As operadoras de planos de saúde e o COVID19 – Há obrigação de cobertura?

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Por Fernando Bianchi, especialista em Direito Médico, sócio do Miglioli e Bianchi Advogados

Diante da pandemia do coronavírus declarada pela OMS – Organização Mundial da Saúde, como fica a responsabilidade das operadoras de planos de saúde no acolhimento de seus beneficiários eventualmente infectados?

Num primeiro momento, se poderia responder de forma apressada que a cobertura é total.

Todavia a questão não é tão simples.

As medidas de saúde pública jamais foram de responsabilidade direta das operadoras privadas, tanto que campanhas de combate a outras epidemias, como o fornecimento de vacinas à população, não têm cobertura imputada aos planos de saúde.

Historicamente, tanto antes como após a Lei dos Planos de Saúde – Lei n. 9.656/98, situações de epidemias, pandemias, cataclismas, desastres naturais e congêneres sempre foram cláusulas de exclusão de coberturas dos planos de saúde.

Não se pode esquecer à luz da Constituição Federal, que a obrigação de prestação de serviço de saúde integral e irrestrita é do Estado e não das operadoras de planos de saúde que exercem cobertura suplementar.

E com o advento da Portaria do Ministério da Saúde nº 188, de 03.02.2020, que declarou emergência em saúde pública de importância nacional, assim como da Lei nº 13.979, de 06.02.2020, e da Portaria/MS nº 356, de 11.03.2020, a questão passou a ser de saúde pública e de Estado.

Apesar de falhas técnicas existentes em tal legislação, como por exemplo, a extrapolação de Portaria/MS nº 356 sobre a própria Lei nº 13.979, representada, por exemplo, na contraditória definição e aplicação do termo “isolamento”, o que não é permitido, se verifica expressa previsão de tratamento gratuito tanto para o suspeito como para o doente do COVID/19 as custas do Estado.

Tal disposição poderia implicar uma exoneração das operadoras de planos de saúde em assumirem os custos de cobertura do tratamento do COVID19.

Com relação a cobertura para o exame de detecção do COVID19, a edição da RN/ANS nº 453 que obrigou as operadoras a arcarem com os respectivos custos também demanda reparo.

Isso porque a Portaria do Ministério da Saúde nº 356 de 11.3.20, que regulamenta a Lei nº 13.979/20, em seu artigo 8º. dispõe expressamente que o exame de diagnóstico do coronavírus realizado em laboratórios privados deve ser validado por laboratórios de referência nacional. Tal previsão implica ausência de utilidade na imposição às operadoras de planos de saúde de prestarem cobertura dos custos do exame junto a sua rede privada de laboratórios, considerando que tal análise deveria ser feita diretamente pelos laboratórios de referência nacional indicados na citada legislação as custas do Estado.

Em que pesem as ponderações supra, que convidam a reflexão sobre a efetiva obrigação de cobertura dos planos de saúde sobre o COVID19, diante do dever legal das operadoras de planos de saúde de realizar as coberturas previstas no rol de procedimentos e eventos em Saúde, editado a cada 2 anos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar, a cobertura para o tratamento do COVID19 que fundamentalmente envolve “infecção respiratória” terá cobertura.

Isso porque, o rol de procedimentos e eventos em Saúde, como o próprio nome sugere, não é um rol de doenças e sim de procedimentos.

E com relação ao COVID19, por sua própria natureza não há o que se falar em exclusão por motivo de “preexistência da doença”.

Logo, diante da previsão do tratamento de problemas decorrentes e afetos a “infecções respiratórias”, assim como de internações eventualmente necessárias, haverá obrigação de cobertura por parte dos planos de saúde privados.

Naturalmente que tal obrigação por parte das operadoras de planos de saúde está sujeita ao tipo de segmentação assistencial dos beneficiários, pois aqueles que tiverem cobertura exclusivamente ambulatorial não terão direito a internações hospitalares, inclusive em UTI, ainda que portadores do COVID19.

O órgão regulador, diante da pandemia do COVID 19, também instituiu:

– as operadoras devem disponibilizar informações e canais de atendimento específicos para prestar esclarecimentos sobre a doença aos seus usuários;

– a possibilidade de relativização com a ampliação dos prazos de atendimento previstos na RN/ANS 259, dos procedimentos eletivos: (i) interação eletiva – 21 dias e (ii) atendimento em hospital-dia 10 dias;

– alteração do padrão TISS para monitorar procedimentos relacionados ao Coronavírus;

– atualização do código TUSS, do exame de detecção do Coronavirus  Covid-19;

– diretrizes para notificação obrigatória, definição de casos suspeitos e prováveis, assim como o “Protocolo de Manejo” do Ministério da Saúde, junto aos seus beneficiários e rede de prestadores

Independente das ponderações supra, s.m.j, sob o ponto de vista técnico, impor mais essa obrigação, que em verdade cabe ao Estado, não contemplada nos cálculos atuariais, que lastreiam os preços dos contratos de planos de saúde, para atender uma necessidade de saúde pública, não é a decisão mais correta, vez que abala o sistema de assistência privada como um todo e de igual modo também prejudica uma coletividade de beneficiários.

Fernando Bianchi, especialista em Direito Médico
Fernando Bianchi, especialista em Direito Médico

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