As hipóteses de dispensa do termo de contrato

Resumo: O termo de contrato, instrumento necessariamente escrito e formal, pode ser substituído em alguns casos por outros documentos simplificados. O artigo tem por finalidade analisar os casos em se possibilita a dispensa desse documento mais complexo.

Palavras-chave: Contratos. Instrumento. Termo. Dispensa.

Sumário: Introdução. 1 O contrato administrativo como instrumento necessariamente escrito e formal; 2 As hipóteses de dispensa do instrumento contratual; 3 Consequências da inexistência de instrumento contratual por utilização indevida da autorização legal; Conclusão; Referências.

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INTRODUÇÃO

O termo de contrato administrativo constitui-se instrumento necessariamente escrito e formal. Em algumas hipóteses autorizadas por lei, há possibilidade da sua dispensa, casos em que um documento contratual mais complexo é substituído por outros simplificados. Pelas hipóteses legais, nota-se que a dispensa do termo de contrato dá-se em função da simplicidade ou do baixo valor das contratações e em como fundamento o princípio da eficiência e da economia processual. A intenção do presente artigo é abordar de forma didática as hipóteses em que o termo de contrato pode ser substituído por outros documentos, evitando-se que a sua indevida dispensa traga prejuízos e insegurança jurídica para a Administração.

1. O CONTRATO ADMINISTRATIVO COMO INSTRUMENTO NECESSARIAMENTE ESCRITO E FORMAL

Os contratos civis são classificados de modo a permitir identificar as peculiaridades de cada um, facilitando assim o estudo de cada espécie de contrato. Exemplo disso são as distinções entre contratos unilaterais e bilaterais, comutativos e aleatórios, solenes (formais) e não solenes (não formais) etc. (Rodrigues, 2003: 28).

Utilizando-se dessa classificação oriunda do Direito Civil, o contrato administrativo classifica-se como “consensual [bilateral], em regra, formal, oneroso, comutativo e realizado intuito personae. […]; é formal porque se expressa por escrito e com requisitos especiais; […]” (Meirelles, 2009: 214). Destaca-se no presente caso a natureza formal, essencialmente escrita. Na verdade, o fato de ser escrito tem muito a ver com a formalidade exigida.

Pelo fato de os contratos administrativos serem necessariamente precedidos de um procedimento formal (o procedimento de licitação ou de sua dispensa), obviamente o resultado desse iter procedimental (o contrato) há de ser também formal. Então, sendo o procedimento todo ele documentado por escrito, o instrumento que consigna as obrigações contratuais deve adotar igualmente a forma escrita.

Essa é uma das características que o distingue dos contratos privados, como reconhecem Mauro Sérgio dos Santos: “Os contratos administrativos exigem maiores solenidades do que os contratos que envolvem apenas pessoas privadas. Isso ocorre para possibilitar maior publicidade e segurança jurídica aos contratos dessa natureza. Os contratos privados, em sua maioria, sequer se revestem sob a forma escrita, apresentando-se na maioria das vezes como contratos verbais; os contratos administrativos exigem uma série de formalidades, entre elas a adoção da forma escrita” (2012: 605-606). Maria Sylvia Zanella di Pietro chega a dizer que, sob o aspecto formal, “exige-se, para todos os contratos da Administração, pelo menos a forma escrita”, dando ênfase à importância dessa exteriorização física do contrato administrativo (2006: 262).

E qual seria a consequência da fuga a essas características? Decerto, conduziria à pecha de nulidade, conforme aduzido a seguir.

Como espécie de ato administrativo, o contrato submete-se, em linhas gerais, aos requisitos do ato administrativo (objeto, motivo, finalidade, forma e competência). Assim, um dos requisitos do contrato é a forma, e sendo a mesma um dos elementos vinculados do ato administrativo, sobre o qual o administrador não tem opção. Por via de consequência, algum vício na forma pode provocar a nulidade do ato (Meirelles, 2009: 223 e Carvalho Filho, 2010: 219).

