Sumário: 1. A guerra e seu objetivo; 1.1 A Guerra Justa; 2. Apontamentos sobre a idéia de justiça; 3. O direito internacional; O papel do Direito Internacional Humanitário; O conflito Israel x Palestina; 4.1 Uma análise do conflito Israel x Palestina à luz da idéia de Justiça; Considerações finais; Referências bibliográficas.
Resumo: O presente trabalho tem como objetivo abordar a Guerra como forma de resolver conflitos internacionais, fundamentando-se na idéia do Justo e no senso de Justiça. Justifica-se tal objetivo pela pretensão de análise do conflito Israel x Palestina, se este é realmente necessário e legitimado naquela sociedade, com base nos mais renomados pensadores do Direito, a exemplo de Osvaldo Ferreira de Mello, Calera e Del Vecchio.
Resumen: El actual trabajo tiene tan objetivo para acercar a la guerra como forma para decidir a los conflictos internacionales, basándose en la idea de apenas y el sentido de la justicia. Tal objetivo para el pretension del análisis del conflicto Israel x Palestina se justifica, si esto es realmente necesario y legitimated en esa sociedad, en base de los pensadores más famosos de la derecha, del ejemplo de Osvaldo Ferreira de Mello, de Calera y de Del Vecchio.
Palavras-chave: justiça – guerra – guerra justa – conflitos armados – direito internacional – direito internacional humanitário
Introdução
Apesar da ciência apresentar em seus livros o histórico da “evolução” do homem inicialmente primitivo, este, por muitas vezes persiste em agir de maneira irracional, retornando aos tempos da “autotutela” e da conquista forçada de território.
Entre as mais diversificadas maneiras de solucionar os litígios entre Estados, a guerra ainda é vista como uma opção na “imposição” ou “defesa” de interesses, na maioria das vezes, econômicos.
Para justificar a utilização de tal meio como forma de resolução de conflitos, surge a “guerra justa”, a qual possibilita os conflitos armados em determinadas situações.
Assim, há que se analisar a idéia que se tem sobre a Justiça, bem como se as guerras que ainda perduram em pleno século XXI são realmente legitimadas pela sociedade.
Desta forma, busca-se com este trabalho refletir sobre a justiça proveniente da guerra, fazendo uma abordagem sobre o conflito entre Israel X Palestina, no Oriente Médio.
1. A guerra e seu objetivo
O homem é um ser vaidoso por natureza, uma vez ofendido, procura se vingar. Mas, nem sempre tal vingança anseia pela morte do adversário, sendo que na maioria das vezes, basta o cativeiro do inimigo para o vingador se “reafirmar como homem”.
São pelas idéias mencionadas que Hobbes se utiliza da expressão homo homini lupus[1] para explicar este estado infeliz da natureza humana, considerando ainda que nem sempre o mais forte vence pela força física, mas pela astúcia.
Nas suas origens, a guerra se caracterizava pela ausência de qualquer regra para além da lei do mais forte. As populações vencidas eram massacradas e, na melhor das hipóteses, reduzidas à escravidão.
Pode-se dizer que a guerra é um dos institutos jurídicos mais antigos, considerando que desde as primeiras civilizações desenvolvidas no Vale Fértil[2] já existiam registros de conflitos entre tribos pequenas. Com o passar do tempo e com o desenvolvimento das nações, os conflitos ganharam maiores proporções, trazendo drásticas conseqüências à sociedade.
Quando os Estados não se submetiam à jurisdição do Império Romano, vencidos, acabavam por ter cidades completamente destruídas, acarretando um grande número de mortes, principalmente de mulheres e crianças.
Os conflitos religiosos também podem ser considerados “alavancas da guerra”, a exemplo das tensões no Oriente Médio.
Apesar de Estados saírem vitoriosos após uma guerra, o desenvolvimento pós-guerra é muito lento, pois o prejuízo por conta dos conflitos armados é de grande monta, resultando em vastas áreas de terra inutilizadas, sem recursos naturais e humanos, dificultando o repovoamento da região afetada.
Na atualidade, para a conceituação de guerra é importante reconhecer a existência de duas vertentes, a subjetivista e a objetivista. Na primeira é necessário o animus belligerandi, ou seja, só há guerra quando existe vontade intrínseca de concretizá-la. Já na segunda vertente, o estado de guerra ocorre através da prática dos atos de guerra, independentemente da intenção de manifestá-la[3].
