Resumo: O direito processual trabalhista, instrumento garantidor dos direitos laborais, divide os litígios da sua natureza em duas vertentes, a saber: dissídios individuais e dissídios coletivos. Os dissídios de natureza individual têm por finalidade a garantia dos direitos materiais do trabalho quando da litigância direta entre trabalhador e empregador. O dissídio de natureza coletiva, por via reflexa, consiste na discussão entre direitos e garantias trabalhistas pertencentes às entidades e categorias de classe representativas, comuns a todos os representados. Como se vê, a distinção entre os litígios individuais daqueles coletivamente considerados é puramente axiológica, malgrado constitua significante aperfeiçoamento do alcance das normas materiais trabalhista. O presente trabalho, nessa perspectiva, pretende abordar as principais discussões que entornam o assunto e os principais entendimentos jurisprudenciais que com elas se correlacionam. Este estudo, pois, visa obter uma melhor percepção acerca do instituto do dissídio coletivo na obtenção de normas regulamentares trabalhistas pela via jurisdicional do Estado.
Palavras-chave: Dissídio coletivo. Sentença normativa. Poder Normativo.
Abstract: The labor procedural law guarantor instrument of labor rights, divides disputes of their nature into two parts, namely: individual bargaining and collective bargaining. The individual nature of bargaining are intended to guarantee labor rights of the materials when the direct litigation between employee and employer. The collective bargaining of nature, by reflex pathway consists of the discussion between labor rights and guarantees pertaining to entities and categories of representative class, common to all represented. As seen, the distinction between individual disputes those considered collectively is purely axiological, despite constituting a significant improvement of the reach of materials labor standards. This work, in this perspective, aims to address the main discussions that entornam the subject and the main jurisprudential understandings that correlate with them. This study therefore aims to get a better perception of the Institute of collective bargaining in obtaining regulatory labor standards by judicial state.
Keywords: Collective Bargaining. Normative judgment. Normative power.
Sumário: I. Métodos de solução de conflitos: lições propedêuticas; II. Conceito de dissídio coletivo; III. Classificação; IV. Poder normativo; V. Pressupostos de cabimento do dissídio coletivo; VI. Requisitos da Petição Inicial nos Dissídios Coletivos; VII. Condições da Ação Coletiva Stricto Sensu; VIII. Sentença Normativa e Dissídio Coletivo; IX. Procedimento dos dissídios coletivos; X. Recurso Ordinário; XI Dissídio Coletivo de Extensão; XII Dissídio Coletivo Revisional; XIII Considerações finais.
I Métodos de solução de conflitos: lições propedêuticas
Na medida em que a sociedade evolui surge, juntamente a ela, uma série de conflitos interpessoais, onde os anseios individuais de cada cidadão nem sempre prevalecerão de maneira harmônica. Essas necessidades, inicialmente indispensáveis ao desenvolvimento humano, deu ensejo à criação do comércio e dispôs à sociedade a concretização dos seus anseios.
O exercício da atividade econômica, com o passar do tempo, ficou cada vez mais exigente pelo mercado consumidor, seja pela globalização que a permeia, ou, ainda, pela competitividade entre produtos e serviços padrões.
É nesse contexto em que surge a necessidade de regulamentação dos trabalhos prestados por cidadãos aos comerciantes, a fim de que lhes sejam assegurados direitos advindos das relações empregatícias.
O Direito Trabalhista, tal como ciência construída através de contextos históricos, é desenvolvida através de normas e princípios que norteiam a relação entre empregado e empregador, bem assim da melhoria nas condições sociais do cidadão hipossuficiente, o trabalhador.
A solução de conflitos existentes no direito do trabalho pode ser dividida em autocompositivos, quando da formalização de mediação, acordos e convenções coletivas, e heterocompositiva, como a arbitragem e a jurisdição.
A solução pela via jurisdicional do direito trabalho pode igualmente ser dividida. Isso porque, fala-se em tal ramo em dissídio individual, quando levados em consideração os direitos singularmente considerados entre trabalhadores e, ainda, em dissídio coletivo, assim considerada os direitos relativos a categorias profissionais e econômicas.
