A Nova Lex Mercatoria entre a mundialização e a pós-modernidade

Resumo: A Nova Lex Mercatoria, direito das relações mercantis internacionais, representa ponto em comum nas ciências Economia e Direito, envolve quase todas as questões existentes, pois  é inerente à produção em escala global. A nova Lex Mercatoria implica em transformações na estrutura do poder a nível mundial, permitindo que os particulares emitam normas para reger suas relações à nível internacional (caráter de normatividade), assim como  a interferência de instituições, associações de categorias, organizações não governamentais,  internacionais ou intergovernamentais em questões internas dos Estados ( caráter de paranormatividade). Esse Direito surge como manifestação de indignação dos soberanos privados, já que os Estados não conseguem regular com a mesma eficiência, velocidade e tecnicidade que os próprios participantes do comércio internacional, essa postura representa uma reconciliação com o papel que os mercadores sempre tiveram durante toda história das trocas e os colocam em uma posição privilegiada na hierarquia do poder no cenário mundial.[1]


Palavras-chave: Economia; Mercado; Poder


Abstract: The New Law Merchant, the law of international trade relations, represents  common point between the sciences Economy and law, involves almost everything, since it is inherent in the production on global scale. The new Law Merchant implies changes in the world´s power structure, allowing individuals to issue rules to govern their relations in the international level (normative character), as well as the interference of institutions, associations of categories, non-governmental, international and intergovernmental organizations in the internal affairs of States (paranormativ character). This law comes as a the private sovereign´s manifestation of indignation of, since the states can not regulate with the same efficiency, speed and technicality that the participants of the international trade by themselves, this position represents a reconciliation with the role that the merchants have always had throughout the history of trade and put them in a privileged position in the hierarchy of power on the world stage.


Keywords: Economy, Market, Power


Sumário: Globalização e mundialização. Pós-modernismo. Direito e pós-modernidade. Nova Lex Mercatoria. Conclusão. Referências.


Globalização e Mundialização


Os termos “globalização” e “mundialização” são termos empregados como sinônimos, mas deveriam ser utilizados para aludir a fenômenos diferentes. Embora em português geralmente não haja diferenciação desses termos, verifica-se que ambos diferem pelo próprio significado, ainda que ambas as palavras derivem de termos latinos, “Global” de “globus”, que significa globo, bola, esfera, pelotão (de soldados); massa enquanto Mundo deriva de “mundus” que corresponde a universo mundo; firmamento; a terra.[2] Deve-se promover discussões e reavaliações sobre o uso desses termos na língua Portuguesa para melhor aproveitamento semântico dos mesmos, tal como já se faz em outros idiomas[3].


A palavra “Mundialisation”, em francês ou “Mundialization” em inglês pode ser utilizada tanto em francês como em inglês com mesmo significado de “Globalisation“, ainda que com ressalvas, pois “Globalisação” refere-se principalmente à fenômeno econômico, social  e “Mundialização”[4] à uma organização política, legislativa e jurídica à nível mundial. Portam significados antagônicos em uma analise aprofundada, ainda que ambos sejam  empregados para descrever fenômenos internacionais, planetários.


O termo “Mundialização” de origem e uso Francês surgiu quando cidades ou autoridades começaram a se declarar cidadãs mundiais por votação de uma carta de sensibilização dos problemas mundiais, assim como seu senso de dividir responsabilidade pela solução dos mesmos assumindo para si direitos e deveres, “Os requerimentos da Mundialização será não estar satisfeitos com as obrigações dos tratados internacionais ou disposições aos quais faltam a força da lei.[5]


O fenômeno que conhecemos como globalização tem seus efeitos de Integração mundial devido e visando a aceleração das trocas, do desenvolvimento das técnicas de informação e de comunicação, além dos meios de transporte. Acarretam-se inovações, destruições, criações, aculturações…, esse fenômeno é gerador de processos complexos de transformação da realidade social, cultural, dos comportamentos e valores.


O termo globalização difere-se de processos de integração já ocorridos, pois, refere-se ao processo de aprofundamento da integração econômica, social, cultural, política, que ocorre atualmente gerando principalmente a integração financeira à nível mundial[6]. ”Globalização” teve sua origem na literatura destinada às firmas multinacionais. Trata-se, portanto, da ideologia do império do mercado mundial, da ideologia do neoliberalismo. (André-jean Arnauld, 2006).


Hodiernamente no capitalismo destacam-se os grandes agentes financeiros, que promovem considerável mudança na produção de riqueza, e muito mais devido o fato de ao fazê-lo adquirem poder não só econômico, mas político.


A Globalização está relacionada à nova Lex Mercatoria uma vez que ambas são promovidas pela Societas mercatorum a expansão e desenvolvimento de ambas está atrelado, e por vezes podem levar ao movimento, na maioria das vezes reacionário, de mundialização, isto é uma regulamentação à nível mundial. Quanto maior o volume de trocas, transações, atuações a nível global inter Estados maiores são os atentados contra a soberania Estatal “A globalização é o conjunto dos “processos em cujo andamento os Estados nacionais vêem a sua soberania, sua identidade, suas redes de comunicação, suas chances de poder e suas orientações sofrerem a interferência cruzada de atores transnacionais”[7]


Com a idéia de aldeia global[8], “Um aspecto crucial da globalização é a emergência de um sistema mundial[9] -, a idéia de que o mundo constitui uma única ordem social[10]” mas não há centralização planetária do poder, ausência de uma organização jurídica mundial[11], surge então o instrumento nova Lex Mercatoria, eficiente à regular relações no ambiente internacional, direito consuetudinário formado pelo esforço conjunto das corporações, Estados, instituições internacionais e intergovernamentais.


PÓs-Modernismo


A questão da superação da Modernidade tem sido muito debatida, uma vez que as ciências atualmente divergem muito sobre o assunto, alguns afirmam que a pós-modernidade já se faz presente enquanto outros a negam. Há ainda autores que se referem ao momento vivenciado por outros termos. A própria pós-modernidade é pouco consciente de si mesma, seus parâmetros de compreensão não são seguros, de modo que se utiliza o termo pós-modernismo para se descrever o momento contemporâneo de perturbações, estremecimentos que atingem a vida cotidiana, a capacidade de avaliar filosófica e criticamente estes tempos.


No campo do direito é difícil tecer afirmações devido o niilismo marcante da atualidade e por não ter haver ruptura brusca com o modernismo “não há um direito pós-moderno, há, sim, reflexão jusfilosófica pós-moderna, questionadora dos paradigmas do direito moderno, mas incapaz ou desinteressada em apresentar modelo alternativo, real, fatível.” [12] O termo pós-modernidade é utilizado para descrever uma realidade na qual está inserida a Nova Lex Mercatoria, assim como esses elementos perturbadores da ordem jurídica.


 André Jean Arnauld[13] contrasta a modernidade com o período evidenciado atualmente e assevera que da Abstração passa-se ao pragmatismo; do Subjetivismo ao Descentramento do Sujeito; do Universalismo ao Relativismo; da unidade da razão à pluralidade de racionalidades; da Axiomatização às lógicas estilhaçadas; da simplicidade à complexidade; da sociedade civil/ Estado ao Retorno da Sociedade Civil e da Segurança ao Risco.


Da abstração passa-se ao Pragmatismo, aquela se baseia em construções axiomáticas, isto é conclusões obtidas através de um postulado inicial, um axioma, uma verdade tomada por absoluta que possibilita deduções de outras verdades. A abstração está ligada aos axiomas universalistas, isto é,  todos os homens conhecem as leis naturais imutáveis que lhes é inerente, logo a lei está gravada no âmago do indivíduo sendo ela herdada por todos.


