Assédio moral (estrutural) nas escolas públicas do município de Macapá: uma consequência espontânea da administração patrimonialista

Resumo: Este trabalho tem por objetivo discutir a existência de um tipo de assédio moral, no âmbito da administração educacional do município de Macapá, advindo espontaneamente da velha prática da administração patrimonialista, que prejudica não apenas os professores e demais profissionais da educação pública municipal, mas principalmente a comunidade/clientela. É o que chamaremos de assédio moral estrutural. Não se trata aqui do já conhecido assédio moral clássico que, na maioria das vezes ocorre de forma isolada, voluntária e até premeditada. Trata-se, sim, de um antigo, porém desconhecido modo de agredir servidores públicos, pais e alunos, originado de velhas e excrescentes práticas perpetradas na estrutura da administração pública educacional do Município de Macapá. É o assédio moral estrutural; de caráter institucional. Nesse caso, restringiremos o estudo apenas ao âmbito da administração pública do município de Macapá, com a finalidade de apurar o rigor científico do presente trabalho. Como metodologia, aplicada ao presente trabalho, usou-se a combinação de observação –  sustentada no olhar profissional e crítico da autora, que é professora de educação infantil de carreira do município de Macapá há mais de 10 anos -, a indução lógica, o método histórico e a pesquisa bibliográfica. A autora concluirá que não é incomum – mas ao contrário, existe – a prática de diversas condutas patrimonialistas, no âmbito da administração educacional do município de Macapá, e que essas práticas possuem uma relação direta – de causa e efeito, portanto – com um tipo de assédio moral, que foi batizado de estrutural, institucional ou difuso.[1]

Palavras-chave: Administração pública educacional. Assédio moral estrutural. Desvio de finalidade. (in) Eficiência. Democracia.

Abstract: This paper aims to prove that there is a type of moral harassment within the educational administration of the city of Macapá, arising spontaneously from the old practice of patrimonial administration, which harms not only the teachers and other professionals in the municipal public education, but especially the community /clientele. It’s what we call structural bullying. This is not the already known classic moral harassment that most often occurs in isolation, voluntary and even premeditated. It is, rather, an ancient but unknown mode of assaulting public servants, parents and students, originated from old and excrescentes practices perpetrated in the structure of educational public administration of the city of Macapá. It is the structural moral harassment; institutional character. In this case, we confine the study only to the public administration of the city of Macapá, in order to determine the scientific rigor of this work. The methodology applied to this study, we will use the observation, supported the professional and critical view of the author – that’s kindergarten teacher in the city of Macapá for more than 10 years – the logical deduction and literature. The complete author who is not unusual – but rather exists – the practice of various patrimonial behavior within the educational administration of the city of Macapá, and that such practices have a direct relationship – of cause and effect, so – with a kind of moral harassment, which was named structural, institutional or diffuse.

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Keyword: Educational public administration. Institutional Moral harassment. Misuse of purpose. (in) Efficiency. Democracy.

Sumário: Introdução. 1. Assédio moral estrutural – delimitações didáticas. 2. A administração pública no Brasil – breve histórico. 3. A educação democrática no texto da lei. 4. O assédio moral estrutural e a gestão educacional do município de Macapá. 4.1. As nomenclaturas do assédio moral estrutural. 4.2. A natureza jurídica do assédio moral estrutural.  4.3. Sujeito ativo do assédio moral estrutural. 4.4. Sujeito passivo do assédio moral estrutural. 4.4. Sujeito passivo do assédio moral estrutural. 4.4. Sujeito passivo do assédio moral estrutural. 4.5. O elemento psicológico da conduta assédio moral estrutural. 4.6. As condutas administrativo-educacionais que ensejam a prática do assédio moral estrutural no âmbito da educação do município de Macapá. Conclusão. Referências Bibliográficas.

Introdução

Inicialmente, é necessário que partamos de definições básicas, de cunho semântico, girando, por hora, em torno das seguintes expressões: assédio e assédio moral.

A palavra assédio, conforme a obra Grande Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa[2], significa entre outras coisas:

“sm (baixo-latassediu) 1. Operações militares em frente ou ao redor de uma praça de guerra; sítio, cerco. 2. Impertinência, importunação, insistência junto a alguém, para conseguir alguma coisa”. (Houaiss, 2008, p. 319)

Assédio, portanto, significa perseguir com insistência, importunar, molestar, com pretensões insistentes, assaltar; ao passo que a expressão moral, no seu aspecto filosófico, é um agir ético, de acordo com as regras morais. É o dever-ser, com o intuito de evitar o mal ao próximo.