II Conceito de dissídio coletivo:
O conceito de dissídio coletivo, embora reúna um núcleo essencial de tal forma de solução de conflitos, é colocado pela doutrina por formas mais variadas.
Nascimento apud Leite (2010, p. 1117) considera o dissídio coletivo um processo destinado à solucionar os conflitos trabalhistas no âmbito dos pronunciamentos de novas condições de trabalho, bem assim da regulamentação de determinados grupos conflitantes entre si. Dessa forma, dissídios coletivos são “relações jurídicas formais, geralmente da competência originária dos Tribunais, destinadas à elaboração de normas gerais”.
Sob a perspectiva da denominação dos dissídios coletivos para o autor acima citado, tem-se que tal processo possui a função de criar um direito novo, aplicável à um determinado grupo de trabalhos, como forma de solucionar as controvérsias existentes na sua categoria profissional.
Por outro lado, Leite (2010) denomina os dissídios coletivos como espécie de ação coletiva. Essa denominação ocorre justamente pelo fato de ser aplicável a grupos específicos, geralmente sindicatos, na defesa de interesses inerentes à classe que interessa nova regulamentação.
Outrossim, é preciso conceituar dissídio coletivo não como processo em si, mas levando em consideração as novas nuances da Carta Constitucional de 1988, para reunir as interpretações do texto magno no âmbitos dos interesses profissionais, bem assim das perspectivas da coletivização dos dissídios em interesses restritos.
III Classificação:
Os dissídios coletivos podem ser classificados segundo à sua natureza econômica, jurídica ou mista.
Ao se falar da natureza econômica dos dissídios coletivos, conforme se depreende do art. 20 do Regimento Interno do TST, estar-se-ia referindo à instituição de normas gerais e condições de trabalho para a classe profissional conflitante.
A natureza jurídica do dissídio coletivo, por sua vez, serve para a interpretação de cláusulas de sentenças normativas, instrumentos de negociação coletiva, acordos e convenções, além de disposições legais particulares de categoria profissional ou econômica de atos normativos (art. 20 do RITST).
O Tribunal Superior do Trabalho considera ainda a existência de dissídios coletivos cuja natureza pode ser originária, quando inexistentes ou em vigor normas especiais decretadas em sentença normativa; de revisão, destinados a reavaliar condutas preexistentes que se tornaram injustas; ou de declaração sobre paralisação de trabalho decorrente do direito de greve.
Alguns doutrinadores ainda, como no caso de José Augusto Rodrigues Pinto, avalia a classificação dos dissídios coletivos como primários ou de interesse. Tal forma de classificação dá lugar a outras três formas, notadamente como dissídios coletivos de extensão de efeitos, de revisão ou dissídio coletivo jurídico que leva em consideração a interpretação dos dispositivos de determinada norma jurídica.
IV Poder normativo:
Dentre os fundamentos que ensejam a existência dos dissídios coletivos, encontra-se o poder normativo da justiça do trabalho.
O tradicional sistema vigente do direito laboral brasileiro é eivado da influência da Carta Del Lavoro, o que representa um ultrapassado método de solucionar os conflitos trabalhistas de massa. Nessa perspectiva encontra-se o fundamento do poder normativo da justiça trabalhista como criador de normas aplicáveis à categorias profissionais e econômicas.
Trata-se de uma garantia consagrada na CRFB/88 em seu artigo 114, §2º que, logo após a EC 45/2004, passou a ter a seguinte redação: “Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente”.
Há quem diga, porém, que o preceito constitucional instituiu a arbitragem no sistema jurídico brasileiro, o que extingue com o poder normativo da Justiça do Trabalho. De modo diverso, Leite (2010) diz não equiparar a sentença arbitral, que é irrecorrível, pela sentença normativa, eis que não foi essa a função do constituinte derivado.