A formalidade dos contratos administrativos resta de tal modo evidente na legislação que é objeto de tópico próprio, qual seja, a Seção II do Capítulo III da Lei nº 8.666/93 (Lei de Licitações e Contratos – LLC), denominado “Da Formalização dos Contratos”. Destacam-se disposições como a que determina a manutenção de arquivo cronológico na repartição (art. 60, caput) e a nulidade de contratos não-escritos (verbais), ressalvada a hipótese específica do parágrafo único do art. 60 da retrocitada Lei.

Vale lembrar que o contrato administrativo não tem requisitos só de forma, mas também de conteúdo. Além das formalidades até então mencionadas (prévia licitação ou sua dispensa, forma escrita etc.), seu conteúdo deve conter as cláusulas necessárias do art. 55 da LLC, mas essa questão de mérito do contrato não é objeto do presente estudo, que se resume à análise dos casos de dispensa do termo de contrato.

Veja-se até aqui que o contrato administrativo, como regra, deve ser necessariamente escrito e formal. A única exceção à forma escrita está veiculada no parágrafo único do art. 60 da LLC, que trata do contrato verbal. Afora essa possibilidade, exige-se que todo contrato administrativo adote a forma escrita.

2. AS HIPÓTESES DE DISPENSA DO “TERMO DE CONTRATO”

A LLC utiliza com mesmo sentido e alcance as expressões “termo de contrato” e “instrumento de contrato”. Basta comparar a redação do caput do art. 62 com o §4º do mesmo artigo; o primeiro torna o “instrumento de contrato” obrigatório para determinadas hipóteses; já o segundo torna dispensável o “termo de contrato” para os casos que especifica.

A doutrina, contudo, distingue as expressões: instrumento é o gênero utilizado para as diversas formas que o contrato administrativo pode assumir (Meirelles, 2009: 222-223 e Carvalho Filho, 2010: 219). Assim, o contrato administrativo exterioriza-se por meio de um instrumento, que pode ser variado, isto é, que pode utilizar uma forma mais rebuscada (termo de contrato) ou outras mais simples (nota de empenho, ordem de serviço etc.).

Por essa razão, será aqui utilizada a expressão “termo de contrato” como o documento contratual formal, com todas as cláusulas obrigatórias do art. 55 da LLC, devidamente registrado, nos termos do art. 60 da mesma Lei, e com todas as demais formalidades necessárias.

Antes de abordar os casos específicos da dispensa de “termo de contrato”, cabe fazer duas necessárias ressalvas.

Em primeiro lugar, os contratos administrativos são institutos jurídicos autônomos, dotados de certas peculiaridades inerentes ao regime jurídico-administrativo a que se sujeitam. São as denominadas prerrogativas da Administração Pública, decorrentes da sua supremacia como contratante. São exemplos dessas prerrogativas os poderes de alterar e rescindir unilateralmente os contratos e de aplicar sanções aos contratados. Assim, independentemente da forma que adotem (“termo de contrato” ou “autorização de compra”, por exemplo), no seu aspecto material (substancial), remanescem todas as características inerentes a um contrato administrativo.

Desta feita, não se deve confundir a forma adotada com a natureza e substância (aspecto material) do contrato, que permanece sendo um contrato administrativo, com todas as suas peculiaridades.

Em segundo lugar, não há que se confundir a dispensa do “termo de contrato” com a celebração de contrato verbal. A dispensa do referido termo é medida de economia processual bastante eficaz e, embora seja exceção, deve ser fomentada, visando dar celeridade e eficiência às contratações públicas. Demais disso, no caso de dispensa do termo, as obrigações contratuais restam estabelecidas em outros documentos (projeto básico, termo de referência, edital etc.), o que não ocorre no contrato verbal. Por fim, a utilização do contrato verbal é permitida em hipótese bastante restrita e configura ato por demais excepcional, devendo ser evitado de todas as formas.

