Resumo: O assédio moral consiste numa prática abusiva no ambiente de trabalho, que expõe o trabalhador a situações vexatórias e humilhantes, capazes de causar ofensa à sua dignidade e integridade psíquica. Esse tema deve ser compreendido devido às consequências nefastas que ocasiona em suas vítimas, pois somente conscientes da gravidade deste fenômeno, é possível prevenir esta prática, fomentada pelo contexto econômico da atualidade, que destrói as relações pessoais no ambiente laboral.
Sumário: Introdução. 1. Aspectos gerais do assédio moral. 2. Análise do Assédio Moral no ambiente de trabalho 3. Consequências Jurisdicionais do Assédio Moral 4. Prevenção do Mobbing. Considerações Finais. Bibliografia.
INTRODUÇÃO
A palavra “trabalho” em latim corresponde a tripaliare. O referido termo foi utilizado por muito tempo como sinônimo de tortura, cansaço, esforço, sofrimento, angústia, obrigação, ou seja, valores negativos, que eram atribuídos aos menos afortunados.
A lembrança dessa etimologia é muito importante, pois guarda consonância com o tema deste estudo, que tem como cenário a violência no ambiente de trabalho donde surge o assédio moral, que é um fenômeno, que merece especial atenção das empresas, dos funcionários e de toda a sociedade devido aos danos que provoca em suas vítimas.
Segundo Rodolfo Pamplona Filho (2006:2):
“O assédio moral é um fenômeno que atinge as relações de trabalho em vários países do mundo, não sendo um produto apenas de origem nacional. Nos países escandinavos e de língua germânica é conhecido como mobbing; na Inglaterra, como bullying; nos Estados Unidos, harassment; na França, harcèlement moral; no Japão, ijime; nos países de língua espanhola, psicoterror laboral ou acoso moral; e em países de língua portuguesa, além da denominação de assédio moral, identifica-se também pelas expressões terror psicológico, tortura psicológica ou humilhações no trabalho.”
Logo, o assédio moral existe em todo o mundo e apesar de ser tão antigo quanto o próprio trabalho, esse tema começou a ser objeto de estudo há pouco tempo, pois, somente nas últimas décadas a sociedade começou a se interessar pelo tema que, tomou conhecimento por meio da divulgação de estudos e pesquisas, das consequências da violência psicológica à saúde do trabalhador.
É oportuno observar que esse assunto não é apenas estudado pelo Direito, mas também por outras ciências como a psicoterapia, a medicina e a sociologia jurídica. Nos últimos anos vem ganhando destaque na doutrina e despertando o interesse da comunidade jurídica em geral, principalmente dos magistrados e advogados.
Segundo a autora Marie-France (Hirigoyen 2002:25):
“O assédio moral consiste na exposição dos trabalhadores a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e duradouras durante a jornada laboral, que atenta contra a integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho”.
Essa conduta tem por escopo desestabilizar emocionalmente a vítima afastando-a do trabalho, e apesar de afrontar o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, não possui legislação específica, ainda não sendo tipificado como crime pela legislação penal brasileira.
Reginald Felker (2008:26) observa que:
“Esse fenômeno tem se intensificado cada vez mais nas últimas décadas. Exemplo do substancial disso é o resultado da pesquisa promovida pela Dra. Margarida Barreto, que constatou que 36% da população economicamente ativa no Brasil sofre de violência no trabalho. Índice que se eleva, em outro trabalho realizado, a 68% dos trabalhadores que declararam sofrer humilhações no trabalho. As conseqüências desse assédio moral são de diversos matizes, variando de um individuo para outro. Vão de crises de choro a depressão, diminuição da libido aos distúrbios digestivos, idéias de suicídio ao alcoolismo.”
A consequência da intensificação da violência psicológica no trabalho são as inúmeras demandas ajuizadas perante a Justiça do Trabalho, pleiteando, geralmente, indenizações por danos morais à integridade psíquica e física da vítima.
É necessário, então, que o poder público, juntamente com a sociedade e as organizações sindicais, dediquem maior atenção ao problema e reúnam esforços na busca de medidas eficazes de prevenção e repressão a esta devastadora doença social que traz consequências nefastas para suas vítimas.
1 ASPECTOS GERAIS DO ASSÉDIO MORAL
1.2 ASSÉDIO MORAL: NOÇÃO E CONCEITO
Hirogoyen (2002:18) conceitua o Assédio Moral da seguinte maneira:
“Toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se, sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, por em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho”.
Segundo a médica do trabalho Margarida Barreto (2000:22), o assédio moral consiste na:
“Exposição prolongada e repetitiva a condições de trabalho que, deliberadamente, vão sendo degradadas. Surge e se propaga em relações hierárquicas assimétricas, desumanas e sem ética, marcada pelo abuso de poder e manipulações perversas.”
O pesquisador Heinz Leymann (2008:13), estudioso na área de psicologia do trabalho elucida que:
“O assédio moral é a deliberada degradação das condições de trabalho através do estabelecimento de comunicações não éticas (abusivas) que se caracterizam pela repetição por longo tempo de duração de um comportamento hostil que superior ou colega(s) desenvolve(m) contra um indivíduo que apresenta, como reação, um quadro de miséria física, psicológica e social duradoura.”
Sônia Aparecida Costa Mascaro Nascimento (2004:922) leciona que:
“O assédio moral se caracteriza por ser uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica, de forma repetida e prolongada, e que expõe o trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de causar ofensa à personalidade, à dignidade, à integridade psíquica, e que tenha por efeito excluir a posição do empregado no emprego ou deteriorar o ambiente do trabalho, durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções”.
Pelos conceitos acima expostos, facilmente se extrai algumas características essenciais do fenômeno, quais sejam: a repetição dos ataques durante certo lapso temporal e a vontade de desestabilizar emocionalmente a vítima, até seu completo afastamento do ambiente de trabalho.
A maior dificuldade no tratamento do assédio moral é fazer o diagnóstico, pois suas primeiras manifestações quase não são percebidas e somente com a repetição das práticas vexatórias é que o fenômeno é identificado, de forma que a vítima perde o controle emocional, sofrendo efeitos nocivos em sua saúde física e psíquica.
Nesse sentido Márcia Guedes (2003:3) afirma que:
“Inicialmente a vítima descuida, encarando o fato como uma simples brincadeira; todavia, é na repetição dos vexames, das humilhações, que a violência vai se mostrando demolidora e, se ninguém de fora intervier energicamente, evolui numa escalada destrutiva. Quando a vítima reage e tenta libertar-se, as hostilidades transformam se em violência declarada, dando início à fase de aniquilamento moral, denominada de psicoterror.”
Logo, esse tratamento humilhante e reiterado no ambiente laboral gera conseqüências devastadoras e termina numa fase em que se verifica a destruição psicológica da vítima, podendo levá-la desde o isolamento, que comprometerá suas relações afetivas e sociais até o cometimento de um suicídio.