Pode-se considerar tecnicamente a guerra como o conflito armado entre os seus sujeitos, havendo a exigibilidade de que destes decorra o animus de submeter o outro às suas aspirações e interesses.
Salienta-se ainda que toda guerra é um conflito armado, sendo que a recíproca não é verdadeira, ou seja, existiram conflitos armados no século XX sem que houvesse guerra.
Para o direito internacional, o conflito armado internacional é definido pelas Convenções de Genebra de 1949 como abrangendo a “guerra declarada” ou “qualquer outro conflito armado”. O Protocolo I de 1977 acrescenta como pertencendo a esta categoria os conflitos armados em que os povos lutam contra a dominação colonial e a ocupação estrangeira e contra os regimes racistas, no exercício do direito dos povos à autodeterminação […].
O termo guerra é distinto de retorsão e represália não armada. Já restou abordado o entendimento sobre guerra, sendo que retorsão é a aplicação de medidas coercitivas pelo Estado ofendido ao Estado ofensor[4], restando às represálias a compreensão de medidas ilegais decorrentes da violação dos direitos de um Estado frente ao outro.
Existe o entendimento de que guerra é um conceito político jurídico daquilo considerado como guerra pela sociedade, pois esta acaba por ser vítima, sendo grande o número de civis que restam traumatizados, mutilados ou mortos por conta dos conflitos armados localizados, que também acarretam a miséria e a fome pelas medidas econômicas e coercitivas, impostas pela sociedade internacional.
A guerra sempre foi considerada relevante para os Estados, pois servia e ainda serve como meio de “resolver” seus litígios e defender seus interesses, porém, ao longo do tempo, observou-se a necessidade dos beligerantes preservarem seu potencial humano e o respeito às normas de outros Estados, evoluindo a uma tomada de consciência que ainda se processa.
1.1 A Guerra justa
Desde a Antigüidade Clássica a guerra já era justificada, principalmente pelos argumentos religiosos provenientes do Cristianismo e do Islamismo. Acreditava-se que o homem combatente era corajoso e virtuoso, com fidelidade ao dever e ao espírito de sacrifício.
Vários conceitos tomaram forma naquela época, a exemplo do direito de asilo, imunidade de agentes diplomáticos, respeito e proteção dos lugares sagrados, assim como várias outras regras de comportamento dos beligerantes no campo de batalha.
Nesta época a guerra era fundamentada pelo sagrado, sendo lhe dado um caráter divino, ou seja, era por vontade de Deus que o inconsciente da coletividade ocasionava a guerra e, apesar disto, era assegurada a “humanização” dos recursos utilizados. Assim, tratava-se da guerra justa e da guerra injusta como forma de classificação, sendo possível, dessa maneira, avaliar os efeitos e impactos de um ato internacional de beligerância para os Estados e também para a sociedade.
Em Roma, uma guerra era considerada justa quando defendesse: o território romano, a não violação ou insulto aos embaixadores romanos, a não violação de tratados firmados com Roma e o apoio a uma nação amiga de Roma.
Com o entendimento de guerra justa e injusta, proclamou-se a inviolabilidade das igrejas e templos religiosos, resguardando os pobres, agricultores, peregrinos, mercadores e seus bens, constituindo assim as regras da Paz de Deus, cuja sanção era a excomunhão.
A igreja se pronunciou sobre a guerra no final do século IV, por Santo Agostinho, considerando injustas as guerras que visassem a destruição, vingança ou a busca do poder, ao contrário da guerra justa que era caracterizada pela busca da paz e se limitaria a uma causa nobre.
Mais tarde, já no século XIII, Tomás de Aquino entendia como justa a guerra que buscasse a reparação de um ilícito, buscasse o bem comum e fosse declarada pela autoridade competente.
No século XVI, Maquiavel defendia que a necessidade transforma a guerra em justa, ensejando a idéia de que a guerra seria o último recurso a ser buscado pelos povos. Nesta época, eram legítimas as guerras que defendessem a autonomia dos Estados, sua segurança e a manutenção da ordem jurídica.
Aos príncipes da Idade Média, Guerra Justa era aquela empreendida pelo Estado na tutela de seus interesses e, assim comunga Rosseau que entende a guerra como sendo uma relação entre Estados que se opõem e não entre homens em sua individualidade.