O assédio moral ou terrorismo psicológico, ou ainda, psicoterror, objeto de estudo das ciências sociais, em especial da psicologia[3] e do direito, significa, nas exatas palavras de Maria Aparecida Alkimin, em sua obra Assédio Moral na relação de Trabalho:

“…forma de violência psíquica praticada no local de trabalho, e que consiste na prática de atos, gestos, palavras e comportamentos vexatórios, humilhantes, degradantes e constrangedores, de forma sistemática e prolongada, cuja prática assediante pode ter como sujeito ativo o empregador ou superior hierárquico (assédio vertical), um colega de serviço (assédio horizontal), ou um subordinado (assédio ascendente), com a clara intenção discriminatória e perseguidora, visando eliminar a vítima da organização do trabalho”. (Alkimin, 2009, p. 38)

De plano, percebe-se pois, que o assédio moral é um fenômeno que não se coaduna com os princípios democráticos de administração pública moderna, como supõe-se ser a brasileira e, por simetria, as administrações públicas do Estado do Amapá e do município de Macapá.

Sucede que a Constituição da República Federativa do Brasil – CRFB/88 (BRASIL, 1988), em seu título III, Capítulo VII, Seção I, estatui (art. 37, caput) que os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, devem, não somente, ser observados, mas ter máxima aplicabilidade no âmbito da administração pública brasileira, em qualquer das três esferas (União, Estados e Municípios).

Tais princípios, são repetidos, ipsis lítteris, nos artigos 2°, inciso IV, e 42 (este – destaque-se – é a perfeita reprodução do art. 37 da CRFB/88) da Constituição do Estado do Amapá (AMAPÁ, 1991).

Por sua vez, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (BRASIL, 1996) – reza, em seu art. 3º, que o ensino será ministrado com base em alguns princípios, entre os quais destacamos aqui a gestão democrática do ensino público (item VIII).

O art. 14, da mesma lei, prevê que os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:

“I – participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes”. (grifo do subscritor)

Quanto à Lei Orgânica do Município de Macapá (MACAPÁ, 1991), o seu artigo 25 – seguindo a mesma lógica simétrica da Constituição do Estado do Amapá, em relação à CRFB -, prevê que a Administração Pública (e aqui inclui-se a administração educacional), direta e indireta, de quaisquer dos Poderes, obedecerá os princípios de legalidade, moralidade, publicidade, impessoalidade e eficiência (caput com redação dada pela Emenda nº 10, de 12.04.2000)

Já o art. 312, também da Lei Orgânica do Município de Macapá, estatui, verbis que:

“Será responsabilidade do Poder Municipal de Macapá, ministrar a educação, com base nos princípios estabelecidos nas constituições da República e do Estado, e nesta Lei Orgânica, mediante sistema que garanta a universalização do ensino fundamental e da educação infantil.”

No art. 4º, do Plano de Cargos, Carreiras e Salários dos Profissionais da Educação do Município de Macapá (MACAPÁ, 2013), observa-se que, tal Lei, objetiva a valorização e a qualificação profissional dos servidores da educação básica municipal, bem como a eficiência e a melhoria da qualidade dos serviços de educação prestados à população do Município de Macapá.

Já no art. 5° do mesmo Plano, percebemos a previsão de que a carreira dos profissionais da educação básica municipal está fundamentada em princípios democráticos, entre os quais o seguinte:

“(…) III – remuneração compatível com a complexidade das tarefas atribuídas ao servidor e ao nível de responsabilidade exigida para desempenhar com eficiência as atribuições do cargo que ocupa;”

Por fim, o art. 49 prevê que, no desempenho das atividades que lhe são próprias, o profissional da educação básica municipal, corresponsável na consecução do propósito enunciado no artigo anterior, deverá agir de modo a concorrer para:

“(…) V – o zelo, dedicação e lealdade para com a escola e a comunidade escolar;

VI – o incentivo à participação, ao diálogo e à cooperação entre os educandos, demais educadores e a comunidade em geral, visando à construção de uma sociedade democrática;(…)

IX – a comunicação à autoridade imediata sobre irregularidades de que tiver conhecimento na sua área de atuação ou às autoridades superiores em caso de omissões por parte da primeira;

X – o cumprimento de suas atribuições, assim como das normas estabelecidas pela legislação educacional, bem como ao zelo pela ética profissional no exercício de suas atividades”.

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Portanto, como podemos perceber, de todo o arcabouço legislativo que embasa a educação pública do município de Macapá – em especial a gestão escolar – a transparência, a eficiência, a impessoalidade, a imparcialidade e o espírito democrático são nortes que devem se fazer presentes de maneira efetiva no âmbito do Sistema Educacional Municipal.

Porém, infelizmente, a prática não se coaduna com o normativo, pois é comum cargos de direção e gestão de recursos públicos serem ocupados por pessoas despreparadas e descompromissadas, dando ensejo a disfunções administrativas, levando a práticas antiquadas, típicas da administração patrimonialista, onde o assédio moral estrutural aniquila os resquícios de eficiência.

Com efeito, a administração educacional do município de Macapá é um corpo vivo, formado por membros, órgãos, tecidos e funções jurídico-administrativas, os quais, devido aos longos anos de tradição – e também como reflexo de um corpo maior que é a administração pública municipal de um modo geral – necessitarão de um esforço concentrado, de médio a longo prazos, para se recuperar do mal (patrimonialismo) que, assim como um doente crônico, sofre de efeitos colaterais fortíssimos, caso sejam aplicados “remédios” (gerencialismo estatal).

