Alguns fatores ocorreram no mundo, na primeira metade do século XX, como, por exemplo, a Primeira e Segunda Guerras Mundiais, a quebra da Bolsa de Valores de Nova York, dentre outros, que trouxeram sérios prejuízos para a economia mundial, sinalizando a necessidade de uma maior intervenção do Estado na economia.
Surgiram os chamados Estados Intervencionistas, legitimados a atuar sobre a atividade econômica privada, inclusive como concorrente desta iniciativa privada, com a iniciativa de promover determinados fins sociais, ou sob o manto da segurança nacional, ou seja, o Estado do bem-estar social (well fare state).
Exemplo clássico, de política intervencionista foi o plano de recuperação da economia norte-americana (New Deal[1]), logo após a Quebra da Bolsa de Valores de New York, engendrado no governo de Roosevelt, após a chamada “grande depressão”, que se caracterizou pela intervenção direta do Estado na economia, inclusive com a determinação aos setores produtivos, da quantidade a ser colocada no mercado.
No Brasil, principalmente, na chamada Era Vargas (1930-1945) e, depois no seu segundo governo (1950-1954), o Estado brasileiro se notabilizou por ser paternalista ao criar uma máquina estatal voltada à proteção e ao atendimento das atividades, consideradas como necessidades básicas para o cidadão brasileiro.
É nesse período que se dá a criação das grandes empresas estatais, em quase todos os setores produtivos e, na definição das áreas que estariam sob a égide do monopólio estatal, com o fito de proteção às influências externas, sob o manto da justiça social.
A Constituição de 1934, expressamente determinou que a economia se organizasse de acordo com os princípios da justiça social que possibilitasse a vida digna, garantindo a liberdade econômica.
Neste contexto, o Estado brasileiro emergiu como o grande provedor do bem estar e da justiça social ampliando a máquina estatal para abraçar atividades que pudessem promover a integração nacional ou por motivos de segurança nacional.
Surgiu o Estado empreendedor que criava dois tipos de empresas: as que se destinavam à intervenção na atividade econômica e as prestadoras de serviços públicos.
Situação agravada, nos governos do regime militar (1964-1984), em que os militares para anestesiar a falta de liberdade, então existente, aparelharam o Estado, cada vez mais intervencionista, com Ministérios e Secretarias a fim de melhor oferecer as atividades típicas de um Estado protetivo.
Mais adiante, com o retorno ao Estado Democrático de Direito (a partir de 1985, com o governo José Sarney), o país buscou de todas as formas continuar com o oferecimento dos serviços públicos, de forma intervencionista.
Verificou-se, ao longo de nossa história, mormente a partir do Governo Vargas, um enorme crescimento da máquina estatal em diversos e diferenciados ramos da atividade econômica.
Este crescimento desenfreado do Estado trouxe graves conseqüências, sendo uma das principais, o déficit estatal fiscal. Como forma de arrecadação para suprir este déficit, o Estado conta com duas alternativas possíveis: a tributação ou venda de ativos.
Em contraposição a este gigantismo estatizante brasileiro que, de certa forma, coibiu o crescimento econômico da iniciativa privada, aparece a necessidade de uma redefinição do real papel, ou seja, a identificação de quais atividades ele realmente deveria estar presente.
Neste cenário de redefinição do papel do Estado na atividade econômica, surge o Programa Nacional de Desestatização, instituída pela Lei nº 8.031/90 (alterada pela Lei nº 9.491/97).
No programa aludido, a privatização é uma das modalidades de desestatização, que tem como objetivo devolver à iniciativa privada o seu espaço, com o retorno do Estado as suas funções essenciais ou típicas.
A privatização surge como um instrumento para enxugar o Estado, com o objetivo deste tentar executar suas finalidades típicas.
O citado programa tem a filosofia de que a atividade econômica produtiva deve ser desempenhada pela iniciativa privada, cabendo ao Estado zelar pela busca do bem estar social. É a busca da nova concepção de Estado entre o interventor e o liberal, ou seja, o Estado Regular.
No processo brasileiro podemos identificar três etapas de privatização: a primeira (1978/1990), foi a tentativa de venda pelo Banco Nacional de Desenvolvimento – BNDES – de empresas privadas que haviam sido encampadas ou recebidas como pagamento de dívidas pelo Estado; a segunda (1990/1995), a privatização de empresas estatais industriais; e a terceira (1995), atualmente a privatização de serviços públicos.
De forma sintética pode-se identificar como objetivos da privatização a redefinição da forma de intervenção do Estado no domínio econômico; a redução do perfil da dívida pública; a ampliação dos investimentos da iniciativa privada com a atração do capital estrangeiro; o fortalecimento do mercado de capitais com a venda de ações de estatais em bolsa e, principalmente, a liberação de recursos do Estado para ser investidos em setores que sua presença seja essencial na busca do bem estar social.
Neste novo cenário a Administração Pública passa a ter um diferente papel na economia, migrando de um Estado fortemente intervencionista para um Estado regulador.
Surgem, então, as chamadas Agências Reguladoras, com finalidade de regulamentar, controlar e fiscalizar a abertura de um mercado econômico, que antes era monopolizado pelo Estado empreendedor.
