A verdade material como diretriz do processo administrativo fiscal

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Resumo: o presente artigo pretende elucidar algumas questões que tangenciam o processo administrativo fiscal, bem como os princípios que lhe são peculiares. No desenvolver das ideias, supera-se a dicotomia meramente doutrinária que alguns autores abordam em relação ao processo e o procedimento, principalmente na seara do contencioso tributário.

Palavras chave: verdade material; processo administrativo fiscal; princípios.

Abstract: this article aims to clarify some issues that are tangential fiscal administrative process and the principles that are peculiar. In developing the ideas, excels merely doctrinal dichotomy that some authors report on the process and the procedure, especially in the harvest of tax litigation.

Keywords: material truth; tax administrative process; principles.

Sumário: 1. Introdução; 2. Processo administrativo tributário (breves apontamentos); 3. A verdade material como princípio máximo do processo administrativo fiscal; 4. Conclusão; Referências.

1 Introdução

Como amplamente debatido, apesar de existir extensa doutrina pátria divagando sobre as diferenças entre processo e procedimento, em termos práticos esta questão não nos parece ainda relevante.

Paulo de Barros Carvalho (2011) enfrenta a questão com a clareza que lhe é peculiar, admitindo a distinção entre os dois institutos. De acordo com o autor:

“De fato, ‘processo’, nos domínios do Direito, é o nome que se dá ao instrumento de composição de litígios, ou ao complexo de atos e termos voltados à aplicação do direito positivo a uma situação controvertida. […]. A figura do ‘processo’ está jungida ao campo da jurisdição, em que se pressupõe a existência de um órgão estatal, independente e imparcial, credenciado a compor conflitos de interesse, de maneira peremptória e satisfativa.” (CARVALHO 2011).

Mais a frente, no artigo intitulado “Segurança jurídica no novo CARF” o mestre ensina:

“Estamos em crer que é imperiosa a distinção entre processo e procedimento. Reservemos o primeiro termo, efetivamente, à composição de litígios que se opera no plano da atividade jurisdicional do Estado, par a que signifique a controvérsia desenvolvida perante os órgãos do Poder Judiciário. Procedimento, embora sirva para nominar também a conjugação de atos e termos harmonizados na ambitude da relação processual, deve ser o último étimo apropriado para referir a discussão que tem curso na esfera administrativa.

Firmadas estas premissas, é lícito deduzir que a locução adequada para aludirmos à impugnação de atos administrativos, junto à própria Administração, no que tange à matéria tributária, é ‘procedimento administrativo tributário’, ao contrário do que faz supor o título do presente trabalho.” (CARVALHO 2011).

 Por mais brilhante que sejam as explanações do autor, como dito alhures, tecnicismos doutrinários, nesta seara, trarão poucos benefícios ao presente estudo. É certo que há consideráveis divergências quanto ao monopólio da jurisdição: se concentrada única e exclusivamente nas mãos do Poder Judiciário frente à atuação da Administração Pública nos processos administrativos e também quanto à arbitragem, modalidade cada vez mais adotada diante da complexidade das relações jurídicas. Aqui não cabe esmiuçado debate sobre o temário, que requer delongadas elucubrações, além de fugir do objeto da presente análise.

Contudo, feita breve introdução, há que se considerar o poder das autoridades administrativas de proferirem decisões quando provocadas, no seio do processo administrativo fiscal, mesmo que estas não sejam dotadas de definitividade.

2 Processo administrativo tributário (breves apontamentos)

 O processo (ou procedimento, para alguns) administrativo tributário inicia-se com a impugnação tempestiva do sujeito passivo (seja ele contribuinte ou responsável, a depender do caso concreto) ao ato de lançamento realizado pela autoridade do ente tributante competente para instituição da exação.