Infelizmente, a busca pelo aumento da eficiência e da transparência na administração pública educacional do município de Macapá deverá traumatizar as velhas práticas.

É que até os níveis dos concursos públicos do passado – ou sua inexistência – refletem ainda hoje o nível de serviços e produtos postos à disposição da população, no presente caso, aos alunos da rede pública de ensino.

Mesmo que vultosa soma em recursos seja dispendida na qualificação dos profissionais da educação, ainda assim, não se terá plena certeza de que as deficiências técnicas e morais, anteriormente deixadas em segundo plano, quando da seleção de profissionais – seja por concurso, seja ad nutum – serão compensadas em médio prazo (1 ou  2 mandatos do chefe do executivo municipal).

É que o assédio moral estrutural – ou institucional, ou ainda difuso -, advindo especificamente das mazelas de uma administração patrimonialista, não é premeditado e isolado, mas um fenômeno histórico, estrutural e espontâneo, cujo dolo, como viremos mais adiante, é o dolo estrutural.

Este tipo de assédio moral, que chamaremos de assédio moral estrutural, não surge da vontade humana isolada; de um Diretor, de um Secretário, ou do Prefeito, apesar dos níveis de responsabilidade. Ele é fruto de uma tradição maléfica, talvez até cultural, mas que, pelo menos neste momento, não cabe aqui perquirir suas prováveis origens sociológicas, simplesmente porque este não é o objetivo deste trabalho.

O ponto central do presente trabalho encontra-se na cogitação da não correspondência (hipocrisia) entre o arcabouço jurídico nacional, estadual e municipal – extremamente moderno, no que pertine a prever a existência de uma administração, educacional e democrática -, e o que ocorre, de fato, no cotidiano das escolas públicas no município de Macapá.

Cogitaremos assim, com este trabalho, que o assédio moral estrutural não é um fenômeno proveniente da “inteligência humana”, isolada de forma livre e consciente, mas é apenas consequência natural de um mal maior, qual seja, as disfunções da administração pública burocrática e patrimonialista, neste caso específico, no âmbito educacional, que dão ensejo, ainda no presente século, a condutas administrativas desprovidas de qualquer senso democrático, impessoal, profissional e eficiente.

Portanto, o assédio moral estrutural (disfunção da atividade-meio) é apenas uma consequência natural de autodefesa de um corpo administrativo doente, retratado inclusive nos índices de desenvolvimento da educação básica do Município de Macapá (atividade-fim).

1. Assédio moral estrutural – delimitações didáticas

O assédio moral (clássico) se dá no âmbito das relações de trabalho. É necessário, pois, que haja, em regra, relação hierárquica entre os envolvidos para se poder cogitar da existência desse fenômeno social.

Há quem defenda uma espécie de assédio moral cuja vítima é o superior hierárquico, e o agressor, portanto, é o subordinado. Porém, reputamos este tipo de assédio figura meramente didático-teórico, sendo este um dos motivos – além do próprio objeto deste trabalho – pelo qual não nos deteremos nele.

O que, efetivamente, nos interessa, nesse momento, é o assédio moral estrutural, isto é, aquele que parte da máquina pública, em detrimento dos servidores (professores, técnicos, auxiliares) e clientes.

Reparem que, nesse momento, alcançamos a delimitação necessária ao desenvolvimento do presente trabalho: a) o assédio moral do qual partiremos, para o desenvolvimento dessa empreitada, é o clássico, isto é, origina-se no superior, em detrimento ao subordinado; b) o âmbito do fenômeno assédio moral é a administração educacional do município de Macapá, apenas; mas nunca as relações de emprego da iniciativa privada e, c) os sujeitos ativos do referido fenômeno são agentes públicos; no caso, para ser ainda mais específico, os profissionais, gestores ou não, da educação pública do município de Macapá.

Ora, mas o que vem a ser assédio, sem um qualificativo, como, por exemplo, o “moral estrutural”, este sim objeto do presente trabalho? Existem outros tipos de assédio? Pois bem, assédio significa cerco. Metaforicamente, assediar significa sitiar um local a fim de dominá-lo e/ou tomar para si.

Por seu turno, o assédio pode ser moral, sexual, processual e psicológico, apenas para citar alguns exemplos. Porém, todos têm o desiderato de humilhar as eventuais vítimas. O assédio moral – do qual nos ocuparemos – é do tipo estrutural, ou seja, não parte de indivíduo(s) específico(s) e determinado(s), em detrimento de outro(s), também específico(s) e determinado(s), mas, ao contrário. O assédio moral estrutural origina-se nas entidades públicas – como é a gestão educacional do município de Macapá, as escolas e os órgãos públicos -, em detrimento de indivíduos indeterminados e inespecíficos, porém, determináveis e especificáveis, como veremos em tópico mais adiante.

Por hora, o que interessa é saber que o assédio moral estrutural não possui uma intenção direta de humilhar a vítima, apesar de isso certamente ocorrer. A humilhação, o cerco e o constrangimento são consequências indiretas, advindas de execuções de atos administrativos incongruente aos mandamentos legislativos e teóricos da administração do município, em específico da administração educacional.

