Autista Tem Direito ao BPC/LOAS

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Sim, a pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA) tem direito ao Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS), independentemente do grau de suporte (nível 1, 2 ou 3). A Lei nº 12.764/2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, é categórica ao estabelecer que a pessoa com TEA é considerada pessoa com deficiência para todos os efeitos legais. Essa equiparação é o pilar que abre as portas para o acesso ao BPC, um benefício assistencial no valor de um salário mínimo mensal, destinado a garantir a subsistência de pessoas com deficiência que vivam em condição de vulnerabilidade socioeconômica.

No entanto, a afirmação desse direito é apenas o ponto de partida. A concessão do benefício não é automática e depende de uma análise criteriosa do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que avaliará dois requisitos fundamentais: a comprovação da deficiência e a demonstração da condição de miserabilidade da família. O processo pode ser complexo, e a falta de informação é o principal motivo pelo qual muitas famílias que teriam direito ao benefício acabam tendo o pedido negado.

Este guia jurídico completo foi elaborado para ser um farol, iluminando cada etapa do caminho para a obtenção do BPC/LOAS para pessoas com autismo. Abordaremos em profundidade o que a lei diz sobre o autismo, como o INSS avalia a deficiência no espectro, quais são as regras do critério de renda, como se preparar para as perícias e o que fazer para garantir que os direitos dos autistas sejam, de fato, respeitados.

O Autismo como Deficiência para Todos os Efeitos Legais

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Para compreender o direito ao BPC, o primeiro passo é entender como a legislação brasileira enxerga o Transtorno do Espectro Autista (TEA). O TEA é um transtorno do neurodesenvolvimento que afeta a comunicação, a interação social e o comportamento, com a presença de padrões restritivos e repetitivos de interesse e atividades. É um espectro, o que significa que se manifesta de formas e com intensidades muito diferentes em cada indivíduo.

A grande virada de chave legal veio com a Lei Berenice Piana (Lei nº 12.764/2012). O parágrafo segundo do seu artigo 1º é inequívoco: “A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais.”

Essa definição é crucial porque ela vincula o autismo diretamente ao conceito de deficiência utilizado para a concessão do BPC/LOAS. A Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) define pessoa com deficiência como aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

No caso do autismo, o “impedimento de longo prazo de natureza mental” é o próprio transtorno. As “barreiras” são os desafios que a sociedade impõe e que dificultam a inclusão: a falta de compreensão, o preconceito, a rigidez dos ambientes escolares e de trabalho, as dificuldades sensoriais em locais públicos, entre muitas outras. A análise para o BPC, portanto, não se resume a um diagnóstico, mas sim a como o autismo, em conjunto com essas barreiras sociais, impacta a vida da pessoa e de sua família.

É um erro comum pensar que apenas o autismo “severo” (nível 3 de suporte) dá direito ao BPC. A lei não faz essa distinção. Pessoas com autismo nível 1 (anteriormente conhecido como Asperger) ou nível 2 também podem ter direito, pois, embora possam ter maior autonomia em algumas áreas, enfrentam barreiras significativas que demandam terapias contínuas, suporte e que podem dificultar ou impedir a inserção no mercado de trabalho e a vida independente.

O Que é o Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS)?

O BPC, previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), é a garantia de um salário mínimo mensal pago pelo Governo Federal, através do INSS, para pessoas com deficiência e idosos com 65 anos ou more que não possuem meios de se sustentar. É fundamental entender suas características para não confundi-lo com uma aposentadoria:

  • Benefício Assistencial: O BPC não é uma aposentadoria. Para ter direito a ele, não é preciso ter contribuído para o INSS. Seu objetivo é amparar quem está em situação de vulnerabilidade, não retribuir contribuições passadas.
  • Sem 13º Salário: Por sua natureza assistencial, o BPC não inclui o pagamento do abono natalino (13º salário).
  • Não Gera Pensão por Morte: Caso o beneficiário venha a falecer, o BPC é extinto e não se converte em pensão por morte para os dependentes.
  • Valor Fixo: O valor do benefício é sempre de um salário mínimo vigente.
  • Individual e Intransferível: É um direito pessoal do autista, não podendo ser transferido para outra pessoa.

Para uma família que lida com os altos custos de terapias (psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional), medicamentos, transporte e educação especializada, o BPC/LOAS representa uma fonte de renda vital, que possibilita o acesso a tratamentos que são essenciais para o desenvolvimento e a qualidade de vida da pessoa com autismo.