É fundamental a compreensão de três tendências para uma análise da ótica pós-moderna: o Universalismo, o Pragmatismo e o Relativismo. O primeiro trata-se de idéia etnocentrista, com vestígios do antigo direito natural de origem grega, o universalismo[14] nos remeta à idéia de que a filosofia ocidental seria válida universalmente, emanando do subjetivismo, ideologia que prega que o sujeito esta no centro do mundo, e por conseqüência é foco do Direito.


O principal aspecto do subjetivismo extraído pelos juristas é o caráter de imutabilidade e de ser próprio ao ser humano, de estar atrelado às regras elementares que presidem as relações jurídicas, regras que, por conseqüência, são aplicadas universalmente, já que o sujeito, independente do lugar que esteja mantém gravado no seu coração os princípios fundamentais do direito.


Há atualmente uma ruptura com a idéia de universalismo como conceito-chave da filosofia jurídica e política, devido o fato de haver erosão dos conceitos nos quais o universalismo se baseia (como por exemplo, a imposição do pragmatismo e enfraquecimento da axiomatização e abstração) e visto que a presente diversificação dos direitos é tão intensa que se torna difícil identificar todos os produtos da natureza do indivíduo, centro da regulação social e jurídica.


O pragmatismo[15] atinge a crença na verdade, o conhecimento, fazendo com que haja um movimento de reflexão sobre o universalismo, o subjetivismo, a abstração, pois para o movimento universalista são possíveis verdades universais, eternas, imutáveis enquanto que sob ótica pós-moderna não é possível atingir a verdade. A pragmática[16] que se inaugura é do atentado privado contra o público “À pragmática moderna é à supremacia do interesse público em face do interesse privado, que poderia marcar a pragmática do direito público, opõe-se a autonomia da vontade, identificadora de modelos exegéticos de direito privado.”[17]


Do universalismo caminha-se para o relativismo, pois os valores são relativos, tendem a variar conforme cada cultura, ideologia, política, até mesmo de indivíduo para indivíduo de modo que “Não há mais qualquer noção de “bem” ou “mal”, de “certo” ou “errado”, de “belo” ou “feio” que seja aceita sem contestações por uma parcela significativa de uma nação ou de uma sociedade. ”(Arbex júnior, José, 1957- mundo pós-moderno. P. 7.) Mesmo o valor justiça é tomado por relativo “Chaїm Perelman em seu ensaio sobre a justiça, não admite que esta seja um valor absoluto, mas relativo e impassível de ser definido pelo conhecimento; o valor é relativo e depende da crença de cada qual.” (Bittar, Eduardo Carlos Bianca. Curso de Filosofia do Direito, 2007 p.464), o relativismo do direito é reconhecido inclusive por Hans Kelsen[18].


O Universalismo possui fundamentos e concepções advindos do direito natural, surgido na Grécia, segundo o qual os homens portam em seu âmago leis naturais imutáveis, que são inerentes a todos os seres humanos, havendo, portanto um conjunto de direitos mínimos herdados por todos os povos. Fundamentam-se também as idéias universalistas no subjetivismo, que afirma que a idéia do sujeito é que projetaria o objeto, logo o sujeito está no centro do mundo e por conseqüência no centro do direito. Por se tratarem de idéias imutáveis inerentes a todos os sujeitos essas regras constatadas de forma universal.


O não reconhecimento de verdades inerentes do ser humano leva ao relativismo, posto que, já que não há uma verdade universal há somente verdades particulares, “O pós-modernismo jurídico insiste que as interpretações autorizadas são oferecidas a partir de ponto de vista particular, com vistas a fim particular, de modo que não haveria significado último e definido de um texto” [19], nítida conseqüência do desacreditamento de verdades absolutas postas até então.


O que é eterno é imutável e também universal, essa ordem universal, eterna e imutável pode ser atingida através do conhecimento considerado genuíno ou a sabedoria, não se poderia atingir a mesma pela reconciliação ou por acordo entre opiniões (Bauman, 2001, Pag. 55). Nega-se o reconhecimento de verdades imutáveis, eternas, universais já que não se reconhece verdades, conhecimentos e sabedorias universais, o niilismo[20] “proclamou a indeterminação da verdade, que deixa de ser fato e passa a conceito. A verdade é construída, mutável, manipulável. A verdade é interpretada, criada escondida, produzida, alterada. A verdade não detém estabilidade.”[21] Reforça-se o relativismo já que nada seria imutável, permanente, absoluto ao passo que emerge uma visão de que o direito é relativo, ligado à relatividade do lugar, época, cultura e moral dos indivíduos.


Da axiomatização às lógicas estilhaçadas, por aquela se demonstrava, construía teorias a partir de um postulado inicial, um axioma, que tomado por verdade possibilitava deduções e inferências de outras verdades. Os postulados axiomáticos  possibilitaram a concepção de uma ordem jurídica em forma piramidal,  modelo que passa a ser questionado e apresentam-se novas representações, como a do ordenamento jurídico em forma de rede, de teia o que melhor representaria a existência da variedade de lógicas, já que o Direito surge de grupos de pressão, da negociação[22], não há uma unidade lógica, a conseqüência do desacreditamento do universalismo é a rejeição da razão una[23].


As lógicas estilhaçadas fazem-se presentes na ciência jurídica devido o fato de que o papel dos conselheiros, interpretes, assessores, grupos de pressão se tornam mais intensos, assumindo campos que até então eram apenas restritos pelo legislador, como não é possível “eleger” uma verdade somente, já que o discurso niilista esvazia o discurso da “verdade”, reconhece-se que verdade não há, sobram somente opiniões, conselhos diversos cada qual com sua própria razão, sua lógica.


Parte-se da segurança ao risco, a sociedade global lida com o risco, porquanto a própria ciência e a técnica estão tão desenvolvidas que se ignora o risco, não se consegue apurar precisamente os riscos. A contribuição de Ulrich Beck através da obra a sociedade do risco, é de fundamental para a compreensão da realidade contemporânea, já que expõe sobre mudanças na configuração da sociedade, em razão do desenvolvimento industrial e tecnológico, onde a questão central é a repartição do risco.


 Beck expõe sobre a tolerância ao risco ao tratar da energia nuclear versus o aquecimento global somado as altas do preço do petróleo[24], assim como Eros Roberto Grau, ao tratar da perseguição a todo custo pela redução do custo da produção[25], de fato o risco é algo inerente da sociedade atual. Mesmo os encarregados de garantir a segurança (Estado, Ciência e Indústria) expõem a humanidade à situações de risco cujas medidas de segurança estão para surgir.


Da simplicidade parte-se para a complexidade, que reside na eliminação das certezas[26], pois o que possibilita que o direito seja sólido é o universalismo, o subjetivismo e a atemporalidade do direito, o que leva a eliminação do risco, a segurança já que as regras são redigidas para serem perpétuas. A complexidade se impõe com o pragmatismo, o relativismo, o descentramento do sujeito, o pluralismo de racionalidades fontes e lógicas, a coexistência de sistemas alternativos ou informais e não-oficiais de regulação jurídica (cada um com sua racionalidade).


Direito e Pós-Modernidade


Não há sistematização pós-moderna do direito, devido o “seu niilismo, o pós-modernismo jurídico é abstração filosófica, especulação teórica, agitação intelectual, negativismo conceitual, anarquia moral, ambigüidade ética.” [27] Mas verifica-se certas características que surgem daquelas perturbações.