2. Administração pública no Brasil – breve histórico

O Estado moderno existe para servir. Ele não é um fim em si mesmo. Partindo dessa premissa, a Constituição da República Federativa do Brasil – CRFB/88 reza em seu art. 37, caput, que:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:” (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (grifos do subscritor)

Como se percebe, esse artigo constitucional é bem detalhista, normatizando minúcias da administração publica brasileira, desde a forma de ingresso no serviço público, passando por greve, aposentadoria, remuneração, casos de acumulação de cargos públicos e etc., até a administração tributária do Estado brasileiro.

Essa preocupação do legislador constitucional brasileiro tem um fim: garantir a máxima eficácia das normas que dão ao Estado brasileiro uma feição gerencial moderna, mormente quando da referência expressa ao princípio da eficiência, incluído no ano de 1998 – portanto 10 anos após a promulgação do texto constitucional original -, por meio da Emenda Constitucional – EC n° 19.

Porém, essa preocupação com a modernização gerencial do Estado brasileiro já esteve presente no intuito do legislador brasileiro, desde o Decreto-Lei n° 200/1967 já regulamentava diversos aspectos da administração pública brasileira, a exemplo do planejamento, da organização, da liderança, da execução e do controle, todos elevados à condição de princípios fundamentais das atividades da Administração Pública Federal, conforme seu art. 6°, verbis:

“Art. 6º As atividades da Administração Federal obedecerão aos seguintes princípios fundamentais:

I – Planejamento.

II – Coordenação.

III – Descentralização.

IV – Delegação de Competência.

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V – Controle”.

Reproduziremos a seguir, para efeitos didáticos, o quadro esquemáticos, publicado por Araújo (2013, p. 93), onde o referido autor sintetiza os modelos de administração pública prevalecentes durante determinado período no Brasil, desde o seu descobrimento até 1995, ano da publicação do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (BRASIL, 1995), na gestão do Presidente da República Fernando Henrique Cardoso.

Levando-se em consideração que a República brasileira só veio a ser proclamada oficialmente em 15 de novembro de 1889, levaram-se 41 anos  para o Brasil começar a fazer algo concreto para acabar com a excrecência do patrimonialismo no Brasil.

Quanto à burocracia, não chega a ser um modelo necessariamente pernicioso, como o patrimonialismo, mas pode sofrer de disfunções (excessos), conforme verifica-se no seguinte quadro:

Por seu turno, é possível estabelecer-se os princípios gerais das reformas gerenciais no Brasil, bem como as críticas que lhe cabe, conforme o quadro a seguir, também retirado da obra de Araújo (2013, p. 142/143, Vestcon):

Fonte: Araújo (2013, p. 142/143)

Portanto podemos perceber que, pelo menos, no âmbito legislativo, o Brasil dispõe de princípios, regras e normas, tanto constitucionais – a exemplo do art. 37 -, como infraconstitucionais – a exemplo do Decreto-Lei n° 200/67 – capazes de caracterizá-lo, teoricamente, um Estado moderno, com uma administração nas três esferas – União, Estados e Municípios – voltada para os seus cidadãos-clientes, e valorizando, ainda, diversas políticas públicas de educação, que, por si sós, justificariam o otimismo em um Estado que não é um fim em si mesmo.

Porém, na prática, não é isso que acontece, pois o nepotismo, a pessoalidade, o trafico de influência e a falta de planejamento são constantes na máquina pública, inclusive na educacional macapaense.

3. A educação democrática no texto da lei.

A educação, assim como a vida e a saúde – entre outros -,é um direito humano. Está reconhecida, sob a rubrica da palavra instrução, no art. 26 da Declaração Universal dos Direitos Humano, de 1948[4], conforme a seguir (BRASIL, 1948):

“1. Toda pessoa tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito.

2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.” (grifos do subscritor)

A Convenção Americana de Direitos Humanos[5], no mesmo trilhar, reza em seu artigo 26 (BRASIL, 1992):

“ARTIGO 26

Desenvolvimento Progressivo

Os Estados-Partes comprometem-se a adotar providência, tanto no âmbito interno como mediante cooperação internacional, especialmente econômica e técnica, a fim de conseguir progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos recursos disponíveis, por via legislativa ou por outros meios apropriados.” (grifo do subscritor)

Seguindo a mesma lógica de âmbito internacional, a CRFB/88, promulgada em 5 de outubro de 1988, em seu art. 6º, prevê verbis:

“Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.  (grifo do subscritor)

Como já citado alhures, a Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996, conhecida popularmente como LDB, reafirma, em quatro passagens de seu texto, o compromisso democrático da educação nacional como os cidadãos e profissionais da educação, em todos os níveis de ensino.

