[4] Ibidem. Acesso em 29/11/2019.
[5] GADELHA DE SÁ, André Beltrão. Evolução histórica do aborto. Publicado em 30 de agosto de 2016, 04:30. Disponível em http://www.conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47418/evolucao-historica-do-aborto. Acesso em 05/09/2019.
[6] GADELHA DE SÁ, André Beltrão. Op cit. Acesso em 05/09/2019.
[7] Ibidem. Acesso em 05/09/2019.
[8] GADELHA DE SÁ. Op cit. Acesso em 05/09/2019.
[9] Ibidem. Acesso em 05/09/2019.
[10] Ibidem. Acesso em 05/09/2019.
[11] GADELHA DE SÁ. Op cit. Acesso em 05/09/2019.
[12] Ibidem. Acesso em 05/09/2019.
[13] MORI, Maurizio apud GADELHA DE SÁ, André Beltrão. Evolução histórica do aborto. Publicado em 30 de agosto de 2016, 04:30. Disponível em http://www.conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47418/evolucao-historica-do-aborto. Acesso em 05/09/2019.
[14] GADELHA DE SÁ, André Beltrão. Evolução histórica do aborto. Publicado em 30 de agosto de 2016, 04:30. Disponível em http://www.conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47418/evolucao-historica-do-aborto. Acesso em 06/09/2019.
[15] CABELEIRA, Mayara. Neomalthusiano: o controle da população revisitado. Revista ecopolítica. PUCSP. 2013. p. 83.
[16] GADELHA DE SÁ. Op cit. Acesso em 06/09/2019.
[17] GADELHA DE SÁ. Op cit. Acesso em 06/09/2019.
[18] Ibidem. Acesso em 06/09/2019.
[19]BRASIL. Lei de 16 de dezembro de 1830. Codigo Criminal do Imperio do Brazil. Secretaria de Estado dos Negocios. Publicada em 08/01/1831. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/LIM-16-12-1830.htm. Acesso em 06/09/2019.
[20] Rebouças, Melina Séfora Souza; Dutra, Elza Maria do Socorro. Psicologia em Estudo, Set/2011, Volume 16 Nº 3. p. 422.
[21] BRASIL. Decreto nº 847, de 11 de outubro de 1890. Codigo Penal dos Estados Unidos do Brazil. Ministério dos Negócios da Justiça. Publicado em 13/12/1890. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/d847.htm. Acesso em 06/09/2019.
[22] BRASIL. Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 31 dez. 1940. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm. Acesso em 06/09/2019.
[23] OS 15 PRIMEIROS PAÍSES QUE LEGALIZARAM O ABORTO, Copyright Agência Patrícia Galvão. Atribuição 4.0 Internacional (CC BY 4.0). Publicado em 31/01/2019. Disponível em https://agenciapatriciagalvao.org.br/mulheres-de-olho/os-15-primeiros-paises-que-legalizaram-o-aborto. Acesso em 06/09/2019.
[24] Sic “The Court held that a woman’s right to an abortion fell within the right to privacy (recognized in Griswold v. Connecticut) protected by the Fourteenth Amendment. The decision gave a woman the right to an abortion during the entirety of the pregnancy and defined different levels of state interest for regulating abortion in the second and third trimesters.” Roe v. Wade Fast Facts, 2019 Cable News Network.Turner Broadcasting System, Inc.All Rights Reserved. CNN Sans ™ & © 2016 Cable News Network. Publicado em 06/05/2019. Disponível em https://edition.cnn.com/2013/11/04/us/roe-v-wade-fast-facts/index.html. Acesso em 06/09/2019.
[25] SENRA, Ricardo. ONU defende descriminalização do aborto em meio à epidemia de zika. Revista BBC Brasil. 05/02/2016. Disponível em https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/02/160205_onu_aborto_zika_rs. Acesso em 10/10/2019.
[26] SENRA, Ricardo. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[27] Ibidem. Acesso em 10/10/2019.