O médico do trabalho Mauro Azevedo de Moura citado por Reginald Felker (2008:26) aponta as seguintes características das pessoas que são preferencialmente assediadas:
“não tem problemas de integridade: são saudáveis; são escrupulosamente honestas: tem um razoável senso de fair play; tem um bem desenvolvido senso de culpa; valoriza, equidade e justiça; são criativos; são dedicados ao trabalho; reagem ao autoritarismo; recusam-se a ser subjugados; são mais competentes que os perversos”.
As razões da violência psicológica no local de trabalho podem ser porque a empresa acredita que esse método seja eficaz para obrigar os assalariados a produzirem mais ou mesmo ser produto da inveja ou ciúmes que um colega desperta no outro. Muitas vezes, os colegas de trabalho do assediado, ao invés de sensibilizarem com a situação, ficam parados, mantendo-se indiferentes ao sofrimento da vítima, seja por temerem o desemprego, de serem também perseguidos ou por estímulo à competitividade, contribuindo significativamente para o êxito da manipulação cruel feita pelo assediador.
1.3 DISTINÇÃO ENTRE O ASÉDIO MORAL E O ASSÉDIO SEXUAL
A distinção entre assédio moral e assédio sexual é de extrema relevância, em razão da confusão que costuma envolver os termos, uma vez que ambos os fenômenos apresentam semelhanças consideráveis a começar com a própria denominação assédio. Entretanto, são fenômenos diferentes pois, enquanto o primeiro visa retirar a vítima do mercado de trabalho pela violência psicológica, o segundo tende dominar sexualmente a vítima contra sua vontade através da chantagem.
Conforme Maria Helena Diniz (1998:285), o assédio sexual “é ato de constranger alguém com gestos, palavras ou com emprego de violência, prevalecendo-se de relações de confiança, de autoridade ou empregatícia, com o escopo de obter vantagem sexual”.
Assim, como o próprio nome indica, no assédio sexual o autor tem a meta principal de obter favores sexuais trazendo uma vantagem ou desvantagem em razão da aceitação ou não da proposta sexual.
Outra característica que diferencia essas duas formas de assédio diz respeito à pessoa que realiza a conduta: o assédio sexual é exercido apenas pelo superior hierárquico em direção aos seus subordinados (relação vertical descendente), já o assédio moral pode ser exercido também pelos subalternos em relação ao superior (relação vertical ascendente) ou pelos próprios colegas de trabalho entre si (relação horizontal).
O assédio sexual está tipificado como crime no artigo 216-A do Código Penal:
“Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo, ou função. Pena: detenção de 1 a 2 anos”.
Como se observa da norma legal transcrito, o agente é sempre o empregador ou um colega de trabalho que atua como superior hierárquico da vítima e que de um modo geral tem poderes de influenciar na sua carreira. No caso em questão, quando o agressor pratica o assédio sexual, ele se sujeitará a uma consequência criminal, qual seja, ao cumprimento da pena de 1 a 2 anos de detenção.
Em relação ao assédio moral, é necessário esclarecer a falta de regulamentação legal como conduta criminal típica, apesar de existirem vários projetos de lei em andamento pendentes de apreciação e aprovação. Mesmo assim, é possível que a vítima seja indenizada pelos danos morais e materiais em razão dessa astuciosa prática com fulcro no art. 1º, III, art. 3º, IV e, sobretudo, art. 5º, X, todos da Constituição Federal.
Segundo Rodolfo Pamplona Filho (2006:05):
“a principal diferença entre esses dois fenômenos reside na questão de interesses tutelados, uma vez que o assédio sexual atenta contra a liberdade sexual do indivíduo, o assédio moral fere a dignidade psíquica do ser humano.”
Enquanto o assédio moral destaca-se no fator psicológico, pela exposição da vítima a situações constrangedoras e humilhantes de forma prolongada e repetitiva, afetando a sua dignidade psíquica no intuito de retira-la do trabalho, no assédio sexual, o agressor visa o próprio favorecimento sexual com insinuações verbais ou por gestos obscenos que venham atingir a intimidade e privacidade da vítima.
Outra diferença é que para configurar a prática do assédio sexual basta um único momento, seja com insistências para aceitar convites obscenos ou insinuações de baixo calão, enquanto que no assédio moral se faz necessário a repetição ao longo do tempo por parte do agressor de atitudes humilhantes.
Márcia Guedes (2003:41) oferece um interessante exemplo em que o assédio sexual serve de premissa para o assédio moral:
“O assédio sexual não se confunde com o assédio moral. Para que haja assédio moral é necessária a presença de dois requisitos fundamentais, que são a duração no tempo e o objetivo de destruir a vítima. Todavia, tanto o mobbing quanto o assédio sexual são violências que guardam certa correlação: o assédio sexual pode muito bem constituir premissa para desencadear uma ação de abuso moral, transformando-se na vingança do agressor rejeitado. Como no caso do marinheiro que, ao rejeitar as propostas sexuais de um ato oficial, passou a sofrer pesada discriminação no trabalho cotidiano. Abusando do poder que detinha, o oficial rejeitado determinou que lhe fossem reservadas as tarefas mais difíceis, arriscadas e fatigante; foi isolado do convívio com os demais colegas, ficando proibido de desfrutar junto ao grupo dos momentos de lazer, inclusive de jogar futebol, durante as pausas na jornada. Não suportando a desqualificação humilhante e o isolamento, solicitou baixa do serviço.”
Logo, o assédio sexual poderá ser motivo para o surgimento do assédio moral, ou seja, basta a recusa das propostas sexuais para que o agressor de tal assédio torne sujeito ativo do assédio moral com a utilização da viloência psicológica, visando desestabilizar emocionalmente a vítima para que a mesma seja excluída do ambiente laboral.
1.4. Tipos de Assédio Moral
1.4.1. Assédio moral horizontal
O assédio moral horizontal é aquele praticado pelos próprios colegas de trabalho cuja escala hierárquica é a mesma que a da vítima. Nessa espécie, a vítima pode ser agredida de modo tanto individual como coletivo.
Sobre essa modalidade o doutrinador Rodolfo Pamplona Filho (2008:4) faz uma observação:
“Frise-se que a conduta assediadora pode ser exercida por uma ou mais pessoas contra um trabalhador ou um grupo destes, desde que, seja este grupo determinado ou determinável, não se admitindo a indeterminabilidade subjetiva (exemplo: toda a coletividade). Afinal, a conduta hostil e excludente do assédio moral, diante de sua característica danosa, será sempre dirigida a um funcionário específico ou a um grupo determinado para atingir sua finalidade.”
Os principais motivos que ensejam essa violência moral são: a competitividade, a inveja, a preferência pessoal do chefe pela vítima, o preconceito racial, a xenofobia, o preconceito sexual ou pelo simples fato da vítima se comportar de forma diferente dos demais no ambiente de trabalho.