Até a primeira metade do Século XX a guerra foi considerada lícita, fundamentada pelo jus in bello[5] e, conforme Rezek, qualquer das partes poderia estar dominada por um estado de obediência a um mandado Divino, o que justificaria o conflito.
No caso dos judeus, estes sempre procuravam uma solução amigável para os conflitos e a guerra era sempre a última alternativa, sendo admitida apenas na luta de reconquista da Terra Prometida e não para outros territórios.
Importantes doutrinadores como Hobbes e Kant entendiam que a guerra é o estado de natureza, havendo sempre a existência de hostilidades entre os povos. Ainda, é de se salientar que Kant, ao contrário de Hobbes, defendia que o estado de paz ao menos pode ser cultivado pelo esforço do homem, conforme demonstra em seu artigo intitulado A paz perpétua[6].
Em 1625 era o entendimento de Hugo Grócio de que a guerra devia não ser apenas justa, mas regulada pelo Direito, o qual deveria estabelecer parâmetros à guerra como condição objetiva.
Ainda nos dias atuais a guerra é admitida, sendo a terminologia guerra justa muito utilizada, porém, fazendo referência aos dispositivos legais que tratam da legítima defesa real e da luta pela autodeterminação de um povo contra a dominação pelo outro.
Diante da guerra justa, evidenciam-se as regras de proteção às suas vítimas como um dever moral, sendo importante salientar que o Direito Internacional Humanitário se utiliza, além de outras bases jurídicas, das convenções de Haia[7] e Genebra[8], as quais permitem maior proteção às vítimas e efetiva limitação aos meios de execução da guerra.
2. Apontamentos sobre a idéia de justiça[9]
Não há como falar sobre guerra justa sem que haja um estudo sobre a categoria Justiça, esta que é objeto de reflexão desde a antigüidade, quando grandes filósofos do Direito já discutiam sobre o que seria realmente o justo e como o Direito se legitimaria a partir do referente Justiça.
Um dos pensadores que deu importância ao estudo da Justiça foi Del Vecchio, filósofo do Direito que procurava a construção do conceito de Direito e do ideal jurídico, com sensibilidade à realidade humana e ao sentimento de justiça pelo homem.
Outro estudioso do Direito é Calera, o qual reflete sobre a necessidade de legitimação social do Direito, já que este constitui um condicionante da liberdade do homem e da sociedade.
Calera entende que só é legítimo o Direito que viabiliza a realização da Justiça[10], pois se não fosse assim haveria somente submissão social ao Direito através do uso da força ou simplesmente por conduta passiva dos indivíduos.
Infelizmente, não é de hoje que o poder jurídico se sujeita ao poder econômico, o que dificulta a atuação do Direito na promoção de mudanças sociais, realizando “ideais de Justiça”.
Outro renomado doutrinador que merece destaque é Höffe, o qual entende a Justiça como instrumento de crítica ética da dominação. Este autor entende que não pode haver uma separação absoluta entre o Direito e a Moral, mas apenas relativamente, na perspectiva da dogmática jurídica.
No entendimento de Höffe, é necessário que os princípios de Justiça sejam positivados para que tenham efetividade, levando em consideração as condições sócio-históricas que constantemente sofrem alterações, o que deve ser ajustado pelas diversas fontes do Direito.
Através da Política Jurídica o Direito deve ser avaliado com proposições de transformação, essas que sejam necessárias para a realização das demandas da Justiça, conforme nos ensina Ferreira de Mello. Ainda, tal autor salienta que a vida do Direito é uma luta de povos, do Estado, das classes e dos indivíduos, sendo que a compreensão do justo e do injusto aflora a consciência humana a partir dos desafios provocados pelas reais condições de existência dos homens.
A Filosofia do Direito tem papel fundamental para a compreensão da Justiça e dos conceitos de justo e injusto, pois enquanto ela realiza a crítica da legitimidade e racionalidade do Direito a partir do referente Justiça, a Ciência Jurídica compreende e interpreta o sistema jurídico vigente.
O Estado pode representar um instrumento de regulação do egoísmo humano. Del Vecchio afirma isso e entende que as instituições positivas são frutos da consciência do homem, sendo que a evolução do Direito Positivo faz-se exatamente pela oposição entre o direito vigente e as aspirações da consciência jurídica dos cidadãos.