No Brasil o surgimento das “Agências Reguladoras” ou dos entes reguladores autônomos teve como parte inicial o processo de privatização, ou de desestatização. Assim demonstra-se a evolução do papel do Estado Brasileiro no que se refere a intervenção na economia, ou seja, o cenário que levou a mudança do Estado Interventor empresário ao atual Estado Regulador.
É importante salientar que apesar da diminuição da intervenção estatal na economia, o mesmo não pode ser considerado como um Estado mínimo, visto que exerce influência econômica, ao regular as atividades que anteriormente eram de sua responsabilidade.
Pelo contrário, ao estabelecer regras e forma de intervenção econômica, verifica-se que este deslocou a atuação estatal do campo empresarial, através das empresas públicas, para o campo da disciplina jurídica, ao ampliar o seu papel na regulação e fiscalização dos serviços públicos e atividades econômicas.
Com isto, o Estado não deixa de ter um papel decisivo. Verifica-se este fato, pela enorme quantidade de textos normativos editados nos últimos anos. Realmente, na década de 90 houve a flexibilização dos monopólios e a conseqüente abertura destes setores ao capital estrangeiro. Foi também, nesse período, que se introduziu no país uma política específica de proteção ao meio ambiente, limitativa à ação dos agentes econômicos, e se estruturou um sistema de defesa e manutenção das condições de livre concorrência que, embora longe do ideal, constitui um considerável avanço em relação ao modelo anterior.
Nesse ambiente é que despontaram as agências reguladoras como instrumento da atuação estatal.
Funções das agências reguladoras no contexto social.
A função básica das Agências Reguladoras é a intervenção do Estado no domínio econômico, ou ainda, a promoção do desenvolvimento econômico, tudo sob o prisma do fortalecimento da competição no setor privado da economia e da criação de procedimentos de controle absolutamente racionais.
Segundo o entendimento de Marcos Augusto Perez[2], em traços gerais o perfil das agências reguladoras acumulam as funções de:
a. relativa independência técnica e gerencial;
b. regular e fiscalizar;
c. exerce função contenciosa ao dirimir divergências entre os prestadores do serviço, os produtores e seus respectivos consumidores;
d. buscar a preservação da competitividade no mercado, valendo-se da crença de que a concorrência proporcionará maior qualidade a um menor custo para o cidadão, alçado a condição de consumidor de serviços públicos.
O Brasil incorporou ao seu Direito Administrativo um instrumento moderno, muito eficiente e de intervenção na economia: a Agência Reguladora. A ela a administração delega:
a. o poder de produzir a nova regulamentação dos setores relevantes da economia nacional, voltada à preservação do interesse público;
b. poder de fiscalização e controle de atividades desenvolvidas pelos atores privados da economia, de modo a impedir a o abuso do poder econômico que coloque em risco a saúde púbica, o meio ambiente e o acesso universal dos cidadãos aos serviços públicos;
c. poder quase jurisdicionais, a procura de solução de litígios que envolvem prestadores e usuários de serviços públicos.
Ainda de acordo com o ilustre autor[3], por outro lado, às Agências Reguladoras se impõe a obrigação de preservação da competição no mercado, como alavanca do desenvolvimento econômico. Impondo-se também, a elas, a adoção do “devido processo legal” como modo de atuação, ou, mais precisamente, como princípio vetor do processo de tomada de decisão da Administração Pública, instrumento que tende a tornar cada vez mais racionais e transparentes as decisões administrativas.
Segundo a Constituição Federal de 1988, especificamente nos artigos 21, XI e 177, §2º, III, as agências reguladoras estão previstas como “órgãos reguladores”, com competência específica a certas atividades.
Deve ser destacado que o signo “órgão”, utilizado pelo legislador constituinte, distancia-se da boa técnica do Direito Administrativo, uma vez que confunde conceitos de descentralização, que é atinente a entes (como as agências reguladoras) e não à desconcentração, esta sim ligada a órgão.
Tendo em vista que as autarquias, no modelo tradicional, permaneciam muito vinculadas ao controle de resultados, passou-se a entender que era mais benéfico à atuação do Estado dar nova dinâmica a estes entes, mediante um controle dos meios de atuação.
Assim, foram criadas as autarquias de regime especial, ou melhor, as agências reguladoras. De forma sucinta, surgiram autarquias com maiores privilégios.
Conforme o artigo 21. XI e 177, § 2º, III, da Constituição Federal, há previsão de órgãos reguladores para certas atividades, apesar do legislador constituinte nominar desta forma as atuais agências reguladoras, não há duvida que, hoje, o termo “órgão” não condiz com a realidade, uma vez que a criação das agências reguladoras é matéria atinente à descentralização e não à desconcentração, feita por intermédio da criação de órgãos.
Segundo Di Pietro[4], as agências reguladoras “[…] estão sendo criadas como autarquias em regime especial. Sendo autarquias, sujeitam-se às normas constitucionais que disciplinam esse tipo de atividade.”