[28] Ibidem. Acesso em 10/10/2019.
[29] SENRA, Ricardo. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[30] Ibidem. Acesso em 10/10/2019.
[31] Ibidem. Acesso em 10/10/2019.
[32] INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Especialistas da ONU pedem fim da criminalização do aborto em todo o mundo. Governo Federal do Brasil. Disponível em http://www.ipea.gov.br/participacao/noticiasmidia/direitos-humanos/1747-onu-pede-fim-da-criminalizacao-do-aborto-em-todo-o-mundo. Acesso em 06/09/2019.
[33] OS 15 PRIMEIROS PAÍSES QUE LEGALIZARAM O ABORTO, Copyright Agência Patrícia Galvão. Atribuição 4.0 Internacional (CC BY 4.0). Publicado em 31/01/2019. Disponível em https://agenciapatriciagalvao.org.br/mulheres-de-olho/os-15-primeiros-paises-que-legalizaram-o-aborto/ Acesso em 06/09/2019.
[34] Conselho Federal de Enfermagem. Uma mulher morre a cada 2 dias por aborto inseguro, diz Ministério da Saúde. Disponível em http://www.cofen.gov.br/uma-mulher-morre-a-cada-2-dias-por-causa-do-abortoinseguro-diz-ministerio-da-saude_64714.html. Acesso em 06/09/2019.
[35] FERNANDES, Marcella. Aborto no Brasil: Como os números sobre abortos legais e clandestinos contribuem no debate da descriminalização. Publicado em 31/07/2018. Atualizado 19/11/2018. Disponível em https://www.huffpostbrasil.com/2018/07/31/aborto-no-brasil-como-os-numeros-sobre-abortos-legais-e-clandestinos-contribuem-no-debate-da-descriminalizacao_a_23486575/. Acesso em 06/09/2019.
[36] FERNANDES, Marcella. Op cit. Acesso em 06/09/2019.
[37] CERQUEIRA, Daniel, e COELHO, Daniel Santa Cruz. Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde. IMPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Publicado em 20/05/2017. Pág. 17/18. Disponível em http://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/artigo/21/estupro-no-brasil-uma-radiografia-segundo-os-dados-da-saude. Acesso em 07/09/2019.
[38] FERNANDES, Marcella. Op cit. Acesso em 06/09/2019.
[39] Ibidem. Acesso em 06/09/2019.
[40] Ibidem. Acesso em 06/09/2019.
[41] FERNANDES, Marcella. Aborto no Brasil: Como os números sobre abortos legais e clandestinos contribuem no debate da descriminalização. Publicado em 31/07/2018. Atualizado 19/11/2018. Disponível em https://www.huffpostbrasil.com/2018/07/31/aborto-no-brasil-como-os-numeros-sobre-abortos-legais-e-clandestinos-contribuem-no-debate-da-descriminalizacao_a_23486575/. Acesso em 07/09/2019.
[42] Ministério da Saúde – Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS). Pesquisa em 07/09/2019.
[43] DINIZ, Debora; MEDEIROS, Marcelo and MADEIRO, Alberto. Pesquisa Nacional de Aborto 2016. Ciênc. saúde coletiva [online]. 2017, vol.22, n.2, pp.653-660. ISSN 1413-8123. Disponível em http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232017222.23812016. Acesso em 07/09/2019. Acesso em 07/09/2019.
[44] DINIZ, Debora; MEDEIROS, Marcelo and MADEIRO, Alberto. Op cit. Acesso em 07/09/2019.
[45] Ibidem. Acesso em 07/09/2019.
[46] DINIZ, Debora; MEDEIROS, Marcelo and MADEIRO, Alberto. Op cit. Acesso em 07/09/2019.
[47] Ibidem. Acesso em 07/09/2019.
[48] Ibidem. Acesso em 07/09/2019.
[49] BRASIL. Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 31 dez. 1940. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm. Acesso em 06/09/2019.