Nesse diapasão, no art. 3º da referida Lei, estão elencados alguns princípios que confirma a íntima relação que, pelo menos, deveria existir entre a democracia e educação nacional. Vejamos:

“Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber;

III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas;

IV – respeito à liberdade e apreço à tolerância;

V – coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

VI – gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

VII – valorização do profissional da educação escolar;

VIII – gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino;

IX – garantia de padrão de qualidade;

X – valorização da experiência extraescolar;

XI – vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.

XII – consideração com a diversidade étnico-racial. (Incluído pela Lei nº 12.796, de 2013)”

O ensino, a que se refere esse artigo, não é somente o ensino formal, mas todos os tipos de ensino, passando pelo recebido na família, chegando ao ensino ministrado na comunidade, de maneira informal. Porém, sem dúvida, é o formal (a exemplo do município de Macapá) o responsável normativo por esses fins.

Dessarte, o artigo 14, a participação dos profissionais da educação e das comunidades são elevados ao patamar de princípios do sistema de ensino, nos seguintes termos:

“Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:

I – participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;

II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.”

É a preocupação do legislador ordinário brasileiro em não deixar à sorte a decisão sobre a vertente democrática da gestão educacional, mormente na educação básica.

No mesmo compasso, o artigo 27, ainda da LDB, clarifica a preocupação do legislador ordinário com o conteúdo democrático dos currículos da educação básica:

“Art. 27. Os conteúdos curriculares da educação básica observarão, ainda, as seguintes diretrizes:

I – a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem democrática;”

Realmente, de nada adiantaria todo esse esforço legislativo, se os conteúdos curriculares da educação básica brasileira não laborassem nessa lógica democrática.

Por sua vez, o artigo 56 da LDB – não poderia ser diferente -, o esforço para que a gestão democrática tonifique no âmbito acadêmico da educação superior:

“Art. 56. As instituições públicas de educação superior obedecerão ao princípio da gestão democrática, assegurada a existência de órgãos colegiados deliberativos, de que participarão os segmentos da comunidade institucional, local e regional”.  (grifos do subscritor)

Discurso que prossegue afinado até o fim, desta feita, quando o ensino, e a respectiva gestão, se refere as universidades brasileiras.

Corrobora com nosso trabalho, o pensamento do Professor Elias Farias (2015, p. 3), em monografia intitulada Educação Democrática e o Ministério Público: O Problema do Mau Exemplo, Com 8 Exemplos Enfraquecedores Do Sistema Educacional, apresentada à Coordenação do Curso de Especialização de Gênero e Diversidade na Escola – GDE, em parceria com a Universidade Federal do Amapá – UNIFAP.

Podemos perceber a ligação íntima entre educação e democracia, após o referido autor discorrer também sobre textos legislativos nacionais, verbis:

“Como se pode depreender dos textos legislativos acima – bem como da própria semântica da palavra educação -, é impossível pensá-la desconectada do sentido de democracia. São duas ideias umbilicalmente ligadas: educação e democracia. Seus graus de pureza são diretamente proporcionais.”

Mais adiante, citando Touraine (1994, 159), na sua obra O que é a democracia? , Farias arremata:

“A democracia foi definida de duas maneiras diferentes. Para alguns, trata-se de dar forma à soberania popular; para outros, de garantir a liberdade do debate político. No primeiro caso, a democracia é definida por sua substância; no segundo, por seus procedimentos.” (grifo do subscritor)

Com efeito, a democracia precisa da educação, e vice-versa, num processo de retroalimentação, formando um ciclo virtuoso, em que todo o Estado ganha em termos de desenvolvimento educacional.

E finaliza com propriedade, ao final Farias (2015, p. 3):

“Ora, para se dar forma à soberania popular, é necessário participação ativa de cidadãos nos destinos de uma nação. Por seu turno, para se garantir a liberdade do debate político, também é necessário essa mesma participação dos indivíduos, que compõem um país democrático e republicano, como é o caso do Brasil.

Forçoso, portanto, entender a imperiosidade de que os mecanismos do sistema educacional de uma nação sejam os mais eficientes possíveis. E esse é, sem dúvida, um dos misteres do Ministério Público, em especial o Ministério Público Federal – MPF, conforma vimos alhures”.

O Ministério Público Federal tem, como um dos seus misteres, fomentar, de forma profilática, discussões sobre democracia e educação, no seio de toda a sociedade.

E para finalizar esse capítulo, gostaríamos de registrar os 7 (sete) princípios da educação em direitos humanos, positivados no art. 3º, da Resolução nº 1, do Conselho Nacional de Educação, nos seguintes termos:

“Art. 3º A Educação em Direitos Humanos, com a finalidade de promover a educação para a mudança e a transformação social, fundamenta-se nos seguintes princípios:

I – dignidade humana;

II – igualdade de direitos;

III – reconhecimento e valorização das diferenças e das diversidades;

IV – laicidade do Estado;

V – democracia na educação;

VI – transversalidade, vivência e globalidade; e

VII – sustentabilidade socioambiental.” (grifos do subscritor)

Portanto, inúmeros textos legislativos infralegais se ocupam em regulamentar essa relação lógica e axiológica entre a educação e as práticas democráticas. Vamos, então, partir para a análise das práticas.

