Recentemente, a Ambev, Companhia Brasileira de Bebidas, foi condenada a pagar R$ 1 milhão de indenização por assédio moral coletivo. O Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Norte considerou que a empresa praticava o assédio contra os empregados que não atingiam a cota de vendas. Casos como este vem demonstrando como, hoje em dia, os empregados de uma empresa vêm tomando consciência de seus direitos e evidenciando que o assédio moral é cada vez mais comum e freqüente.
O assédio moral é uma figura relativamente nova nos estudos de Direito e começou a se desenvolver no início de 2000, com estudos na área de psicologia. Quando um profissional é humilhado, seja por um colega de trabalho seja por algum superior, por exemplo, através de agressão interpessoal, abuso de poder ou abuso emocional, pode-se dizer que ouve um assédio moral. Além disso, a situação de sofrimento moral deve ser reiterada e repetitiva, pois uma única situação não denota assédio moral (pode até gerar dano moral, mas não como assédio moral).
Ainda há pouca literatura sobre o tema, mas sua detecção na empresa não depende somente de uma reação da vítima. Uma análise cuidadosa do ambiente de trabalho poderá demonstrar a eventual existência de um empregado que esteja afastado dos demais colegas, sob tensão extrema, por vezes, deprimido e com problemas de saúde, primeiros “sintomas” de uma situação de assédio. Verificada tal situação uma investigação mais cuidadosa se impõe.
Muitas pesquisas acadêmicas realizadas em todo o mundo demonstram que variados ambientes de trabalho estão cheios de ações que deixam os indivíduos se sentindo ameaçados e humilhados e que geralmente vêm de pessoas mais poderosas para seus subordinados. Um levantamento realizado nos EUA mostrou que 10% de 800 empregados de uma empresa presenciavam casos diários de falta de civilidade em seus empregos e 20% eram alvos diretos de falta de respeito ao menos uma vez por semana.
Estimativas indicam que as humilhações no trabalho que partem de superiores a seus funcionários variam entre 50% e 80%. Já entre colegas com níveis hierárquicos semelhantes o índice é menor variando entre 20% e 50%. Outra curiosidade apontada pelas pesquisas é que nos eventos de assédio moral as proporções de homens e de mulheres é parecida, sendo que a maior parte do abuso psicológico acontece entre pessoas do mesmo sexo.
Segundo a advogada Maria Lúcia Benhame, “a empresa é responsável pelos atos de seus prepostos e em situação de assédio moral, age com culpa em duas situações: culpa in eligendo, ou seja, ao eleger, escolher o profissional e culpa in vigilando, ou seja, em não verificar, perceber e controlar a atitude de seus prepostos”. Benhame lembra que hoje as seleções privilegiam competências, resultados, lucratividade, mas não há mecanismos de percepção da velha e boa ética profissional do empregado contratado.
Mesmo com toda informação, notamos que casos de assédio moral continuam a acontecer. No episódio da Ambev o gerente não foi demitido no primeiro momento, e sim transferido, dando margem à continuidade dos problemas interpessoais na empresa. Neste caso, a multa imposta pelo TRT-RN não afasta o direito de indenização por dano moral individual para cada empregado atingido, o que gera uma ainda mais alta. Para evitar que ações de assédio moral aconteçam Maria Lúcia sugere que as empresas desenvolvam formas internas de solução do problema, punindo o culpado e, em alguns casos, indicando tratamento médico se necessário.
O ideal é que a empresa cuide da situação de assédio de maneira ampla e sem preconceitos. Assim, é preciso verificar a validade das acusações de maneira isenta e cuidar da saúde psicológica do assediado como também do assediante, que pode estar passando por pressões e problemas na empresa ou familiares que estejam gerando esse comportamento. Se após as medidas de cuidado e tratamento o assediante mantiver as atitudes prejudiciais, a empresa deverá tomar medidas mais sérias, sob pena de omitindo-se ser responsabilizada civilmente.
“Essa realidade só pode ser modificada pelas empresas e o ideal é que isso aconteça sem necessidade de indenizações imensas, mas pela resolução de ser ético. As notícias, as ações judiciais nos mostram que a realidade o modelo de gestão precisa ser modificado”, reforça Maria Lúcia.
Informações Sobre o Autor
Maria Lucia Ciampa Benhame Puglisi
Advogada formada pela Faculdade de Direto da USP, com pós-graduação latu-sensu em Direito do Trabalho, pela mesma Faculdade. Atua na área de assessoria jurídica empresarial como advogada desde 1988. É sócia do escritório Benhame Sociedade de Advogados que atua em assessoria empresarial contenciosa, consultiva e contratual nas áreas do Direito Civil, do Trabalho e Recursos Humanos, sendo responsável pela área de recursos humanos e coordenadora do comitê de legislação e emprego da ONG Instituto Amigos do Emprego e Vice-Presidente do Comitê Estratégico de Trabalho da AMCHAM.