Análise do eercício do controle de constitucionalidade pelos Poderes do Estado

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Resumo: O presente ensaio busca examinar o instituto do controle constitucionalidade, especificamente com relação aos momentos e órgãos de realização desse controle.

Palavras-chave: controle de constitucionalidade; controle preventivo; controle repressivo; órgãos de controle.

Abstract: This paper seeks to examine the institution of constitutional control, specifically with respect to time and bodies to achieve this control.

Keywords: constitutional control, preventive control, repressive control, control agencies.

Sumário: 1. Introdução – 2. Órgãos de Controle de Constitucionalidade – 2.1. Controle de Constitucionalidade Preventivo pelo Poder Legislativo – 2.2. Controle de Constitucionalidade Preventivo pelo Poder Executivo – 2.3. Controle de Constitucionalidade Preventivo pelo Poder Judiciário – 2.4. Controle de Constitucionalidade Repressivo pelo Poder Legislativo – 2.5. Controle de Constitucionalidade Repressivo pelo Poder Executivo – 2.6. Controle de Constitucionalidade Repressivo pelo Poder Judiciário – Controle de Constitucionalidade pelo Tribunal de Contas. Referências Bibliográficas.

1. INTRODUÇÃO

O controle de constitucionalidade se desenvolve em dois momentos clássicos, podendo ser  prévio (preventivo) ou posterior (repressivo). O controle prévio não recai sobre uma lei ou ato normativo já perfeito e acabado, mas sim, sobre um projeto de lei, uma proposta normativa que ainda não está completamente aperfeiçoada. Se aferição da constitucionalidade ocorre antes da lei efetivamente existir e integrar a ordem jurídica, o controle será prévio. O controle posterior, por sua vez, atua após estar definitivamente acabada a lei ou ato normativo. No Brasil, por influência norte-americana, adotou-se a teoria da revisão judicial dos atos legislativos, pela qual, em regra, compete ao poder judiciário aferir posteriormente a constitucionalidade dos atos normativos.

Embora o controle de constitucionalidade seja, via de regra, jurisdicional, não somente o poder judiciário pode exercê-lo. A regra geral é que compete a órgão do poder judiciário o exercício desse controle, mas isso não significa que o poder executivo ou o legislativo não possam também proceder à sua realização. Trata-se exatamente do princípio da separação de poderes, conhecido mecanismo de freios e contrapesos ("checks ands balances system"), aplicável na esfera do controle de constitucionalidade. É, portanto, sobre este ponto, que buscaremos discorrer, analisando as diferentes possibilidades previstas no ordenamento jurídico brasileiro para o exercício do controle de constitucionalidade pelos órgãos dos três Poderes do Estado.

2. ÓRGÃOS DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Pela teoria da revisão judicial dos atos normativos, sabe-se que o controle de constitucionalidade é feito repressivamente pelo poder Judiciário. Contudo, os três poderes, Judiciário, Legislativo e Executivo, podem realizar controle de constitucionalidade, seja em momento preventivo, seja em momento repressivo. Em outros termos, tanto o controle preventivo, como o controle repressivo, podem ser feitos pelo Executivo, Legislativo e Judiciário. Vejamos cada um:

2.1. Controle de Constitucionalidade Preventivo pelo Poder Legislativo

É possível ao Poder Legislativo realizar preventivamente o controle de constitucionalidade sobre os seus próprios atos normativos. Tal controle é feito eminentemente pelas Comissões de Constituição e Justiça (CCJ), na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, durante a elaboração dos projetos legislativos.

Antes de ser encaminhada determinada proposta de lei, as Comissões de Constituição e Justiça analisam previamente se o projeto é constitucional, para fins de encaminhamento à deliberação nas casas legislativas. A função precípua do Legislativo é elaborar leis e, obviamente, essas leis não são elaboradas sem qualquer critério, logo, é atividade rotineira, ordinária do legislativo, realizar controle de constitucionalidade prévio dos projetos que tramitam em suas Casas.

Isso não faz com que seja a hipótese padrão de controle de constitucionalidade, porque o modelo constitucional, por adoção da teoria da revisão judicial dos atos legislativos, é o controle repressivo do judiciário. Mas, a rigor, em se tratando de controle de constitucionalidade preventivo, este é feito primordialmente pelo poder Legislativo.

2.2. Controle de Constitucionalidade Preventivo pelo Poder Executivo

O Chefe do Executivo, ao receber um projeto de lei, poderá sancioná-lo ou vetá-lo. Se há veto, estará havendo controle preventivo. Na verdade, o Chefe do Executivo veta o projeto de lei, e não a lei, porque o projeto de lei só se torna lei com a sanção (aquiescência) ou eventual derrubada do veto. Assim, o controle de constitucionalidade preventivo feito pelo poder executivo ocorre por meio do veto.

