A representatividade garantista do júri popular na raiz constitucional como forma de repulsa ao recurso da dúvida como fundamento da decisão de pronúncia

Resumo: O presente trabalho tem como escopo realizar estudo pontual sobre a competência do Tribunal do Júri, elaborado  a partir de análise aparelhada com elementos dogmáticos, sem, contudo, esgotar seu objeto nos limites do procedimento regrado pelo Código de Processo Penal. Assim, projetar-se-á o Tribunal Popular sobre a raiz garantista derivada do texto constitucional, cujo teor evoca a possibilidade de rompimento da aplicação de uma regra jurídica como forma de solução de conflitos ao outorgar ao cidadão o exercício da soberania. Ver-se-á, em vista disso, que o procedimento afeto ao julgamento dos crimes dolosos contra a vida, consumados ou tentados, significa um novo paradigma de estruturação do Direito, caracterizado por linhas heteropoiéticas, permitindo que a empatia com a sorte do semelhante sobreponha-se à declaração formal presente, como modo de decidir, no exercício do poder jurisdicional.


Palavras-chave: Garantia, Júri, Pronúncia, Dúvida.


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Sumário: 1.Introdução. 2. Regras jurídicas versus garantias constitucionais. 3. As funções do juiz presidente e dos jurados. 4. A inviabilidade da adoção da dúvida como razão de decidir. 5. Considerações finais.


1 INTRODUÇÃO


A esposa do rei Menelau, Helena, era considerada uma das mais belas mulheres da Grécia Antiga. Talvez por conta disso ou, quiçá, pelo pouco apreço que o monarca lhe devotava, sucumbiu às investidas do príncipe Páris, fugindo com ele para Tróia, então governada por Príamo.


O irmão de Menelau, Agamêmnon, percebendo no enredo a oportunidade, há muito esperada, de fazer guerra à Tróia, uniu suas forças às de Menelau, embarcando-as em uma poderosa esquadra. Por longos dias, os guerreiros aguardaram que o vento soprasse e os conduzisse às praias de Tróia; porém, o ar permanecia sem movimento, de modo que as inúmeras naus se mantinham atracadas no porto de Argos.


O rei Agamêmnon começou a ficar temeroso de que a longa espera afetasse o moral dos soldados. Aconselhado por poderes espirituais, ofereceu sua pequena filha Ifigênia em sacrifício aos deuses, obtendo, como resultado, o tão esperado vento que inflou as velas dos navios e conduziu seu exército à orla troiana.


A esposa de Agamêmnon, Clitminestra, corroída pela dor causada pela morte de sua filha Ifigênia, uniu-se a Egisto[1], primo de Agamêmnon, e quando este, 10 anos depois, retornou vitorioso da guerra contra Tróia, assassinou-o nas dependências do palácio real.


Orestes, filho de Agamêmnon e Clitminestra, vingou a morte de seu genitor, matando a própria mãe, materializando a vingança de sangue.


Agamêmnon matou Ifigênia; Clitmninestra matou Agamêmnon; Orestes matou Clitminestra. Fácil perceber que o ritual da vingança de sangue reclamava que Orestes também fosse morto; contudo, Orestes era o último descendente da família real, não havendo ninguém que pudesse reclamar o direito de derramar seu sangue como vingança pela morte de Clitminestra.


Para que, em situações como essa, o assassino não escapasse impune, havia, segundo a mitologia helênica, divindades inferiores – as Fúrias – encarregadas de vingar o sangue. Era seu dever, portanto, matar Orestes, vingando, assim, o assassinato de Clitminestra.


Tão logo passou a ser perseguido pelas Fúrias, incitadas pelo fantasma de Clitminestra, Orestes buscou socorro no deus Apolo, o qual, apesar de inclinado em favor do suplicante, não podia revogar o direito atribuído às vingadoras, portadoras, segundo proclamavam, “da justiça inflexível”. Apolo, então, convoca sua irmã, a deusa Atena, para tentar resolver o impasse.


Atena era filha de Zeus e nascera sem o concurso de uma mulher, tendo brotado da cabeça de seu pai, motivo suficiente para que se inclinasse, da mesma forma que Apolo, em favor da causa de Orestes. Todavia, como Apolo, Atena não detinha o poder de negar às perseguidoras o exercício da “justiça inflexível” de que eram portadoras. Em vista disso, a deusa indica seis juízes e encarrega-os, sob sua direção, de ouvir os demandantes (Orestes e as Fúrias), inquirir testemunhas e proferir um veredicto.


Após encerrados os debates, o tribunal constituído por Atena e estabelecido na Colina de Ares[2], deposita seus votos em uma urna, apurando-se três votos dando razão às Fúrias e três votos absolvendo Orestes. Diante do empate, Atena profere seu voto, somando-o aos favoráveis a Orestes[3].


A alegoria presente na tragédia escrita por Esquilo acaba por revelar um aspecto destacado do Tribunal do Júri adotado pelo sistema processual penal vigente na República Federativa do Brasil.


O Tribunal do Júri, mais especificamente o Conselho de Sentença[4], é o órgão jurisdicional encarregado, nos termos do disposto no artigo 74, parágrafo 1º, do Código de Processo Penal, do julgamento dos crimes dolosos contra a vida, consumados ou tentados.


