Benefício assistencial e Lei nº 12.435/2011: Redefinição do grupo familiar


Resumo: Trata das mudanças promovidas pela Lei nº 12.435/2011 sobre a Lei nº 8.742/93 acerca do âmbito da definição de grupo familiar, para fins de concessão do benefício de prestação continuada da Assistência Social.


Palavras-chave: Lei nº 12.435/2011. Lei nº 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social, ou LOAS). Benefício de Prestação Continuada. Condições. Grupo Familiar.


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A Lei nº 12.435/2011, que entrou em vigor no dia 07/07/2011, alterou diversos dispositivos e acrescentou outros à Lei nº 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social, ou LOAS).


Entre as mudanças principais, destacam-se os §§ 1º e 2º do art. 20 da LOAS, sobre a abrangência do grupo familiar e o conceito de deficiência, ambos com reflexos sobre a concessão do benefício de prestação continuada.


Pretende-se, neste artigo, analisar a modificação realizada sobre o § 1º do art. 20 da Lei nº 8.742/93.


Uma das condições para o BPC é o fato de a família do requerente não ter meios para mantê-lo. Para as condições de não ter o postulante meios de prover à própria subsistência, próprios ou da família, a LOAS fixou um critério objetivo, qual seja, de a renda mensal familiar per capita ser inferior a 1/4 do salário mínimo (art. 20, § 3º).


O conceito legal de família inicialmente abrangia as pessoas que viviam sob o mesmo teto (independentemente da existência de grau de parentesco), mantida pela contribuição de seus integrantes. Conforme a redação original do art. 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93: “Para os efeitos do disposto no caput, entende-se por família a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes”.


Com a alteração no citado dispositivo pela Lei nº 9.720/98, passou a se restringir aos dependentes para fins previdenciários previstos no art. 16 da Lei nº 8.213/91, que tenham o mesmo domicílio: “Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto”.


Essa delimitação gerou polêmica na prática, pois, com fundamento em “peculiaridades” dos casos concretos, existem inúmeras decisões “relativizando” esse rol exaustivo do grupo familiar.


A Turma Nacional de Uniformização já decidiu que (mesmo com previsão legal expressa) o rol do grupo familiar não é exaustivo, e o padrasto (ou a madrasta) pode ser considerado como membro da família (ainda na vigência da redação conferida pela Lei nº 9.720/98), incumbindo ao julgador, em cada caso concreto, avaliar se outras pessoas não inseridas no art. 16 da Lei nº 8.213/91 fazem parte da família que vive sob o mesmo teto (Processo nº 200770950064928, rel. Juíza Federal Maria Divina Vitória, j. 26/09/2008, DJ 19/08/2009).


Por outro lado, a mesma TNU já afastou a filha maior de 21 anos (e a filha desta, neta da autora) do núcleo familiar, sob o fundamento principal de que, na ocasião, o art. 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93 fazia referência ao art. 16 da Lei nº 8.213/91, e que o rol desse é exaustivo (ou seja, argumento diametralmente oposto ao do acórdão citado acima, que considerou a listagem como sendo exemplificativa) (Processo nº 200563060020122, rel. Juiz Federal Alexandre Miguel, j. 16/10/2006, DJ 13/11/2006).


Há diversos outros precedentes da TNU excluindo irmã e filho maior de 21 anos do conceito do grupo familiar, por não se enquadrar nos requisitos do art. 16 da Lei nº 8.213/91 (que, como visto, abrangia apenas os irmãos não emancipados, menores de 21 anos, ou inválidos de qualquer idade): Processo nº 200770530010236, rel. Juiz Federal Cláudio Roberto Canata, j. 03/08/2009, DJ 13/11/2009, p. 3; Processo nº 200670950022498, rel. Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Junior, j. 13/08/2007, DJ 17/09/2007; Processo nº 200770530025203, rel. Juiz Federal Ricarlos Almagro Vitoriano, j. 03/08/2009, DJ 09/08/2010; Processo nº 200563060141557, rel. Juiz Federal Renato César Pessanha de Souza, j. 05/02/2007, DJ 26/02/2007; Processo nº 200563060083879, rel. Juiz Federal Renato César Pessanha de Souza, j. 04/12/2006, DJ 26/02/2007.


O art. 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93, teve sua redação novamente modificada, pela Lei nº 12.435/2011, e passou a dispor: “Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto”.