A relação do Direito com a Moral se estabelece por esta caracterizar-se como um conjunto de normas de comportamento humano ou conjunto de valores aceitos e defendidos pelos homens. Calera ensina que o direito justo é o que está em relação com os valores fundamentais que portam os homens, pois consideram este mundo dos valores como o que lhes é próprio.
O Direito tem que contribuir na resolução dos graves e históricos problemas sociais, relativos principalmente à liberdade e às desigualdades sociais, inclusive com relação aos choques entre Estados. Sendo assim, considera-se a Guerra e os conflitos armados grandes problemas não só sociais em níveis mundiais, mas também jurídicos.
A Justiça tem significado teórico interdisciplinar que, conforme Höffe, demanda a cooperação tanto da filosofia quanto das ciências particulares e apresenta também uma dimensão prática referida aos problemas sociais e políticos de cada tempo.
Quando se pensa em Justiça, esta deve ser abordada e estudada não apenas enquanto categoria teórica, mas no dia-a-dia, em sua aplicabilidade dentro da sociedade, e neste caso podemos falar em Estados, instituindo-se no desejo destes em possibilitar progresso, segurança e a paz comum.
Nossa herança é anti-humana, segundo Max Neef, fruto de muito egoísmo e da falta de solidariedade entre os homens. Por este motivo existe a ameaça à vida no planeta a depredação dos recursos naturais, a poluição ambiental, a miséria, a fome, a pobreza e, conseqüentemente as guerras, estas que estão presentes no início e no final de todo este processo decadente.
Conforme o entendimento de Dias, o direito não pode mais ser pensado apenas enquanto técnica de regulação coercitiva da vida social, pois esta não se constitui somente de ordem, organização e razão, mas também de afeto, sensibilidade, desordem, rupturas, caos. Não há como expurgar a sombra da luz; todos estes elementos convivem numa relação dialética de complementaridade. E o Direito, cujo sentido de ser é ser para a sociedade, deve em sua constituição considerar todos estes elementos.
Dessa maneira, considerando que o Direito se caracteriza como elemento de humanização do homem na medida em que garanta a justiça nas relações sociais, econômicas e jurídicas, assegurando a estética da convivialidade humana, é necessário que se resgate a reflexão ética sobre o justo, o útil e o legítimo.
3. O direito internacional
As relações externas dos atores que compõem a sociedade internacional[11] são reguladas através do Direito Internacional, que era conhecido pelos romanos como ius gentium[12].
O direito romano nos trouxe a figura do pretor peregrino, o qual era responsável pela aplicação do ius gentium aos estrangeiros, apesar de que a Igreja influenciava em muitas decisões, inclusive relacionadas ao direito internacional.
A igreja contribuiu para o surgimento de três institutos importantes para o direito internacional, como a Paz de Deus[13], a Trégua de Deus[14] a Guerra Justa[15].
Na vertente interna da soberania[16], o Estado está acima dos demais sujeitos de direito, impõe a ordem jurídica interna e garante sanção no caso de sua violação, já na vertente externa[17], o Estado está em pé de igualdade com os demais Estados soberanos[18], os quais constituem a sociedade internacional.
No caso de violação a tratados internacionais, a sanção depende dos demais Estados, estes que atuam sob a égide do pacta sunt servanda[19].
Ao longo de sua história, o Direito Internacional veio constantemente ocupando espaço no “mundo jurídico”, sendo criada no século XX a Sociedade das Nações e a ONU[20].
Os Estados soberanos são os sujeitos do Direito Internacional, bem como as organizações internacionais e a Santa Sé, restando ao indivíduo uma discussão doutrinária sobre a sua inclusão como tal.
Além de população, território e governo, para que o Estado seja considerado pessoa internacional, deve ser soberano. Pode um Estado se associar a outro, através de ato internacional, sob forma de organização internacional.
São fontes básicas do Direito Internacional os tratados, o costume e os princípios gerais do direito. Entre tais fontes, não há qualquer hierarquia.
Quanto aos princípios que regem o direito internacional, pode-se destacar o da boa-fé, não regressão, solução pacífica de controvérsias, continuidade do Estado, autodeterminação dos povos, entre outros tão importantes.