4. O assédio moral estrutural e a gestão educacional do município de Macapá

O assédio moral estrutural – no mesmo trilhar do assédio, que sitia e cerca, causando humilhação às suas vítimas – é resultado da incongruência entre o aparato legislativo-regulamentar-teórico (princípios e regras) e os resquícios das práticas patrimonialistas da gestão educacional do Município de Macapá. Esse é o cerne do presente trabalho. É a discussão propriamente dita. O mérito, pois, está no ângulo de visão da autora, que assim vislumbra um novo tipo de assédio moral, como veremos com detalhes a seguir.

4.1. As Nomenclaturas do Assédio Moral

O assédio moral estrutural, cerne da presente discussão, pode também ser chamado de assédio moral institucional ou, ainda, assédio moral difuso.

4.2. A Natureza jurídica do Assédio Moral

O assédio moral estrutural, logicamente, não é crime, pois não preenche o requisito formal, ínsito no princípio da legalidade.

O assédio moral estrutural é, portanto, instituto de natureza cível-administrativa, passível de responsabilização, atribuível a agente público, politicamente consciente de sua obrigação de fazer valer os princípios e normas constitucionais e infraconstitucionais, relacionados à eficiência, à gestão democrática, à impessoalidade, à legalidade, à moralidade e à publicidade, no âmbito da administração educacional do município de Macapá.

4.3. Sujeito Ativo do Assédio Moral

O sujeito ativo pode ser direto ou indireto.

O sujeito ativo direto é determinado e específico. Não se confundem com o sujeito ativo indireto, eventual(ais) sujeito(s) ativo(s) indeterminado(s), mas determinável(veis) (Prefeito, Secretário de Educação e Vereadores).

O sujeito ativo direto é, pois, a própria máquina educacional pública do município de Macapá, fruto da invenção humana, porém viva, e com personalidade própria, diversa da personalidade dos seus agentes (eventuais sujeitos ativos indiretos).

O sujeito ativo indireto – como já dito – são os agentes políticos (Prefeito, Secretário de Educação e Vereadores) que, de maneira, microscópica, podem praticar o assédio moral estrutural. Estes sujeitos não são determinados e específicos, mas apenas determináveis e especificáveis.

4.4. Sujeito Passivo do Assédio Moral Estrutural

O sujeito passivo, assim como o ativo, também pode ser direito ou indireto.

O sujeito passivo direto é a própria comunidade escolar.

O sujeito passivo indireto são todos os agentes públicos do município de Macapá, bem como os cidadãos-clientes (pais e alunos), que sofrem com as consequências nefastas do fenômeno.

Note-se que, no assédio moral clássico, o sujeito passivo não se divide em direto e indireto. Aliás, o sujeito passivo indireto do assédio moral estrutural coincide com o sujeito passivo do assédio moral clássico. É apenas questão de ponto de vista.

4.5. O Elemento Psicológico da Conduta Assédio Moral Estrutural

O elemento psicológico desse tipo de abuso de poder só faz sentido se analisado pelo prisma do sujeito ativo, visto que sobre o sujeito passivo apenas incide a conduta, originada da vontade do sujeito ativo.

Enquanto no assédio moral clássico, o elemento psicológico é o dolo clássico, no assédio moral estrutural, esse elemento psicológico é o dolo estrutural, isto é, existe a vontade de um ente fictício, porém vivo, com personalidade própria (a máquina pública educacional do município de Macapá), de perpetrar tal conduta.

Portanto, não se pode responsabilizar, de forma individual, um agente público que, não obstante instrumento da conduta, não possui consciência estrutural de seu ato (elemento do dolo estrutural).

Com efeito, os agentes políticos têm consciência estrutural (presunção absoluta) – e, portanto, podem ser responsabilizados pela prática do assédio moral estrutural –, pois possuem o poder de mudar a realidade do município de Macapá, no que diz respeito, principalmente, a dar um tom mais eficiente, moderno, democrático e profissional à máquina pública educacional.

Como ilustração, podemos afirmar que o(a) diretor(a) de uma escola municipal (eventualmente instrumento de assédio moral estrutural) não possui essa consciência estrutural (presunção relativa), capaz de torna-lo(a) responsável pelos efeitos maléficos causadores de assédio aos cidadãos-clientes do sistema educacional do município de Macapá.

Por sua vez, o Prefeito, o Secretário de Educação e os Vereadores, por exemplo, teriam essa consciência estrutural, consubstanciada nos males que as práticas de assédio moral estrutural causam à população, e, portanto, seriam, eles, passíveis de responsabilização.

É que, todos esses agentes públicos, além de eleitos, são providos de poderes políticos, capazes de alterar a realidade administrativa, incongruente com as teorias, normas e princípios que regem a administração educacional do município de Macapá.

4.6. As Condutas Administrativo-Educacionais que Ensejam a Prática do Assédio Moral Estrutural no Âmbito da Educação do Município de Macapá

Os caixas escolares tinham como único gestor o(a) Diretor(a) de determinada Escola. Somente o fato de recursos públicos do Fundo Nacional da Educação Básica serem geridos por uma única pessoa, já seria motivo suficiente para gerar assédio moral estrutural.