Os Dois Requisitos Fundamentais para o BPC do Autista

Para que o direito ao BPC/LOAS seja concedido a uma pessoa com autismo, é obrigatório comprovar, de forma cumulativa, dois requisitos: o da deficiência e o da vulnerabilidade socioeconômica. Se um deles não for atendido, o INSS negará o pedido.

1. A Comprovação da Deficiência e do Impedimento de Longo Prazo

Como já mencionado, a lei considera o autista uma pessoa com deficiência. No entanto, durante o processo no INSS, essa deficiência precisa ser demonstrada e contextualizada. O INSS realizará uma avaliação médica e uma avaliação social para entender como o autismo impacta a vida do requerente.

  • Laudo Médico Detalhado: A peça central para comprovar a deficiência é um laudo médico robusto e detalhado, preferencialmente de um neuropediatra, psiquiatra ou neurologista. Um bom laudo para fins de BPC não deve apenas conter o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (CID-11: 6A02 ou CID-10: F84), mas também deve:
    • Descrever as comorbidades: Muitas pessoas com autismo também têm TDAH, transtornos de ansiedade, deficiência intelectual, epilepsia, etc. Todas devem ser listadas.
    • Detalhar as limitações: Explicar como o TEA afeta a comunicação, a interação, o aprendizado, a autonomia e o comportamento.
    • Indicar as terapias necessárias: Listar todos os tratamentos recomendados (terapia ABA, fonoaudiologia, terapia ocupacional, etc.) e, se possível, a frequência semanal. Isso ajuda a comprovar os altos custos que a família enfrenta.
    • Especificar o uso de medicamentos: Mencionar os remédios de uso contínuo.
  • Avaliação Biopsicossocial do INSS: A análise do INSS é baseada em um modelo biopsicossocial. Isso significa que a avaliação vai além do laudo. As perícias médica e social avaliarão:
    • Funções do corpo: Dificuldades na comunicação verbal e não verbal, funções mentais.
    • Atividades e Participação: Capacidade de aprender, de se relacionar, de cuidar de si mesmo.
    • Fatores Ambientais: Como as barreiras na sociedade (preconceito, falta de suporte) e os facilitadores (apoio familiar, acesso a terapias) influenciam a vida da pessoa.

A família deve estar preparada para explicar detalhadamente na perícia como é a rotina do autista, quais são suas dificuldades, seus gastos e os desafios que enfrentam no dia a dia.

2. O Critério da Vulnerabilidade Socioeconômica (A Renda Familiar)

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Este é o requisito que mais gera dúvidas e indeferimentos. Para ter direito ao BPC, a família precisa estar em situação de vulnerabilidade.

  • A Regra Objetiva de Renda: A lei estabelece que a renda por pessoa do grupo familiar (renda per capita) deve ser igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo. Em 2025, por exemplo, se o salário mínimo for de R$ 1.550,00, a renda por pessoa não poderá ultrapassar R$ 387,50.

  • Cálculo do Grupo Familiar: É fundamental saber quem entra nesse cálculo. O grupo familiar para o BPC é composto por:

    • O requerente (a pessoa com autismo);
    • O cônjuge ou companheiro(a);
    • Os pais (ou madrasta/padrasto);
    • Os irmãos solteiros;
    • Os filhos e enteados solteiros;
    • Os menores tutelados.
    • Regra de Ouro: Todos devem viver sob o mesmo teto. Avós, tios e outros parentes, mesmo morando na mesma casa, não entram no cálculo.
  • A Flexibilização do Critério de Renda (A Tese dos Gastos): Este é um ponto jurídico crucial. Mesmo que a renda familiar per capita ultrapasse um pouco o limite de 1/4 do salário mínimo, o benefício ainda pode ser concedido. O Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que este critério não é absoluto. Se a família comprovar que possui gastos extraordinários e contínuos com o tratamento da pessoa com autismo, esses valores podem ser “abatidos” da renda.

