O advogado de compliance é o profissional jurídico responsável por garantir que empresas atuem em conformidade com as leis, regulamentos e boas práticas do mercado. Sua atuação vai muito além da simples revisão contratual ou da defesa em processos judiciais, sendo cada vez mais estratégica na prevenção de riscos, fraudes e crimes corporativos. Com a crescente complexidade regulatória e a exigência de padrões éticos mais elevados por parte de investidores, órgãos de fiscalização e consumidores, o advogado de compliance tornou-se figura essencial nas estruturas empresariais modernas. Neste artigo, você vai entender o que é compliance, qual o papel do advogado nessa área, como funciona sua atuação prática, quais são os desafios e oportunidades da carreira e tudo que envolve essa especialidade jurídica.
O que é compliance e por que ele é importante
Compliance é um termo que deriva do verbo inglês “to comply”, que significa agir de acordo com, estar em conformidade com. No contexto corporativo, o compliance representa o conjunto de procedimentos, políticas, controles internos e condutas destinados a assegurar que a empresa esteja em conformidade com a legislação, regulamentos do setor, normas internas e princípios éticos.
A importância do compliance cresceu exponencialmente nas últimas décadas, especialmente após escândalos corporativos de grande repercussão. Empresas passaram a investir fortemente em mecanismos preventivos para evitar violações legais, riscos de corrupção, fraudes financeiras, danos à imagem institucional e sanções regulatórias.
A adoção de programas de compliance é um diferencial competitivo. Além de evitar multas milionárias, a prática proporciona maior segurança jurídica, melhora a reputação da empresa e facilita o relacionamento com investidores, parceiros e órgãos de controle.
Qual o papel do advogado de compliance
O advogado de compliance é o responsável por planejar, implementar e monitorar programas que garantam a conformidade legal da empresa. Ele atua como elo entre o departamento jurídico e a área de compliance, assegurando que todas as decisões empresariais estejam alinhadas com as exigências legais e com os princípios éticos que regem o setor.
As principais atribuições do advogado de compliance incluem:
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Identificar e mapear riscos legais e regulatórios;
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Elaborar políticas internas e códigos de conduta;
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Monitorar mudanças legislativas e adaptar os processos internos;
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Participar de auditorias e investigações internas;
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Conduzir treinamentos e ações de sensibilização;
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Assessorar a alta administração na tomada de decisões;
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Coordenar a resposta a fiscalizações, autuações e notificações de órgãos reguladores;
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Auxiliar na gestão de denúncias e canal de ouvidoria.
Esse profissional precisa dominar conhecimentos jurídicos em áreas como direito empresarial, direito penal econômico, direito regulatório, direito do trabalho e direito tributário, além de habilidades interpessoais, visão de negócios e integridade profissional.
Diferença entre advogado de compliance e departamento jurídico tradicional
Embora ambos os profissionais atuem na área jurídica, há diferenças significativas entre o advogado de compliance e o advogado que atua exclusivamente no contencioso ou na assessoria contratual.
O advogado tradicional costuma atuar de forma reativa: analisa riscos jurídicos após a ocorrência de fatos, elabora defesas, ajuíza ações e realiza pareceres técnicos sobre demandas pontuais. Já o advogado de compliance atua preventivamente, ou seja, seu foco é impedir que a empresa venha a cometer ilícitos ou se envolva em situações que possam comprometer sua integridade e reputação.
Outra diferença é a natureza multidisciplinar do compliance. O advogado dessa área precisa dialogar com diversos setores da empresa (recursos humanos, finanças, comercial, tecnologia, etc.), ter conhecimento prático de governança corporativa e entender como os riscos se materializam na operação da empresa. Sua atuação é menos jurídica no sentido clássico e mais estratégica, voltada à gestão de riscos e à tomada de decisão.
Áreas do direito que mais exigem atuação em compliance
A atuação em compliance é multidisciplinar, mas há áreas do direito que exigem especial atenção do advogado de compliance, especialmente em grandes empresas ou corporações que operam em setores regulados. As principais áreas são:
Direito penal empresarial e anticorrupção:
O advogado deve assegurar que a empresa não pratique atos lesivos contra a administração pública ou se envolva em corrupção, lavagem de dinheiro e fraudes. A Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013) é um marco nesse sentido.
Direito regulatório:
Empresas que operam em setores como saúde, energia, telecomunicações e mercado financeiro precisam seguir normas específicas de agências reguladoras como ANVISA, ANEEL, ANATEL e BACEN.