[50] BRASIL. Op cit. Acesso em 06/09/2019.
[51]BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Petição/STF nº 75.796/2004, TERCEIRO – ADMISSIBILIDADE NO PROCESSO – INDEFERIMENTO – RECONSIDERAÇÃO- IMPROPRIEDADE. TERCEIRO – JUNTADA DE DOCUMENTOS, Requerente: Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, Ministro Nelson Jobim, Data de Julgamento 02/08/2004, Data de Publicação: 03/08/2004, Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADPF&s1=54&processo=54. Acesso em 06/10/2019.
[52] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADPF: 54, DF, Relator: Min. Marco Aurélio, Data de Julgamento: 12/04/2012, Tribunal Pleno, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-080 DIVULG 29-04-2013 PUBLIC 30-04-2013. Disponível em https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/24807932/arguicao-de-descumprimento-de-preceito-fundamental-adpf-54-df-stf. Acesso em 06/10/2019.
[53] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NOTÍCIAS STF. Imprensa STF. Publicado em 08/03/2017. Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=337860. Acesso em 06/10/2019.
[54] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Op cit.
[55] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 07/10/2019.
[56] BRASIL. Op cit. Acesso em 07/10/2019.
[57] BARROSO, Luís Roberto, A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: Natureza Jurídica, Conteúdos Mínimos e Critérios de Aplicação. Versão provisória para debate público. Mimeografado, dezembro de 2010. p. 17.
[58] KANT, Immanuel, apud BARROSO, Luís Roberto, A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: Natureza Jurídica, Conteúdos Mínimos e Critérios de Aplicação. Versão provisória para debate público. Mimeografado, dezembro de 2010. p. 17.
[59] KANT, Immanuel Kant, apud BARROSO, Luís Roberto. Op cit. p. 17.
[60] BARROSO. Op cit. p. 21.
[61] KANT, Imannuel, apud BARROSO, Luís Roberto. Op cit. p. 17/18.
[62] BARROSO. Op cit. p. 23.
[63] BARROSO. Op cit. p. 24.
[64] CHAUÍ, Marilena apud BARROSO, Luís Roberto. Op cit. p. 24.
[65] BRASIL. Lei n. 10.406, 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 11 jan. 2002. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm. Acesso em 09/10/2019.
[66] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Parte Geral. 17. ed. Atlas. São Paulo. 2017. p. 182.
[67] DINIZ, Maria Helena. O Estado atual do biodireito. 2. ed. Saraiva. São Paulo. 2002. p. 113.
[68] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Especial. 14ª ed. Impetus. 2017. p. 177.
[69] BORGES, Helena. Média global de abortos cai, puxada por países ricos onde a prática é legalizada. Revista O GLOBO. 22/03/2018, 16:08. Disponível em https://oglobo.globo.com/sociedade/media-global-de-abortos-cai-puxada-por-paisesricos-onde-pratica-legalizada-22513033. Acesso em 10/10/2019.
[70] BORGES, Helena. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[71] DE LIMA, Juliana Domingos. Por que a média global de abortos está em queda, segundo este relatório. Jornal Nexo. 06/07/2018. Disponível em https://www.nexojornal.com.br/expresso/2018/03/28/Por-que-a-m%C3%A9dia-global-de-abortos-est%C3%A1-em-queda-segundo-este-relat%C3%B3rio. Acesso em 10/10/2019.
[72] DE LIMA, Juliana Domingos. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[73] DE LIMA, Juliana Domingos. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[74] EXAME. Aborto clandestino é drama para mais de meio milhão de mulheres no Brasil. Abril. Publicado em 25/09/2018. Disponível em https://exame.abril.com.br/brasil/aborto-clandestino-e-drama-para-mais-de-meio-milhao-de-mulheres-no-brasil/. Acesso em 10/10/2019.