3.1 Direito Internacional Humanitário
O Direito Internacional Humanitário é um ramo do Direito Internacional Público que abarca normas sobre os problemas que surgem a partir das guerras e dos conflitos armados.
Dentre as normas mais importantes que protegem as vítimas da guerra e que constituem o Direito Internacional Humanitário, têm-se as quatro Convenções de Genebra do ano de 1949, já mencionadas no item 1.1. Tais convenções possuem dois protocolos adicionais que foram elaborados no ano de 1977.
Também há que se destacar o Direito de Haia que, também já mencionado, é alicerçado nas Convenções de Haia do ano de 1899, as quais tratam do direito de guerra propriamente dito.
Os direitos humanos não são esquecidos nas chamadas regras de Nova Iorque, estas que também servem de base para o instituto do Direito Internacional Humanitário.
Toda esta proteção surgiu pela necessidade dos beligerantes preservarem o potencial humano, levando à criação de normas escritas que contribuíram para o desenvolvimento deste ramo do Direito.
Assim, regras e princípios foram sendo considerados ao longo do tempo, permitindo com que vidas humanas fossem preservadas. A exemplo, pode-se citar que: a) Uma vez rendido, é proibido matar o adversário; b) Os não combatentes têm direito à preservação de suas vidas; c) Feridos e doentes devem ser socorridos pela cruz vermelha; d) As garantias judiciárias fundamentais são asseguradas; e) Os métodos e meios de guerra são limitados; f) Os beligerantes devem distinguir e preservar a população civil; Enfim, o direito humanitário resguarda a vida e o valor humano, evitando retrocesso ante as conquistas viabilizadas pelas regras consuetudinárias.
É necessário que todos os Estados envolvidos nas guerras e conflitos armados participem das convenções, considerando ainda que a solidariedade e a neutralidade se entrelaçam através da Carta da ONU. Alguns Estados soberanos resistem em participar de guerras, sendo considerados como neutros[21].
Durante as duas grandes guerras mundiais, vários princípios foram consagrados no que tange à neutralidade, sendo que no Brasil, foi em 1854 que ocorreu a primeira declaração formal, na guerra entre a França e a Inglaterra.
4. O conflito Israel x Palestina
No Oriente Médio as tensões são constantes, não só pela sua localização geográfica, mas pelos mais diversos fatores, dentre eles, o cultural.
Berço das religiões foi em território palestino que se originou o judaísmo e o islamismo, arraigado fortemente até nos dias atuais.
O elevado potencial econômico, as jazidas de petróleo e a importância religiosa atraem a atenção dos mais diversos países, que acabam sofrendo as conseqüências pelos conflitos regionais entre árabes palestinos e judeus israelenses.
A criação do Estado de Israel e o não reconhecimento do Estado Palestino intensifica os impasses entre estes povos, cuja raiz de tal desentendimento se encontra na intolerância do povo romano com o judaísmo ainda no início da era cristã.
Foi durante a Idade Média que a Palestina, também conhecida como Canaã dos judeus, foi ocupada por povos árabes, chamados palestinos. Porém, no século XIX, sob o domínio dos turcos e pelo movimento sionista, os judeus retornam à palestina, objetivando edificar nesse território o Estado judeu.
No século XX, os britânicos buscaram enfraquecer a comunidade árabe e tirar vantagem daquela região estratégica para a economia mundial, sendo que a crise na região se agravou com a presença de dois povos sem a delimitação das áreas de assentamento.
Apesar de tudo, ainda devem ser consideradas as diferenças culturais que deram maior amplitude às hostilidades. Não só para os judeus, mas também para os cristãos e muçulmanos, Jerusalém é um lugar sagrado.
Na divisão do território Palestino, Israel ampliou seus domínios em 75% dos limites da antiga Palestina, assim o ódio entre os povos Israelense e Palestino ampliou consideravelmente, gerando uma situação conflituosa ainda mais complexa.
4.1 Uma análise do conflito Israel x Palestina à luz da idéia de Justiça
Quando ouvimos falar nos conflitos do Oriente Médio, em especial no que diz respeito a Israel e Palestina, já nos lembramos dos ataques cruéis em que inocentes são mortos e cidades são bombardeadas.