Atualmente a lei encontra obstáculos devido à imensa diversificação dos direitos humanos, o que torna difícil identificar todos como produtos da natureza do individuo, “Fala-se cada vez mais, em nome dos direitos humanos, não tanto de direitos do indivíduo do que de direitos sociais, de direitos das minorias ou dos grupos específicos.” [28]. O direito é pragmático, um “direito negociado” editado pela autoridade legítima, mas elaborado grupos interessados (negociação entre técnicos e grupos representativos), o que faz com que o direito se distancie da certeza e simplicidade.


Com pragmatismo, a relativização, o direito “negociado” faz com que as diversas culturas e grupos de pressão passem a requerer que a norma lhes mais favorável. O tempo torna-se relativo em relação aos princípios, que não são mais considerados inerentes ao homem, logo não mais “eternos”. Considera-se somente o tempo presente e conseqüentemente rompe-se com a vocação para a perpetuidade dos princípios, enfraquece-se a axiomatização e fragiliza-se a idéia de codificação. Dessa forma o neoliberalismo apresenta a lei do mercado como substituta às leis, hora tidas por eternas e imutáveis.[29]


Essa lógica faz não ser mais o “público” a colonizar o “privado”, mas o inverso, “é o privado que coloniza o espaço público, espremendo e expulsando o que quer que não possa ser expresso inteiramente, sem deixar resíduos, no vernáculo dos cuidados, angústias e iniciativas privadas.” [30] De forma que a esfera publica necessite de defesa contra a privado, para viabilizar a liberdade individual.


Além desses distúrbios se lida a policentricidade das fontes do direito, o direito oficial aceita vias alternativas de regulação jurídica, contrapondo-se à monocentricidade e à ordem jurídica piramidal defendida pelo corrente positivista legalista. Faz-se presente cada vez mais a presença e participação de terceiros auxiliando na produção normativa. Observa-se a iniciativa de grupos interessados, tanto à nível interno como externo do Estado[31].


A nova Lex Mercatoria porta diversas das características expostas, a relatividade já que as partes convencionam sua aplicação, não é um direito universal aplicável a todos; o pragmatismo, é voltada a superar obstáculos do comércio internacional, ferramenta desenvolvida com finalidade exclusiva de superar dificuldades e controvérsias mercantis; por surgir do Mercado, das instituições diversas cada qual com sua razão e não do Estado lhe confere uma pluralidade de racionalidades, lógicas fragmentadas; o risco, pois passa pela nova Lex Mercatoria as questões referentes à produção global.


nova Lex mercatoria


Pode-se fazer dois tipos de leitura da Nova Lex Mercatoria, uma interna, tomando-se o viés dos operadores jurídicos, visualizada principalmente na doutrina de direito internacional privado e outra leitura externa que seria a leitura sob ângulo sócio-cultural, filosófico, econômico.


Através da leitura externa da nova Lex Mercatoria[32] tem-se um conceito diferente do habitualmente apresentado pela doutrina de direito internacional, que se restringe ao conceito legal. Sob aquela ótica a nova Lex Mercatoria está no centro do sistema produtivo global, logo toda a produção passa por ela, Juan Ramón Capella classificou o gênero em quatro espécies, a saber: Acordos sobre políticas públicas, Acordos de normatização técnica, acordos de Produção, Acordos de repartição de Mercado. Essa classificação permite que se visualize a interferência da societas mercatorum em praticamente todas as questões econômicas, políticas, sociais, através da nova Lex Mercatoria.


Os acordos sobre políticas públicas são decisões que versam sobre política econômica, laboral, militar, ecológica, informação e de educação pelo soberano Supra-estatal. Constata-se a intervenção dos agentes detentores de poder econômico a nível internacional sobre os Estados de modo a interferir nas decisões internas de um país, através de pressões para produção normativa, realização de reformas e investimentos[33].


Quando se trata de acordos que visam pautar sobre políticas públicas ferramentas como o soft-power e a nova Lex Mercatoria se confundem de modo que ambas portam em si enunciados normativos baseados nas regras, usos, costumes e princípios de direito internacional, além provém principalmente de instituições internacionais e intergovernamentais e aquém provém da societas mercatorum, mas ocorre que as instituições internacionais e a societas mercatorum se confundem já que o soberano supra-Estatal influi naquelas, logo enunciados da Lex Mercatoria estão sempre presentes na soft-law.


Os acordos de normatização técnica versam sobre questões de normatização e uniformização de padrões que anteriormente era encabeçada pelos Estados e agora assumida pelos entes privados de acordo com a lógica e política econômica dominante. Acordos que versam sobre Padrões, estabelecimento de regras, diretrizes, ou características acerca de um material, produto, processo ou serviço. Esses acordos produzem normas referentes à questões de grande importância tais como matrizes energéticas, indústria da informática, telecomunicações, biogenética, engenharia genética, Indústria mecânica, suprimentos, Indústria farmacêutica, a comunidade médica (prescrições médicas, uniformidade de drogas, norma técnica da droga), “padrões de referência”, à exemplo o quilo-grama-padrão e inúmeras outras questões.


Acordos de produção ocorrem devido à constante inovação tecnológica, essencial para humanidade que dela depende e constante ameaça para os grandes agentes produtores mundiais. O simples ato de investir ou deixar de investir em certas tecnologias pode ser fatal às corporações[34], logo essas recorrem aos acordos para produzir e comercializar os novos inventos de forma escalonada, por passos, e para rentabilizar as mercadorias que incorporam avanços que já são intermediários ou até obsoletos, antes mesmo de serem produzidos, com tempo para sua introdução e retirada dos mercados já totalmente planificados[35].


O papel da Lex Mercatoria de substituição da concorrência faz com que a nível global, os soberanos supra-estatais exerçam a planificação e obsolescência das mercadorias assim como a substituição da liberdade do mercado pelos acordos de produção e planejamento, deixando claro que há muito já não há liberdade de mercado e que as novas tecnologias das quais a humanidade depende são selecionadas minuciosamente de acordo com o interesse do soberano supra-estatal.


Os acordos de divisão de mercados são realizados com base nos resultados demonstrados pela teoria dos jogos e equilíbrio de Nash. Um jogo é uma situação em que vários agentes tomam suas decisões cujo resultado estará atrelado, não provem de uma decisão isolada, mas de um conjunto de decisões de vários sujeitos. Desta forma a nova Lex Mercatoria está diretamente ligada à teoria dos jogos, uma vez que o resultado, os efeitos dos contratos firmados entre os jogadores, isto é as multinacionais, agentes produtores mundiais dependerá do conjunto de decisões de cada jogador, tais como respeitar ou não o contrato firmado entre eles.


Os acordos de divisão de mercados e de produção como conjunto de estratégias devem ser vistos como um equilíbrio de Nash, que representa uma situação em um jogo envolvendo jogadores em que esses nada têm a ganhar, em nada haverá aumento dos ganhos com a mudança repentina em sua estratégia individualmente. Por esses acordos as multinacionais podem acordar a divisão dos mercados existentes no planeta evitando a competição direta de forma a maximizar seus lucros, ou ainda excluir Estados que se recusam a realizar reformas nas legislações trabalhistas, tributárias, reformas do poder judiciário de acordo com as exigências postas.