O art. 62 e seus parágrafos da LLC trazem um rol de documentos que entende como passíveis de comportar, em aspecto formal, um contrato administrativo, nominando especificamente os seguintes: “termo de contrato”, “carta contrato”, “nota de empenho de despesa”, “autorização de compra” e “ordem de execução de serviço”. O §2º do art. 62 prevê ainda a possibilidade de utilização de “outros instrumentos hábeis”.

O rol de nomes utilizados, portanto, é claramente exemplificativo, mas é possível desde já perceber o que a Lei quis dizer com alguns deles: por “nota de empenho da despesa” entende-se o documento por meio do qual se formaliza o empenho, conforme mencionado no art. 61 da Lei 4.320/64; por “autorização de compra” entende-se o documento formal por meio do qual a autoridade administrativa defere ao servidor responsável o poder de solicitar do fornecedor a aquisição do produto que fora objeto de licitação no prazo estipulado no instrumento convocatório; a “ordem de execução de serviço” consiste no mesmo documento antes citado para compras, aplicável neste caso aos contratos de serviços.

Na substituição do “termo de contrato”, com todos os seus requisitos formais, por documentos equivalentes, a Lei não quis despir o ato daquelas formalidades minimamente necessárias ao resguardo da segurança jurídica; prezou para que, mesmo nesses casos mais simples, ficasse a Administração devidamente resguardada, conforme será visto neste tópico.

A obrigação e a desobrigação de utilizar o documento denominado termo de contrato está no art. 62 da LLC, o qual convém reproduzir:

“Art. 62.  O instrumento de contrato é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de preços, bem como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos demais em que a Administração puder substituí-lo por outros instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço.

§ 1o  A minuta do futuro contrato integrará sempre o edital ou ato convocatório da licitação.

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§ 2o  Em "carta contrato", "nota de empenho de despesa", "autorização de compra", "ordem de execução de serviço" ou outros instrumentos hábeis aplica-se, no que couber, o disposto no art. 55 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)[…]

§ 4o  É dispensável o "termo de contrato" e facultada a substituição prevista neste artigo, a critério da Administração e independentemente de seu valor, nos casos de compra com entrega imediata e integral dos bens adquiridos, dos quais não resultem obrigações futuras, inclusive assistência técnica”.(sublinhamos)

A questão é de tal modo atual que a novel disciplina do Sistema de Registro de Preços, Decreto 7.892/2013, reforçou a possibilidade de contratação de fornecedores por outros instrumentos que não o termo de contrato, conforme previsto em seu art. 15.

Antes de abordar as hipóteses específicas, cabe advertir, como já dito, que a utilização do “termo de contrato” é regra, portanto sua substituição configura exceção. Assim, uma questão preliminar que a Administração deve superar é saber se o caso comporta de fato a substituição ou se, ao contrário, o uso do “termo de contrato” faz-se necessário. A parte final da cabeça do art. 62 deve ser interpretada do seguinte modo: a Administração pode substituir o instrumento de contrato, desde que os aspectos fáticos não recomendem a adoção de documento mais formal. O requisito “possibilidade fática” deve ser verificado no caso concreto em que a Lei permite, juridicamente, a substituição.

Da leitura do dispositivo, especialmente dos termos sublinhados, é possível identificar as seguintes hipóteses de dispensa do “termo de contrato”: a) licitações e contratações diretas (dispensa e inexigibilidade) que estejam dentro do limite de valor para utilização da modalidade “convite”; b) compra com entrega imediata e integral, da qual não resultem obrigações futuras, independentemente do valor da contratação.

As duas hipóteses veiculadas trazem questionamentos vários, o que exige seja fixada a exata interpretação (sentido e alcance) das exceções legais. Pelo só fato de serem exceções, pode-se desde já fixar os seguintes pressupostos: a interpretação deve ser restritiva, não ampliativa; as hipóteses são taxativas (numerus clausus), não exemplificativas. “Quando um ato dispensa de praticar o estabelecido em lei, regulamento, ou ordem geral, assume o caráter de exceção, interpreta-se em tom limitativo […]” (Maximiliano, 2007: 191). No entanto, a interpretação não poderá ser de tal modo restritiva que fulmine a razão de ser da exceção, pois “as diposições excepcionais são estabelecidas por motivos ou considerações particulares” (Idem: 184).