Porém o problema é muito mais grave, pois é sabido que inúmeras ações de improbidade e penais são ajuizadas pelo Ministério Público Federal no Amapá e pelo Ministério Público do Estado do Amapá contra servidores, na maioria diretores de escolas municipais, que deixaram de prestar contas dos referidos recursos, exatamente por que, ou foram negligentes ou desviavam esses recursos.

E essa prática era tão arraigada no seio da administração educacional do município que era feita às claras, sem nenhum pudor ou medo de ser descoberto.

E aqui também cabe uma crítica aos Ministérios Públicos, pois demoraram muito para começar a atacar tais práticas ilegais, irregulares, ademocráticas e ineficientes, porém já corriqueiras de tanto que eram praticadas.

Tais condutas chegaram a parecer práticas normais. E aqui está uma das consequências da prática reiterada do assédio moral estrutural na administração pública: o anestesiamento do cidadão, que, pelo cerco que sofre, começa a ter receio e medo de denunciar e, até, de se revoltar. Não é incomum o assediado moralmente ser cooptado pelo sistema e, como um zumbi público, passa a ser instrumento do sistema que um dia combateu.

Com efeito, “comprar” notas fiscais e recibos, e prestar contas desses recursos, apenas pró-forma, para maquiar os destinos privados dos recursos públicos são práticas não republicanas e patrimonialistas que geram assédio moral estrutural, dado o poder de aparentar que tais práticas são normais, e qualquer pessoa que deseje se rebelar contra isso será, inexoravelmente, massacrada e alijada da convivência escolar. Até continua com seus afazeres, mais passam a ser persona non grata em qualquer discussão que envolva a administração educacional e, principalmente, a aplicação de recursos públicos.

É estrutural, o assédio, porque não tem origem em uma pessoa específica – de tão disseminado como “normal” no seio da comunidade escolar – mas parte-se da própria máquina pública – logicamente por intermédio de seus agentes.

Qualquer cidadão, ou professor, ou merendeira, ou inspetor, ou técnico educacional que tente ir de encontra tais práticas é, natural e rapidamente, calado, alijado, isolado, enfim, assediado estruturalmente; e não precisamente por seu superior hierárquico, mas pela própria máquina pública educacional do município de Macapá. O superior hierárquico é, em regra, apenas um instrumento do assédio moral estrutural.

E não adiantaria pensar-se que apelar para as autoridades competentes seria a solução, pois, de tão arraigada essas práticas patrimonialistas, seria uma luta inglória. Seria nadar contra a maré. Uma maré muito forte, que não dá qualquer sinal de que irá acabar. Uma maré na contramão até mesmo da moderna legislação alhures estudada.

As concessões de gratificações a apenas alguns servidores que, de forma pessoal, podem contar com a ajuda de políticos, por meio de tráfico de influência, é algo visto como normal no seio da administração educacional hipócrita do município de Macapá.

Ou seja, para aqueles servidores que não possuem intimidade com um agente político-partidário, ou mesmo uma pessoa de influência no âmbito da Prefeitura de Macapá, os seus pedidos administrativos de concessão, dos mais variados tipos de gratificação – patentemente legítimos – são postergados ao máximo, chegando-se ao absurdo de, os procedimentos administrativos que consubstanciam os pedidos, serem extraviados e ficarem sem resposta. Caso o servidor, que não possua amizade com o chamado “pistolão”, queira dar continuidade ao seu pedido de gratificação, não é incomum que tenha que dar nova entrada no pedido, ao singelo argumento de que seu processo foi perdido. Em tudo isso se consubstancia o assédio moral estrutural.

Nesse diapasão, o professor público municipal de Macapá é obrigado gastar do próprio bolso para ter uma sala de aula minimamente digna e higienizada (patrocínio forçado pelo assédio moral estrutural); fazer brindes do dia das crianças, com recursos próprios; promover festas culturais relacionadas ao aprendizado das crianças, também gastando do seu próprio bolso.

A prática de dois pesos e duas medidas, conforme o servidor se relacione, ou não, de modo íntimo-pessoal (em certo grau afetivo), com o seu superior hierárquico, pode ensejar tratamentos não isonômicos, como, por exemplo, a exigência do cumprimento de carga horária completa, apenas para alguns, e rigor na cobrança de assiduidade e pontualidade.

A exclusão, de reuniões extraescolares, mas necessárias a continuidade do bom convívio funcional (chamadas de panelinhas) é uma constante. O princípio da impessoalidade certamente é um idealismo, porém nunca deve deixar de ser buscado.

O assédio moral estrutural é tão massacrante que, qualquer servidor que ainda não foi cooptado pelas práticas antirregulamentares e impessoais, certamente acabará cedendo. É só uma questão de tempo, pois esses vícios do patrimonialismo acabarão por vencê-lo no cansaço.