Pela leitura interna faz-se uma definição para a nova Lex Mercatoria, mais restrita ao campo jurídico, atrelada aos estudos de direito internacional[36], de conjunto de costumes, princípios e regras a-nacionais desenvolvidas pelo comercio internacional através dos contratos internacionais tipo (constituída de fato,  de modelos de cláusulas e de contratos internacionalmente uniformes), condições gerais de compra e venda, Condições gerais do Conselho de Assistência Econômica Mútua (COMECON), Inconterms e de leis modelo uniformes[37], com influência dos tratados internacionais em destaque os multilaterais (GATT e OMC) e os constitutivos de blocos regionais, de  práticas, de códigos privados, de princípios aplicados em sede de arbitragem[38] comercial internacionalmente elaborados  pelos sujeitos privados independentes e com vocação universal[39], (como exemplos – UNIDROIT, câmara de comercio internacional  ICC, Associações de categorias (exemplo London Trade Corn Association, International General Produce Association) e comissões de estudo sobre unificação e uniformização e em geral as organizações não governamentais ONGs) e Organizações internacionais ou intergovernamentais OIGs (por exemplo –UNCITRAL, OEA).


Grande parte da discussão sobre a nova Lex Mercatoria passa pela sua natureza Jurídica, tema gerador de grande divergência[40]que levou à distinção de teorias, que visam melhor compreendê-la. Essa classificação se dá em três tendências, a saber: teoria da massa legal, teoria do ordenamento jurídico e a teoria Hibrida, posicionamentos majoritários da doutrina. [41]


A primeira teoria, da massa legal é a teoria mais conservadora reduz a nova Lex Mercatoria ao mesmo nível da sua antecessora, de conjunto de princípios e regras consuetudinárias, espontaneamente referidos ou elaborados nas relações internacionais, sem suporte nem coerção bem como regras uniformes aceitas, cumprindo o papel de fonte do direito,


Em seu conceito Amaral assevera, de forma condizente com essa doutrina, que “o Direito provém do Estado, sendo inconcebível imaginar-se norma jurídica dele não originada nem seu suporte de coerção.” [42]


Francesco Sbodorne assevera que a doutrina defensora desta teoria vê na nova Lex Mercatoria uma massa legal de princípios sem nenhuma consistência interna ou qualidade sistemática, fenômeno que se remete à antiga Lex Mercatoria ou do ius commune. A nova Lex Mercatoria, opera entre uma realidade caracterizada pela divisão política dos mercados em uma pluralidade de Estados; sua função é superar a descontinuidade jurídica. Por essa nova Lex Mercatoria se dissolvem tanto os particularismos jurídicos das codificações quanto, fenômeno ainda mais significativo, a diferença entre o civil Law e o Common Law.


A segunda teoria, do ordenamento jurídico, sustenta a natureza jurídica de ordenamento jurídico autônomo da nova Lex Mercatoria, mesmo pelo próprio histórico da comunidade mercadora, o direito do comercio sempre regeu suas relações de forma independente, perdendo somente essa característica na era das codificações. A nova Lex Mercatoria para essa corrente se afirma como um terceiro sistema entre a lei domestica e a lei internacional publica sendo ordenamento jurídico autônomo a-nacional aplicável, inter pares[43], e adstrito ao âmbito aplicativo das relações comerciais internacionais (de forma subjetiva à societas mercatorum), isto é o espaço transnacional, o campo das relações internacionais, substitui o “território” convencional.[44]


Como direito seria produto de fora do poder do Estado e às vezes em contradição com esse, já que o direito Estatal é assegurado pelo poder político do Estado, enquanto que o direito da Lex Mercatoria é assegurado pelo poder econômico da comunidade do comercio internacional.


A nova Lex Mercatoria seria aceita como ordenamento das relações comerciais internacionais com base no argumento de que aquela tem efetividade aplicativa (devido espontânea observação ou por aplicação em sede de arbitragem); possui transparência e previsibilidade, as decisões formam uma “jurisprudência privada” que possibilitam previsões sobre os resultados das controvérsias e cria soluções para controvérsias futuras; auto-sancionamento, o descumprimento gera descrédito comercial, exclusão por aplicação de sanções, impossibilidade de recorrer Lex Mercatoria futuramente, etc.). Assim estariam presentes na nova Lex Mercatoria características essenciais à um ordenamento jurídico, acessibilidade, previsibilidade, independência.[45]


A classificação da nova Lex Mercatoria como ordenamento jurídico encontra serias críticas ao passo que a mesma é reduzida à um conjunto unitário de regras, devido o fato de a mesma ser um sistema jurídico fragmentário somado à desomogeneidade dos sujeitos envolvidos na sua produção e a impossibilidade de se individuar os elementos fundadores de um ordenamento consuetudinário levam a rejeição da nova Lex Mercatoria como ordenamento jurídico.


Verifica-se que há certa precaução por parte dos estados nacionais quanto ao reconhecimento da nova Lex Mercatoria, esses através de seus ordenamentos jurídicos mantém um controle dos critérios regulatórios que o mercado emite, de modo a se evitar uma extremada mercantilização da sociedade, a identificação e exaurimento dos direitos civis e humanos com aqueles econômicos.


A importância da arbitragem para a Lex Mercatoria é mais exaltada nesta corrente, pela cláusula contratual “pactum de lege utenda (ou ferenda)”  [46], as partes convencionam uma lei nacional para reger o contrato, assim como balizar a arbitragem caso ela seja necessária, dessa forma o foro eleito deverá aplicar a lei eleita. A arbitragem pode ser elemento da nova Lex Mercatoria, sendo pactuada por convenção arbitral, clausula arbitral ou compromissória, porém essa não tem sua produção e existência limitada em razão daquela.


Já a terceira teoria, chamada de Hibrida nega que a nova Lex Mercatoria seria um ordenamento jurídico autônomo, assim nega-se que a mesma teria enforcement e nem mesmo self-enforcement, não prescindindo a indicação de um ordenamento ou juiz arbitral para que mesma tenha efetiva aplicação “impositiva” caso ocorra falta espontânea de atuação. Destarte a nova Lex Mercatoria, segundo a concepção que a reconhece como um sistema hibrido, não seria manejável sem um ordenamento jurídico que lhe desse suporte.


Para a teoria hibrida a Lex Mercatoria são normas de proveniência extra-estatais, usos do comercio internacional, legislações internacionais (convenções, leis uniformes), integrados de princípios gerais do direito e se mantém sempre ancorada, direta ou indiretamente, aos ordenamentos jurídicos nacionais. Sustenta-se que é essa “ancoragem” principal aspecto levantado pela teoria hibrida. Esse sistema “hibrido” tem por conseqüência a mudança dos conteúdos das normas nacionais e internacionais[47] quando em contato com ele.


Para essa teoria a nova Lex Mercatoria não é ordenamento autônomo nem massa de regras indeterminadas, ela estaria apoiada no Estado, adentra ao sistema judiciário e gera modificações, enunciados, interpretações. A nova Lex Mercatoria é a base para a reforma do judiciário, e pode ser extraída das decisões judiciais.  


Conclusão


A nova Lex Mercatoria está relacionada à globalização e às contribuições pós-modernas e é de grande importância para compreensão das reformas do poder judiciário e as relações de poder fundamentadoras do direito.


Das Classificações apresentadas a teoria híbrida é a que possibilita uma boa compreensão da proporção, da extensão e as implicações do fenômeno. A partir da análise dessa teoria, constata-se que a Lex Mercatoria serve de base para reformas dos Estados[48], para aproximar os ordenamentos jurídicos eliminando divergências[49] e fazer do judiciário instrumento previsível, eficiente e transparente de eliminação de riscos, assegurador de cenário mais favorável para investimentos e de expansão da economia e riqueza.


