O artigo 271 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) trata de uma das medidas administrativas mais relevantes no contexto do trânsito: a remoção e a retenção de veículos. Ele estabelece as regras e os procedimentos que devem ser adotados quando um veículo estiver em situação irregular, explicando em que casos ele pode ser retido no local ou removido para depósito. Trata-se de um tema que gera muitas dúvidas entre os motoristas, especialmente quando se deparam com situações em que seus veículos são guinchados ou bloqueados sem entender claramente os motivos.
Neste artigo, vamos apresentar uma análise completa do artigo 271 do CTB, explicando cada uma de suas previsões legais, os critérios de aplicação, os direitos e deveres dos condutores, bem como os procedimentos administrativos envolvidos. Também abordaremos os aspectos controversos e as alterações legais que vêm ocorrendo ao longo do tempo.
O que diz o artigo 271 do Código de Trânsito Brasileiro
O artigo 271 do CTB estabelece que, sempre que uma infração de trânsito for constatada e houver previsão legal para a remoção do veículo como medida administrativa, esse veículo poderá ser removido ao depósito público até que a irregularidade seja sanada e os encargos sejam devidamente quitados.
A redação legal diz o seguinte:
Art. 271. A autoridade ou o agente de trânsito, na esfera das competências estabelecidas neste Código e dentro de sua circunscrição, poderá remover o veículo nos casos previstos neste Código, assegurada a sua devolução ao proprietário mediante o pagamento das despesas com remoção e estada, e após sanadas as irregularidades.
Esse artigo foi ao longo do tempo complementado por parágrafos e incisos que ampliam e detalham os procedimentos, incluindo a forma de aplicação, hipóteses específicas de remoção ou retenção, prazos e direitos dos condutores.
Diferença entre remoção e retenção do veículo
Um dos pontos mais importantes ao interpretar o artigo 271 é entender a diferença entre remoção e retenção:
Remoção do veículo: ocorre quando o veículo é transportado por um guincho e levado ao pátio ou depósito público. Isso acontece geralmente quando ele está estacionado em local proibido ou apresenta irregularidade que impede sua circulação imediata.
Retenção do veículo: significa que o veículo é impedido de seguir viagem temporariamente, mas permanece no local. O agente de trânsito aguarda que a irregularidade seja sanada no local ou que o condutor providencie a regularização (ex: substituição de lâmpada, retirada de película irregular, chegada de condutor habilitado).
A retenção é preferível à remoção, sempre que possível, pois evita os custos e transtornos do depósito.
Situações em que a remoção pode ser aplicada
O artigo 271 e outras partes do CTB autorizam a remoção do veículo em diversas hipóteses. Entre os exemplos mais comuns:
Estacionamento em local proibido pela sinalização
Estacionamento sobre calçadas ou faixas de pedestre
Veículo abandonado em via pública
Condução do veículo com licenciamento vencido
Condução sem placas ou com placas ilegíveis
Veículo com irregularidade grave de segurança (ex: pneus carecas, faróis quebrados)
Veículo dirigido por pessoa não habilitada e sem outro condutor presente
A autoridade de trânsito deve, em todos os casos, observar o princípio da razoabilidade e avaliar se há possibilidade de sanar o problema no local.
A devolução do veículo e os encargos legais
O artigo 271 determina que o veículo somente poderá ser devolvido ao proprietário quando:
Todas as irregularidades forem sanadas
As despesas de remoção (guincho) e estadia (diária no depósito) forem quitadas
A propriedade do veículo for comprovada
Esses encargos costumam gerar reclamações, especialmente quando o veículo fica muitos dias no pátio. Contudo, a cobrança é legal, desde que os valores estejam previstos por regulamento local.
Importante destacar que a ausência de pagamento de IPVA ou multas vencidas não pode ser usada como justificativa exclusiva para reter indefinidamente o veículo, conforme decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).
Direitos do condutor e garantias legais
O artigo 271 e a legislação correlata preveem que o condutor tem o direito de:
Ser informado da infração e da medida aplicada
Ter acesso ao auto de infração
Ser identificado no documento da autuação
Ter a chance de regularizar a situação no local, quando possível
Apresentar defesa ou recurso administrativo
Ser tratado com dignidade e respeito
A retenção ou remoção devem ser registradas formalmente, e o agente de trânsito não pode agir de forma arbitrária ou desproporcional.
Procedimentos administrativos e prazos
Após a remoção do veículo, os seguintes passos devem ser seguidos:
O veículo é levado ao pátio do Detran ou empresa concessionária
O proprietário é notificado da medida e informado sobre as providências necessárias
O prazo para retirada do veículo varia conforme o regulamento local, mas geralmente é de 5 a 60 dias
Se o veículo não for retirado, ele poderá ser levado a leilão, conforme previsto no artigo 328 do CTB
Durante esse período, acumulam-se as despesas de estadia e os encargos legais.
Mudanças recentes no artigo 271
O artigo 271 tem sofrido alterações ao longo do tempo. Uma das mais relevantes foi promovida pela Lei nº 13.281/2016, que atualizou diversas normas do CTB e acrescentou novos parágrafos ao artigo.
A principal mudança foi a inclusão do §9º, que obriga a autoridade a liberar o veículo assim que sanada a irregularidade, independentemente do pagamento de encargos, em determinadas situações específicas, como falta de licenciamento, desde que comprovada a propriedade e a quitação do tributo. Essa previsão busca evitar a retenção abusiva de veículos por questões meramente administrativas.