Seria possível pensar em Direitos Humanos e em Direito Internacional Humanitário quando o ser humano se encontra dominado por um sentimento de violência e sacrifício? Na abordagem ao longo do texto, foi possível verificar que a razão dos conflitos entre Israel e Palestina vão muito além do território.
Em 18 de maio deste ano, o site Pravda[22] divulgou a seguinte notícia:
“A Força Aérea de Israel matou ontem seis pessoas em quatro ataques aéreos contra alvos do grupo extremista palestino Hamas. As ações israelenses agravam a crise de segurança em Gaza, em meio aos confrontos entre os rivais Hamas e Fatah. A ofensiva de Israel é uma resposta aos mais de 50 foguetes vindos de Gaza que atingiram a cidade israelense de Sderot nos últimos três dias. Os ataques foram lançados depois que o país ameaçou dar uma “resposta severa” aos repetidos lançamentos de foguetes […]ao conflito entre palestinos e israelenses: não é possível saber qual dos dois está com a razão, pois ambos têm reivindicações legítimas, ambos são vítimas e também perpetradores de terrorismo”.
A guerra tem como objetivo “resolver” os litígios entre Estados e defender seus interesses, mas, como é possível acreditar que em um conflito que se arrasta por séculos existe a possibilidade de tais litígios serem solucionados? Seria uma “guerra justa” o combate entre grupos terroristas rivais por uma disputa cujo objeto já se perdeu ao longo do tempo?
Pensa-se que a questão Israel x Palestina é cultural, consuetudinária e que está longe de ser solucionada, pois a idéia de justiça para os combatentes ainda está na fase do Talião, do homem “virtuoso” nos campos de batalha.
É muito provável que não exista interesse em cessar fogo, até porque as vítimas e a pessoa humana não apareceram diante da fumaça do egoísmo e ambição dos beligerantes. Já dizia Max Neef que nossa herança é anti-humana e que há falta de solidariedade.
Como ficam os ensinamentos dos ilustres pensadores do Direito, a exemplo de Del Vecchio, em meio a tanta barbárie? Não é possível identificar sensibilidade à realidade humana, tampouco ao sentimento do justo quando pessoas mutilam outras, quando cidades são explodidas, crianças mortas, enfim, naquele território ainda não foi possível processar a idéia de Justiça.
Em que momento podemos dizer que os povos do Oriente Médio, em especial os israelenses e palestinos, legitimam os conflitos armados para viabilizar a Justiça de Calera?
O justo está intimamente relacionado à satisfação do homem, à saciedade da alma, à felicidade, alegria, não é possível pensar o justo mediante foguetes, bombas e terrorismo.
O papel do Direito internacional e do Direito internacional humanitário vai muito além da mera normatização, pois são legítimos e fundamentais para pensar a Política Jurídica em nível internacional, considerando não só a situação cultural, mas jurídica dos Estados beligerantes.
Considerações finais:
Não há possibilidade alguma de relacionar Justiça com Guerra, se esta não for realmente legitimada pela sociedade. Em se tratando dos conflitos armados existentes no nosso planeta, percebe-se que os meios já não justificam mais os fins, isto porque não se sabe mais qual será o fim.
A afirmação supra se dá pela análise do caso Israel X Palestina, cujo objeto se perdeu no tempo e então, não se pode mais afirmar porque pessoas morrem, cidades são destruídas, enfim, não há mais preocupação com o ser humano nesse cenário internacional, uma vez que entre os povos as razões são hereditárias e complexas.
De modo geral, os interesses econômicos dos Estados beligerantes acabam por prevalecer quando a situação é crítica, principalmente em casos de vítimas anônimas e sujeitas ao preconceito e egoísmo humano.
Por maior que seja o esforço do Direito Internacional e Humanitário, é visível o desinteresse de diversas parcelas da sociedade em pôr fim aos desentendimentos religiosos, culturais, econômicos e sociais que levam inocentes a morte.
Repensar o ideal de Justiça entre os beligerantes proporcionando segurança, paz, ordem e felicidade é papel de toda a comunidade internacional, legitimando suas aspirações no Direito Positivo e sempre à luz da Política Jurídica.
Referências bibliográficas
Notas:
Informações Sobre o Autor
Ana Selma Moreira
Mestranda em Ciência Jurídica na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, Pós-Graduada em Direito Processual Civil, Advogada e Professora Universitária.