V Pressupostos de cabimento do dissídio coletivo:
Malgrado seja uníssono o entendimento de que a ação é um direito inerente a qualquer indivíduo, exige-se para a admissibilidade da tutela jurisdicional a existência de determinadas condições e pressupostos. As condições da ação se classificam em legitimidade (ad causam), interesse em agir e possibilidade jurídica do pedido. Os pressupostos processuais, por sua vez, são interpretados de acordo com a existência e validade de tais elementos.
Os dissídios coletivos, mesmo tendo que estar em harmonia com os preceitos constitucionais basilares do direito processual, possuem pressupostos específicos, que podem ser definidos em subjetivos ou objetivos.
Pelos pressupostos subjetivos dos dissídios coletivos têm-se a competência e a capacidade processual. A competência para conhecer dos dissídios coletivos é precípua dos Tribunais do Trabalho, excluindo, pois, a competência das Varas do Trabalho nessa espécie de ação. Assim, a competência para apreciar tais feitos é funcional, originária dos tribunais superiores do trabalho, segundo a abrangência territorial do respectivo dissídio. Daí falar-se que a competência dos dissídios coletivos é de cumulação funcional e territorial, pois, além da fixação da competência pela função desempenhada pelos Tribunais do Trabalho, devem estar circunscritos à base territorial do TRT ou TST.
A capacidade processual, outro pressuposto subjetivo, leva em consideração quem postula em juízo que, neste caso, não é o conjunto de empregadores (categoria), mas o sindicato que os representa, assim como determina os comandos da CRFB nos seus artigos 8º, III e 114, §2º. Há de ressaltar, por oportuno, o que a nova redação dada ao art. 114, §2º pela EC 45/2004 descreve que as partes (sindicatos e empresas) poderão, em comum acordo, ajuizar o dissídio coletivo quando o mesmo for de natureza econômica.
Os pressupostos objetivos, por outro lado, exigem uma negociação coletiva prévia, inexistência de norma coletiva em vigor, observância da época própria para o ajuizamento, petição inicial apta, além de comum acordo entre as partes.
A negociação coletiva prévia como pressuposto objetivo do dissídio coletivo tem gerado alguns debates doutrinários. Isso porque, alguns doutrinadores tem considerado a frustração da negociação coletiva como um pressuposto processual objetivo, conforme outrora salientado (como exemplo, Ives Gandra da Silva). Por outro lado, outra parte dos juristas tem salientado a negociação coletiva prévia como uma condição da ação, pois implicaria em falta de interesse em agir do suscitante, em que se pese a possibilidade de solução do conflito suscitado antes do ajuizamento do dissídio coletivo (nesse entendimento, Carlos Henrique Bezerra Leite).
A inexistência de norma coletiva em vigor é, do mesmo modo, considerado pressuposto objetivo em tais feitos, eis que tanto a sentença normativa, quanto os acordos e convenções coletivos possuem vigência temporária, o que impediria o ajuizamento de novo dissídio, salvo nos casos em que a discussão é o direito de greve.
A necessidade de se observar o prazo apropriado para o ajuizamento do dissídio coletivo também deve ser respeitado. Ainda que inexista prazo prescricional para o ajuizamento do dissídio coletivo, a CLT estabelece algumas regras a serem cumpridas no ajuizamento no que tange à sua eficácia no tempo da sentença normativa. Em linhas gerais, se ultrapassados os prazos estabelecidos pela CLT, a categoria profissional corre o risco de ficar temporariamente exposta ao vazio normativo, pois a sentença normativa não pode retroagir à data-base da categoria, entrando em vigor apenas a partir de sua publicação.
A petição inicial subscrita com todos os seus elementos essenciais também constitui um pressuposto processual objetivo do dissídio coletivo, tendo ela, pois, que preencher todos os seus requisitos, sob pena da sua não apreciação.
Conforme acima disposto, a EC 45/2004 alterou a redação do art 114, §2º da CRFB. Diante dessa nova alteração, foi acrescentada a expressão “comum acordo” no texto constitucional e, mesmo com as divergências sobre o tema, o acordo comum entre as partes também constitui pressuposto objetivo dos dissídios coletivos. Isso significa que se uma das partes não concordar com a sua propositura, certamente lhe faltará um dos elementos essenciais aptos à apreciação dos dissídios coletivos pelos Tribunais do Trabalho.