Em se tratando de interpretação, não se pode descuidar dos princípios constitucionais que regem a atividade administrativa, notadamente o da eficiência. Aqui, calha resgatar lição segundo a qual os princípios – no caso, o da eficiência – cumprem importante “função orientadora do trabalho interpretativo”, sendo isso reconhecido mesmo antes de os princípios jurídicos assumirem o protagonismo de que hoje gozam (Bonavides, 2009: 283-284).

Passa-se, então, a abordar as hipóteses legais de forma autônoma, guiando-se pelas orientações hermenêuticas invocadas acima.

2.1. Contratações de baixo valor

A primeira hipótese veiculada no artigo trata de contratos de baixo valor, isto é, aqueles que estejam abaixo do valor de alçada para realização de concorrência ou tomada de preços. Em suma, são os contratos com valores abaixo de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), nos casos de obras e serviços de engenharia, e os contratos com valores abaixo de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), nos casos de compras e outros serviços que não de engenharia.

Note-se que, embora a hipótese seja taxativa e exceptiva, trata-se de um rol bastante amplo. A depender da estrutura administrativa da unidade, é possível que a maioria das contratações esteja abaixo dos limites supracitados, utilizando-se com frequência a exceção ora em apreço.

A limitação de valor impõe dificuldades práticas, algumas das quais passam a ser abordadas de forma autônoma a seguir.

O primeiro questionamento que se faz é o seguinte: se a modalidade utilizada for concorrência ou tomada de preços, deve-se necessariamente utilizar o termo de contrato? Não. Embora a resposta negativa possa causar estranheza, ela não é despida de fundamentação. A LLC admite utilizar-se da concorrência e tomada de preços inclusive quando o valor do contrato previsto estiver abaixo da alçada dessas modalidades (art. 23, §4º). Portanto, se, em vez do convite, a Administração optar por fazer uma tomada de preços ou concorrência, poderá dispensar o termo de contrato, pois a LLC estabelece a dispensa em função do valor do contrato, não necessariamente da modalidade de licitação.

Outra questão que pode suscitar dúvidas é quando a licitação reunir vários itens ou lotes: se a licitação reunir vários itens/lotes, de modo que, juntando todos, o valor esteja na alçada de uma concorrência ou tomada de preços, é obrigatório o uso do termo de contrato? Não. Mais uma vez aqui não importa o valor da licitação, mas o valor dos contratos a serem individualmente celebrados. Por exemplo, se cada contrato a ser celebrado com o vencedor de cada lote/item tiver valor inferior à alçada do art. 62, não será necessário o termo de contrato. Lembrando aqui do requisito primeiro (for faticamente possível a substituição), as várias contratações decorrentes da licitação podem ocorrer pela mera emissão de nota de empenho ou ordem de serviço. Explica-se.

Atualmente, como eficiente medida de economia processual, a Administração tem utilizado uma mesma licitação para a contratação de diversos itens e lotes. Por exemplo, suponha-se que uma unidade administrativa de âmbito nacional tenha representação em três Estados do País. Se quiser contratar um serviço (vigilância, por exemplo) a ser prestado em cada unidade, poderá fazer uma só licitação, com um item para cada Estado.

O Edital, a publicação e a comissão serão únicos, mas o julgamento será triplo, avaliando-se cada item/lote autonomamente. Cada item/lote gerará um contrato distinto, cujas regras gerais serão semelhantes, distinguindo-se apenas os valores, local de prestação de serviços, convenções coletivas que regem as categorias, dentre outras questões peculiares.

Essa sistemática é permitida em âmbito federal, cujo regulamento de contratação de serviços (Instrução Normativa 02/2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão) obriga licitação e contratação distinta para serviços distintos, mas isso não impede “a adoção de medidas de economia processual, tais como a assinatura e publicação conjunta, em um mesmo documento, de contratos distintos” (art. 3º, §1º).