A apreciação e julgamento das imputações de prática de crimes dolosos contra a vida (homicídio, instigação, auxilio e induzimento ao suicídio, infanticídio e aborto) por parte de um júri leigo, tomando suas decisões com lastro na íntima convicção, possibilita que o dogmatismo “inflexível” que orienta as decisões dos magistrados togados ceda lugar a uma empatia com a sorte e o destino do acusado, derivada, no mais das vezes, do aporte cultural-valorativo do Conselho de Sentença, conforme ilustram as palavras de Atena, proferidas por ocasião de seu voto a favor de Orestes:


“Serei a última a pronunciar o voto/e o somarei aos favoráveis a Orestes./ Nasci sem ter passado por ventre materno;/meu ânimo sempre foi a favor dos homens,/à exceção do casamento; apóio o pai./ Logo, não tenho preocupação maior/ com uma esposa que matou seu marido,/o guardião do lar; para que Orestes vença,/basta que os votos se dividam igualmente”.[5]


Essa empatia gerada pelo compartilhamento de condições gerais de existência[6] possibilita que a submissão de um indivíduo ao julgamento pelos jurados funcione como verdadeira garantia do imputado, acrescendo ao procedimento a característica de salvaguarda, capaz, inclusive, de gerar absolvição mesmo quando demonstradas, de forma patente, autoria e materialidade do delito, ou seja, ainda que todo o conjunto probatório indique que o acusado deve ser condenado, nada impede que os jurados, invocando a própria consciência, absolvam-no.


Nesse contexto, o julgamento plenário ganha um cariz heteropoiético, conferindo-lhe


“[…]um ponto de vista externo, que significa sobretudo dar primazia axiológica à pessoa, e, portanto, de todas as suas especificas e diversas identidades, assim como da variedade e pluralidade de pontos de vista externos expressos por ela”.[7]


Todavia, essa proeminência do aspecto garantista não libera a ritualística do Tribunal do Júri de fortes críticas, em algumas vezes, procedentes.


O objetivo desse trabalho é, justamente, resgatar pequena parcela dessas críticas ao procedimento, especificamente de forma a demonstrar que o problema não reside na garantia que o julgamento pelos jurados representa desde tempos nos quais a jurisdição não se encontrava formalizada como poder do Estado, mas em sua transformação em mera regra procedimental destinada a solver um conflito específico.


Para tanto, desenvolver-se-á exposição sobre a representatividade jurídica da garantia derivada da constituição do Tribunal do Júri como juiz natural dos delitos dolosos contra a vida, destacando-a da incidência formal da regra processual que, na prática do procedimento, remete ao conhecimento dos jurados matéria de conteúdo jurídico implícito e causas nas quais a acusação não se desincumbiu do ônus probatório, utilizando-se, para tanto, do brocardo in dubio pro societate.


2 REGRAS JURÍDICAS VERSUS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS


A síntese epistemológica delineada por Michel Foucault, cobrindo, segundo suas palavras, “o domínio inteiro do conhecimento do homem”, estrutura-se a partir da combinação de três pares: função e norma, conflito e regra, significação e sistema.


Conforme sua exposição,


Esses modelos constituintes são tomados de empréstimo aos três domínios da biologia, da economia e do estudo da linguagem. É na superfície de projeção da biologia que o homem aparece como um ser que tem funções — que recebe estímulos (fisiológicos, mas também sociais, inter-humanos, culturais), que responde a eles, que se adapta, evolui, submete-se às exigências do meio, harmoniza-se com as modificações que ele impõe, busca apagar os desequilíbrios, age segundo regularidades, tem, em suma, condições de existência e a possibilidade de encontrar normas médias de ajustamento que lhe permitem exercer suas funções.


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Na superfície de projeção da economia, o homem aparece enquanto tem necessidades e desejos, enquanto busca satisfazê-los, enquanto, pois, tem interesses, visa a lucros, opõe-se a outros homens; em suma, ele aparece numa irredutível situação de conflito; a esses conflitos ele se esquiva, deles foge ou chega a dominá-los, a encontrar uma solução que apazigúe, ao menos em um nível e por algum tempo, sua contradição; instaura um conjunto de regras que são, ao mesmo tempo, limitação e dilatação do conflito. Enfim, na superfície de projeção da linguagem, as condutas do homem aparecem como querendo dizer alguma coisa; seus menores gestos, até em seus mecanismos involuntários e até em seus malogros, têm um sentido; e tudo o que ele deposita em torno de si, em matéria de objetos, de ritos, de hábitos, de discurso, toda a esteira de rastros que deixa atrás de si constitui um conjunto coerente e um sistema de signos.[8]


A positivação do Direito como um conhecimento ordenado que serve ao homem e, por consequência, o cerca, insere-o na combinação conflito/regra, operacionalizando um arcabouço de soluções gerais e abstratas (regras) verbalizadas com o escopo de diluir, eliminar ou pacificar os conflitos derivados da interação humana.


Por certo que o Direito não se constitui no único elemento do qual derivam regras destinadas a solver conflitos humanos.