Vale ressaltar que existe o veto político e o veto jurídico. O veto é político quando o Chefe do Executivo entende que o projeto é contrário ao interesse público. O veto é jurídico quando veta-se o projeto não mais por ser contrário ao interesse público, mas por entender que o projeto é inconstitucional. Nos termos do art. 66, §1º, da CF/88, estabelece a Carta Magna que se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional (veto jurídico) ou contrário ao interesse público (veto político), vetá-lo-á total ou parcialmente. Somente o veto jurídico é, de fato, o controle de constitucionalidade prévio, o veto político não é controle de constitucionalidade, porque nesse caso não há afronta à Constituição.

2.3. Controle de Constitucionalidade Preventivo pelo Poder Judiciário

Em regra, o controle de constitucionalidade cabe ao poder Judiciário, que o fará de forma repressiva. Contudo, existe uma hipótese de controle preventivo realizado pelo Judiciário. Trata-se da impetração de mandado de segurança por parlamentar, para fazer valer o seu direito-função ao processo legislativo juridicamente regular. É o que acontece na hipótese de Emendas Constitucionais que violam cláusulas pétreas. Trata-se, nesse caso, nos termos do entendimento da Corte Suprema, da chamada inconstitucionalidade chapada, ou flagrante. Se um parlamentar visualiza uma emenda tendente a violar cláusulas pétreas, será hipótese, desde já, de controle de constitucionalidade.

O remédio constitucional adequado a tal ocorrência é o mandado de segurança, para impedir a votação do projeto. O mandado de segurança não é contra a lei já aprovada, mas tem por objetivo  sustar o prosseguimento do processo irregular de votação de um projeto de lei eivado de constitucionalidade no seu nascedouro. Nesse caso, é possível ser submetido o texto da proposta de emenda à controle do judiciário, de forma preventiva, porquanto não chegou a haver ainda a aprovação final da Emenda, ainda em trâmite.

Isso decorre da análise da redação do §4º do art. 60 da Constituição Federal, o qual estabelece que Emenda tendente a abolir cláusula pétrea não será objeto de deliberação. Isso significa que, pelo texto constitucional, obsta-se até mesmo a deliberação legislativa de emenda ofensiva à cláusula pétrea. Portanto, o texto constitucional determina que tais matérias nem podem ser postas em deliberação, daí porque a jurisprudência atual do STF reconhece o direito subjetivo conferido pela CF/88 aos parlamentares, os quais poderão obstar, via mandado de segurança, a própria deliberação da proposta de emenda.

2.4. Controle de Constitucionalidade Repressivo pelo Poder Legislativo

Em regra, como visto, o poder Legislativo exerce controle de constitucionalidade em momento preventivo, por meio das Comissões de Constituição e Justiça, mas é possível também fazê-lo em momento posterior. Trata-se da hipótese de rejeição de medida provisória.

Quando a medida provisória chega no Legislativo, este poderá convertê-la em lei, ou poderá rejeitá-la. A medida provisória, embora não seja lei, tem força de lei. Isto é, com a medida provisória, já houve o efetivo ingresso no ordenamento jurídico de espécie normativa pronta e acaba, como se lei fosse. Logo, a rejeição de medida provisória é hipótese de controle repressivo de constitucionalidade realizado pelo poder Legislativo.

Além disso, dispõe o art. 49, V, da CF/88 que compete ao Congresso Nacional sustar os atos normativos do Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa. O Legislativo, assim, pode suspender ato normativo do Executivo quando este exorbitar os limites: (a) do poder regulamentar (art. 84, IV, CF/88); (b) da delegação legislativa (art. 68, CF/88). Em ambos os casos, trata-se, pois, de um controle de legalidade, nesse caso a inconstitucionalidade é reflexa. Havendo, então, exorbitação do executivo aos limites impostos pelo legislativo, pode o próprio Legislativo atuar repressivamente sustando atos normativos do executivo.

2.5. Controle de Constitucionalidade Repressivo pelo Poder Executivo

Já se sabe que o Executivo pode realizar controle prévio de constitucionalidade por meio do veto jurídico. É possível ao Executivo também, em hipótese excepcionalíssima, realizar controle de constitucionalidade repressivo. Trata-se de hipótese reconhecida pela jurisprudência da Suprema Corte, do exercício do controle de constitucionalidade pelo Executivo com a não aplicação de lei que repute maculada de incostitucionalidade.

Refere-se a uma possibilidade conferida aos Chefes do Executivo de não aplicar determinada lei ou ato normativo quando entender que essas espécies são inconstitucionais. Nesse caso, a lei fica ineficaz por opção do Executivo, que tem a possibilidade de descumprir um ato legislativo quando entender inconstitucional.

É claro que isso não é um "cheque em branco", o Executivo não pode simplesmente deixar de aplicar uma lei porque não lhe interessa, sob pena de responsabilidade. Trata-se de hipótese excepcionalíssima, exercido pelo Executivo, em momento posterior, que embora não haja previsão expressa em lei, é reconhecida pelos tribunais.

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2.6. Controle de Constitucionalidade Repressivo pelo Poder Judiciário

A regra é o controle de constitucionalidade feito pelo poder Judiciário, e feito em momento posterior. O controle de constitucionalidade no Brasil adota a teoria da revisão judicial dos atos legislativos. Toda e qualquer lei que viole à Constituição pode, em tese, ser objeto de impugnação ao Judiciário, cabendo a este a função precípua de guardião da Constituição, o que pressupõe a competência originária para o controle de constitucionalidade.