Da leitura das considerações feitas pela professora Andréa Medrado Darzé (2014), em artigo intitulado “Preclusão da prova no processo administrativo tributário: um falso problema”, uma passagem, a nosso ver, é bastante feliz e retrata de modo cristalino a finalidade do processo administrativo tributário. De acordo com a autora:

“Neste ponto, vale ressaltar que, diferentemente do que se verifica no processo judicial, a principal finalidade do processo administrativo tributário não é solucionar conflitos de interesses entre particular e o Poder Público, ainda que o faça mediatamente. Sua razão é controlar a legalidade dos atos de constituição do crédito tributário.” (DARZÉ, 2014)

Além da finalidade delineada pela autora, a nosso sentir, respaldado nos ensinamentos do Mestre Geraldo Ataliba, o processo administrativo fiscal tem por escopo, senão principal, mas de extremada relevância, o “desafogamento” do Judiciário, já abarrotado com demandas das mais diversas espécies. Por isso, apregoa-se com tanta veemência, a necessidade do processo administrativo fiscal transcorrer sem excesso de formalismo, respeitando os princípios da celeridade e eficiência, norteadores, pelo menos em tese, da atividade administrativa.

Não resta dúvida quanto à aplicação do Código de Processo Civil no âmbito administrativo, porém apenas de forma subsidiária, somente em casos omissos, pois o processo administrativo fiscal, espécie do gênero processo administrativo, contem princípios e regras próprias, que norteiam as partes demandantes, até prolação da decisão final.

A estrita legalidade é parâmetro máximo do Direito Tributário como um todo, não sendo diferente na seara do processo administrativo tributário. Assim, o desenrolar dos atos devem, desde o lançamento (CTN artigo 142), aterem-se a lei.

Dúvida não há quanto à sujeição do processo administrativo fiscal ao devido processo legal, princípio basilar do Estado Democrático de Direito, expressamente positivado na Carta Magna de 1988, mais precisamente no artigo 5º, LIV. Decorrentes de tal princípio, a ampla defesa e o contraditório são garantias processuais asseguradas constitucionalmente às partes, que legitimam o procedimento. No entendimento de Paulo de Barros Carvalho (CARVALHO, 2011), o devido processo legal compreende o direito de oitiva das partes, ampla publicidade dos atos procedimentais, informalismo, bem como o amplo direito de produção de provas, claro, dentro do limites legais.

Quanto à dilação probatória, especificidade inerente ao processo administrativo fiscal é de competência da autoridade administrativa julgadora produzir prova por iniciativa própria, em detrimento as partes.

O informalismo nada mais é do que o respeito à verdade material, de modo a beneficiar o administrado, desembaraçando o procedimento e despindo-o de formalidades, em prol do contribuinte. É defeso a Fazenda Pública valer-se do princípio em comento, já que sua atividade é plenamente vinculada à lei. Aqui não se descarta por óbvio, as transações administrativas ex lege, cuja leitura do livro “Transações Administrativas” do Professor Onofre Alves Batista Júnior (2007) torna-se imprescindível.

3 A verdade material como princípio máximo do processo administrativo fiscal

Grandes doutrinadores pontuam que o processo administrativo tributário visa a busca da verdade material, aquela cujas diretrizes são os fatos que realmente ocorreram no mundo fenomênico, conquanto que o processo judicial, não só de natureza tributária, acaba por prevalecer a verdade formal, limitada aos documentos que instruem os autos.

Assim, no contencioso administrativo fiscal deve-se afastar a formalidade processual probatória, típica do contencioso judicial, em nome da verdade material. Logo, dentro do processo administrativo lato senso, a autoridade administrativa tem maior liberdade na colheita e produção de provas. Mais uma vez: no processo administrativo fiscal prepondera a verdade material.

Em apertada síntese, conforme preleciona a Lei 9.784/99, o Decreto nº 70.235/72 e o Decreto 7.574/11, arcabouço jurídico do processo administrativo, dentre eles o fiscal, é conferido à autoridade administrativa julgadora amplas prerrogativas de investigação dos fatos, através do impulso oficial e da iniciativa probatória do “juiz”, de modo a sempre buscar a verdade material da demanda levada a apreciação. Desatrela-se, deste modo, o julgador das provas constantes apenas nos autos.

Pelo princípio da oficialidade o trâmite dos atos na duração do processo administrativo não é exclusividade das partes, podendo ser realizados pelo órgão julgador, em nome da celeridade, eficiência e economia processual. É o que prevê expressamente o artigo 2º, parágrafo único, XII, da Lei 9.784/99. Nítida é a busca pela verdade material.