As instituições[50] freqüentemente utilizam do Soft-power[51] para formatar o Estado de acordo com o mercado, visualiza-se um “dialogo”, entre Banco mundial e os Estados, em que o banco aconselha o poder judiciário à proporcionar resoluções de conflitos transparentes e igualitárias para aprimorar a qualidade e eficiência da Justiça, fomentando um ambiente propício ao comércio e investimentos[52]. A resposta do Estado é a emenda constitucional de nº 45, “todos têm direito à razoável duração do processo”, em que se acatou a diretriz do Mercado, que surge do cálculo econômico que considera o fator essencial para atividades econômicas, o tempo. A preocupação de que o elemento tempo não seja óbice às atividades produtivas fez o judiciário protegê-lo constitucionalmente como garantia fundamental.


Os detentores do poder econômico mundial usam deste poder para assumir a função normativa até então exercida quase exclusivamente pelos Estados. Essa função é propriamente dita normativa quando se manifesta com o surgimento da nova Lex Mercatoria e paranormativa quando os Estados são levados a sedimentarem em seus ordenamentos jurídicos os valores condizentes com a nova Lex Mercatoria sugeridos pelas instituições internacionais. Manifestações dos agentes econômicos mundiais que deixam clara a intenção por parte dos mesmos de assumir forte presença normativa à nível global.


 


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Notas:

[1] Trabalho orientado pelo Prof. Amilcar Douglas Packer.

[2] Bussarello, Raulino – Dicionário Básico Latino-Português, 6. Ed., 3. reimpressão – Florianópolis: Ed. Da UFSC, 2005.

[3] As a term, mundialization is, as I said, often used in the same manner as globalization but it has different roots and so carries different connotations and denotations. Both words are Latin in origin. Globalization refers to the globe, to the shape of globe and hence, with regard to the earth, to the shape of the earth.

3 In-Suk Cha; The Mundialization of Home in the Age of Globalization: Toward a Great Community; Seoul National University – Mudialization comes from the Latin word, mundus, or, in English, world, and as such it refers to far more than spatial dimensions or geographic confines. When we speak of “our world,” we usually mean the manners and customs, ideas, language and the like which are in our particular community or communities of reference. It is not geographic at all, though place may be a part of it.

[4]Mundialização é um movimento expressando a solidariedade das populações do globo e o desejo de estabelecer instituições e leis supranacionais de uma estrutura federativa comum aos mesmos, ao passo que se respeita a diversidade das culturas e povos.

O movimento de Mundialização advoga por uma nova organização política governando toda a humanidade, envolvendo a transferência de certas partes da soberania nacional a uma autoridade federativa mundial, Governo federativo mundial e Corte federativa mundial. A autoridade seria capaz de resolver, por decisões majoritárias, os problemas os quais em que o futuro do homem, assim como fome, água, guerra, manutenção da paz, poluição e energia. O Presidente do governo mundial deve ser eleito pelos cidadãos por voto direto (presidencialismo). Disponível em: < http://fr.wikipedia.org/wiki/Mondialisation> data de acesso dia 28 de Fevereiro de 2010. (tradução nossa)

[5]The requirements of mundialization will not be satisfied with the obligations of international treaties or agreements that lack the force of law. Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Mundialization>. Acesso em: 10 de Junho de 2010. (tradução nossa)

[6]A “globalização” decorre da terceira Revolução Industrial – informática, microeletrônica e telecomunicações-, realizando-se como “globalização financeira”.

É isso que efetivamente surge de novo, a “globalização financeira”, que permitiu que o dinheiro deixasse de ser, definitivamente, um mero intermediário da troca entre valores de uso, exercendo uma função própria, como propõe a formula de Marx, D-M-D.

O que agora se vê nos mercados financeiros internacionais é D-D, e não D-M-D. O dinheiro dobra-se sobre si mesmo, na esperança “de uma reprodução hermafrodita da riqueza abstrata”. – GRAU, Eros Roberto – A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e Crítica) 13ª edição revisada e atualizada. p.53.

[7]GIDDENS, 1998: 100. apud Arnauld, André-jean & Junqueira, Eliane Botelho (organizadores). Dicionário da globalização, Direito e Ciência Politica. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. Pag. 224.

[8] O processo de “globalização” representa um atentado, uma grande perturbação com o modo de pensar e de agir ligado à “modernidade”. A progressão da unificação do mundo, leva à formação da chamada aldeia global, um processo percebido com nitidez crescente neste ciclo. Os espaços tradicionalmente reservados à política e ao Direito já não coincidem mais com o espaço territorial dos Estados nacionais, já quanto à cultura o modo de pensar os hábitos, como expõe Boaventura Santos Souza há de se falar em localismos globalizados, bem como de globalismos localizados.

[9]A tendência do direito é de seguir esse movimento globalizador “um direito global extrapola largamente as fronteiras do Estado Nacional para buscar suas fontes também fora dele: desde os tratados multilaterais (…) até as normas emanadas dos organismos internacionais (…), passando pela rica jurisprudência dos entes jurisdicionais internacionais” SUNFELD, 1998: 157-158; 164. apud Arnauld, André-jean & Junqueira, Eliane Botelho (organizadores). Dicionário da globalização, Direito e Ciência Politica. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. Pag. 224.

[10]GIDDENS, 1997: 868. apud Arnauld, André-jean & Junqueira, Eliane Botelho (organizadores). Dicionário da globalização, Direito e Ciência Politica. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. Pag. 223.

[11]Nenhum Estado nação seria mais ou menos soberana que a outra, o que faz com que haja um hiato normativo à nível mundial, o que possibilita que os atores internacionais exerçam a governança global: “Na realidade, com a globalização, o direito está em mutação. De uma parte, a cultura jurídica anglo-americana da Common Law invade os espaços submetidos a este processo: mercados, finanças, blocos regionais, justiça internacional, direitos humanos… De conformidade com a tradição anglo-saxônica, o direito global é, cada vez mais produzido prioritariamente pela tradição (a jurisprudência intervém supletivamente). De outra parte, a maioria das medidas na escala planetária é tomada pelos governos dos países centrais, pelas empresas transnacionais, por instituições inacessíveis e habitualmente suspeitas de falta de transparência, como FMI, o Banco Mundial, o G7-G8, a OMC. Eis o que é na prática quotidiana, o direito global.” – Arnauld, André-jean & Junqueira, Eliane Botelho (organizadores). Dicionário da globalização, Direito e Ciência Politica. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. Pag. 225

[12] Godoy, Arnaldo Sampaio de Moraes. O pós-modernismo jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2005. Pag. 117

[13] Arnauld, André-jean. O direito entre modernidade e globalização : lições de filosofia do direito e do Estado; tradução de Patrice Charles Wuillaume. – Rio de Janeiro : Renovar, 1999.

[14] As conseqüências desse universalismo permearam toda a ciência jurídica inclusive o direito comercial “on peut donc dire que jusqu´a la première Guerre mondiale, le droit du commerce internacional, limité dans les techniques qu´il utilisait, techniques empruntées au seul droit internal privé, semblait porter en lui un potentiel d´universalisme ilimité.” Loussouarn e Bredin Apud  Strenger, Irineu. Direito Interncaional Privado. – 6. Ed. São Paulo: LTr, 2005. Pag. 795.

[15]O pragmatismo é concepção filosófica proposta por pensadores americanos, seu surgimento se deu no final do século XIX e inicio do século XX. Atribui-se a criação dessa filosofia aos pensadores estadunidenses Charles Sanders Peirce, Williams James e John Dewey, contribuíram cada um para a criação de uma filosofia pragmática, Pierce: “em vez de dizer que você quer saber a ‘Verdade’, você deve dizer que quer alcançar um estado de crença inatingível pela duvida” (Pierce, 1905, p. 279de Hartsshorne e weiss) acrescentando “A opinião que está destinada a ser, em ultima analise, aceita por todos aqueles que investigam é o que entendemos por ‘verdade’ e o objeto representado nessa opinião é o real” (Pierce, 1878, p.55 de Schimit), James contribui: “idéias verdadeiras” “são idéias que podemos assimilar validar, corroborar e verificar. Idéias falsas são aquelas com as quais não podemos [fazer isso]” e mais “A verdade de uma idéia não é uma propriedade estática inerente a ela. A verdade ocorre a uma idéia. Ela torna-se verdadeira, é feita verdadeira pelos eventos. Sua veracidade é, de fato, um evento, um processo: o processo de sua valid-ação” (James, 1907, p.60).