Este tipo de assédio é comum quando dois empregados concorrem à obtenção do mesmo cargo ou uma promoção. Com o mercado de trabalho cada vez mais exigente, o relacionamento entre empregados passou a ser o mais competitivo possível. Muitas vezes essa competição é incentivada pelo próprio empregador, pois acha que com isso os empregados acabam buscando os melhores resultados, o que o que propicia muitas vezes, a deslealdade no âmbito do trabalho.
Existem também outros casos que não podem ser esquecidos ao se tratar de assédio moral entre os próprios empregados: a intolerância étnica e racial e até mesmo o preconceito em relação à opção sexual e religiosa.
Márcia Guedes (2003:4) exemplifica um caso concreto de assédio moral horizontal por motivos de xenofobia:
“Relevante destacar, no caso brasileiro, que a ausência de políticas públicas capazes de gerar um desenvolvimento calcado em justiça social, nas regiões do Norte e Nordeste, obriga a população a emigrar para o Sul e o Sudeste do país, em busca de emprego, o que torna freqüentes os casos de humilhações e assédio moral por conta do racismo e da xenofobia. Reflexos disso colhemos no fato de que, em São Paulo, entre os assalariados, quase todo nordestino é designado de “baiano”, ainda que tenha nascido em Pernambuco. Certos instrumentos de trabalho são igualmente conhecidos com a alcunha de “baiano”, e qualquer lapso ou gafe no ambiente de trabalho é designada como “baianada”.”
O assédio moral exercido sob as referidas condições acaba causando uma agressão de fato aos direitos individuais baseados no princípio da dignidade, no direito à personalidade entre outros.
Nestes casos, a empresa deveria interferir de forma justa, penalizando os empregados responsáveis, pois do contrário, se houvesse o apoio de um superior a um dos obreiros, isto poderia aumentar o processo de assédio moral.
1.4.2 Assédio moral vertical ascendente
O assédio moral vertical ascendente ocorre com menos freqüência, e está relacionado a casos em que um subordinado ou um grupo de subordinados assediam o seu chefe imediato ou dono da empresa, portanto, superiores hierárquicos.
A incidência dessa modalidade é mais restrita e acontece quando os subordinados se revoltam e perversamente investem ataques contra o superior por razões diversas. Os subordinados tentam, então, remover a autoridade de seu chefe, deixando de cumprir ordens por ele emanadas. Os ataques ficam cada vez mais freqüentes e o chefe começa a desacreditar no seu próprio potencial e na capacidade de liderar pessoas, abalando, dessa forma, a sua auto-estima.
Márcia Guedes (2003:4) afirma que:
“A violência de baixo para cima geralmente ocorre quando um colega é promovido sem a consulta dos demais, ou quando a promoção implica um cargo de chefia cujas funções os subordinados supõem que o promovido não possui méritos para desempenhar. Claro que tudo isso e extremamente agravado quando a comunicação interna inexiste entre superiores e subordinados.”
Diante dessa situação, o chefe desrespeitado se isola no ambiente de trabalho por não conseguir impor sua autoridade, e muitas vezes não comunica o ocorrido ao empregador, pois acha que poderá perder o cargo por expor suas fraquezas.
Apesar de a estatística apontar os pequenos índices do mobbing ascendente em relação às outras espécies, a brutalidade e a violência praticada naquele não é menor do que nas demais modalidades.
1.4.3. Assédio vertical descendente
Verifica-se o assédio moral vertical descendente quando os subordinados são agredidos pelos empregadores ou superiores hierárquicos. Os motivos que levam a tal perseguição estão relacionados a forma trabalho autoritário, onde se predominam a falta de respeito e a exigência excessiva do chefe. Neste caso, o chefe geralmente usa seu poder dentro da empresa para humilhar e constranger determinado empregado, isolando-o dos seus colegas de trabalho, diminuindo suas atribuições, a fim de deixá-lo sem atividade. Muitas vezes, o empregado aceita toda situação em silêncio por temer a perda do emprego, rendendo-se, assim, aos ataques do agressor.
Esta é a modalidade mais comum de assédio existente atualmente uma vez que, o assediado (subordinado) é a parte mais frágil na relação empregatícia, além disso, muitas vezes não tem conhecimento dos seus direitos.
Sobre esse tipo de assédio Marie-France Hirigoyen (2002:05) nos leciona que:
“A experiência mostra que o assédio moral vindo de um superior hierárquico tem conseqüências muito mais graves sobre a saúde do que o assédio horizontal, pois a vítima se sente ainda mais isolada e tem mais dificuldade para achar a solução do problema.”
É, assim, o tipo de assédio mais preocupante de todos, pois a vítima fica mais desamparada, tendo piores conseqüências psicológicas ou físicas.
1.4.4 Assédio Moral Misto
O assédio moral misto é uma mistura que envolve ao mesmo tempo o assédio moral vertical ascendente e o horizontal. Logo, o assediado é agredido tanto pelo superior hierárquico, quanto pelos colegas de trabalho.
Essa modalidade de assédio ocorre, geralmente, em empregos onde há alta competitividade interna, bem como em locais de trabalho onde o chefe ou patrão é bastante exigente. Isso acarreta, por conseqüência, um isolamento do assediado, pois ele acaba sem ter com quem se comunicar, uma vez que todos estão manifestando alguma atitude contra a vítima.
II ANÁLISE DO ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO
2.1CARACTERÍSTICAS
A ausência de tratamento legal no nosso ordenamento jurídico para o assédio moral no trabalho dificulta em muitos casos que o assediado obtenha uma possível reparação. No entanto, mesmo diante da omissão dos diplomas legais, a doutrina tem feito a sua tipificação e distinção diante de outros fenômenos como o assédio sexual e o próprio dano moral.
Dessa forma, para a configuração do assédio moral tem sido exigida a presença de quatro elementos constitutivos, quais sejam: a conduta abusiva do assediador; a natureza psicológica da conduta; a prolongação da conduta ofensiva no tempo; e a finalidade de exclusão da vítima.
A conduta abusiva é elemento primordial para se caracterizar o assédio moral. Consiste no abuso de direito do empregador, dos próprios colegas de trabalho, ou de ambos, de acordo com o caso e a finalidade de cada qual, podendo ser um exagero do poder diretivo do empregador ou por razões de competição ou simplesmente discriminatórios pelos colegas, que passam a maltratar e constranger o assediado buscando excluí-lo do ambiente do trabalho.
Reginald Felker (2008:6) conceitua e exemplifica a conduta abusiva da seguinte forma:
“É a manipulação consciente do psicoterror. Há inclusive, chefes de departamento ou de seções, no estabelecimento, de segundo ou terceiro escalão, que são mais severos e desrespeitosos no tratamento com os colegas do que os próprios donos do estabelecimento. Este fenômeno já se constatava com os feitores de escravos, geralmente mais cruéis e desumanos do que os próprios senhores-de-engenho. Estes novos feitores pretendem mostrar serviço e não hesitam em pisar sobre seus subordinados, tratando-os com arrogância, desrespeito e total desconsideração.”