Diversas são as disfunções que originam práticas de assédio moral estrutural: nepotismo estrutural; servidores que não batem ponto e nem vão trabalhar mais recebem normalmente seus salários; servidor que possui deficiência física, mas não tem acessibilidade (rampas, sanitários, guarda-corpo, pouco espaço para movimentação), sofre assédio moral estrutural, além do assédio moral comum, pois, sendo deficiente, é um alvo fácil; corrupção estrutural; ineficiência estrutural; transparência estrutural; ante economicidade estrutural; tráfico de influência estrutural; condescendência criminosa estrutural; ilegalidade e nepotismo estruturais, e sigilosidade estrutural.

Portanto, o assédio moral estrutural é um fenômeno social antigo, porém desconhecido, espécie de abuso do poder, resultando direto de práticas administrativas educacionais patrimonialistas, ocorridas no âmbito do município de Macapá.

CONCLUSÃO

O presente trabalho é, antes de tudo, uma reflexão. Não obstante sua discussão girar em torno do assédio moral estrutural, como consequência espontânea da incongruência entre as legislações educacionais do município de Macapá e suas práticas antiquadas – ainda em voga na administração desse município -, o valor das conclusões de sua autora é mais de ponto de vista e ângulo de visão científica, do que necessariamente de ineditismo.

É, portanto, um trabalho cujas contribuições e críticas são bem-vindas e até necessárias, posto estar em franca construção, apesar do esforçado e comprovado embasamento lítero-científico-axiológico, da aplicação do raciocínio lógico-dedutivo e da observação científica da autora, fruto de mais de dez anos serviços públicos prestados à área da educação infantil ao município de Macapá.

Com efeito, o administrador público tem a nobre missão de aplicar bem os recursos que não são seus. E, exatamente por isso, deve prestar contas (accountability).

A missão é tão nobre que lhes são outorgados poderes administrativos, que são instrumentais, isto é, não têm um fim em si mesmo. Resumindo: Não devem ser autorreferidos. No entanto, quando esses poderes são desvirtuados, duas coisas distintas, porém relacionadas, acontecem: o poder se torna abuso e os recursos são mal aplicados.

Nem só de recursos públicos, porém vive o administrador público, mas de toda conduta que pratique. Por isso, os frutos do seu trabalho são proporcionais as suas virtudes, ou seja, caso resguarde os princípios e regras do sistema normativo e ético mundial, brasileiro, regional e local, certamente não precisará abusar do poder que lhe é outorgado. Caso contrário precisará humilhar, cercar, sitiar e acossar os seus subordinados.

Assediados, os subordinados, praticamente, não terão para quem recorrer, pois existe um claro descompasso entre as falas organizacionais (estruturais) e as práticas (hipocrisia).

Não que uma máquina pública eficiente, econômica, democrática e não autorreferida não possa ser sujeito ativo do assédio moral! Pode! Mas isso não é comum, pois a resultante de forças dos agentes públicos, inseridos nesse contexto, não tendem a labutar nesse sentido.

E quanto ao fator subjetivo de propulsão das condutas assediosas estruturais? Estas podem ser dolosas? Ou somente culposas?

A resposta é difícil, pois parece muito mais lógico que o dolo seja coisa do ser; para ser mais preciso, dos seres humanos; não de suas criações (máquina pública). O dolo é típico da psique humana, individualizada, bio e patologicamente. Porém, sabemos que muito da realidade humana é criado por ele mesmo e, assim, nada pode negar a existência do dolo (o estrutural), no assédio moral estrutural.

Ora, a máquina pública educacional do município de Macapá não obstante ser resultado de convenção humana, existe faticamente, ou seja, ela têm vida própria, é um mecanismo vivo. E é essa máquina, que tomamos como o sujeito ativo do assédio moral estrutural.

Portanto, a discussão é extensa e longa, pois caminha para o campo da filosofia e da ética, aplicada ao setor público; e serve para que, cada um de nós, servidores públicos da educação do município de Macapá, ou não, façamos uma autocrítica, pois, uma andorinha só não faz verão, e caminhará inequivocamente para render-se ao inverno rigoroso das disfunções burocráticas e patrimonialistas, caso deixe, por outro lado, de carregar gotículas de água, em suas asas, para apagar o fogo da ineficiência educacional pública.

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Notas:
[1] Trabalho orientado pela Profa. Dacicleide Sousa Cunha Gatinho, MsC Biodiversidade Tropical  pela UNIFAP
1 Moderno Dicionário da Língua Portuguesa
[3] “qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude…) que tende, por su repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho” (conceito da psicóloga francesa Marie-France Hirigoyen, na obra Mal-Estar no Trabalho – Redefinindo o Assédio Moral. Tradução de Rejane Janowitzer, p. 17
[4] Adotada e proclamada pela Resolução nº 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948. Assinada pelo Brasil na mesma data.
[5] Adotada e aberta à assinatura na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, em San José de Costa Rica, em 22.11.1969 – ratificada pelo Brasil em 25.09.1992.

Informações Sobre o Autor

Deuzete Ferreira Barbosa

Acadêmica de Direito na Faculdade Estácio Seama

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