Embora outras regras se façam presentes na solução de conflitos, emprestando ao Direito um caráter subsidiário, a coerção e imperatividade advindas de seu regramento estabelecem sua prevalência em função da inafastabilidade de suas soluções.


De outro lado, a simples inserção textual de um postulado jurídico no corpo de uma lei não autoriza sua classificação no conjunto das regras elaboradas com o desiderato de agir sobre um conflito, formando-se a exceção por meio das positivações emanadas da declaração proferida pelo titular da soberania e endereçadas aos poderes formalizados do Estado[9]. Como exemplos do ato declaratório da soberania popular pode-se citar a ação popular, o habeas corpus, o referendo, o plebiscito e o Tribunal do Júri, típicas manifestações que, apesar de resguardas por uma regra jurídica, agem de forma a permitir a (re)apropriação da soberania por parte de qualquer do povo, representando a submissão do Direito, como forma de atacar conflitos humanos, às garantias emanadas do exercício direto do poder soberano.


A apropriação da soberania por meio de uma declaração de prerrogativas ultrapassa, obviamente, o aspecto regulatório de um conflito, inserindo-se em uma via reversa do Direito enquanto produção do Estado, ao passo que instrumentaliza o indivíduo com uma blindagem de resistência sobreposta ao pacto civil que legitima a produção de regras jurídicas voltadas à solução de conflitos, permitindo, assim, a superação do pensamento hobbesiano.[10]


Desse modo e contornando-se a longa discussão acerca da diferença entre direitos e garantias, perfeitamente possível validar a hipótese de que a garantia advem da possibilidade do exercício direto da soberania por parte de qualquer do povo, submetendo a regra gerada com o desiderato de atacar um conflito humano às declarações emitidas no exercício direto do poder, possibilidade consentânea, no mais, com o expresso no artigo 1º, parágrafo único, da Constituição Federal.


Especificamente no que tange ao Tribunal do Júri, a característica que define a garantia – uma declaração de apropriação de soberania – pode ser verificada tanto no domínio da regra, uma vez que a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea “c”, assegura a soberania dos veredictos, como nas decisões proferidas, na prática, com base na própria (in)consciência dos jurados.


Ilustrativamente, se for formulado em desfavor de um indivíduo uma acusação de latrocínio (roubo seguido de morte), valendo lembrar que, de acordo com a dicção da Súmula 603 do Supremo Tribunal Federal, seu julgamento compete ao juiz singular, o magistrado sentenciante, em face da presença de material probatório confirmando autoria e materialidade, deverá proferir sentença condenatória, mesmo que, ao final, o Ministério Público tenha se manifestado pela absolvição (artigo 385 do Código de Processo Penal), ou seja, se há provas suficientes, a sentença condenatória é inafastável, devendo o juiz aplicar ao conflito a regra prevista para o caso: reclusão de 20 a 30 anos.


Todavia, se em desfavor desse mesmo indivíduo for formulada uma acusação de homicídio qualificado pela motivação torpe, aos jurados é permitido, independente do material probatório, ignorar o conflito oriundo da morte de um semelhante, afastar a regra (reclusão de 12 a 30 anos) e, exercendo a soberania popular, garantir uma absolvição[11].


Por isso,


“Quando se diz que seu traço fundamental consiste em ser uma garantia da tutela maior do direito de liberdade, o que se quer dizer, a nosso juízo, é que ficando o julgamento nas mãos da sociedade, representada por 7 de seus membros, longe das peias da lei, de precedentes, súmulas e doutrina, haverá mais garantia para o direito de liberdade. Conhecendo os costumes do povo, o que ele sente em determinadas situações de valoração cultural, o fato de muitas vezes a lei estar dissociada do pensamento da sociedade, as conversas de rua, que nem sempre ou quase nunca chegam aos autos, o conhecimento que as pessoas têm das circunstancias que antecederam o fato delituoso, a vida pregressa do cidadão, a natureza do crime (o aborto, p. ex., é defendido por considerável contingente da sociedade, mesmo entre católicos, e, em alguns países, devidamente legalizado; o infanticídio é crime praticado por mães solteiras, num ato de extremo desespero), os jurados mais soltos, mais libertos, sem a obrigação de dizerem como e por que votaram desta ou daquela maneira, estando assim, mais à vontade, justificam a conduta do(a) acusado(a), dando asas a seu coração, a seus sentimentos. Quantas pessoas que gozam de foro privativo não preferem o julgamento popular ao técnico? Por acaso tudo isso não representa uma garantia maior ao direito de liberdade? Pode até haver condenação, mas se essa for injusta, ainda restará o juízo revidendo. Nem por isso a proteção ao direito de liberdade ficou mais acanhada. Poderia o juiz togado, se pudesse julgar um homicídio doloso, fazê-lo fora das hipóteses elencadas no art. 386 do CPP? Compreenderia, por acaso, o drama da infeliz que interrompeu uma gravidez não desejada? Poderia até absolvê-la, mas a segunda instância, de regra, castraria seu sentimento piedoso. Os jurados são leigos na “subsunção da conduta ao tipo penal”, são leigos na dosimetria da pena, mas sabem distinguir o que certo e o que é errado, sabem dizer, num clima de empatia, se agiriam da mesma maneira que o réu. Se por acaso o constituinte quisesse um julgamento técnico, por óbvio não teria instituído e mantido o Júri. Este compreende a sociedade em que vive. O Juiz togado, não. O togado compreende a lei e dela não pode afastar-se. Ainda que sabendo que teria a mesma conduta do réu, ficaria acorrentado, preso às provas dos autos, ao texto da lei, podendo inclusive, se ousar agir de outra maneira, responder por prevaricação. Como observado por Luiz Guilherme Marques, A Psicologia do Juiz, p. 10, “os horizontes do Juiz são marcados pelas leis; se o juiz compreendesse o que há além, talvez não pudesse mais aplica-las com tranquilidade de consciência…”.[12]