Direito trabalhista:
O cumprimento das normas trabalhistas, prevenção de assédio moral e sexual, controle de jornadas e respeito às normas de segurança do trabalho também fazem parte das obrigações de compliance.
Direito concorrencial:
A legislação antitruste proíbe práticas como cartel, abuso de poder econômico e concorrência desleal. O advogado de compliance ajuda a garantir que a empresa não cometa infrações à ordem econômica.
Direito tributário:
O compliance fiscal exige atenção especial na gestão dos tributos, retenções, emissão de notas fiscais e escrituração contábil. O advogado atua em conjunto com contadores e auditores.
Proteção de dados e privacidade:
Com a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a área de compliance passou a ter um papel fundamental na proteção das informações pessoais de clientes, funcionários e parceiros comerciais.
Como implementar um programa de compliance eficaz
O papel do advogado de compliance também inclui a elaboração e implementação de programas de integridade. Para que um programa seja eficaz, ele deve conter os seguintes elementos:
1. Comprometimento da alta direção (tone at the top):
A liderança da empresa precisa demonstrar engajamento e apoio real ao programa de compliance. Sem isso, todas as ações seguintes perdem força.
2. Mapeamento de riscos:
Identificar e classificar os riscos legais e reputacionais a que a empresa está exposta. Isso inclui analisar os setores mais vulneráveis a fraudes, corrupção, sanções trabalhistas ou ambientais.
3. Código de ética e conduta:
Um documento claro, objetivo e acessível a todos os colaboradores, estabelecendo padrões de comportamento, punições para desvios e os valores da organização.
4. Políticas e procedimentos internos:
Políticas de brindes e hospitalidades, conflitos de interesse, uso de informações privilegiadas, compliance fiscal, tratamento de dados pessoais, entre outros.
5. Treinamentos e comunicação:
A capacitação constante dos funcionários é essencial para que todos compreendam suas responsabilidades e saibam como agir diante de situações suspeitas.
6. Canais de denúncia:
Ferramentas seguras, anônimas e eficazes para que qualquer pessoa possa reportar irregularidades sem medo de retaliação.
7. Investigações internas:
Procedimentos claros para apurar denúncias, garantir o contraditório e adotar as medidas disciplinares cabíveis.
8. Monitoramento e auditoria:
Avaliações periódicas de conformidade, revisão de controles e adaptação às mudanças legais ou institucionais.
Responsabilidade do advogado de compliance diante de infrações
O advogado de compliance tem responsabilidade ética e legal na condução de suas atividades. Se, por omissão ou negligência, ele deixar de agir diante de uma conduta ilícita conhecida ou contribuir para acobertá-la, pode ser responsabilizado civil, administrativamente e até criminalmente.
No entanto, sua função não é a de policial interno da empresa, mas sim de garantir que os procedimentos estejam alinhados com a lei e oferecer as orientações necessárias. A responsabilização do advogado depende da comprovação de dolo ou culpa grave.
Sua atuação deve estar documentada, com registros de recomendações, alertas, treinamentos e pareceres. A prestação de contas e a independência do setor jurídico de compliance em relação à diretoria operacional também são fundamentais para a integridade do sistema.
Oportunidades de carreira na área de compliance
A área de compliance oferece um leque amplo de oportunidades profissionais para advogados. É possível atuar:
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Em departamentos jurídicos de grandes empresas;
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Como compliance officer em companhias nacionais e multinacionais;
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Em escritórios de advocacia especializados;
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Como consultor independente;
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Em instituições financeiras, seguradoras, hospitais e operadoras de saúde;
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Em startups e empresas de tecnologia que operam com dados sensíveis.
Além disso, o campo se expande para funções relacionadas, como auditoria interna, investigação corporativa, governança corporativa, ESG (meio ambiente, social e governança), proteção de dados e gestão de riscos.
Com a internacionalização de normas de conduta e a exigência de compliance por parte de fornecedores e parceiros comerciais, profissionais da área jurídica ganham destaque por sua capacidade de interpretar normas, mediar conflitos e propor soluções éticas e juridicamente seguras.
Perfil e habilidades do advogado de compliance
O advogado de compliance precisa reunir uma série de competências técnicas e comportamentais para exercer sua função com excelência. Entre as principais habilidades exigidas estão:
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Sólido conhecimento jurídico, especialmente em direito penal empresarial, direito regulatório e direito do trabalho;
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Boa comunicação escrita e oral para redigir políticas e conduzir treinamentos;
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Capacidade de negociação e mediação;
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Raciocínio lógico e visão analítica para identificar e mapear riscos;
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Atualização constante sobre leis, normas e jurisprudência;
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Ética, sigilo profissional e integridade inquestionáveis;
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Conhecimentos de inglês jurídico e legislação internacional, especialmente se a empresa tiver relações com o exterior;
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Familiaridade com ferramentas de tecnologia voltadas à gestão da conformidade, denúncias e auditorias.