VI Requisitos da Petição Inicial nos Dissídios Coletivos:
Nos dissídios coletivos, a petição inicial também é conhecida como “representação” ou “instauração de instância” e deve ser obrigatoriamente escrita. Além de cumprirem todos os requisitos básicos de qualquer petição inicial, a representação no dissídio coletivo deve preencher ainda todos os seus requisitos específicos, sejam eles objetivos ou específicos.
VI.I Requisitos objetivos:
Além da formalização escrita da petição inicial, a sua análise depende de alguns documentos e, por isso, são imprescindíveis já em seu ajuizamento. Por meio de tais documentos torna-se possível verificar o preenchimento de outros requisitos essenciais dos dissídios coletivos, notadamente a partir das condições da ação e pressupostos processuais. Assim, são documentos essenciais na sua propositura:
a) Edital de convocação da assembleia geral da categoria profissional;
b) Ata da assembleia geral;
c) Lista de presença da assembleia geral;
d) Correspondência, registros e atas que demonstrem a frustração da negociação coletiva;
e) Acordo, convenção coletiva ou sentença normativa anterior;
f) Instrumento de mandato outorgada pelo presidente do suscitante ao advogado subscritor da petição inicial;
g) Comprovação de concordância entre as partes no ajuizamento do dissídio coletivo, sempre que o mesmo for de natureza econômica.
VI.II Requisitos subjetivos:
Os requisitos subjetivos da petição inicial do dissídio coletivo, estabelecidos nos arts. 857 e 858 da CLT, levam em consideração a forma pelo qual a pretensão do suscitante deve ser articulada. A designação da autoridade competente, qualificação, bases da conciliação e os fundamentos da demanda são os requisitos subjetivos.
Pela designação de autoridade competente, o presidente do TRT ou TST, a depender da circunscrição da base territorial da categoria profissional, é que terá competência para apreciação e, por tal razão, deve ser feito menção à ele na representação.
A qualificação dos suscitantes e suscitados, por sua vez, corresponde à descrição da delimitação territorial das entidades sindicais, categorias profissionais envolvidas e quorum estatutário para deliberação da assembleia.
A petição inicial do dissídio coletivo deve conter ainda as bases da conciliação, que representam a proposta das cláusulas que o sindicato almejam ver instituídas, isto é, da pauta de reivindicação da categoria envolvida.
Por fim, os fundamentos da demanda são as razões que ensejam o pedido contido nos dissídios. Por uma consequência lógica, não faria sentido algum o ajuizamento de uma ação sem que nela não conste os fundamentos que, em tese, ensejam a instituição de melhores condições de trabalho.
VII Condições da Ação Coletiva Stricto Sensu:
A admissibilidade da tutela jurisdicional depende, sobremaneira, da análise das condições da ação, notadamente os requisitos que possibilitam que os magistrados analisem o mérito da ação. A ausência de tais requisitos leva a extinção do feito sem resolução de mérito, a teor do que emprega o art. 769 da CLT.
VII.I Legitimidade ad causam:
A representação para instaurar dissidio coletivo, assim como propõe o artigo 857 da CLT, “constitui prerrogativa das associações sindicais”, salvo nas hipóteses do artigo 856, isto é, por iniciativa do Presidente ou a requerimento da Procuradoria da Justiça do Trabalho.
Em apurada análise dos artigos acima mencionados, bem assim do disposto no art. 114, §2º da CRFB, é possível se dizer que os legitimados (ad causam) para a propositura do dissídio coletivo é, de um lado, do sindicato das categorias profissionais e, de outro, facultativamente, o sindicato da categoria econômica ou empresa.
Quando os sujeitos são os sindicatos, fala-se em conflito intercategorial, pois envolve duas categorias distintas, econômica e profissional. Se, por outro lado, os sujeitos da demanda são o sindicato de uma categoria profissional e uma ou mais empresas, o dissídio acaba por ser mais restrito, haja vista que decorre de um grupo de trabalhadores de uma determinada empresa, representada pelo sindicato.