[16]A principal característica da filosofia pragmática reside no modo que a mesma trata o problema da ‘verdade’, a atitude pragmática consiste em “parar com baboseira, limpar o terreno e concentrar-se no que interessa do ponto de vista prático” (Lynch, 2004, p.61); é uma espécie de filosofia para engenheiros. Pode ser difícil perceber o quanto esta atitude pode ser utilizada no problema da verdade, mas Michael Lynch oferece uma analogia muito útil com a filosofia moral (lynch, 2004, p. 66). Para os utilitaristas, quando você tem uma escolha quando ao fazer, a ação moralmente certa é aquela que leva à maior felicidade. Assim, o ‘certo’ é definido em termos de ‘felicidade’, a maximização da felicidade é construtiva do ser certo. Da mesma forma, para um pragmatista, quando você tem uma escolha quanto ao que acreditar , a crença verdadeira é aquela que traz o maior beneficio prático, aquela que é mais útil – e a utilidade tem varias formas. Assim o ‘verdadeiro’ é definido em termos de utilidade – é a sua utilidade que torna uma crença verdadeira. (Observe que, no espírito viril do pragmatismo, deixamos de falar de proposições – por ser demais fantasioso – e passamos a falar em crenças.) (mas isto é somente uma fachada, porque mesmo que crenças fossem estados físicos do cérebro, é o conteúdo de um estado-crença, isto é uma proposição que é verdadeira ou falsa.) – Goldstein, Laurence – Lógica: conceitos-chave em filosofia /Laurence Goldstein, Andrew Brennan, /Max Deutsch, joe Y. F. Lau. ; tradução Lia Levy. – Porto Alegre : Artmed, 2007. p 88.

[17]Godoy, Arnaldo Sampaio de Moraes. O pós-modernismo jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2005. P. 117

[18] Sendo um valor relativo à justiça ‘e passível de varias acepções, varias ao sabor das preferências, tendências, bem como das culturas, das ideologias, das políticas, devendo ser admitido que o valor absoluto de justiça não é palpável para o homem. Aliás, Platão mesmo, em suas investigações, torna clara a verdadeira natureza da justiça, que é transcendente e inacessível para os homens.

Kelsen, O que é justiça? A justiça, o direito e a política no espelho da ciência, 1998, p. 23-25 Apud Bittar, Eduardo Carlos Bianca & Almeida, Guilherme Assis de. Curso de Filosofia do Direito. – 5. Ed. – São Paulo: Atlas, 2007. Pag. 465.

[19]Godoy, Arnaldo Sampaio de Moraes. O pós-modernismo jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2005. Pag. 126.

[20]A crítica aos direitos naturais, tomados como ilusórios, é referenciada em Nietzsche, que negava a existência de leis imutáveis na natureza; a constatação dessas normas seria mera leitura interesseira dos eventos. Interpretações são criações humanas. A verdade não é encontrada. A verdade é feita; não existem fatos eternos; assim como não existem verdades absolutas – Godoy, Arnaldo Sampaio de Moraes. O pós-modernismo jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2005. Pag. 139.

[21]Godoy, Arnaldo Sampaio de Moraes. O pós-modernismo jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2005. Pag. 123.

[22]“como a variada multidão de conselheiros, interpretes e assessores assume cada vez mais as tarefas previamente reservadas aos legisladores, não é de surpreender que os críticos que desejam ser instrumentais na atividade de emancipação lamentam sua privação.” – Bauman, Zygmunt; tradução, Plínio Dentzien. Modernidade líquida. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001, Pag. 59. Que vai ao encontro de Godoy, que afirma: “A noção de autor, que poderia ser aproximativa de legislador, assume conteúdo prático de espaço significação distorcida, repleto de ruídos, que se presta a limitar o jogo livre das plurissignificações. Não se admite interpretação vinculada a centro referencial único e de validade universal. O que é um autor? A pergunta é de Foucault, para quem provavelmente o autor tende a desaparecer, na medida em que se valoriza a importância de quem fala. Mas outros problemas há, inseridos no contexto reflexivo de morte do autor.” Godoy, Arnaldo Sampaio de Moraes. O pós-modernismo jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2005. Pag. 124.

[23]O modernismo jurídico construiu-se com base na realização da razão no universo normativo. De Descartes a Kant tinha-se razão como faculdade universal pronta para articular conjunto de institutos verdadeiros e coerentes. A concepção de código, por exemplo, ou as justificativas conceituais da ratio decidendi no construído pragmático da common Law, sintetizam essa entronização da racionalidade, como vetor constitutivo do direito moderno. O pós modernismo rejeita essa razão e assim vê-se assumidamente em ponto antípoda ao modernismo jurídico. A rejeição da razão significa, em planisfério mais sociológico, a negação da estrutura do direito burguês. – Godoy, Arnaldo Sampaio de Moraes. O pós-modernismo jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2005. Pag. 121.

[24]LE MONDE. L’énergie nucléaire relancée au nom de la lutte contre le réchauffement climatique – Article publié le 02 Février 2010. Disponível em: <http://www.lemonde.fr/cgi-bin/ACHATS/acheter.cgi?offre=ARCHIVES&type_item=ART_ARCH_30J&objet_id=1113644com>. Acesso em: 02 Fev. 2010.; Beck, Ulrich – Le danger Nucléaire escamoté.  – mercredi 6 août 2008 Disponível em:<http://lefrancaisensuede.blogspot.com/2008/08/le-danger-nuclaire-escamot-par-ulrich.html>. Acesso em: 02 Fev. 2010.

[25] Diz o Le monde de 13.3.3.2001 que todas as pesquisas revelam um liame entre certas modificações do processo de fabricação de farinhas animais inglesas e o surgimento do prion, partícula infecciosa protéica, de natureza e método de ação mal-conhecidos, que seria o agente de encefalopatias espongiformes.

Em 1981 os fabricantes britânicos suprimiram uma etapa do processo de fabricação dessas farinhas: eles reduziram a temperatura (economia de energia) e suprimiram os solventes (economia de matérias-primas). Essas duas modificações impedem a erradicação do prion e induzem a sua expansão.

[…] Em nome da desregulamentação, os governos de Margaret Thatcher mandaram às favas o principio da precaução e chegaram ao ponto de destruir inteiramente o serviço nacional de Veterinária.

[26] De acordo com Aguiar, 1993 Apud Godoy, Arnaldo Sampaio de Moraes. O pós-modernismo jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2005. Pag. 120. “o mundo é harmônico, a vontade informa o livre arbítrio (de todos), o Estado é perene e benfazejo, a coação está nas sanções, direito e Estado formam elo indissolúvel, o sujeito de direitos é abstração, os autos do processo representam a síntese do mundo, as decisões e orientações são neutras e assépticas, a história é invenção de filósofos, a sociedade suscita problema que não é jurídico, os poderes são discutidos em âmbito interno,  técnica deve ser murada contra a crítica” A simplicidade ocorre pois cria-se um sistema fechado sem contradições com aceitação de determinadas verdades que possibilitam dedução de outras.