A repetição da conduta ofensiva é essencial para a configuração do assédio moral, uma vez que ato isolado geralmente não tem o condão de caracterizar tal doença social. No entanto, há autores que entendem que se o comportamento do assediante for altamente grave (como, por exemplo, em casos de contatos físicos de intensa intimidade não aceitável socialmente), é possível o afastamento deste requisito, mas isso é exceção e a regra exige a reiteração da conduta danosa.
Vale salientar que o dano moral pode decorrer de um único ato, e este ser suficiente para gerar direito à reparação, diferentemente do assédio moral que, como vimos, em regra, não pode ser configurado quando ocorrem apenas atos isolados.
A agressão psicológica é um elemento indispensável caracterizador assédio moral, pois ele tem por objetivo causar dano à personalidade e à dignidade do trabalhador. É uma prática exclusivamente dirigida ao psíquico da vítima, não se toca, então, no físico, pois se isso ocorresse poderia ser caracterizada a agressão física ou qualquer outra modalidade de dano.
Nesse sentido, Reginald Felker (2008:21) observa que:
“No entanto, não caracterizarão o assédio moral fatos isolados, decorrentes de um mal-entendido, que freqüentemente ocorrem nas relações inter-pessoais em qualquer coletividade. Também não o caracterizarão disposições individuais ou coletivas oriundas do poder de comando do Empregador privado ou do Administrador público, desde que não atinja a honra, a intimidade e a dignidade do empregado. O poder de direção confere a possibilidade de organizar, dirigir, e fiscalizar a atividade laboral, impondo, inclusive, sanções disciplinares pelo descumprimento. Esta discricionariedade é relativa, na medida em que a conduta diretiva não poderá violar os direitos da personalidade do empregado ou funcionário.”
Por fim, o último elemento caracterizador do assédio moral é a finalidade de excluir a vítima do grupo ou ambiente de trabalho. O descontentamento no ambiente de trabalho, a falta de rendimento e a diminuição da produtividade farão a vítima abandonar aquela relação de trabalho voluntariamente.
Muitas vezes, o objetivo do empregador é fazer o empregado pedir demissão voluntariamente, pois nesse caso ele teria uma imensa economia com as verbas rescisórias. Já em se tratando de assédio moral por parte do próprio grupo de colegas de trabalho, o que se busca já não é a referida economia, mas a exclusão da pessoa indesejada, diminuindo a competição no ambiente de trabalho.
2.2Técnicas utilizadas pelo agressor
O agressor pode utilizar várias estratégias para desestabilizar psicologicamente a vítima, destruir sua autoconfiança e sua dignidade profissional, concretizando dessa forma o assédio moral.
Dentre as diversas condutas de que se vale o assediador, uma das mais comuns consiste em tolher a liberdade de expressão da vítima, seja pelo fato de não ser solicitada a opinar sobre nenhum assunto da empresa, ou pelo fato de não conseguir expor suas idéias por ser sempre bruscamente interrompida antes de conseguir concluí-las. Esta falta de liberdade de expressão faz com que a vítima passe a se sentir desprezada, uma vez que suas idéias ou opiniões não demonstram possuir nenhuma importância.
Outra tática muito utilizada pelo agressor é a de menosprezar e ridicularizar a vítima na presença de seus colegas de trabalho, depreciando-a em público, e fazendo comentários mal intencionados sobre sua incapacidade, levando-a, paulatinamente a desacreditar em seu potencial.
Muitas vezes o assediador exerce uma fiscalização exagerada sobre suas atividades, atribuindo-lhe ocupações desnecessárias ou exigindo metas que sabe impossíveis de serem atingidas. Essa verdadeira perseguição instaurada desestabiliza o emocional da vítima e faz com que, aos poucos, se desinteresse pelo trabalho e pela vida.
A vítima fica, então, com problemas psicológicos e muitas vezes com a saúde debilitada, conseguindo o assediador, finalmente, atingir seu objetivo de eliminá-la do trabalho, seja por meio de um pedido de demissão, seja despedindo-a por justa causa, ou, nos casos mais graves tirando a sua própria vida.
Além das estratégias mencionadas, o assediante pode utilizar diversas outras formas de agredir a vítima, como por exemplo:
– Impor prendas que exponham o empregado ao ridículo;
– Atribuir tarefas complexas com prazos de cumprimento incompatíveis;
– Determinar a execução de tarefas que estão em desacordo com a função exercida;
– Responsabilizar o obreiro por erros de outra pessoa;
– Excluir o servidor, ignorando-o, só se dirigindo a ele através de terceiros;
– Sonegar informações;
– Fazer ameaças constantes de despedida individual ou coletiva;
– Fazer referências maldosas sobre os aspectos físicos, crença, conduta ou família;
– Ameaças constantes de despedida, coletiva ou individual;
– Tratar os subordinados, costumeiramente, com rudeza e de forma agressiva;
– Rebaixamento injustificado de função, dentre outras.
Enfim, o agressor utiliza condutas que visam atingir a auto-estima do trabalhador ou funcionário, desestruturando suas defesas psíquicas e somáticas. As estratégias são diversas, mas todas tem a mesma finalidade, qual seja, a de desestabilizar psicologicamente a vítima, para que ela seja eliminada do ambiente de trabalho.
O autor Mauro Schiavi (2008:25) em seu artigo “Aspectos Polêmicos e atuais do Assédio Moral na Relação de Trabalho” aconselha o que a vítima deve fazer após tais agressões:
“O que a vítima deve fazer: Resistir: anotar com detalhes todas as umilhações sofridas (dia, mês, ano, hora, local ou setor, nome do agressor, colegas que testemunharam, conteúdo da conversa e o que você achar mais necessário). Dar visibilidade, procurando a ajuda dos colegas, principalmente daqueles que testemunharam o fato ou que já sofreram humilhações do agressor. Organizar: o apoio é fundamental dentro e fora da empresa. Evitar conversar com o agressor sem testemunhas. Ir sempre com colega de trabalho ou representante sindical. Exigir por escrito explicações do ato agressor e permanecer com cópia da carta enviada ao D.P. ou R.H. e da eventual resposta ao agressor. Se possível mandar uma carta registrada, por correio, guardando o recibo. Procurar seu sindicato e relatar o acontecido para diretores e outras instancias como: médicos ou advogados dos sindicatos assim como: Ministério Público, Justiça do Trabalho, Comissão de Direitos Humanos e Conselho Regional de Medicina.”
Logo, diante de tais agressões, a vítima deve tomar uma das medidas supracitadas. É necessário que a vítima não fique inerte e faça alguma coisa e para que o assediador não continue praticando a conduta abusiva contra ela.
2.3 Consequências do Assédio Moral
As conseqüências que o assédio moral pode vir a causar na vítima são imprevisíveis, pois pode acabar com uma desmotivação pessoal levando até mesmo a morte da pessoa agredida.