A interpretação acima parte do seguinte pressuposto: a intenção da disposição excepcional, ao vincular a dispensa do termo de contrato às modalidades licitatórias, foi, na verdade, vincular a dispensa da formalidade aos valores “dos contratos”. A possível incoerência da redação é justificável, porque o dispositivo presume que se realiza uma licitação para a celebração de um só contrato quando, na verdade, a praxe administrativa e questões de eficiência recomendam a reunião de vários itens/lotes semelhantes numa mesma licitação, dela decorrendo diversos contratos com empresas distintas.

Exemplo disso são as aquisições por meio do Sistema de Registro de Preços; é possível que um órgão público reúna sua demanda em nível nacional para aquisições pontuais, por cada unidade administrativa. Quando contratadas, essas aquisições poderão atingir um pequeno valor, dispensando-se o termo de contrato. Se considerado o valor da licitação, abstraindo o valor do contrato em si, seria obrigatória a utilização do termo de contrato para cada pequena aquisição que a Administração fizesse pela Ata de Registro de Preços, o que viola os princípios da economia e da eficiência que fundamentam a dispensa do “termo de contrato”. É imprescindível, pois, distinguir “valor da licitação” e “valor do contrato”, fazendo uma leitura do art. 62, caput, considerando o valor do(s) contrato(s) que serão celebrados como decorrência da licitação.

Em suma, qualquer que seja a modalidade de licitação, deve-se observar o valor previsto para cada contrato superveniente ao certame, concluindo-se, a partir daí, se o “termo de contrato” será obrigatório ou dispensável, lembrando sempre da avaliação quanto à possibilidade fática de substituição.

Por fim, cabe mencionar ainda que a mesma faculdade aplica-se aos casos de dispensa ou inexigibilidade, isto é, mesmo nas contratações diretas (sem prévia realização de licitação), se o contrato de obra ou serviço de engenharia for de valor inferior a R$ 150.000,00 ou se a compra ou outro serviço que não de engenharia for inferior a R$ 80.000,00, será possível a substituição do “termo de contrato” por documento simplificado.

2.2. Compra com entrega imediata e integral, da qual não resultem obrigações futuras, independentemente do valor da contratação

O caso em apreço exige uma primeira distinção: deve-se estar efetivamente diante de uma compra, não de um serviço travestido de compra, como às vezes se confunde na praxe administrativa (cf. Furtado, 2009:658-661). Embora a LLC traga uma definição de compra no seu art. 6º, esta não esclarece de modo suficiente a distinção entre ambos. Por isso, para se ter a exata noção do que seria uma compra, convém mencionar a definição posta no art. 481 do Código Civil: “Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro”.

Constata-se pela definição civil que o contrato de compra e venda é por demais fugaz, resumindo-se aos atos de pedir, entregar e pagar. Por isso a LLC enfatiza a questão de não resultarem obrigações futuras, inclusive de assistência técnica. Com isso, quis a Lei deixar claro que a compra não pode trazer em si embutida um serviço, pois, para a LLC, “obrigações futuras, inclusive de assistência técnica” consistem, na verdade, num serviço.

Assim, se a compra exigir do vendedor – ou do fabricante – visitas para prestar assistência corriqueira, por exemplo, o contrato deve ser tido como uma compra seguida de um serviço (assistência técnica). Nessa hipótese, não poderá haver dispensa do termo de contrato com base no dispositivo legal em apreço, que somente se aplica às compras.

Muita discussão prática se dá no caso de garantia. Se a Administração exigir garantia, deve-se necessariamente exigir termo de contrato? Entende-se aqui que não, pois a garantia é cláusula acessória e, em regra, decorre da própria Lei (art. 24 da Lei 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor), independendo de previsão contratual ou de o contrato estar vigente. Também entende dessa forma Lucas Rocha Furtado, quando diz que a dispensa do termo de contrato na hipótese de compra imediata e integral com amparo na LLC não isenta o fornecedor de prezar pela garantia (2009: 497). Assim, deve-se cuidar para não confundir a garantia com a assistência técnica, pois esta última configura verdadeiro serviço, a ser devidamente definido, com prazos de visita técnica, serviços contemplados etc.