A norma se mantém distanciada de sua redação original (que permitia a inclusão, no grupo familiar, de qualquer pessoa vivendo sob o mesmo teto, independentemente de relação civil de parentesco), e assemelha-se ao texto anterior, com a diferença de que não faz mais referência aos dependentes para fins previdenciários previstos na Lei nº 8.213/91, e passa a listar expressamente quem pode ser considerado como integrante do núcleo familiar.


Desde a Lei nº 9.720/98, houve uma opção expressa do legislador em não considerar como sendo do mesmo grupo familiar as pessoas com fundamento apenas no mesmo domicílio, ou, na expressão legal, “vivendo sob o mesmo teto”. Com a modificação feita pela citada lei, o art. 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93 passou a especificar quais pessoas devem ser consideradas como pertencendo a um grupo familiar, técnica que foi repetida na alteração promovida pela Lei nº 12.435/2011 sobre o mesmo dispositivo.


Logo, somente podem ser inseridas, no cômputo de integrantes e na apuração da renda do grupo familiar, as pessoas (com o mesmo domicílio) arroladas de forma expressa e exaustiva (não exemplificativa) no art. 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93, que são: cônjuge ou companheiro, os pais (ou padrastos), os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados.


A contrario sensu, qualquer pessoa que não tenha esse grau de vínculo com o requerente do beneficio de prestação continuada deve ser desconsiderada, tanto para o cálculo do número de indivíduos quanto da renda per capita do grupo familiar.


Por exemplo, se aquele que pleitear o benefício morar com seus pais (de 57 e 56 anos), dois irmãos solteiros (de 24 e 18 anos), um irmão casado (de 20 anos), a esposa (de 19 anos) e o filho (de 2 anos) deste, e a renda da família for de R$ 2.725,00 (R$ 1.635,00 derivada do trabalho do irmão casado, R$ 545,00 do labor de um irmão solteiro, e R$ 545,00 de aposentadoria do pai), a verificação da renda deverá levar em conta: os pais e os irmãos solteiros integram o grupo familiar, mas estão excluídos o irmão casado, a esposa e o filho deste. Consequentemente, o grupo familiar é composto por 5 pessoas (autor, pais e dois irmãos solteiros), e a renda total de R$ 1.090,00, logo, a renda per capita é de R$ 218,00. Se todos fossem incluídos, a família teria 8 pessoas, renda total de R$ 2.725,00, e a renda per capita seria de R$ 340,62.


A idade dos irmãos, que teria influência se ainda fosse observado o critério do art. 16 da Lei nº 8.213/91 (que inclui como dependentes previdenciários o filho e o irmão não emancipados, ou menores de 21 anos; ou os inválidos, independentemente da idade), não gera mais consequências de acordo com a nova redação do art. 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93.


O critério principal não reside mais na idade ou na capacidade civil, e sim no estado civil, pois, como visto, apenas integram o grupo familiar do requerente do BPC (se tiverem o mesmo domicílio): o cônjuge ou companheiro; os pais ou padrastos; os irmãos solteiros (independentemente da idade); os filhos e enteados solteiros (independentemente da idade) e os menores tutelados.


Em resumo, a alteração legal excluiu do conceito familiar as pessoas que, mesmo com relação de parentesco e domicílio comum com o requerente do benefício, tenham outros dependentes. Logo, um irmão de 17 anos de idade que seja casado é afastado do grupo familiar, pois se presume sua obrigação de manter apenas (ou preferencialmente) sua própria dependente, pertencente ao seu núcleo familiar constituído, e não os demais familiares (irmãos, pais, etc.). Assim, encerra-se a controvérsia existente sobre as situações em que pessoas que, mesmo sendo dependentes para fins previdenciários, têm seus próprios dependentes, em classe preferencial à do requerente do benefício de prestação continuada da Assistência Social.



Informações Sobre o Autor

Oscar Valente Cardoso

Juiz Federal Substituto na 4ª Região. Mestre em Direito e Relações Internacionais pela UFSC. Especialista em Direito Público, em Direito Constitucional, em Direito Processual Civil e em Comércio Internacional. Autor do livro “Juizados Especiais da Fazenda Pública (Comentários à Lei nº 12.153/2009)”, publicado pela Editora Dialética.


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