Os efeitos do assédio moral nas vítimas podem ser de ordem psíquica ou física. O assédio pode causar na vítima ansiedade, insegurança, depressão, tensão, cansaço, com a necessidade médica de tratamentos, principalmente de natureza psicológica. A vítima passa ficar insegura, perdendo desta forma a confiança em sua própria competência.
José Dallegrave Neto (2008:7) cita um dos efeitos do mobbing:
“Uma das moléstias que afetam o trabalhador como resultado desse quadro abusivo e a “Síndrome de Burnout”. A expressão “burn-out” vem do inglês que significa “combustão completa”, sinalizando para a sensação de explosão ou exaustão da pessoa acometida pelo estresse no ambiente de trabalho. É, pois, um esgotamento profissional provocado por constante tensão emocional no ambiente do trabalho, sendo a prática de assédio (moral, organizacional ou sexual) a sua principal causa”.
As vítimas sentem-se cansadas e sem energia. Elas têm dificuldades de se concentrar, mesmo na atividade mais simples. Nessas horas podem sobrevir idéias de suicídio.
Segundo Hirogoyen (2003:24): “Quando há um suicídio, ou tentativa de suicídio, isso conforta os perversos em sua certeza de que o outro era fraco, perturbado, louco, e que as agressões que lhe eram infligidas eram justificadas”.
Além dos prejuízos à saúde, ainda existem outros prejuízos que vão além da pessoa da vítima como: econômico, financeiro, social e humano.
Na maioria das vezes as conseqüências do assédio moral chegam a ter reflexos na economia da empresa, trazendo sérios problemas. Geralmente, os custos do empregador aumentam porque ele faz com que trabalhos realizados sejam desperdiçados; o trabalhador devido aos problemas de saúde começa a faltar o trabalho e a sua produtividade tende a diminuir; os serviços ou os produtos têm atingida a sua qualidade; além do próprio nome da empresa que fica afetado. Isso tudo acontece porque um trabalhador, vítima de assédio, geralmente não tem a calma e a paz de espírito necessária para o adequado desempenho de suas atividades laborais.
O processo de assédio moral quase sempre acaba com o afastamento da vítima do trabalho num estado de saúde tão debilitado, que muitas vezes fica em péssimas condições físicas e mentais para ir atrás de um novo trabalho.
Rodolfo Pamplona Filho (2008:8) afirma que:
“O assédio também caracteriza, do ponto de vista do direito positivo brasileiro, uma hipótese de despedida indireta. (…) Ressalte-se, porém, que essa situação é de extrema delicadeza, pois significa, em última análise, o trabalhador prefere abrir mão de seu posto de trabalho – fonte normalmente única de sua subsistência – a continuar se submetendo às condutas que lhe são impostas pelo empregador ou seus prepostos”.
Logo, nos casos de assédio moral, a empresa terá que arcar com as conseqüências da despedida indireta, respondendo pela futura indenização que deve ser paga ao assediado, como também arcando com os custos de seu tratamento psicológico.
Em relação ao dano social, ele é evidente, pois o problema não afeta apenas o trabalhador, mas toda sociedade. Nesse caso, João Batista Ferreira (2007:48) cita como exemplo: "as crises de relações familiares e comunitárias, custos sociais por enfermidade, aumento do mal-estar, riscos de suicídio, de aborto e divórcios, além do desemprego"
A questão humana, também não pode ser esquecida, uma vez que o trabalhador começa a perder a confiança em si, na sua competência e aos poucos vai perdendo o sentido de viver.
Por fim, o Estado também sofre os efeitos do assédio moral, arcando com altos custos no que concerne à saúde pública, à assistência e à previdência social, fornecendo serviços de reabilitação profissional e prestando benefícios previdenciários devido à remoção antecipado dos empregados/segurados.
Dessa forma, impõe-se a organização empresarial a obrigação de assegurar ao empregado um ambiente de trabalho sadio e livre de qualquer agressão, violência ou infortúnio. Como conseqüência disso, se por ventura o trabalhador for despedido por qualquer motivo, ele deve estar em perfeito psicológico e físico para ir atrás de um novo trabalho, caso contrário ele deverá ser indenizado quando isso não acontecer.
III CONSEQUÊNCIAS JURISDICIONAIS DO ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE LABORAL
3.1 Provas do Assédio Moral no Processo
O assédio moral, diferentemente do dano moral, caracteriza-se pelo dano à saúde da vitima, e desse modo, é imprescindível que o assediado prove os fatos como também os prejuízos psíquicos e físicos.
Ao postulante é exigida a prova do fato, ou seja, a prova da conduta ilícita do assediador, o que por lógica ocorre em um ambiente sob o controle deste, a comprovação do dano e seu nexo causal com a conduta abusiva praticada pelo agressor.
3.1.1 A Prova do fato
O ônus que a vítima tem para provar o fato que enquadra o assédio moral no trabalho em juízo constitui uma das tarefas mais difíceis no Direito trabalhista, levando-se em consideração a necessidade da existência de quatro elementos imprescindíveis para caracterização desse fenômeno laboral: a conduta abusiva; a natureza psicológica da conduta; a reiteração da conduta abusiva; e a finalidade de exclusão da vítima.
Logo, o assediado terá a tarefa de, no decorrer da conduta abusiva usar dos meios legais para reunir o maior número de provas que, em comunhão, possam levar o julgador ao convencimento de que ocorreu no seu local de trabalho uma série de condutas abusivas de natureza psicológica com o objetivo de excluí-lo do trabalho.
Robson Zanetti (2008:12) observa que:
“As provas dos fatos podem ser das mais variadas, desde que não sejam ilícitas, é livre a sua apreciação. Para provar os fatos, admitem-se todos os meios de provas em admitidas em direito, como por exemplo: gravação telefônica, e-mails, testemunhas, cartas, bilhetes ou mesmo qualquer outro tipo de comunicação que possa ser provado”.
No entanto, se o trabalhador não provar tais fatos, não haverá que se falar em direito de indenização. O problema reside no fato de que as lesões ocorrem geralmente no ambiente de trabalho, que, sendo dominado pelo empregador, em se tratando da modalidade de assédio moral descendente ou misto, é muito difícil que o assediado obtenha meios de provas da ocorrência do mobbing na relação de trabalho. Mas, caso a vítima consiga provar que houve a conduta abusiva por parte do assediador, ela terá pleno direito à indenização que lhe é cabível.
Segundo Mauro Schiavi (2008:26):
“Nessas hipóteses, o juiz deve ser guiar principalmente, pelas regras de indícios e presunções, pelas regras de experiência do que ordinariamente acontece (artigos 335 do CPC e 852-D, da CLT), pela prova indireta, pela razoabilidade da pretensão e dar especial atenção à palavra da vítima. Deve o juiz admitir, nesses casos, com maior flexibilidade, o depoimento de testemunhas, que mesmo suspeitas, estejam envolvidas no fato e também exercer amplo poder instrutório”.