[27]Godoy, Arnaldo Sampaio de Moraes. O pós-modernismo jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2005. Pag. 121

[28]Arnauld, André-jean. O direito entre modernidade e globalização : lições de filosofia do direito e do Estado; tradução de Patrice Charles Wuillaume. – Rio de Janeiro : Renovar, 1999. P. 207

[29]“É assim que o neoliberalismo apresenta como eterna a lei do mercado, ao mesmo tempo que convida os indivíduos a estarem permanentemente atentos aos sinais emitidos pelas condições do mercado que devem lhes permitir se orientarem conforme as condições sociais e econômicas em constante movimento.” – Arnauld, André-jean. O direito entre modernidade e globalização : lições de filosofia do direito e do Estado; tradução de Patrice Charles Wuillaume. – Rio de Janeiro : Renovar, 1999. P. 211

[30]Bauman, Zygmunt; tradução, plínio Dentzien. Modernidade líquida. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001, P. 49.

[31]Verifica-se os esforços dos blocos regionais, dos sujeitos privados independentes, das comissões de estudo sobre unificação e uniformização, de ONGs e de OIGs na produção normativa, produzindo resultados tão ou até mais eficazes do que a regulação elaborada pelo próprio Estado. Surge desse pluralismo dos modos e das fontes de regulamentação, por conseqüência pluralismo de racionalidades, a representação do sistema jurídico em forma de rede.

[32]Se entenderá, pues, por Lex Mercatoria el conjunto de normas acordadas explícita o implicitamente por los grandes agentes económicos, con independencia de los poderes públicos, para regular relaciones recíprocas, para reglar sus relaciones con los estados abiertos y para determinar las políticas de éstos.

La Lex Mercatoria, en este sentido, es derecho creado directamente por el soberano privado supraestatal.

Las normas de la nueva Lex Mercatoria se estabelecem por procedimentos informales, puntuales, pero suscetibles de descripción genérica.

Hay foros donde se debaten las cuestiones que afectan en general o sectorialmente a los principales agentes económicos y conglomerados de interesses financeiros. Las más generales – por ejemplo, las políticas económicas y monetárias que deben ser impuestas a los estados abiertos, o las politicas laborales, o las grandes opciones de politica fiscal o de desarrollo regional – son aceptadas y consensuadas por las entidades significativas en la ocasión del csoberano privado difuso, y encaminadas luego hacia las instituciones económicas internacionales : (…) donde los principales agentes económicos dejan oír poderosamente su voz. – Capella, Juan Ramón – Fruta Prohibida; Editorial Trotta S.A., Madrid 1997. p.273

[33] Acuerdos por los cuales se diseñan ante todo los marcos mundiales y regionales de política econômica adecuados para la expansión de lãs empresas transnacionales. También se forman em zona de la Lex Mercatoria lãs decisiones acerca de lãs dimensiones del âmbito de actuación de los poderes estatales abiertos. – Capella, Juan Ramón – Fruta Prohibida; Editorial Trotta S.A., Madrid 1997. p.275 

[34]Cada innovación, por otra parte, supone uma amenaza para los distintos conglomerados productivos, que pueden perder su posición estratégica si adoptan decisiones errôneas; La previción Del largo plazo pueden resultar catastróficas em el plazo largo – Capella, Juan Ramón – Fruta Prohibida; Editorial Trotta S.A., Madrid 1997. p.277

[35] Las normas de contingentación, planificación y obsolecencia productiva estabelecidas em el plano de La Lex mercaoria hacen ridículas las afirmaciones sobre la liberdad de mercado, em el sentido de estímulo a La concurrencia. La Lex Mercatoria sustituye tal concurrencia por acuerdos sobre La produccion y su planeamiento. – Capella, Juan Ramón – Fruta Prohibida; Editorial Trotta S.A., Madrid 1997. p.277

[36]A Lex Mercatoria é posta geralmente entre os costumes comerciais pois como lembra Antonio Carlos Rodrigues do Amaral (2006, p.72) aquela no ordenamento jurídico inglês foi sendo afastada com as cortes do almirantado e outras especializadas que foram abolidas ou limitadas, as disputas passaram a ser solucionadas pela Common Law enquanto a Lex Mercatoria começou a ser naquela ocasião considerada como costumes e praticas comerciais.

[37] Quanto às leis uniformes, leis modelos, conjunto de regras e princípios norteadores do comércio internacional destacam-se: “Leis uniformes sobre Letras de Cambio e Notas Promissórias (Genebra, 1930), Lei uniforme sobre cheques (Genebra, 1931), inconterms, Regras e Usos Uniformes de Créditos Documentários, as Regras Uniformes para Garantia de Contratos (CIC), a Lei-modelo de Arbitragem (UNCITRAL), a Convenção Internacional sobre compra e Venda Internacional (Viena, 1980), os Princípios dos Contratos Internacionais (UNIDROIT) e a Convenção Interamericana sobre o Direito Aplicável aos Contratos Internacionais (Cidip V – Cidade do México, 1994).” (Amaral, 2006 p. 76)

[38]A arbitragem exerce grande papel na propagação da nova Lex Mercatoria não somente em âmbito internacional, como nacional, pois , por este meio a nova Lex Mercatoria pode alcança as partes que convencionaram seu uso através de clausula arbitral, para efeitos jurídicos reconhece-se que a sentença Arbitral tem os mesmos efeitos jurídicos da sentença proferida pelo juiz Estatal de acordo com a norma do Art. 31 da lei 9.30/1996, in verbis: A sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo.

[39]“estima-se que quase noventa por cento dos contratos internacionais de comércio, atualmente, contêm uma cláusula arbitral” – Rechsteiner, Beat Walter – direito internacional privado : teoria e prática. – 10. Ed. Ver. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2007. Pag 79.

[40] Carlos Rodrigues do Amaral, na obra Fontes do Direito do Comercio Internacional: A Lex Mercatoria, 2006, retoma em sua obra a discussão posta desde os anos 60 sobre a Natureza Jurídica, destacando se as posições de Berthold Goldmann,Schmitthoff, Lange, Goldstajn, Jessup. Segundo o primeiro a Nova Lex Mercatoria é um conjunto de princípios e regras costumeiras,espontaneamente referidos ou elaborados no quadro do comercio internacional, sem referencia a um sistema particular de lei nacional; já para Schimitthoff princípios comuns de leis relacionados aos negócios comerciais internacionais, ou regras uniformes aceitas por todos os países; Lange descreve como regras do jogo do comercio internacional; Goldstajn coloca como corpo de normas que as relações internacionais de natureza de direito privado, envolvendo diferentes países; Jessup vai além dos anteriores ao afirmar os elementos da transnacionalidade, de inter-relação das ordens jurídicas nacionais e o caráter transnacional das relações entre povos e nações.

[41] De acordo com a primeira corrente doutrinária, a Lex Mercatoria constitui uma ordem jurídica autônoma, criada espontaneamente pelos agentes do comercio internacional, cuja existência independe dos ordenamentos jurídicos estatais, e cuja origem não decorre do direito internacional público. A segunda vertente doutrinária vê na Lex Mercatoria uma alternativa para a ordem jurídica nacional aplicável, por constituir um corpo suficiente de regras jurídicas que permitem decidir um litígio entre agentes do comercio internacional. Outra tendência, finalmente, entende que a Lex Mercatoria destina-se a complementar o direito nacional aplicável, constituindo uma consolidação dos usos, costumes e de certas expectativas concernentes ao comercio internacional. – Rechsteiner, Beat Walter; Direito Internacional Privado: Teoria e Pratica – 10. ed. Rev. e atual – São Paulo: Saraiva, 2007, pag. 74.