Aqui, portanto, está a maioria esmagadora os casos de controle de constitucionalidade, sendo atividade corriqueira e ordinária do Judiciário a realização do controle repressivo de constitucionalidade. No direito brasileiro adotou-se o chamado controle misto de constitucionalidade, porque admite tanto o controle concentrado, no âmbito da Corte Marior e dos Tribunais de Justiça nos Estados, como também o controle difuso, realizado por todos os órgãos do judiciário.

2.7. Controle de Constitucionalidade pelo Tribunal de Contas

A Corte de Contas é órgão que realiza o controle externo da Administração, como "longa manus" do poder Legislativo. No exercício desse controle, pode o Tribunal de Contas exercer aferição de constitucionalidade. O Supremo Tribunal Federal autoriza expressamente essa possibilidade, através da Súmula 347:

“O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do poder público”.

Ao Tribunal de Contas, contudo, só será possível declarar a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo "in concreto", jamais em abstrato, caso contrário estaria havendo usurpação da competência do próprio STF.

Contudo, há que se ressalvar que o tema atualmente tem gerado certa polêmica, sobretudo porque o STF, em várias decisões monocráticas em sede de liminar, vem suscitando a necessidade de revisão da referida Súmula, porque exarada em momento anterior à CF/88. A regra atual, portanto, é que cabe declaração de inconstitucionalidade pelo Tribunal de Contas para afastar a aplicação da lei no caso concreto, mas existe uma inclinação no STF no sentido de mudar esse panorama, ainda inalterado. A respeito veja-se o voto singular do Min. Gilmar Mendes em decisão monocrática no MS 25.888:

“Assim, a declaração de inconstitucionalidade, pelo Tribunal de Contas da União, do art. 67 da Lei n° 9.478/97, e do Decreto n° 2.745/98, obrigando a Petrobrás, consequentemente, a cumprir as exigências da Lei n° 8.666/93, parece estar em confronto com normas constitucionais, mormente as que traduzem o princípio da legalidade, as que delimitam as competências do TCU (art. 71), assim como aquelas que conformam o regime de exploração da atividade econômica do petróleo (art. 177). Não me impressiona o teor da Súmula nº 347 desta Corte, segundo o qual ‘o Tribunal de Contas, o exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público’. A referida regra sumular foi aprovada na Sessão Plenária de 13.12.1963, num contexto constitucional totalmente diferente do atual. Até o advento da Emenda Constitucional n° 16, de 1965, que introduziu em nosso sistema o controle abstrato de normas, admitia-se como legítima a recusa, por parte de órgãos não-jurisdicionais, à aplicação da lei considerada inconstitucional. No entanto, é preciso levar em conta que o texto constitucional de 1988 introduziu uma mudança radical no nosso sistema de controle de constitucionalidade. Em escritos doutrinários, tenho enfatizado que a ampla legitimação conferida ao controle abstrato, com a inevitável possibilidade de se submeter qualquer questão constitucional ao Supremo Tribunal Federal, operou uma mudança substancial no modelo de controle de constitucionalidade até então vigente no Brasil. Parece quase intuitivo que, ao ampliar, de forma significativa, o círculo de entes e órgãos legitimados a provocar o Supremo Tribunal Federal, no processo de controle abstrato de normas, acabou o constituinte por restringir, de maneira radical, a amplitude do controle difuso de constitucionalidade. A amplitude do direito de propositura faz com que até mesmo pleitos tipicamente individuais sejam submetidos ao Supremo Tribunal Federal mediante ação direta de inconstitucionalidade. Assim, o processo de controle abstrato de normas cumpre entre nós uma dupla função: atua tanto como instrumento de defesa da ordem objetiva, quanto como instrumento de defesa de posições subjetivas. Assim, a própria evolução do sistema de controle de constitucionalidade no Brasil, verificada desde então, está a demonstrar a necessidade de se reavaliar a subsistência da Súmula 347 em face da ordem constitucional instaurada com a Constituição de 1988″. (STF, MS 25.888 MC / DF, Decisão do Ministro Relator – Monocrática, Rel . Min. Gilmar Mendes, DJ 29/03/2006.)

 

Referências bibliográficas
BARROSO, Luis Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 2ª ed. Saraiva, 2010.
BULLOS, Uadi Lammego. Curso de Direito Constitucional. 6ª ed. Saraiva, 2011.
CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 6ª ed. Juspodvum, 2012.
FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira Filho. Curso de Direito Constitucional. 37ª ed. Saraiva, 2011.
MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 6ª ed. Saraiva, 2011.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 27ª ed. Atlas, 2011.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 34ª ed. Malheiros, 2011.

Informações Sobre o Autor

José Eliaci Nogueira Diógenes Júnior

Procurador Federal Membro da Advocacia-Geral da União. Pós-graduado em Direito Ambiental e Urbanístico. Pós-graduado em Direito Processual Civil e Trabalho. Pós-graduado em Direito Constitucional. Professor Universitário.


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