Tendências e desafios do compliance no Brasil
O compliance no Brasil tem evoluído rapidamente, especialmente após escândalos envolvendo corrupção e má gestão em empresas públicas e privadas. A Operação Lava Jato, por exemplo, acelerou a implantação de programas de integridade em diversos setores.
Atualmente, os principais desafios incluem:
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Difundir a cultura de compliance em empresas de médio e pequeno porte;
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Integrar compliance com práticas de ESG e responsabilidade social;
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Atuar de forma preventiva em relação a crimes tributários, ambientais e de concorrência;
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Lidar com a alta complexidade normativa e a sobreposição de exigências entre diferentes órgãos reguladores;
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Promover a efetividade dos canais de denúncia e combater a impunidade interna;
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Integrar compliance com proteção de dados, cibersegurança e novas tecnologias.
O futuro aponta para um compliance mais tecnológico, automatizado, conectado ao negócio e focado em resultados mensuráveis. O advogado que quiser se destacar nesse campo precisará aliar domínio jurídico a habilidades de gestão, comunicação e estratégia corporativa.
Perguntas e respostas
O que é compliance jurídico?
É o conjunto de ações para garantir que a empresa esteja em conformidade com leis, regulamentos e normas internas. O advogado atua na prevenção de riscos e infrações legais.
Quais leis regem o compliance no Brasil?
Entre as principais estão a Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013), a Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/1998), a LGPD (Lei 13.709/2018) e o Código Penal.
Toda empresa precisa de um advogado de compliance?
Embora não seja obrigatório por lei, é altamente recomendável. Ter um profissional especializado reduz riscos legais, protege a imagem da empresa e fortalece sua governança.
Qual a diferença entre compliance e auditoria?
O compliance foca na prevenção de riscos e conformidade legal. A auditoria verifica se as práticas adotadas estão sendo cumpridas de fato.
O advogado de compliance pode ser responsabilizado?
Sim, se agir com negligência, dolo ou acobertar práticas ilegais. Porém, seu papel é orientar e não policiar a empresa.
Como entrar na área de compliance como advogado?
É recomendável fazer especializações na área, participar de cursos sobre integridade corporativa, direito penal empresarial e ESG, além de buscar certificações internacionais.
É possível ser advogado de compliance em escritório de advocacia?
Sim. Muitos escritórios oferecem serviços de consultoria e implementação de programas de integridade, além de conduzir investigações internas.
Qual a relação entre compliance e a LGPD?
O compliance é responsável por garantir que a empresa trate dados pessoais conforme a LGPD, incluindo mapeamento de riscos, adequação de contratos e treinamento de equipes.
Compliance serve apenas para grandes empresas?
Não. Pequenas e médias empresas também se beneficiam do compliance, especialmente na prevenção de riscos trabalhistas, fiscais e reputacionais.
Advogado de compliance ganha bem?
Sim. Os salários variam conforme o porte da empresa e a experiência do profissional, mas costumam ser acima da média do mercado jurídico tradicional.
Conclusão
O advogado de compliance é hoje um dos profissionais mais valorizados do mundo jurídico e corporativo. Sua atuação estratégica, preventiva e multidisciplinar faz dele um guardião da ética, da legalidade e da reputação empresarial. Em um cenário cada vez mais exigente em termos de transparência, sustentabilidade e responsabilidade corporativa, o compliance deixou de ser um diferencial para se tornar uma necessidade.
Mais do que saber interpretar leis, o advogado de compliance precisa entender o funcionamento do negócio, antecipar riscos, propor soluções viáveis e contribuir para a cultura de integridade nas organizações. Sua presença é decisiva para o crescimento sustentável da empresa e para a construção de um ambiente de negócios mais justo, seguro e ético.
Quem deseja seguir essa carreira deve se preparar com profundidade, buscar certificações, desenvolver competências além do Direito e, sobretudo, estar disposto a assumir um papel de liderança na transformação das organizações. O futuro do direito passa, inevitavelmente, pelo fortalecimento do compliance e pela atuação comprometida de profissionais que entendem que ética e legalidade caminham juntas com o sucesso.