Voltando à literalidade do dispositivo que trata da dispensa de termo de contrato para compras, convém destacar que não é toda e qualquer compra que desobriga essa formalidade, mas apenas aquelas consideradas como “entrega imediata e integral”. O conceito de entrega imediata é dado pela própria Lei 8.666/93: “compras para entrega imediata, assim entendidas aquelas com prazo de entrega até trinta dias da data prevista para apresentação da proposta” (art. 40, §4º).

Para uma leitura harmônica do dispositivo com o procedimento de licitação, deve-se mitigar o termo inicial fixado (data prevista para apresentação da proposta). Depois da fase de “apresentação da proposta” ainda sucedem diversas outras, como a habilitação, o julgamento, os recursos, a adjudicação, a homologação etc. Portanto, estabelecer um prazo de trinta dias para entrega, tendo como termo inicial “a data de apresentação da proposta” revela-se de todo inadequado.

Assim, a interpretação correta do artigo exige que o termo inicial seja contado do pedido da Administração: nos casos em que a Administração estabelecer um prazo de entrega inferior a trinta dias, pode-se considerar como uma compra para entrega imediata. Para tanto, deve-se verificar o que consta do instrumento convocatório, para, a partir daí, verificar se há respaldo jurídico ou não na dispensa do termo de contrato em razão da compra enquadrar-se como “de entrega imediata”.

Por fim, a entrega deve ser, além de imediata, integral, isto é, não parcelada. Em outras palavras, todo o quantitativo previsto deve ser entregue em uma só oportunidade, não sendo cabível a dispensa do termo de contrato, por exemplo, quando as entregas forem mensais, conforme já decidiu o Tribunal de Contas da União no Acórdão 390/1999-Primeira Câmara (Furtado, 2009:496).

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CONCLUSÃO

Em sede de conclusão do tema proposto, podem ser fixadas as seguintes assertivas:

a. Em regra, o contrato administrativo deve ser necessariamente escrito, sob pena de nulidade;

b. A dispensa do termo de contrato é hipótese distinta do contrato verbal, pois as obrigações restam escritas em outros documentos, tias como termos de referência, projetos básicos e o próprio edital;

c. A dispensa do termo de contrato é definida na Lei 8.666/93 em rol exaustivo, não exemplificativo, devendo ser lidas em apartado as hipóteses do caput do art. 62 e do seu §4º;

d. Os casos de dispensa do termo de contrato em razão do valor (caput do art. 62) devem levar em consideração o valor do(s) contrato(s) individualmente previsto(s) na licitação, não se vinculando de forma absoluta à modalidade de licitação utilizada nem ao valor estimado para o certame como um todo;

e. Nos casos de compra para entrega imediata não se deve considerar como termo inicial do prazo de entrega “a data prevista para apresentação das propostas”, como se depreende da interpretação literal do §4º do art. 40 da Lei 8.666/93, mas sim o prazo de entrega previsto no instrumento convocatório, que se conta a partir de quando a Administração faz o pedido do(s) produto(s).

A partir das premissas acima, será possível dispensar de forma lícita o termo de contrato, prezando-se, assim, por uma interpretação balizada na eficiência das contratações públicas, não se descuidando da necessária segurança jurídica dos contratos.

 

Referências
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 24 ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 23 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19 ed. São Paulo: Atlas, 2006.
FURTADO, Lucas Rocha. Curso de licitações e contratos administrativos. 2 ed. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2009.
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 35 ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
RODRIGUES, Silvio. Direito civil. 29 ed. Vol. 3. São Paulo: Saraiva, 2003.
SANTOS, Mauro Sérgio dos. Curso de direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 2012.

Informações Sobre o Autor

Bráulio Gomes Mendes Diniz

Procurador Federal. Especialista em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera.


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