[75] EXAME. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[76] EXAME. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[77] DINIZ, Debora; MEDEIROS, Marcelo, e MADEIRO, Alberto. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[78] DINIZ, e MADEIRO. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[79] NAÇÕES UNIDAS DO BRASIL. Especialistas da ONU pedem fim da criminalização do aborto em todo o mundo. Publicado em 28/09/2018. Conteúdo disponível em https://nacoesunidas.org/especialistas-da-onu-pedem-fim-da-criminalizacao-do-aborto-em-todo-o-mundo. Acesso em 10/10/2019.
[80] NAÇÕES UNIDAS DO BRASIL. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[81] NAÇÕES UNIDAS DO BRASIL. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[82] VARELLA, Drauzio. A questão do aborto. Portal Drauzio Varella. 06/05/2019. Disponível em https://drauziovarella.uol.com.br/drauzio/artigos/a-questao-do-aborto-artigo/ Acesso em 10/10/2019.
[83] VARELLA, Drauzio. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[84] BLOWDER, Ana Paula, e PAINS, Clarissa. Quem são as mulheres que respondem na Justiça pelo crime de aborto. O GLOBO. Publicado em 01/08/2018, atualizado em 05/02/2019. Disponível em https://oglobo.globo.com/sociedade/quem-sao-as-mulheres-que-respondem-na-justica-pelo-crime-de-aborto-22938237. Acesso em 10/10/2019.
[85] Ibidem. Acesso em 10/10/2019.
[86] BLOWDER, Ana Paula, e PAINS, Clarissa. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[87] Ibidem. Acesso em 10/10/2019.
[88] Ibidem. Acesso em 10/10/2019.
[89] BLOWDER, Ana Paula. ‘É um ciclo perverso’, diz defensora sobre mulheres negras e pobres serem as mais criminalizadas por aborto. O GLOBO. Publicado em 01/08/2018, atualizado em 02/08/2018. Disponível em https://oglobo.globo.com/sociedade/e-um-ciclo-perverso-diz-defensora-sobre-mulheres-negras-pobres-serem-as-mais-criminalizadas-por-aborto-22938193. Acesso em 10/10/2019.
[90] CASSERES, Lívia apud BLOWDER, Ana Paula. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[91] CASSERES, Lívia apud BLOWDER. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[92] BLOWDER, Ana Paula, e PAINS, Clarissa. Op cit. Acesso em 10/10/2019.
[93] CORTÊZ, Natacha. 30 mulheres respondem por crime de autoaborto em SP; médico é quem denuncia. UOL. Publicado em 28/09/2017. Disponível em https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2017/09/28/processadas-por-autoaborto-30-mulheres-respondem-pelo-crime-em-sp.htm?cmpid=copiaecola. Acesso em 11/10/2019.
[94] PRATA, Ana Rita apud CORTÊZ, Natacha. Op cit. Acesso em 11/10/2019.
[95]ALONSO, Matilde; CASSERES, Lívia; CASTRO, Mariana; CUNHA, Beatriz; DE MATTOS, Ricardo; REBELLO, Arlanza. Entre a morte e a prisão – Quem são as mulheres criminalizadas pela prática do aborto no Rio de Janeiro. Defensoria Pública Geral do Estado do Rio de Janeiro – DPGE. Rio de Janeiro. 2018. p. 21/22.
[96] ALONSO, Matilde; CASSERES, Lívia; CASTRO, Mariana; CUNHA, Beatriz; DE MATTOS, Ricardo; REBELLO, Arlanza. Op cit. 2018. p. 169.
[97] Ibidem. 2018. p. 170.
[98] Ibidem. 2018. p. 170.
[99] Ibidem. 2018. p. 170/171.
[100] Ibidem. 2018. p. 171.
[101] ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Nações Unidas, 217 (III) A. 1948. Paris. Disponível em https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2018/10/DUDH.pdf. Acesso em 29/10/2019. p. 01.
[102] Ibidem. 1948. Acesso em 29/10/2019. p. 04.
[103] Ibidem. 1948. Acesso em 29/10/2019. p. 02.