3.1.2 A prova do dano psíquico e físico
Para que se exista o assédio é necessário provar que a vítima teve, pelo menos, problema psíquico ou físico, pois existem algumas pessoas que não são afetadas nem fisicamente, nem psicologicamente pelas práticas hostis.
O assediado deve comprovar que sofreu problemas psicológicos ou físicos ou ambos por atestado médico. Esta declaração científica deve comprovar que a pessoa está com problemas de saúde, em razão da prática de assédio moral, e que pessoa não possuía tal doença antes das agressões.
Para Zanetti (2008:17): “a comprovação médica pode vir não apenas de atestados, mas de consultas médicas, radiografias, receitas, notas fiscais de compra de medicamentos, etc.”
No entanto, na prática o assédio moral não é algo muito simples de se comprovar, mas, isso é necessário para que não seja feita nenhuma injustiça com o possível assediador ou mesmo com a empresa.
3.1.3 Nexo de causalidade
Um outro ponto que merece atenção para provar o assédio moral é a necessidade de comprovar a relação entre o dano e a conduta do assediador. A conexão entre esses dois fatores garantirá o acolhimento pelo Judiciário da alegação de existência do assédio moral, juntamente com a prova do dano sofrido.
O Conselho Federal de Medicina editou a Resolução nº 1.488, de 11 de fevereiro de 1998, onde são fornecidas as diretrizes para o estabelecimento do nexo causal do assédio moral no trabalho e as doenças psíquicas e físicas dos assediados. O artigo 2º da referida Resolução determina o seguinte:
“Para o estabelecimento do nexo entre os transtornos da saúde e as atividades do trabalho, além do exame clínico (físico e mental) e os exames complementaras, quando necessário, deve o médico considerar: – A história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal; – O estudo do local de trabalho; – O estudo da organização do trabalho; – Os dados epidemiológicos; – A literatura atualizada; – A ocorrência do quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas; -A identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros; – O depoimento e a experiência dos trabalhadores; – Os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da área da saúde. Assim, resta mais uma vez comprovada a possibilidade de se estabelecer o necessário nexo causal entre os danos causados, qual sejam, doenças psicológicas e/ou físicas e os atos praticados pelo agente agressor.”
Para corroborar esse entendimento, o seguinte julgado mostra com clareza o entendimento do que vem a ser nexo de causalidade no caso de assédio moral no ambiente de trabalho:
“[…] Efetivamente danos psíquicos se revestem à índole patológica e constituem, portanto, enfermidades que pressupõe diagnóstico clínico com nexo causal entre o ambiente nocivo de trabalho e o psiquismo da vítima e isto envolvem prova. Ele se configura quando a personalidade da vítima é alterada e seu equilíbrio emocional sofre perturbações, que se exteriorizam por meio de depressão, bloqueio, inibições, etc. Esses estados devem guardar igual nexo de causalidade com o fato danoso. A doutrina distingue dano psíquico do dano moral. O primeiro, por meio de uma alteração psicopatológica comprovada e o segundo, na lesão a direitos da personalidade, mas é atando-os ao conceito de assédio moral que deverá ser definido o comportamento do assediador, sendo enfático o elemento alusivo ao dano psíquico como indispensável ao conceito de assédio moral na construção da ilicitude da conduta. A prova, nesse contorno, é paupérrima. Nada revela em contemporização a esse figurino, sendo o“stress“ um sintoma possível da vítima de assédio, mas que também pode ter inúmeras outras concausas, mesmo não dolosas, mas especialmente na particularidade de cada psiquismo. É essencial o cuidado redobrado para não se presumir causas pelos seus efeitos. Pode uma pessoa assediada apresentar “stress“, mas nem todo “stress“ é decorrência do assédio moral. Não provados os fatos típicos alegados na petição inicial acerca do assédio moral, indevida a indenização pleiteada. TRT – 3ª Região. Recurso Ordinário. Processo nº 00997-2006-112-03-00-3. Data de publicação no DJMG: 30/01/2007, p. 16. 6ª Turma. Relatora: Emília Facchini”.
Logo, se o empregado não conseguir provar que a causa de sua enfermidade é proveniente do trabalho, ele não terá direito à indenização, ou mesmo, se existirem outras causas além do trabalho que contribuíram para a vítima se encontrar com problemas de saúde, a indenização que a empresa deverá pagar deve ser reduzida, já que ela não é a única causadora dos danos, pois nada mais justo que cada pessoa responder na proporção dos seus atos que colaboraram para o evento danoso.
3.2 A Responsabilidade Civil do Empregador nas Relações de Trabalho
Atualmente, o assédio moral é objeto de inúmeras ações, das mais variadas formas possíveis, sendo todas com o intuito de reparação, sob a forma de indenização por danos morais, decorrentes do dano sofrido.
Via de regra, o responsável pela indenização é o empregador e não a pessoa física que causou o dano à vítima. A indenização tem natureza punitiva e educativa e seu valor deve ter relação com a gravidade do dano e as condições financeiras do agressor e da vítima do dano.
Para uma melhor compreensão da responsabilidade civil do empregador nas ralações de trabalho, é viável que se separe a responsabilidade em dois aspectos diferentes, a primeira acontece quando o empregador comete o ato, enquanto o segundo trata da responsabilidade do empregador por ato de seu empregado.
3.2.1 Responsabilidade civil do empregador por ato seu
A responsabilidade civil do empregador no assédio moral é subjetiva, desde que estejam presentes seus quatro pressupostos básicos, quais sejam:
a) ação ou omissão;
b) dano;
c) elo de causalidade entre ação/omissão e dano;
d) dolo ou culpa do agente.
José Afonso Dallegrave Neto (2004:122) entende que nesta hipótese, o dano emana da do contratante, ou seja, do empregador pela inexecução contratual, pois desrespeitou a obrigação de respeito, civilidade e lealdade em relação ao empregado contratado.
Desta forma, quando o assediante for o próprio empregador, ele será diretamente responsabilizado para indenizar a vítima, pois trata-se de responsabilidade civil subjetiva, uma vez que presentes os elementos dano, nexo causal e ato ilícito.
3.2.2 Responsabilidade civil do empregador por ato do empregado
De acordo com o novo Código Civil, a responsabilidade civil do empregador por ato causado por seus empregados e prepostos no exercício do trabalho que lhes competir corresponde a uma hipótese legal de responsabilidade civil objetiva. Dessa forma, o empregador responde pelos atos de seus empregados, e sobre isto o artigo 932, III, do Código Civil (2002:326) determina que:
“Art. 932. – São também responsáveis pela reparação civil: […]
III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.”
Logo, independentemente de culpa, o empregador responderá com base na responsabilidade civil objetiva, na ocorrência de dano praticado por empregados ou prepostos no exercício do trabalho que lhes competir ou por ocasião deste.