Conforme o artigo 5º, inciso I, do Decreto-lei 200/67, autarquia é:
[…] o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralização[5].
Na lição de Hely Lopes Meirelles,
“A autarquia não age por delegação, age por direito próprio e com autoridade pública, na medida do jus imperii que lhe foi outorgado pela lei que a criou. Como pessoa jurídica de direito público interno, autarquia traz ínsita, para a consecução de seus fins, uma parcela do poder estatal que ele deu vida. Sendo um ente autônomo, não há subordinação hierárquica da autarquia para com a entidade estatal a que pertence, porque, se isto ocorresse, anularia seu caráter autárquico. Há mera vinculação à entidade matriz de que, por isso, passa a exercer, um controle legal, expresso no poder de correção finalístico do serviço autárquico[6]”.
Atuação das Agências Reguladoras e a sociedade.
Com a implementação da política que transfere para o setor particular a execução dos serviços públicos e reserva para a Administração Pública a regulamentação, o controle e a fiscalização da prestação desses serviços aos usuários e a ela própria, o Governo Federal, dito por ele mesmo, teve a necessidade de criar entidades para promover, com eficiência, essa regulamentação, controle e fiscalização, pois não dispunha de condições para enfrentar a atuação dessas parcerias.
Tais entidades, segundo o magistério de Gasparini[7], são criadas com essa finalidade e poder, são as agências reguladoras. São criadas por lei como autarquia de regime especial recebendo os privilégios que a lei lhes outorga, indispensáveis ao atingimento de seus fins. São entidades, portanto, que integram a Administração Pública Indireta.
Tem-se que a função essencial das agências reguladoras das concessionárias é a fiscalização dos serviços prestados. Essa fiscalização depende também de autorização legislativa, para não se confrontar com o princípio da legalidade.
Esta autorização legislativa, até porque se faz difícil descrever todos os fatos de lide possíveis, deve dar à agência reguladora uma margem de atuação, um caminho a ser seguido por ela, ou seja, seus principais objetivos. Decaindo desta forma, as idéias de que se as agências reguladoras fiscalizassem automaticamente, estariam violando o princípio constitucional da legalidade.
O fundamental é a tutela dos hipossuficientes em relação aos agentes econômicos cada vez mais fortes. As agências reguladoras devem atuar através de advertências, quando as concessionárias estiverem em desconformidade com seus objetivos, resolvendo os problemas de imediato e em casos mais graves devem estipular multas diárias para as concessionárias que estiverem violando direitos.
A importância das agências reguladoras, no atual sistema político adotado em nosso país, objetivam sobremaneira a regulação das concessionárias, a fiscalização, a estipulação de multas, bem como a cassação da concessão, caso não sejam atingidas suas metas.
Por se tratar de serviços de natureza pública, as agências têm o dever de zelar pelo bom funcionamento das concessionárias, resguardando dessa forma um serviço que pertence a sociedade.
As Agências Reguladoras são instrumentos de proteção e segurança, para tanto. É fundamental que sua performance apresente-se na mais pura transparência. Desta forma, outra característica comum entre as Agências Reguladoras é o contato aberto com população.
A sociedade deve estar ciente de suas ações que, para serem socialmente legítima, necessitam ser amplamente divulgadas pela imprensa escrita, falada e televisionada.
As Agências Reguladoras, além da publicidade de seus atos, também devem criar e manter ouvidorias ou centros de atendimentos aos cidadãos, no sentido de receber as reclamações, investigá-las e, se for o caso, aplicar as sanções cabíveis em face das empresas que estejam infringindo alguma norma, confirmando, deste modo, seu caráter de ente estatal regulador e fiscalizador da economia.
Dentro dessa expectativa de proximidade com a sociedade, a necessidade de que as Agências Reguladoras possuam meios de comunicação eficientes com as empresas privadas, no sentido de ouvir seus anseios e reivindicações, formando, dessa maneira, novas normas regimentais dos respectivos mercados que atuam.
O exercício da regulamentação pode ser realizado com bases em audiências públicas, e reunião com empresários.
Há, uma certa confusão entre regulação estatal com os processos de desregulamentação da atividade econômica. Quem melhor expõe esse entendimento é Eros Grau[8] quando afirma que “ como os norte-americanos usam o vocábulo regulation para significar o que designamos “regulamentação”, deregulation, para eles, assume o mesmo significado que indicamos ao usar o vocábulo “regulação”; vale dizer: a deregulation dos norte-americanos está para a regulation assim como, para nós, a “regulação” está para a “regulamentação”. Não parece cabível a associação tanto pelos seus pressupostos, quanto pelos seus resultados.
A importância dessa entidade pública como responsável pela regulamentação da economia do país. Além das grandes inovações que trouxeram ao nosso ordenamento, também um relevante progresso na aproximação significativa dos anseios da sociedade para com a autuação do Estado, esse fato traz o desenvolvimento para todos, caso for efetivamente verificado na prática da atuação das Agências Reguladoras.
Informações Sobre o Autor
Carlos Roberto Antunes Torres
Acadêmico do Curso de Direito da Fundação Universidade Federal do Rio Grande/FURG