Vê-se, portanto, que a constituição de um postulado garantista, atributo direto de uma declaração de soberania, espelha-se na possibilidade de derrogação pontual das regras jurídicas, razão pela qual, ao contrário de uma simples regra, somente pode ser invocada como salvaguarda individual e jamais interpretada em desfavor do titular individual ou coletivo do poder soberano.


Dessa forma, se o Tribunal do Júri é uma garantia do indivíduo, sua submissão ao julgamento pelos jurados somente pode ser admitida em face de um conjunto robusto de provas que autorizariam o magistrado singular, caso fosse o juiz natural, a prolatar sentença condenatória[13], pois, de outro modo, o objeto da garantia converte-se de blindagem em ardil formulado com o intento de suprir a deficiência da acusação por meio de raciocínio que privilegia a probabilidade de condenação pelos jurados em detrimento das demais possibilidades ditadas pelos artigos 414 e 415 do Diploma Processual Penal (impronúncia e absolvição sumária).


3 AS FUNCÕES DO JUIZ PRESIDENTE E DOS JURADOS


A par da função geral encomendada ao juiz togado pelo artigo 251 do Código de Processo Penal, incumbindo-lhe “prover à regularidade do processo e manter a ordem no curso dos respectivos atos”, e além do normal exercício do poder de polícia que lhe é afeto, cumpre ao magistrado, quando na presidência do Tribunal do Júri, resolver, seguindo a disposição estampada no artigo 497, inciso X, do Código de Processo Penal, as questões de direito.


A função do juiz presidente do Tribunal do Júri é, portanto, eminentemente jurisdicional, satisfeita, semanticamente, pela declaração e aplicação do direito (regra jurídica) incidente no caso concreto, isto é, o magistrado que preside o Tribunal do Júri deve solver um conflito pela aplicação da regra adequada à situação típica que lhe á apresentada (verbi gratia, pronúncia, dosimetria da pena, reconhecimento de causas de extinção da punibilidade).


De outro vértice, os 7 jurados sorteados para tomarem parte no Conselho de Sentença não se encontram sujeitos ao encargo de externar manifestação sobre matéria de direito, limitando-se à análise fática[14], operada a partir do escrutínio de elementos textuais (relatório, decisão de pronúncia, vista dos autos do processo) e orais (interrogatório, testemunhas, esclarecimentos dos peritos e debates).


Há, como se percebe, substancial diferença entre as funções do Juiz Presidente, afetas à aplicação do direito positivado ao caso concreto, e aquelas exercidas pelo corpo de jurados em plenário de julgamento, circunscritas à análise de matéria de fato, isto é, os jurados não exercem, em sentido estrito, atividade jurisdicional, mas, apenas, sem que isso signifique qualquer desprestigio à dignidade de sua função, decidem a sorte do pronunciado com base em critérios derivados de sua (in)experiência, respondendo quesitos sobre materialidade, autoria e absolvição.


Em vista disso, a trabalho do Juiz Presidente durante a condução da primeira fase do rito, até a pronúncia, portanto, reveste-se de extrema relevância, estando a seu encargo a prevenção de remessa a julgamento pelo Conselho de Sentença de questões jurídicas suscitadas pela acusação e defesa, mesmo quando, aparentemente, apresentem-se como questões de fato.


Não lhe é permitido, dessa feita, o recurso à dúvida ao argumento de que o júri é o juiz natural da causa, uma vez que a dúvida liga-se à prova, e a admissão, produção e avaliação da prova, como se sabe, não constituem matéria de fato, mas de direito, devendo, especificamente no que toca à valoração, ser apreciada pelo togado com lastro no princípio do livre convencimento racional e não entregue aos jurados para que estes a avaliem ao amparo da íntima convicção.


Esse esqueleto teórico diferenciador das funções do juiz e do jurado presta-se, assim como a própria garantia do devido processo legal que lhe é imanente, a evitar cenários como o romantizado na obra “O Estrangeiro”, de Albert Camus[15], ou vivenciados no mundo fático, tal como aquele narrado por Marchi na obra histórico-biográfica “Fera de Macabu”.[16]


Camus narra, com maestria, os acontecimentos recortados de um pequeno espaço da vida do protagonista, principiando pela morte de sua genitora. No velório e na inumação, o personagem não verte nenhuma lágrima e, também, não esboça manifestação de tristeza. No dia seguinte, vai à praia e inicia um romance com Maria, sua conhecida do trabalho. Dias depois, envolve-se em incidente relacionado a Raimundo, seu vizinho e amigo e, como resultado, dispara, em manifesta legítima defesa, cinco tiros contra um árabe, desafeto de Raimundo, levando-o a óbito.