Neste caso, o empregador responderá de forma solidária com o agente pelos danos causados à vítima, independentemente de culpa. Bastará a prova do ato ilícito do empregado ou preposto; do dano causado à vítima e do nexo de causalidade entre ambos. Após o ressarcimento do dano, todavia, é assegurado ao empregador o exercício do respectivo direito de regresso.
Existe uma pequena parcela da doutrina que opina no sentido de que o patrão somente responderia se efetivamente concorresse para o evento ou deixasse de tomar as medidas aptas a obstá-lo.
Devido a diversidade de casos em que ficou reconhecida a responsabilidade do empregador pelos atos de seus empregados, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 341 que trata desta matéria, cuja redação é a seguinte: “é presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”.
No mesmo sentido o artigo 2º da CLT menciona que: “O empregador quando se dispõe a desenvolver uma empresa, assume os riscos da atividade econômica e dirige a prestação pessoal de serviços”.
Dessa forma, pode-se concluir que quando ocorre o assédio moral horizontal, que é aquele que é exercido pelos colegas do empregado assediado, a responsabilidade recai sobre o empregador, tendo ele culpa ou não. Essa responsabilidade é objetiva e solidária por aplicação do artigo 942 do Código Civil.
Uma vez cumprida a obrigação, o empregador poderá requerer o regresso por quem se responsabilizou, salvo é claro quando essa pessoa for seu descendente, absoluta ou relativamente incapaz. Logo, existe o direito de regresso daquele que ressarciu o dano causado por outrem. Com isso, o empregador possui o direito de mover uma ação de regresso para se reembolsar do prejuízo que sofreu por danos praticados por seus empregados e prepostos.
No entanto, é bom que se observe que a vítima pode direcionar a sua ação diretamente contra o empregado que praticou os atos, deixando de entrar em lide contra o empregador.
IV DA PREVENÇÃO DO MOBBING
4.1 FORMAS DE PREVENÇÃO
Os efeitos do assédio moral no meio ambiente laboral são extremamente graves e negativos e, erradicar este fenômeno quando já introduzido no local de trabalho, é uma tarefa que exige certa dificuldade, devido ao silêncio que na maioria das vezes acompanha esta forma de terror psicológico.
É necessário agir com antecedência, adotando medidas eficazes de prevenção do assédio moral no local de trabalho, que diminuam as seqüelas desta prática não apenas para vítima, mas também para a empresa e a sociedade.
Com isso, vamos citar no presente estudo algumas medidas sensatas que deveriam ser adotadas para combater a violência psicológica no ambiente organizacional.
4.1.1 Atividades de relaxamento e entretenimento.
O assédio moral geralmente se difunde nas empresas que incentivam a competitividade desmedida, o lucro acima do bem estar dos trabalhadores e com isso, freqüentemente, utilizam a ameaça do desemprego para que os empregados se sintam pressionados.
Logo, a primeira coisa a se fazer é dar aos empregados melhores condições de trabalho, pois melhorando a qualidade de vida, o estresse e a frustração dos trabalhadores diminuem.
Uma das melhores técnicas para combater o estresse é a que utiliza alguns minutos da jornada de trabalho para a realização de atividades físicas, como exercícios de alongamento, respiração e meditação. É recomendável que nesses momentos de descontração e relaxamento participem ao mesmo tempo todos os empregados da organização empresarial e até mesmo os chefes.
Trata-se de uma técnica simples, mas que gera resultados extremamente satisfatórios, uma vez que melhora a qualidade de vida dos obreiros mantendo sua saúde física e mental.
4.1.2 Novas técnicas de gerenciamento.
Outra técnica a ser utilizada é aquela que utiliza um sistema que avalia os colegas de trabalho e superiores hierárquicos, garantindo-se, sempre, o sigilo das manifestações e opiniões expressadas. Sem dúvidas, isso atua como um meio eficaz para revelação de problemas e sua correção no âmbito empresarial interno. Muitas vezes, o trabalhador somente através desta técnica toma ciência de seu desempenho, valores e defeitos dentro da empresa.
É bom ressaltar que essa técnica pode ser utilizada tanto para avaliar os subordinados, como também para avaliar os chefes, diretores, supervisores e gerentes por seus inferiores hierárquicos.
Esta técnica se concretiza geralmente através de questionamentos, onde são formuladas afirmações e o empregado ou superior hierárquico decide se avalia a pessoa em questão como ineficaz, não muito eficaz, razoavelmente eficaz ou eficaz.
A implantação dessa medida na empresa pode contribuir significativamente para identificar o problema do assédio moral, pois a vítima sente-se segura para denunciar o seu agressor, sem medo de retaliações, uma vez que lhe é garantido o sigilo e o anonimato nas respostas dos questionamentos.
4.1.3 Condutas afirmativas da empresa.
Outra medida eficiente que a empresa pode tomar para combater o mobbing é escolher profissionais especializados, como médicos do trabalho, psicólogos e advogados militantes para se dedicarem a uma campanha de esclarecimento e conscientização desta prática, promovendo debates, palestras e distribuindo folhetos. Com isso, a empresa demonstra que não compactua e tolera esta forma de violência psicológica.
4.1.4 Ouvidorias e mediações.
A ouvidoria é um órgão situado dentro da própria empresa que recebe as reclamações e denúncias dos empregados garantindo o anonimato e o sigilo das denúncias formuladas.
Geralmente ela é composta por uma equipe de profissionais de várias áreas, sobretudo por psicólogos que ofereçam tratamento apropriado à vítima, com a finalidade de que ela se recupere das agressões que a violência psicológica perpetrada pelo agressor já possa lhe ter ocasionado. Ela tem se mostrado uma eficiente forma de combate à violência psicológica no ambiente de trabalho, devido a vítima se sentir a vontade para expor os atos de violência a que está sendo submetida, sem medo de ser demitida.
4.1.5 Marketing social dos sindicatos.
O sindicato utiliza várias estratégias para evitar o mobbing no trabalho. Uma delas é utilizando o marketing social que faz com que a informação ao alcance de todos por qualquer meio de comunicação de massa (televisão, rádio, internet, etc.).
Outra técnica bastante utilizada pelos sindicatos é a elaboração de cartazes, com frases de impacto, panfletos explicativos, conceitos, características, seqüelas, formas de precaução, dentre outras informações relevantes, que demonstram que o problema existe e que pode ser evitado.