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Paulo de Barros Carvalho (2011), autor que inspira as anotações aqui transcritas realça a importância do princípio da oficialidade:

“Do princípio da oficialidade se desprende a regra de que o impulso do procedimento deve caber à Administração […]. Demora-se aqui um fator de dessemelhança com relação ao Direito Processual Civil, em que prevalece a diretriz segundo a qua a lei atribui às partes assegurarem o caminhar do procedimento judicial, na busca da tutela jurisdicional do Estado. […]. Deflui, também, da máxima da oficialidade o preceito do timbre instrutório que há de acompanhar o procedimento administrativo, entendendo-se por isso a circunstância de que a produção de provas e todas as demais providências para a averiguação dos fatos subjacentes cabem tanto ao Poder Público quanto à parte interessada.” (CARVALHO 2011)

Tudo para preconizar o postulado da verdade material.

A nosso ver, em que pese às diversas teorias sobre o momento da prova no processo administrativo tributário, dentre elas a que preconiza a aplicação imediata do §4º artigo 16 do Decreto nº 70.235/72, para alcançar a verdade material em sua excelência, deve ser aplicado o teor do artigo 38 da Lei 9.784/99 aqui transcrito in verbis:

“Art. 38. O interessado poderá, na fase instrutória e antes da tomada da decisão, juntar documentos e pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do processo.

§ 1o Os elementos probatórios deverão ser considerados na motivação do relatório e da decisão.

§ 2o Somente poderão ser recusadas, mediante decisão fundamentada, as provas propostas pelos interessados quando sejam ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias.”

Assim, além de respeitar o devido processo legal, o documento apresentado, mesmo que de modo atemporal, deve ser analisado pelo julgador, devido a competência concorrente deste, juntamente com as partes, para produzir provas, dentro dos liames da legalidade.

Bem mais que prerrogativa, é dever da autoridade julgadora analisar as provas constantes dos autos, mesmo que preclusa. Assim, a análise que cabe ao julgador é se a prova apresentada intempestivamente é ou não decisiva, necessária para a solução do conflito.

4 Conclusão

Por mais que para renomados autores, tanto de Direito Tributário, como de diversas outras áreas do conhecimento jurídico, seja relevante a distinção entre processo e procedimento, na nossa modesta opinião, debates acerca do assunto restam superados.

Não há dúvida que o procedimento administrativo, para alguns, trata-se de verdadeiro processo, pois presentes ampla defesa e contraditório, princípios inerentes ao devido processo legal, em que pese a Administração Pública não ser dotada de jurisdição (juris dicere = dizer o direito), esta privativa do Poder Judiciário.

Ademais, já há doutrinadores refutando esta atribuição exclusiva do Judiciário, vide a importância que vem ganhando os Tribunais Administrativos, bem como a disseminação da mediação e da arbitragem, julgamentos privados presididos por profissionais especialistas em determinadas áreas.

Assim, o processo administrativo fiscal é regido por princípios e legislações próprias, sendo, em caso de omissão, aplicado o CPC. Através deste arcabouço legislativo e principiológico o processo administrativo, gênero, tem por escopo máximo a busca da verdade material, beneficiando o administrado, em detrimento a verdade formal, típica do processo judicial, que se atêm as provas e indícios constantes nos autos.

Referências:
ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 6ª Edição, São Paulo: Ed. Malheiros, 2011;
BRASIL. Código Tribitário Nacional. Disponível em: www.planalto.gov.br/legislação/códigos> Acesso em: jul. 2014;
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>
BRASIL. Lei nº 12.546, de 14 de dezembro de 2011. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12546.htm> Acesso em: agosto de 2014;
COELHO, Sacha Calmon Navarro Coelho. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 12ª edição, Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2012;
MACHADO, H.B. Curso de Direito Tributário. 11ª Edição, São Paulo: Ed. Malheiros:, 1996;
DARZÉ, Andréa Medrado, “Preclusão da Prova no Processo Administrativo Tributário: Um Falso Problema”in “VIII Congresso Nacional de Estudos Tributários. Derivação e Positivação no Direito Tributário”, CARVALHO, Ana Carolina Papacosta Conte de [et al]. São Paulo: Noeses, 2011.

Informações Sobre o Autor

Thiago Duca Amoni

Graduado em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos. Pós Graduando em Direito Tributário pela Faculdade de Direito Milton Campos


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