Preso e processado, o personagem é apresentado ao juiz e, superada a instrução, é submetido a julgamento pelos jurados, restando condenado não pelo homicídio, mas em função de não ter pranteado a morte de sua mãe e, no dia seguinte ao enterro, saído com uma mulher, valendo pontuar que sua submissão ao julgamento popular decorreu, exclusivamente, da omissão do togado que, descurado da função de aplicar o direito (regra), entregou-se a uma cruzada moral e religiosa destinada à busca do arrependimento do acusado.


O paradigma literário esboçado por Camus delimita, sem representar, por óbvio, um anacronismo jurídico, a necessidade do estrito cumprimento por parte do Juiz  Presidente da vocação legislativa programada para tutelar a garantia constitucional do Tribunal do Júri, positivada com o objetivo de oportunizar a absolvição por parte do titular do Poder Soberano quando seu representante jurisdicional estivesse convencido acerca da materialidade e da autoria de delito doloso contra a vida e, em consequência, propenso, caso possível, a condenar.


4 A INVIABILIDADE DA ADOÇÃO DA DÚVIDA COMO RAZÃO DE DECIDIR


A redação do artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal traduz o Tribunal do Júri como garantia do indivíduo em face do Estado.


No contexto de um Estado Democrático de Direito, vertido da matriz liberal, opondo, para efeito de regulação do conflito pela regra, a liberdade do cidadão ao poder do governo que o representa nas práticas executivas, deliberativas e judiciárias, o instrumento de garantia vocalizado pela lei constitui-se na barreira de contenção que estabelece o limite e o alcance da regra sobre o conflito.


Assim, a fixação da competência do Tribunal do Júri para apreciar eventual prática de delito doloso contra a vida não se confunde com mera regra de regulação do conflito, inadmitindo-se, por conseguinte, o acolhimento de denúncia para submeter o cidadão ao julgamento plenário sob o singelo argumento de que o Tribunal Popular é o juiz natural da causa, uma vez que a garantia que o júri representa não objetiva solver o conflito, mas operar em favor do cidadão criminalizado, blindando-o em face da sanha repressora do aparelho estatal, ou seja,


“[…]o princípio da soberania dos veredictos e mesmo a garantia do próprio tribunal do júri para julgamento dos crimes dolosos contra a vida foram instituídos em favor do interesse da defesa.”[17]


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Não por outro motivo, a remessa do feito à apreciação dos jurados somente pode ser considerada como opção se, e somente se, o magistrado singular estiver convencido da existência de prova de materialidade e indícios de autoria de delito doloso contra a vida, valendo assinalar que a prova indiciária não se confunde com especulações e suposições articuladas pela acusação e sem qualquer suporte documentado no processo. Essa a razão, aliás, pela qual a lei vincula o convencimento à existência.


De outro vértice, o artigo 5°, inciso LVII, da Constituição Federal[18], garante a todo o acusado a desconsideração prévia da culpabilidade. Aliado ao ditame constitucional, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, em seu artigo 14, número 2[19], e o Pacto de San José da Costa Rica, em seu artigo 8°, número 2, primeira parte[20], estabelecem o princípio da presunção da inocência. A conclusão que se extraí da conjugação dos três diplomas, todos com status constitucional por força do disposto no parágrafo 3° do artigo 5°, é de que, para efeitos penais, não se presume culpa; porém, a inocência de todo o acusado é presumida.


Em vista disso, eventual decisão de pronúncia ancorada na dúvida vilipendia a ordem constitucional, uma vez que presume, a partir de conjecturas sem base objetiva, a responsabilidade pelo ilícito penal, construindo, a partir daí, presunção de culpa.


Ainda que se reconheça que a dúvida concreta acerca de eventual violação de um tipo penal traz consigo uma carga axiológica negativa, tal desvalor não pode ser entronizado como requisito à decisão de pronúncia, sobrepondo, em nome de um princípio não albergado pela Constituição Federal, interesses sociais dispersos ao direito constitucional de liberdade do indivíduo.


Importante destacar que o artigo 156 do Código de Processo Penal dispõe que “A prova da alegação incumbirá a quem a fizer;”. Discorrendo sobre o tema e partindo da premissa de que o ônus da prova recaí sobre a acusação em decorrência do contraponto ao princípio da presunção da inocência, importando em presunção de falsidade da tese acusatória, preleciona Ferrajoli[21]:


“Ali onde a refutação é impossível significa que a técnica de definição legal e/ou judicial do que é punível não permite juízos cognitivos, mas apenas juízos potestativos, de forma que a livre convicção não se produz sobre a verdade, mas sobre outros valores. Isso bem pode ocorrer sobre razões semânticas, quer dizer, porque a hipótese legal e/ou judicial não está formada por preposições que designam fatos, senão por juízos de valor ou de significado indeterminado do tipo “Tício é perigoso”, “Caio é subversivo” ou “tal objeto é obsceno”; ou bem podem ocorrer por presunções ou preclusões normativas que de fato exoneram a acusação do ônus da prova ou precluem da defesa o contraditório e a refutação. […] Em nenhum dos dois casos se dá “juris-dicção” em sentido próprio, senão mero exercício de repressão; não há juízo de comprovação, mas de decisão: direito penal “sem verdade” e “sem saber”, enquanto inteiramente confiado à vontade discricionária, ou seja, ao poder dos órgãos julgadores.”