Segundo Rodolfo Pamplona Filho (2006:16):
“O mais importante a destacar, porém, no que toca à atividade de prevenção ao assédio moral, é que ela passa necessariamente por dois enfoques básicos, a saber, educação e fiscalização. No que diz respeito à educação, a organização de campanhas esclarecedoras, seja por organismos públicos, seja por entidades não-governamentais, é uma iniciativa extremamente válida na prevenção desta doença social. Esta atividade de educação possibilita, também, o afastamento de eventuais alegações dos assediadores de desconhecimento às restrições da conduta adotada, o que é um aspecto de grande relevância. Já a atividade de fiscalização deve ser exercida pelo empregador diretamente (ainda que, subjetivamente, possa ser feita pelo Estado), uma vez que implica necessariamente em uma atuação mais efetiva na própria relação de direito material. As atividades de fiscalização, porém, podem ser atribuídas, inclusive, aos prepostos da empresa. Recomendamos, porém, que esta atividade de fiscalização não seja exercida por um único preposto, pela circunstância óbvia de que este indivíduo pode ser, eventualmente, o próprio agente violador da liberdade e dignidade dos demais empregados, o que lhe retiraria a isenção de ânimo para atuar como fiscal do empregador”.
Logo, todas essas medidas citadas já são tomadas em diversas empresas do mundo e os resultados são satisfatórios, uma vez que contribuem para promoção de um ambiente de trabalho mais transparente e sadio, no qual vigora a ética e o respeito ao próximo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo que realizamos neste trabalho tem o propósito de elucidar a questão envolvendo o assédio moral nas relações de trabalho. Com essa análise, demonstramos que o mobbing no ambiente laboral é uma patologia social, que atenta contra os direitos basilares de qualquer sociedade democrática, como por exemplo, o direito a dignidade da pessoa humana, sendo este direito uma característica de uma sociedade em que seus integrantes se respeitam mutuamente, sem distinções de cor, raça, sexo, cultura, religião, etc.
Com idêntico status constitucional surge o direito de todos a um meio ambiente de trabalho sadio, tranqüilo e seguro, mas que atualmente não é muito respeitado, devido contexto econômico vivenciado, que faz prevalecer a competitividade exacerbada e desmedida.
Conclui-se sem dificuldades, então, que a prática do assédio moral, na qual a vítima é ofendida e humilhada, reiteradas vezes, no ambiente laboral ferem frontalmente estes dois postulados constitucionais, gerando conseqüências nefastas não apenas para a vítima que tem sua saúde debilitada, mas para a empresa que terá elevados custos, diminuição na produção e também para o Estado, que terá que prestar serviços de reabilitação profissional e conceder benefícios previdenciários devido ao afastamento antecipado dos empregados segurados.
O assédio moral existe em toda a parte e apesar de ser tão antigo quanto o próprio trabalho, esse tema começou a ser objeto de estudo há pouco tempo. Por toda a história da civilização aqueles que detinham o capital se colocaram acima de tudo e de todos, achando-se no direito de tratar com desprezo e até mesmo perversidade aqueles que estavam hierarquicamente em situação inferior.
Logo, o problema do assédio moral no ambiente de trabalho não é recente, no entanto, somente nos últimos anos se aprofundaram os estudos e pesquisas sobre o tema. Atualmente é objeto de estudo do direito, da sociologia, psicologia, psiquiatria e pela medicina do trabalho.
O assediado, vítima do terror psicológico, pode ser agredido por seu superior hierárquico (assédio moral ascendente), como também pelo colega de trabalho (assédio moral horizontal) e por seu subordinado (assédio moral descendente). No entanto, o mais agressivo e o mais corriqueiro, sem dúvidas, é a modalidade praticada pelo patrão, pois a experiência mostra que o assédio moral vindo de um superior hierárquico tem conseqüências muito mais graves sobre a saúde da vítima que se sente ainda mais isolada e tem mais dificuldade para achar a solução do problema.
As causas ensejadoras do mobbing são diversas, contudo, a inveja sentida pelo agressor de algum atributo, habilidade ou talento da vítima é mostrada como um dos motivos mais freqüentes para a sua ocorrência. Outras causas também são apontadas como motivadoras do assédio, a exemplo da discriminação em razão da raça, religião, deficiência física ou doença, em função da orientação sexual ou mesmo da origem da pessoa. Nesses casos, o assediador rejeita a diferença ou característica individual da vítima passando a persegui-la e tratá-la com desprezo e desrespeito na frente de seus colegas, tentando, desse jeito, forçar seu pedido de demissão.
Os efeitos do assédio moral nas vítimas podem ser de ordem psíquica ou física. As conseqüências que o assédio moral pode vir a causar na vítima são imprevisíveis, pois pode levar a uma desmotivação pessoal ou até mesmo nos casos mais extremos ao suicídio da pessoa agredida.
Apesar de no Brasil ainda não existir lei específica que trate do assédio moral no ambiente de trabalho, isso não pode ser óbice isso para a apreciação de casos pelo Poder Judiciário, pois, como antes mencionado, o assédio moral viola frontalmente a dignidade da pessoa humana, sendo perfeitamente possível a incidência deste postulado no âmbito das relações privadas.
Os Juízes desenvolveram através da indenização, uma solução para resolver o problema acima discutido e tentar impedir que o agressor continue praticando condutas impróprias no ambiente de trabalho.
A Justiça do Trabalho tem usado como fundamento para o embasamento das condenações, o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, em conjunto com as normas do direito civil atinente a responsabilidade civil, que estabelecem o dever de indenizar àquele que causar danos a outrem, ensejando, três tipos de reparação à vítima, a rescisão indireta do contrato de trabalho, recebendo o empregado suas verbas rescisórias como se tratasse de uma despedida sem justa causa; a indenização por danos morais, em decorrência da violação aos direitos da personalidade; e indenização por danos materiais, quando a violência moral resultar gastos financeiros para a vítima, como despesas com tratamentos, remédios, psicológicos, etc.
A prevenção, então, surge como a melhor forma de evitar o terror psicológico no ambiente laboral. A inserção de atividades de relaxamento na jornada diária de trabalho; o investimento na informação através de palestras e cartazes conscientizando dos males provocados por essa violência; o incentivo ao diálogo mediante a criação de ouvidorias dentro da empresa são alguns exemplos que, sem dúvidas, contribuirão significativamente para a preservação da saúde dos obreiros e, por conseguinte, aumentarão sua produtividade.
Os argumentos expendidos nesse estudo demonstram que o problema do assédio moral não pode ser olvidado, nem tornar-se comum, mas deve ser compreendido com a importância que possui e com as conseqüências nefastas que ocasiona, pois somente assim, conscientes da gravidade deste fenômeno, poderemos prevenir esta chaga social, fomentada pelo contexto econômico da atualidade, e que destrói as relações pessoais no ambiente laboral.
É imprescindível, então, no ambiente de trabalho, as pessoas se tratem com respeito, dignidade e sem discriminação, pois quando isso acontece, sem dúvidas, elas estarão contribuindo para concretizar um dos objetivos da República Federativa do Brasil, que é construir uma sociedade livre, justa e solidária e sem preconceitos.
Informações Sobre o Autor
Ana Carenina Pamplona Pinho Ramos
Advogada. Colaboradora da Defensoria Pública do Distrito Federal e Territórios no Núcleo de Atendimento Jurídico do Segundo Grau e Tribunais Superiores. Graduada em Direito pelo Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ. Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera – UNIDERP.