    • Exemplo: Uma família de 3 pessoas com renda total de R$ 1.800,00. A renda per capita é de R$ 600,00, acima do limite. No entanto, eles comprovam com notas e recibos que gastam R$ 800,00 por mês com terapias e medicamentos não fornecidos pelo SUS. A Justiça pode entender que a renda real disponível para o sustento da família é de apenas R$ 1.000,00 (R$ 333,33 per capita), reconhecendo a vulnerabilidade e concedendo o benefício. Essa comprovação de gastos é uma tese poderosa, especialmente em processos judiciais.
  • Obrigatoriedade do Cadastro Único (CadÚnico): Para sequer solicitar o BPC, é obrigatório que o requerente e sua família estejam inscritos e com os dados atualizados no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal. A inscrição é feita no CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) do município.

A Avaliação do INSS: Como se Preparar para as Perícias Médica e Social

Após o requerimento, o INSS agendará as avaliações médica e social, que geralmente ocorrem no mesmo dia. Esta é a etapa mais importante do processo administrativo.

Preparando-se para a Perícia Médica:

  • Organize todos os documentos: Leve o laudo médico original e completo, relatórios de terapeutas (psicólogo, fonoaudiólogo, T.O.), receitas médicas, e exames, se houver.
  • O autista deve comparecer: É fundamental que a pessoa com autismo esteja presente, mesmo que não seja verbal ou que a interação seja difícil. A ausência pode levar ao indeferimento.
  • Seja o porta-voz: O acompanhante (geralmente a mãe ou o pai) deve estar preparado para descrever com clareza a realidade. O perito tem pouco tempo e não conhece o caso. Fale sobre as dificuldades de comunicação, as crises, as estereotipias, a seletividade alimentar, os problemas de sono, as dificuldades na escola e a falta de autonomia.
  • Foque no impacto, não só no diagnóstico: Não diga apenas “ele é autista”. Diga “por causa do autismo, ele não consegue se vestir sozinho, tem crises sensoriais em locais com barulho, precisa de suporte constante para entender comandos e não tem noção do perigo”.

Preparando-se para a Avaliação Social:

  • Leve comprovantes de gastos: Apresente recibos e notas fiscais de medicamentos, terapias particulares, transporte, alimentação especial, fraldas, etc. Isso ajuda a comprovar a tese dos gastos.
  • Descreva a dinâmica familiar: O assistente social quer entender o contexto. Quem cuida do autista? Alguém teve que parar de trabalhar para se dedicar aos cuidados? Quais são as condições de moradia? A casa é adaptada?
  • Seja honesto sobre as dificuldades financeiras: Explique como os custos do tratamento impactam o orçamento da família e quais outras necessidades básicas deixam de ser atendidas.

A combinação das informações colhidas nessas duas perícias, somada à análise do CadÚnico, formará a decisão do INSS.

Guia Prático: Como Solicitar o BPC para o Autista Passo a Passo

  1. Passo Zero – Laudo Médico: Antes de tudo, consiga um laudo médico o mais detalhado possível. Este documento é a base de tudo.
  2. Passo 1 – Cadastro Único (CRAS): Vá ao CRAS do seu município para inscrever ou atualizar o CadÚnico. É obrigatório e gratuito. Leve os documentos de todas as pessoas que moram na casa.
  3. Passo 2 – Requerimento no INSS: Com o CadÚnico em dia, faça o pedido no INSS. A forma mais recomendada é pelo portal ou aplicativo “Meu INSS”.
    • Faça o login com a conta Gov.br (do representante legal, se o autista for menor).
    • Clique em “Novo Pedido”.
    • Digite “benefício assistencial”.
    • Selecione “Benefício Assistencial à Pessoa com Deficiência”.
    • Siga as instruções, preenchendo todos os dados e anexando os documentos (laudo médico, documentos de identificação, etc.).
    • O pedido também pode ser feito pelo telefone 135.
  4. Passo 3 – Agendamento e Comparecimento às Perícias: Após o requerimento, o INSS convocará para as perícias. Acompanhe o status do seu pedido pelo Meu INSS para não perder a data. Compareça com todos os documentos e com a pessoa autista.
  5. Passo 4 – Acompanhamento do Resultado: O resultado será informado no Meu INSS ou por carta.
    • Deferido (Concedido): A carta informará o banco e a data para o primeiro saque.
    • Indeferido (Negado): A carta explicará o motivo. É neste momento que a ajuda de um advogado se torna ainda mais crucial.

A Importância do Advogado Especialista em Direito Previdenciário

Embora seja possível fazer todo o processo sozinho, a complexidade do BPC e as altas taxas de indeferimento pelo INSS tornam a assessoria de um advogado especialista uma decisão estratégica.