Tem-se, dessa feita, que a decisão de pronúncia não pode ser proferida com base em dúvidas acerca da verdade processual, sob pena de constituir-se em mero exercício de repressão. Portanto, se a acusação não se desincumbe do ônus probatório, deve suportar as consequências de sua falência funcional e não as transferir à defesa.


Patente, nesse quadro, que o princípio in dubio pro societate, utilizado a míngua como fundamento nas decisões de pronúncia, não foi recepcionado pelo texto da Constituição vigente, na qual a regra é a presunção de inocência, autorizando concluir que se a inocência do imputado não for desqualificada e contrariada pela acusação, a dúvida porventura verificada deve operar contra o acusador e contra ele deve ser resolvida.


Nessa linha, leciona Aury Lopes Jr.[22], amparado no ensinamento de Paulo Rangel:


“[…]o chamado princípio do in dubio pro societate não é compatível com o Estado Democrático de Direito, onde a dúvida não pode autorizar uma acusação, colocando uma pessoa no banco dos réus[…].


Com razão, RANGEL destaca que não há nenhum dispositivo legal que autorize esse chamado princípio in dubio pro societate. O ônus da prova, já dissemos, é do Estado e não do investigado. Por derradeiro, enfrentando a questão na esfera do Tribunal do Júri, segue o autor explicando que, se há dúvida, é porque o Ministério Público não logrou êxito na acusação que formulou em sua denúncia, sob o aspecto da autoria e materialidade, não sendo admissível que sua falência funcional seja resolvida em desfavor do acusado, mandando-o ao júri, onde o sistema que impera, lamentavelmente, é o da íntima convicção. […] A desculpa de que os jurados são soberanos não pode autorizar uma condenação com base na dúvida.”


Cunha Campos adota o mesmo posicionamento, insurgindo-se com veemência contra o por ele denominado “mito do in dubio pro societate”.


Conforme seu ensinamento,


Com base na terminologia infeliz do Código ao mencionar “indícios de autoria”(agora, pelo menos, pela nova lei, adjetivados de suficientes) para a pronúncia, criou-se um mito, o in dubio pro societate, qual seja: se, terminada a instrução da primeira fase do rito escalonado do Júri, houver dúvida a respeito da autoria, o juiz deve remeter o caso para que seja decidido pelo tribunal leigo, preservando, assim, a competencia constitucional do Júri.


Em primeiro lugar, no campo puramente jurídico e lógico, nunca o juiz decide embasado em dúvida(s). Ou ele tem certeza de que existem as condições para se remeter o caso a julgamento pelo Júri, ou ele tem certeza de que tais requisitos não se encontram presentes. Ele não fica em dúvida.


Em segundo lugar, analisando-se a finalidade de nosso procedimento do Júri, chegamos à conclusão de que o rito só é escalonado em duas fases, porque o legislador entendeu que remeter alguém a julgamento por seus pares não é um passeio dominical, mas algo muito sério, constrangedor ao extremo para o réu, que  ocupa o banco da ignominia e, por que não, constrangedor também para a sociedade, que vê um integrante seu em posição vexatória, expondo até às vísceras as mazelas daquele agrupamento humano.


Sendo assim, para se evitar constrangimentos, humilhações e vexames inúteis (para o acusado, principalmente, mas também para a comunidade), em processos que não tenham provas ou sejam elas raquíticas, deve o juiz atuar como um filtro selecionador de julgamentos pelo Júri, só remetendo a este caso com prova séria de autoria e materialidade, barrando os demais com a impronúncia.”[23]


Admitir que a dúvida possa operar em desfavor do acusado por conta da desculpa de que o Conselho de Sentença é o juiz natural da causa, devendo as controvérsias do processo serem submetidas a seu julgamento, retira das decisões do juiz togado tomadas na primeira fase do procedimento toda a importância, transformando o magistrado em mero homologador dos atos processuais, pois as “verdadeiras decisões” competem aos jurados.


Pergunta-se: de que serve o Código de Processo Penal, aparelhado à decisão de pronúncia, estabelecer que o juiz poderá impronunciar (artigo 414), absolver sumariamente (artigo 415) ou desclassificar a infração para outra  não dolosa contra a vida (artigo 419) se o recurso à dúvida resolvida em favor do corpo social limita a extensão de sua atividade cognitiva sobre a causa?


O Estado Democrático de Direito, fundado em valores-guia de ordem axiológica superior à simplicidade normativa formal do velho constitucionalismo, superado por uma visão normativa de uma Constituição ética, representativa da conquista emancipatória do indivíduo, não compactua com retrocessos interpretativos, motivo pelo qual se pode ver emergir da Carta Política fundamentos como cidadania, dignidade da pessoa humana e pluralismo político, mas jamais o recurso à dúvida como fundamento de prosseguimento da persecução penal em juízo.