[42]Amaral, Antonio Carlos Rodrigues do Amaral, Direito do Comércio internacional: aspectos fundamentais. 2ª edição, São Paulo : Lex editora, 2006. p. 73.

[43]As justificações, validades desse sistema autônomo se dá através dos princípios da pacta sunt servanda e da autonomia das partes como norma meta legal, válida somente entre as partes não se apresentando ultra partes.

[44]A perspectiva que tende a assinalar à Lex Mercatoria, sobre a base de múltiplas argumentações, o valor de ordenamento jurídico autônomo, distinto dos ordenamentos nacionais e internacionais de proveniência estadual, e conato do mesmo caráter de autonomia e força desse ultimo; que a Lex Mercatoria conviveria, inter pares, com os ordenamentos jurídicos estatais, somando a esses no “mundo do direito” com um seu âmbito aplicativo exclusivo (territorial, isto é o espaço transnacional no qual si colocam as relações comerciais internacionais, e subjetivas, a societas mercatorum) análogo a aquele que a lei estatal manifesta sobre o próprio território e nos confrontos dos próprios cives. – Sbodorne, Francesco; Contratto Internazionale e Lex Mercatoria, Collana: Quaderni del Dipartimento di Scienze Giuridiche della Facoltà di Economia dell`Università degli Studi della Calabria, 18 Napoli: 2008. P.95

[45]A observação de alguns ordenamentos jurídicos não estatais, como aqueles das corporações medievais, da igreja e da comunidade internacional, de fato, consentiria de revogar em duvida a tradicional concessão de exclusividade do ordenamento jurídico estatal pela qual se «diferente da sociedade, diferente do Estado são fontes de um próprio direito, isto é não pode ocorrer se não em força de uma investidura do Estado», pelo qual «de fora do Estado não se poderia falar de um direito e de um ordenamento jurídico». Nas hipóteses acenadas, então, seria produto um direito de fora de um poder conferido do Estado e às vezes em contradição com esse, onde os Estados e as normas produtos de tais «associações e instituições» apareceriam dotadas de uma força intrínseca que assinala suas «características de juridicidade», «com meios e com efeitos que são possíveis» sim a consentir a identificação do fenômeno jurídico com aquele social.

Nessa perspectiva, a Lex Mercatoria constituiria o ordenamento das relações comerciais internacionais atribuídas à societas mercatorum – entendendo essa ultima como um corpo social unitário e individualizado que dita por si as regras da própria organização – do tato de efetividade aplicativa (effectiveness) pela espontânea observação das suas regras da parte dos consociados ou ainda pela aplicação em sede di arbitragem, que é por sempre uma forma de “jurisprudência privada”, e de um aparato sancionatório autônomo (self-enforcing) de tipo social (em termos de descrédito comercial, exclusão do comercio por condenações de sanções de fonte profissionais e/ou corporativas etc.).

A análise conduz, ainda, a individuar-se na Lex Mercatoria ulteriores características fisionômicas de um ordenamento jurídico. Essa seria geral, acessível, previsível (predictability) e “auto-suficiente”. – Sbodorne, Francesco; Contratto Internazionale e Lex Mercatoria, Collana: Quaderni del Dipartimento di Scienze Giuridiche della Facoltà di Economia dell`Università degli Studi della Calabria, 18 Napoli: 2008. P. 98. (tradução nossa)

[46]Os instrumentos através os quais se manifesta tal poder normativamente atribuído são tradicionalmente identificados como pactum de lege utenda (o ferenda), de un lado, e convenção arbitral, clausula arbitral ou compromissória, e mais genericamente convenções ou clausulas di derrogação ou prorrogação da jurisdição em favor de juízes estatais ou de árbitros internacionais, de outro. – Sbodorne, Francesco; Contratto Internazionale e Lex Mercatoria, Collana: Quaderni del Dipartimento di Scienze Giuridiche della Facoltà di Economia dell`Università degli Studi della Calabria, Nuova serie, 18 Napoli: Edizioni Scientifiche Italiane, 2008. p. 43 (tradução nossa)

[47]As analises das posições sobre a natureza de assegurar a Lex mercatoria envolve ainda o seus conteúdos: pela opinião inclinada a reconhecer-la natureza de ordenamento autônomo essa ultima seria composta somente de normas de proveniência extra-estatais, ao mais integrada de princípios gerais do direito universalmente reconhecidos; em senso contrario, quando se entra na perspectiva pela qual o «seu  fundamento jurídico mantém sempre ancorado, diretamente ou indiretamente, na vontade dos Estados individualmente», a Lex mercatoria «seria abrangente, além de que dos chamados usos do comercio internacional (international commercial custom), ainda da chamada legislação internacional (international legislation), ou seja das varias convenções ou leis uniformes  avençadas por objeto instituídos ou relações típicas do comercio internacional». Não a caso se sustentou que a Lex Mercatoria constituiria um sistema “hibrido” que mudaria os próprios conteúdos das normas nacionais, internacionais «e na região vagamente definida região dos princípios gerais da lei» – Sbodorne, Francesco; Contratto Internazionale e Lex Mercatoria, Collana: Quaderni del Dipartimento di Scienze Giuridiche della Facoltà di Economia dell`Università degli Studi della Calabria, Nuova serie, 18 Napoli: Edizioni Scientifiche Italiane, 2008. Pag. 111. (tradução nossa)

[48]Associações de categorias, comissões de estudo sobre unificação e uniformização, organizações não governamentais e Organizações internacionais ou intergovernamentais, essas entidades emitem os mais diversos tipos de documentos (aconselhamentos, manifestações, pareceres, resoluções) recomendando aplicação, consideração de enunciados da Lex Mercatoria  nas reformas do poder judiciário.

[49]Os ordenamentos jurídicos pátrios são vistos como normas internacionais divergentes, o que prejudica o comércio internacional, logo são necessárias harmonizações, uma das lógicas do Documento técnico 319 é que a América latina e caribe se aproximem da Common Law, sistema apontado pelo Mercado como mais eficiente, e alinhem seus ordenamentos jurídicos ao sistema dos Estados unidos e Canadá, medida facilitadora do comércio global.

[50]Banco Mundial: Relatório nº 17 de 1997, O Estado num mundo em transformação; Relatório nº24 de 2002, instituições para os mercados;Documento Técnico 319, O Setor Judiciário na América Latina e no Caribe; Conferência do Banco Mundial sobre o Judiciário de 2000; Conferencia Internacional sobre transparência do Judiciário no Superior Tribunal de Justiça (STJ),  4 e 5 de agosto de 2010.

[51] esses enunciados de soft-law sejam meras recomendações verifica-se que as mesmas geram grande pressão sobre o Estado talvez até mais do que a coação tradicional, pois caso o Estado não cumpra a cartilha elaborada pelo mercado o mesmo sofrerá com a perda contínua de investimentos, será desacreditado pelos investidores e sua economia tenderá a ser reduzida, o que tornará mais árduo prover as necessidades de seus cidadãos, já que a realização dos indivíduos passa necessariamente por uma questão jurídico-econômica.

[52]A proposta do banco mundial ao sistema judiciário brasileiro é de que o mesmo proteja a propriedade privada, garanta o cumprimento dos contratos, dê previsibilidade às decisões, de que os juízes tenham independência (não interferência política), eficiência, transparência, credibilidade (combate à corrupção), propõe ainda que o Estado possibilite acessibilidade à justiça (adoção de métodos alternativos de resolução de controvérsias). Esse esforço do banco demonstra nítida atividade paranormativa.


Informações Sobre o Autor

Rafael Beloti

Acadêmico de Direito na Universidade Estadual de Maringá/PR


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