[104] ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. Op cit. 1948. Acesso em 29/10/2019. p. 04.
[105] GRIFFIN, James apud TONETTO, Milene Consenso. O direito humano à liberdade e a prática abortiva brasileira. Revista bioética. Florianópolis/SC. 2018. Disponível em http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_informativo/bibli_inf_2006/Rev-Bio%C3%A9tica_v.26_n.1.07.pdf. Acesso em 30/10/2019. p. 59.
[106] Ibidem. 1948. Acesso em 29/10/2019. p. 05.
[107] TONETTO, Milene Consenso. Op cit. Acesso em 30/10/2019. p. 62.
[108] GRIFFIN, James apud TONETTO, Milene Consenso. Op cit. Acesso em 30/10/2019. p. 59/60.
[109] NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. Direitos Humanos das Mulheres. A equipe das Nações Unidas no Brasil. 2018. Disponível em https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2018/08/Position-Paper-Direitos-Humanos-das-Mulheres.pdf. Acesso em 30/10/2019. p. 17.
[110] NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. Op cit. Acesso em 30/10/2019. p. 17.
[111] PIOVESAN, Flávia. O que são Direitos Reprodutivos? Revista digital Universidade Livre Feminista. 2009. Disponível em https://feminismo.org.br/o-que-sao-direitos-reprodutivos/523/. Acesso em 31/10/2019.
[112] PIOVESAN, Flávia. Op cit. Acesso em 31/10/2019.
[113] Ibidem. Acesso em 31/10/2019.
[114] DREHMER, Raquel. Pílula, DIU, camisinha… Existe método anticoncepcional 100% seguro? Revista M de Mulher. Ed. Abril. Publicado em 24/08/2018. Disponível em https://mdemulher.abril.com.br/saude/pilula-diu-camisinha-existe-metodo-anticoncepcional-100-seguro/. Acesso em 31/10/2019.
[115] PODGAEC, Sérgio apud DREHMER, Raquel. Op cit. Acesso em 31/11/2019.
[116] DE LIMA, Juliana Domingos. Direito reprodutivo e sexual das mulheres: a posição do país na ONU. JORNAL NEXO LTDA. Publicado em 28/03/2019. Disponível em https://www.nexojornal.com.br/expresso/2019/03/28/Direito-reprodutivo-e-sexual-das-mulheres-a-posi%C3%A7%C3%A3o-do-pa%C3%ADs-na-ONU. Acesso em 02/11/2019.
[117] Ibidem. Acesso em 02/11/2019.
[118] Ibidem. Acesso em 02/11/2019.
[119] DE LIMA, Juliana Domingos. Op cit. Acesso em 02/11/2019.
[120] NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. Aborto seguro é direito de todas as mulheres, dizem especialistas da ONU. Publicado em 27/09/2017. Disponível em https://nacoesunidas.org/aborto-seguro-e-direito-de-todas-as-mulheres-dizem-especialistas-da-onu/. Acesso em 02/11/2019.
[121] NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. Op cit. 02/11/2019.
[122] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 1ª Turma afasta prisão preventiva de acusados da prática de aborto. Notícias STF. 29/11/2016. Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=330769. Acesso em 04/11/2019.
[123] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[124] BARROSO, LUÍS ROBERTO apud BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 124.306-RJ. Impetrante: Jair Leite Pereira. Coator: Supremo Tribunal de Justiça. Relator: Min. Marco Aurélio. Votante: Luís Roberto Barroso. 29 de novembro de 2016. Disponível em http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/HC124306LRB.pdf. Acesso em 04/11/2019. p. 06.