Outras alterações posteriores reforçaram a necessidade de aplicar a medida de forma proporcional e garantiram mais segurança jurídica ao cidadão.
Casos em que o veículo não pode ser removido
Em algumas situações, a remoção do veículo pode ser considerada ilegal ou abusiva. Exemplos:
Falta de sinalização adequada sobre proibição de estacionamento
Veículo parado por pane mecânica e com providências em andamento
Carro em local permitido, mas sem o pagamento de taxa de estacionamento (zona azul) – há jurisprudência questionando a legalidade da remoção nesses casos
Veículo com débitos de IPVA ou multas, mas sem infração que justifique remoção naquele momento
É sempre importante analisar o contexto concreto, pois a remoção indevida pode configurar abuso de autoridade e gerar indenização ao proprietário.
O que diz o STF sobre remoção por IPVA vencido
O Supremo Tribunal Federal já firmou entendimento de que a retenção de veículo por ausência de pagamento de tributos (como IPVA) é inconstitucional. Isso porque a Constituição Federal proíbe a utilização de meios coercitivos para cobrança de tributos, como previsto no artigo 150, inciso IV.
Portanto, o veículo só pode ser removido se houver uma infração de trânsito prevista no CTB que justifique a medida. Apenas o fato de haver débitos tributários não é motivo legítimo para remoção ou retenção.
Possibilidade de recurso contra a remoção do veículo
Sim. O proprietário pode apresentar defesa administrativa contra a infração que deu origem à medida. Os passos são:
Defesa prévia ao órgão de trânsito que aplicou a infração
Recurso à JARI (Junta Administrativa de Recursos de Infrações)
Recurso ao CETRAN, se a JARI indeferir
Se a infração for anulada, o proprietário pode inclusive requerer a devolução das despesas de remoção e estadia, com base em jurisprudência administrativa e judicial.
Além disso, se a remoção for considerada abusiva ou arbitrária, pode-se recorrer ao Judiciário por meio de mandado de segurança ou ação indenizatória.
Jurisprudência sobre o artigo 271 do CTB
Vários tribunais estaduais e superiores já se manifestaram sobre a legalidade da remoção de veículos. Alguns exemplos:
STF – RE 1.017.365/SP (Tema 1.017): vedação da apreensão de veículo por dívida de IPVA
TJ-SP – Apelação Cível 1000277-82.2020.8.26.0224: remoção de veículo considerada ilegal por falta de sinalização adequada
STJ – REsp 1.657.156/SP: medida administrativa de remoção deve ser aplicada de forma proporcional
Esses precedentes reforçam que a aplicação do artigo 271 exige cautela e respeito aos direitos fundamentais.
Medidas para evitar a remoção do veículo
Para não correr o risco de ter o carro removido, o condutor deve:
Manter o licenciamento do veículo em dia
Evitar estacionar em locais proibidos ou sem sinalização clara
Manter o veículo em boas condições de segurança
Certificar-se de que as placas estão legíveis e no padrão exigido
Garantir que esteja habilitado e com os documentos do veículo em mãos
Também é importante conhecer as normas locais de trânsito e acompanhar o site do Detran para verificar possíveis pendências.
Perguntas e respostas
O que é o artigo 271 do CTB?
É o dispositivo legal que trata da remoção e retenção de veículos como medida administrativa diante de infrações de trânsito.
Quando meu carro pode ser removido?
Quando for constatada infração que tenha como penalidade a remoção, como estacionamento proibido, falta de placas, licenciamento vencido, entre outros.
Posso pegar o carro de volta no mesmo dia?
Sim, desde que todas as irregularidades sejam sanadas e as despesas sejam quitadas.
Se eu pagar IPVA atrasado, posso liberar o carro?
Sim. Após pagar o débito e apresentar o comprovante, a autoridade deve liberar o veículo.
E se eu não pagar a diária do pátio?
A liberação pode ser condicionada ao pagamento, salvo em situações protegidas pelo §9º do artigo 271, ou caso a cobrança seja considerada abusiva.
Meu carro pode ser levado por dívida de IPVA?
Não. O STF declarou essa prática inconstitucional, exceto se houver outra infração que justifique a remoção.
Posso recorrer se meu carro foi removido indevidamente?
Sim. Você pode apresentar defesa administrativa e, se necessário, ação judicial.
Conclusão
O artigo 271 do Código de Trânsito Brasileiro trata de uma medida poderosa, que permite à autoridade de trânsito remover veículos das vias públicas em casos de infração. No entanto, essa medida deve ser aplicada com critério, proporcionalidade e respeito aos direitos dos cidadãos.
Compreender os fundamentos legais e as hipóteses de aplicação da remoção e da retenção é essencial para todo condutor. O conhecimento da legislação permite agir com mais segurança no dia a dia e contestar eventuais abusos com base legal sólida.
Além disso, manter os documentos em dia, respeitar a sinalização e circular com o veículo em condições adequadas são atitudes que, além de evitar penalidades, promovem a segurança no trânsito e a boa convivência nas vias urbanas e rodoviárias. Quando aplicada corretamente, a medida prevista no artigo 271 protege a coletividade. Quando aplicada de forma arbitrária, deve ser enfrentada com os instrumentos legais à disposição do cidadão.