Há a possibilidade ainda de que os presidentes dos Tribunais do Trabalho ajuízem o dissídio coletivo. Essa norma, no entanto, tem sofrido inúmeras criticas no que diz respeito ao seu alcance de aplicação, pois, para alguns doutrinadores, a mesma não teria sido rececpionada pela Carta Constitucional de 1988, que faculta apenas às partes, em comum acordo, a legitimação para a ação coletiva.
Além das hipóteses acima elencadas, a Lei Complementar 75/93 faculta aos Ministério Público do Trabalho a instauração de dissídio coletivo de greve (art. 83, VIII). Essa norma, todavia, não entra em divergência com o texto constitucional, pois uma vez ajuizado o dissídio pelo MPT, não há de se falar em defesa de interesses de categorias profissionais, mas sim em interesses públicos. Foi somente com o advento da EC 45/2004 que o MPT passou a ter sua legitimidade tratada no seio constitucional (art. 114, §3º da CRFB).
Ainda sobre os dissídios coletivos de greve, há de se considerar ainda que o natural legitimado é o sindicato representativo da categoria econômica, vez que o próprio TST não tem possibilitado o ajuizamento em tais casos pelo sindicato que deflagrou o movimento grevista. Esse é, inclusive, o teor da OJ nº 12 da SDC.
VII.II Interesse processual:
A Constituição Federal de 1988 condicionou o interesse processual no ajuizamento da ação coletiva trabalhista ao exaurimento prévio da negociação coletiva, em seu artigo 114, §2º. Essa, todavia, não é uma simples tarefa de se implementar, muito em virtude pela cultura brasileira do empresariado e dos sindicatos, bem como pelas exigências que os tribunais superiores tem firmado nesse sentido.
Á guisa de exemplo, o TST já decidiu que o quorum mínimo de 1/3 prevalece sobre o mesmo quorum fixado nas regras do estatuto sindical, o que impossibilita o ajuizamento de diversos dissídios coletivos. Do mesmo modo, o próprio TST também tem impedido a propositura desses feitos de natureza econômica ainda durante a vigência de convenção, acordo ou sentença normativa, por falta de interesse processual.
Há ainda de ser ressaltado que o mútuo consentimento quando do ajuizamento de dissídio coletivo, ainda que suscite dúvidas acerca da sua constitucionalidade, deve ser respeitado, eis que, na sua falta, o mesmo será extinto sem resolução de mérito.
VII.III Possibilidade Jurídica do Pedido:
A possibilidade jurídica do pedido como condição da ação pode ser tratada como a inexistência de fundamentos que impossibilitem o deferimento da pretensão em almejo.
Hipótese em que ocorre a impossibilidade jurídica do pedido pode ser apontada pela OJ nº 5 SDC/TST, em que impossibilita o ajuizamento do dissídio coletivo econômico por sindicato dos servidores públicos em face de pessoa jurídica de direito público, pois somente o Executivo tem atribuição para deflagrar o processo legislativo que aumente a remuneração pretendida ou concessão de qualquer vantagem ligada a tais servidores.
VIII Sentença Normativa e Dissídio Coletivo
A decisão em dissídio coletivo, quando referente à sentença normativa, não possui conteúdo condenatório, razão pela qual não comporta execução, mas podem dar ensejo à algumas condições, a saber:
a) econômicas, geralmente que versam sobre salários, abonos pecuniários, etc.;
b) sociais, como garantia do trabalhador no emprego ou preservação do ambiente de trabalho;
c) sindicais, que são relativas à relação entre os sindicatos e empresas;
d) obrigacionais, que visam estabelecer multas para eventuais descumprimentos das normas coletivas de trabalho.