[125] BARROSO, LUÍS ROBERTO apud BRASIL. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[126] RUA, Maria das Graças apud GONÇALVES, Luamary Silveira de Carvalho Spalla,; RANGEL, Tauã Lima Verdan. A institucionalização do aborto como Política Pública? Uma reflexão à luz do princípio da dignidade da pessoa humana e dos direitos sexuais e reprodutivos. Jornal Jurid. 19/10/2018. Disponível em https://www.jornaljurid.com.br/doutrina/constitucional/a-institucionalizacao-do-aborto-como-politica-publica-uma-reflexao-a-luz-do-principio-da-dignidade-da-pessoa-humana-e-dos-direitos-sexuais-e-reprodutivos. Acesso em 04/11/2019.
[127] BRASIL ESCOLA apud GONÇALVES, Luamary Silveira de Carvalho Spalla,; RANGEL, Tauã Lima Verdan. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[128] SMITTER, Phillippe apud GONÇALVES, Luamary Silveira de Carvalho Spalla,; RANGEL, Tauã Lima Verdan. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[129] GONÇALVES, Luamary Silveira de Carvalho Spalla,; RANGEL, Tauã Lima Verdan. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[130] AMARAL, Ney apud GONÇALVES, Luamary Silveira de Carvalho Spalla,; RANGEL, Tauã Lima Verdan. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[131] FERRAZ, Claudio. A descriminalização do aborto deve ser pensada como política pública, não discussão religiosa. JORNAL NEXO LTDA. 09/08/2018. Disponível em https://www.nexojornal.com.br/colunistas/2018/A-descriminaliza%C3%A7%C3%A3o-do-aborto-deve-ser-pensada-como-pol%C3%ADtica-p%C3%BAblica-n%C3%A3o-discuss%C3%A3o-religiosa. Acesso em 04/11/2019.
[132]BERGAMO, Karolina. Para evitar a gravidez indesejada, planejar é preciso. Revista Saúde. Ed. Abril. 31/10/2018. Disponível em https://saude.abril.com.br/medicina/para-evitar-a-gravidez-indesejada-planejar-e-preciso/. Acesso em 04/11/2019.
[133] SALES, Carolina apud BERGAMO, Karolina. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[134] SALES, Carolina apud BERGAMO, Karolina. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[135] FERRAZ, Claudio. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[136] FERRAZ, Claudio. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[137] BOUERI, Aline Gatto. Portugal, Espanha e Uruguai: o que aconteceu após a legalização do aborto?. Gênero e Número. 11/09/2018. Disponível em http://www.generonumero.media/portugal-espanha-e-uruguai-o-que-aconteceu-apos-legalizacao-do-aborto/. Acesso em 05/11/2019.
[138] BOUERI, Aline Gatto. Op cit. Acesso em 05/11/2019.
[139] Ibidem. Acesso em 05/11/2019.
[140] Ibidem. Acesso em 05/11/2019.
[141] GONÇALVES, Luamary Silveira de Carvalho Spalla,; RANGEL, Tauã Lima Verdan. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[142] PINTO, Thiago Ferrare apud GONÇALVES, Luamary Silveira de Carvalho Spalla,; RANGEL, Tauã Lima Verdan. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[143] PORTAL DA SAÚDE apud GONÇALVES, Luamary Silveira de Carvalho Spalla,; RANGEL, Tauã Lima Verdan. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[144] PORTAL BRASIL apud GONÇALVES, Luamary Silveira de Carvalho Spalla,; RANGEL, Tauã Lima Verdan. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[145] CRISÓSTOMO, Laina. Aborto como direito humano. Justificando. 11/07/2018. Disponível em http://www.justificando.com/2018/07/11/aborto-como-direito-humano/. Acesso em 04/11/2019.
[146] CRISÓSTOMO, Laina. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[147] CRISÓSTOMO, Laina. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[148] DA ROCHA, Maria Isabel Baltar. A discussão política sobre aborto no Brasil: uma síntese. Revista Brasileira de Estudos de População, v.23, n.2, São Paulo. Publicado em 06/11/2006. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-30982006000200011&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em 04/11/2019.
[149] CRISÓSTOMO, Laina. Op cit. Acesso em 04/11/2019.
[150] BRASIL. Op cit. Acesso em 07/10/2019.