Assim, se há dúvidas acerca da autoria ou da materialidade de delito doloso contra a vida, o magistrado tem o dever constitucional de prestar a jurisdição na ordem emanada pelos ditames procedimentais, seja impronunciando, absolvendo sumariamente ou desclassificando a infração para outra de competência do juiz singular, resistindo, coralário lógico, em recorrer à dúvida para não prestar a tutela que lhe faculta como possível o Código de Processo Penal.


5 CONSIDERAÇÕES FINAIS


O julgamento dos delitos dolosos contra a vida por um grupo de indivíduos estranhos ao aparelho jurisdicional do Estado carrega manifestação simbólica de reconhecimento de uma capacidade de julgamento imanente ao organismo social, recuperando a crença racionalista do Iluminismo.


Como bem recorda Bourdieu,


“Uma historia social de “opinião pessoal” mostraria, sem dúvida, que essa invenção do século XVIII enraíza-se na fé racionalista segundo a qual a faculdade de “julgar corretamente”, como dizia Descartes, ou seja, discernir o bem do mal, o verdadeiro do falso por um sentimento interno, espontâneo e imediato, é uma aptidão universal de aplicação universal […]”[24]


Parece haver, desse modo, uma certa convergência entre a instituição do Júri composto por integrantes da Sociedade Civil, definida em contraposição ao Estado, e a matriz hegeliana dos julgamentos, admitindo a hipótese de uma imanência de equidade nos pronunciamentos de quem decide um caso particular em condição de igualdade com a parte submetida ao processo[25], valendo ressaltar que, por essa especial razão, Hegel posiciona os tribunais na Sociedade Civil, negando, por conseguinte, sua inserção na estrutura burocrática do Estado.


Assim,


“Sempre que uma classe, empregando seja um caráter comum ao conjunto das leis seja o processo, se apropria do reconhecimento do direito e da possibilidade de o fazer valer, e, além disso, se coloca numa situação de exclusividade usando uma língua que é estranha àqueles a que o direito se refere, os membros da sociedade civil que obtêm a subsistência na sua atividade, sua vontade e suas aptidões ficam à margem do direito, isto é, à margem não só do que lhes é próprio e pessoal como do que é substancial e racional nas suas relações; ficam numa espécie de tutela, até de escravidão em face dessa classe. Se lhes cabe o direito de se apresentarem ao tribunal corporalmente {in judicio starè), pouco será isso se também não estiverem presentes em espírito, com o saber que lhes é próprio, e o direito que obtêm é para eles um destino exterior”.[26]


Ao que tudo indica, essa compreensão da capacidade social de julgamento acaba por negar validade ao postulado hobbesiano segundo o qual a “doença” derivada de todo o indivíduo poder ser juiz acerca do bem e do mal traduziria a potencialidade de destruição do Estado, aniquilando, por conseguinte, sua função ligada à estruturação e à ordenação do corpo social.


Nas próprias palavras de Hobbes,


“Partindo desta falsa doutrina, os homens adquirem tendência para debater consigo próprios e discutir as ordens do Estado, mais tarde para obedecê-las ou desobedecê-las conforme acharem conveniente em seus juízos particulares, advindo um Estado perturbado e enfraquecido.”[27]


O Tribunal Popular desmente a posição hobbesiana e reafirma a crença na suposição de ser o povo o verdadeiro obstáculo à crescente tendência à hipertrofia do aparelho burocratizado do Estado, presente mesmo no âmbito da administração da Justiça; porém, a efetividade dessa crença encontra-se na dependência do reconhecimento de sua característica exclusivamente garantista de sorte a impedir sua utilização como instrumento velado de manobra voltado à potencialização das probabilidades de uma condenação iníqua e irracional, supostamente vedada no âmbito dos provimentos jurisdicionais dogmatizados.


Nessa conjuntura, merece especial importância o juízo de impronuncia, ferramenta adequada tanto à conservação da possibilidade acusatória, uma vez que permite, enquanto não extinta a punibilidade, a apresentação de nova denúncia lastreada em prova nova (artigo 414, paragrafo único, do Código de Processo Penal), quanto à preservação do status dignitatis do individuo, evitando-se sua corrosão pela dúvida, seja ela judiciária, social ou individual. 


 


Referências

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Notas:

[1] Egisto possuía fortes razões a justificar sua participação no homicídio de Agamêmnon. Atreu, pai de Agamêmnon, serviu a Tiestes, seu irmão e pai de Egisto, um grande banquete cujo prato principal era composto pela carne de seus filhos (ÉSQUILO. Oréstia: Agamêmnon, Coéforas, Eumênides. 6ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003, pp 80-85).

[2] Prestai toda a atenção no que instauro aqui/atenienses, convocados por mim mesma/para julgar pela primeira vez um homem/autor de um crime em que foi derramado sangue./A partir desse dia e para todo o sempre/ o povo que teve como rei Egeu/terá a incumbência de manter intactas/as normas adotadas neste tribunal/na colina de Ares, onde as Amazonas,/iradas com Teseu, instalaram seus tronos[…]. (ÉSQUILO. Oréstia: Agamêmnon, Coéforas, Eumênides. 6ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003, p.179)..