Um advogado especialista pode:

  • Analisar o caso previamente: Avaliar se os requisitos de renda e deficiência estão preenchidos e orientar sobre como fortalecer as provas.
  • Instruir na produção de provas: Orientar sobre como deve ser o laudo médico e quais outros documentos (relatórios escolares, de terapeutas) são importantes.
  • Preparar para a perícia: Instruir a família sobre como se comportar e o que dizer nas perícias do INSS para que a realidade seja transmitida de forma eficaz.
  • Atuar em caso de negativa: Se o INSS negar o pedido, o advogado ingressará com uma ação judicial. Na Justiça, a análise é muito mais detalhada. O juiz nomeará um perito médico e um assistente social de sua confiança para reavaliar o caso, e a tese dos gastos com o tratamento é muito mais bem aceita, aumentando exponencialmente as chances de reverter a decisão.
  • Garantir os retroativos: Em caso de sucesso na ação judicial, o advogado garantirá que a família receba todos os valores atrasados desde a data do pedido no INSS.

Perguntas e Respostas Frequentes

1. Autismo nível 1 de suporte (Asperger) tem direito ao BPC? Sim. A lei não distingue o grau do autismo. A análise é sobre o impacto do transtorno na vida da pessoa e na interação com as barreiras sociais. Uma pessoa com autismo nível 1 pode ter grandes dificuldades de inserção no mercado de trabalho e de manutenção de vínculos sociais, além de necessitar de terapias. Se o requisito da renda for preenchido, o direito existe.

2. Se a criança autista tem um pai que trabalha de carteira assinada, ela perde o direito? Não necessariamente. O que importa é a renda per capita da família. Se a renda do pai, dividida pelo número de membros do grupo familiar, ficar abaixo do limite legal (ou se os gastos com o tratamento forem altos o suficiente para justificar a flexibilização na Justiça), o direito ao BPC pode ser mantido.

3. Posso acumular o BPC/LOAS com o Bolsa Família? Sim. O valor recebido a título de Bolsa Família não entra no cálculo da renda familiar para fins de BPC. É perfeitamente possível receber os dois benefícios simultaneamente.

4. A criança precisa estar matriculada na escola para pedir o BPC? Não é um requisito obrigatório para o pedido, mas a frequência escolar é um direito da criança e relatórios pedagógicos da escola podem ser documentos importantes para ajudar a comprovar as dificuldades de aprendizado e interação, fortalecendo o processo.

5. Se o pedido for negado, o que eu faço? Você tem dois caminhos: entrar com um recurso administrativo no próprio INSS (geralmente pouco eficaz) ou ingressar com uma ação judicial. A via judicial, com o auxílio de um advogado especialista, costuma ser muito mais vantajosa, pois a análise do caso é mais completa e imparcial.

6. Depois de concedido, o BPC para o autista pode ser cortado? Sim. O BPC é reavaliado a cada dois anos. O INSS verifica se o beneficiário continua atendendo aos critérios de deficiência e, principalmente, de renda. Por isso, é fundamental manter o Cadastro Único sempre atualizado. Se a renda da família aumentar significativamente, o benefício pode ser suspenso.

Conclusão

O direito da pessoa com Transtorno do Espectro Autista ao BPC/LOAS é uma conquista legal inquestionável e uma ferramenta poderosa para garantir dignidade, acesso a tratamentos e qualidade de vida. No entanto, entre o direito previsto na lei e o benefício depositado na conta, existe um caminho que exige informação, preparo e persistência.

O sucesso na obtenção do BPC depende de uma tríade: um laudo médico completo que traduza o diagnóstico em limitações reais, a comprovação da vulnerabilidade econômica através de um Cadastro Único atualizado e, se necessário, da demonstração dos altos custos do tratamento, e uma preparação cuidadosa para as perícias do INSS.

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Para as famílias que enfrentam a jornada diária de cuidado e luta por inclusão, o processo pode parecer intimidador. Mas é fundamental saber que a lei está do seu lado. Diante de uma negativa ou da complexidade do sistema, a busca por um advogado especializado não é um luxo, mas sim um passo estratégico para assegurar que a proteção social destinada aos mais vulneráveis cumpra, de fato, o seu propósito. O BPC não é um favor, é um direito a ser reivindicado.

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