Outro ponto de grande destaque acerca da sentença normativa no dissídio coletivo envolve a coisa julgada. O dissenso acabou sendo instaurado em face das divergências doutrinárias sobre o tema, em que, parte da doutrina, tem considerado que a sentença normativa produz coisa julgada formal, pois seu cumprimento ocorre antes do trânsito em julgado. Um outro lado dos doutrinadores, porém, acreditam que a sentença normativa produz efeitos formais e também materiais, pela justificativa de que o parágrafo único do art. 872 da CLT veda a rediscussão sobre matérias de fato e de direito em sede de ação de descumprimento.
Segundo o TST, consubstanciado em sua súmula 397, a sentença normativa produz tão somente efeitos formais.
IX Procedimento dos dissídios coletivos:
O procedimento dos dissídios coletivos, além de levar em consideração os preceitos gerais do direito processual comum, encontra alicerce nos arts. 856 e 857 da CLT.
Já no ajuizamento da ação a CLT exige uma série de requisitos a serem cumpridos na petição inicial – já descritos – dirigida à autoridade competente, isto é, Presidente do TRT ou TST. A exigência mais comum da representação do dissídio coletivo é a de que esta seja escrita, não se admitindo petição inicial verbal no âmbito das ações coletivas.
A primeira tentativa de solução dos conflitos ocorre pela conciliação em uma audiência exclusivamente para esse fim. Tal sessão deve ser presidida pelo Presidente do Tribunal, embora alguns regimentos internos tem admitido tal atribuição ao Vice-Presidente. Conseguindo as partes chegarem a um acordo, o presidente da sessão deverá encaminhar o feito ao Tribunal para homologação. A decisão de homologação tem os mesmos efeitos de uma sentença normativa. Não havendo acordo entre as partes, o processo será distribuído por sorteio ao seu relator e revisor. No âmbito do TST, a competência na análise dos dissídios coletivos é do SDC.
Antes da distribuição do feito, no entanto, o MPT poderá emitir parecer escrito.
Pelo fato de no dissídio coletivo não existir pedido, mas apenas propostas de criação de novas normas, não há que se falar em julgamento extra ou ultra petita da decisão.
As sentenças normativas, mesmo tendo divergência quanto aos efeitos da coisa julgada, produz efeito ultra parte, alcançando todos os integrantes da categoria profissional suscitante.
De acordo com art. 867 da CLT a decisão do Tribunal deve ser notificada as partes por registrado postal, “com franquia, fazendo-se, outrossim, a sua publicação no jornal oficial, para ciência dos demais interessados”. O Parágrafo único do aludido dispositivo dispõe ainda que a “sentença normativa vigorará: a) a partir da data de sua publicação, quando ajuizado o dissídio após o prazo do art. 616, § 3º, ou, quando não existir acordo, convenção ou sentença normativa em vigor, da data do ajuizamento; b) a partir do dia imediato ao termo final de vigência do acordo, convenção ou sentença normativa, quando ajuizado o dissídio no prazo do art. 616, § 3º.”. Foi com base nesse dispositivo que o TST editou a súmula 277, indicando que as condições de trabalho vigoram no prazo assinado nos instrumentos de negociação coletiva, não integrando, em definitivo, os contratos individuais de trabalho.
Como se vê, a ausência de normas gerais sobre os dissídios coletivos, faz com que o procedimento é na maioria das vezes descrito no Regimento Interno do Tribunal, e, em sua maioria, bastante flexíveis.
X Recurso Ordinário:
Quando da insatisfação da decisão de sentença normativa, cabe recurso ordinário dirigido ao TST, que será analisado e julgado pela SDC, conforme define a Lei nº 7.701/88. O prazo para a interposição do recurso ordinário é o mesmo que os demais recursos na justiça do trabalho, de 8 dias (art. 895, b, CLT).
Sempre que nos autos do dissídio coletivo for formalizado acordo entre as partes, só caberá recurso da decisão que a homologa pelo Ministério Público do Trabalho. A atribuição do MPT no que tange à interposição de recursos nos dissídios coletivos, convém ressaltar que além de quando for parte, é possível interpor recurso ordinário quando emitiu parecer no feito, isto é, quando atuou como custos legis.