[3] O voto proferido por Atena ficou conhecido como voto de Minerva, referência ao nome da deusa na mitologia romana.

[4] Na forma disposta no artigo 447 do Código de Processo Penal, “O Tribunal do Júri é composto por 1 (um) juiz togado, seu presidente e por 25 (vinte e cinco) jurados que serão sorteados dentro os alistados, 7 (sete) dos quais constituirão o Conselho de Sentença em cada sessão de julgamento.”

[5] ÉSQUILO. Oréstia: Agamêmnon, Coéforas, Eumênides. 6ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003, pp. 181-182).

[6] Lynn Hunt, ao assinalar que os direitos humanos dependem da percepção individual de como são as outras pessoas, lembra que a empatia “depende do reconhecimento de que outros sentem e pensam como fazemos, de que nossos sentimentos interiores são semelhantes de um modo essencial”. (A Invenção dos Direitos Humanos: uma história. São Paulo: Companhia das Letras, 2009, p. 27).

[7] STRECK, Lenio Luiz. Tribunal do Júri: Símbolos e Rituais. 4ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 24.

[8] FOUCAULT, Michel. As Palavras e as Coisas: Uma arqueologia das ciências humanas. 8ª Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000, pp. 492-493.

[9] Reproduzindo parcialmente o paradigma de soberania defendido por Rousseau, a Constituição Federal declara que todo poder emana do povo, que o exerce diretamente ou por meio de seus representantes.

[10] Na precisa lição de Streck, “Há que se abandonar a perspectiva hobbesiana do direito penal e processual penal. Ou seja, o direito penal não deve colocar o jurista em uma encruzilhada, na qual tenha que optar entre a civilização e a barbárie. Por isso, o Direito deve ser visto como um sistema de garantias.” (STRECK, Lenio Luiz. Tribunal do Júri: Símbolos e Rituais. 4ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001,  p.14)

[11] Poder-se-á objetar que a decisão dos jurados proferida em completo desacordo com as provas dos autos autoriza o manejo de recurso de apelação com base no artigo 593, inciso III, alínea “d”, do Código de Processo Penal. É verdade! Contudo, se o órgão recursal der provimento ao recurso, o alcance de sua decisão será restrito à submissão do imputado a um novo julgamento por um grupo de jurados diferentes. Nesse caso, se o imputado for submetido a um novo julgamento plenário e, novamente, a decisão for absolutória, é defeso à acusação interpor um novo recurso alegando a dissociação do veredicto com a prova dos autos (artigo 593, paragrafo 3º, do Código de Processo Penal), culminando por cristalizar o viés garantista afeto à instituição do júri popular.

[12] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. Volume 4. 31ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 120-121.

[13] CAMPOS, Walfredo Cunha. Tribunal do Júri: Teoria e Prática. São Paulo: Atlas, 2010, pp. 90-91.

[14] “O Conselho de Sentença será questionado sobre matéria de fato e se o acusado deve ser absolvido.” (artigo 482 do Código de Processo Penal)

[15] CAMUS, Albert. El extranjero. Madri: Editora Planeta, 2010, 146 p.

[16] Marchi relembra a história real de Manoel da Motta Coqueiro, cujo enforcamento foi por ele considerado o maior erro da justiça brasileira. Coqueiro foi acusado pela morte de uma família inteira, agregada de sua fazenda, localizada no estado do Rio de Janeiro. Mesmo sem provas de autoria, foi levado a Júri Popular e, por conta de um jogo de manipulações reais e discursivas, condenado à morte. (MARCHI, Carlos. Fera de Macabu: O maior erro da Justiça Brasileira. Rio de Janeiro: Bestbolso, 2008)

[17] OLIVEIRA, Eugenio Pacelli. Curso de Processo Penal. 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p.846.

[18]LVII – ninguém será considerado culpado antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória.

[19] Toda pessoa acusada de um delito terá o direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente   provada sua culpa.

[20]Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa.

[21] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: Teoria do Garantismo Penal. 2a ed. Revista e ampliada. São Paulo: RT, 2006. p. 160. 

[22]LOPES JR., Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal (Fundamentos da Instrumentalidade Constitucional). 4a ed. Revista, atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2006. pp. 153-154.

[23] CAMPOS, Walfredo Cunha. Tribunal do Júri: Teoria e Prática. São Paulo: Atlas, 2010, pp. 88-89.

[24] BOURDIEU, Pierre. A Distinção: Critica Social do Julgamento. 2ª ed. Porto Alegre: Zouk, 2011, p. 372.

[25] HEGEL, Georg Wilíelm Friedrich. Princípios da Filosofia do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1997, pp. 200-201.

[26] Ibidem. pp. 210-202.

[27] HOBBES, Thomas. O Leviatã ou Matéria, Forma, Poder de um Estado Eclesiástico e Civil. São Paulo: Martin Claret, 2001, p. 236.  


Informações Sobre o Autor

Joel Eliseu Galli

Advogado Criminal. Mestrando em Sociologia Politica pela Universidade Federal de Santa Catarina.


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