A Medida Provisória nº 1.398/96 possibilitava que o Presidente do TST conceda efeito suspensivo ao recurso interposto da decisão de sentença normativa. Atualmente, a Lei nº 10.192/2001, em seu art. 14, dispõe que “o recurso interposto de decisão normativa da Justiça do Trabalho terá efeito suspensivo, na medida e extensão conferidas em despacho do Presidente do Tribunal Superior do Trabalho”. Em outros termos, atribuindo efeito suspensivo, o Presidente do tribunal deve estabelecer todas as consequências do efeito suspensivo.
XI Dissídio Coletivo de Extensão:
Sendo suscitado dissídio coletivo de extensão, cuja finalidade é estabelecer novas condições de trabalho, caberá ao tribunal competente limitar os alcances das condições de trabalho, sempre que se reputar conveniente aos empregados da empresa. Essa regra é estabelecida em respeito ao juízo de equidade estabelecido no art. 868 da CLT, que poderá ser estendida por solicitação de empregados, empregadores ou sindicato, ex officio pelo tribunal competente ou por solicitação do MPT.
No caso de extensão dos efeitos da sentença normativa, o tribunal competente deve fixar data em que a decisão mereça ser cumprida, além de prazo de vigência, que deve ser inferior a 4 anos.
A validade na extensão dos efeitos da sentença normativa depende, no entanto, da concordância dos sindicatos ou de pelo menos três quartos dos empregadores e três quartos dos empregados (art. 870 da CLT).
Qualquer interessado pode se manifestar sobre a extensão dos efeitos da sentença, desde que sempre no prazo não inferior a trinta nem superior a sessenta dias.
XII Dissídio Coletivo Revisional:
O dissídio coletivo revisional consiste em uma espécie de dissídio derivado do dissídio coletivo de natureza constitutiva, sempre que a respectiva sentença normativa tenha fixado condições específicas de trabalho e que, por razões diversas, tenham se modificado.
O prazo para o dissídio coletivo revisional ocorre após decorrido mais de um ano de vigência da sentença normativa respectiva.
Além disso, importa registra que a propositura do dissídio coletivo revisional é de iniciativa do Tribunal prolator da sentença normativa, do Ministério Público do Trabalho, das associações sindicais, além de empregado ou empregadores quando do cumprimento das respectivas decisões. Sobre o tema, alguns doutrinadores alertam, no entanto, que o MPT nem o Presidente do Tribunal tem competência para tanto, em razão da natureza econômica que permeia esse tipo de ação coletiva.
A competência de julgamento do dissídio coletivo revisional, por razões lógicas, é do mesmo tribunal que prolatou a sentença normativa que dá ensejo à ação revisional.
XIII Considerações finais:
Dentro do contexto histórico que se situa os dissídios coletivos, a importância de tal ação apareceu no cenário brasileiro somente com o advento da Constituição Federal de 1988 e, sobremaneira, pelas alterações advindas da EC nº 45/2004.
Os dissídios coletivos inegavelmente constituem um dos mais importantes instrumentos na defesa de interesses relativos à categorias profissionais e entidades de classe. Distintamente dos dissídios individuais que são levados em consideração os direitos singularmente considerados, o dissídio coletivo representa a forma pelo qual uma categoria profissional almeja melhores condições de trabalho.
O procedimento dos dissídios coletivos, pela ausência de normas gerais, é encontrado com maior facilidade nos regimentos internos dos tribunais competentes. A doutrina e jurisprudência, no entanto, não tem medido esforços para estabelecer parâmetros mais precisos acerca de tal ação coletiva, o que tem contribuído para o estudo dos dissídios coletivos.
O presente trabalho, pois, teve o objetivo de demonstrar os mais importantes aspectos que norteiam os dissídios coletivos no sistema jurídico brasileiro.
Informações Sobre o Autor
Igor Coelho Antunes Ribeiro
Advogado e Consultor Jurídico. Especialista em Direito Público pela Faculdades Integradas Pitágoras. Pós-graduando em Direito Processual Tributário pela Universidade Anhaguera – UNIDERP