A participação de diferentes níveis de governo e da sociedade na governança ambiental: uma avaliação do arcabouço legal brasileiro

Resumo: A noção de governança ambiental contemporânea compreende a atuação conjunta e integrada de diferentes níveis de governo e da sociedade nos processos de política pública ambiental. O artigo verifica se esta noção está respaldada em declarações internacionais das quais o Brasil é signatário e na legislação brasileira. Conclui-se que a há ampla presença de atribuição de responsabilidades e obrigações relacionados à sociedade civil e às diferentes esferas governamentais em declarações internacionais, na Constituição Federal de 1988, na Política Nacional do Meio Ambiente e nas principais políticas de meio ambiente.[1]

Palavras-chave: Governança ambiental. Sociedade. Governo. Direito. Meio Ambiente.

Abstract: The contemporary  notion of environmental governance comprises the joint and integrated action of different levels of government and society in environmental public policy processes. The article verifies if this notion is backed in environmental declarations signed by Brazil and in the Brazilian Law. It is concluded that there is a wide presence of attribution of responsibilities and obligations related to civil society and the different governmental spheres in international declarations, in the Federal Constitution of 1988, in the National Environment Policy and in the main environmental policies.

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Keywords: Environmental governance. Society. Government. Law. Environment

Sumário: 1 – Introdução. 2 – Declarações internacionais. 3 – Marco legal Brasileiro. 4 – Conclusão. Referências.

1 – Introdução

Governança ambiental refere-se aos modos institucionalizados de coordenação social para definir e implementar coletivamente regras relacionadas ao meio ambiente (BÖRZEL e FAGAN, 2015). Envolve o “como”, o “porquê” e “com que implicações” os assuntos coletivos de ordem ambiental são geridos (BULKELEY, 2010). Dá-se pelo conjunto de processos regulatórios, mecanismos e organizações por meio das quais os atores políticos influenciam ações e resultados ambientais (LEMOS e AGRAWAL, 2006).

A noção de governança ambiental compreende uma série de instituições formais e informais, grupos sociais, processos, interações e tradições, as quais influenciam a forma como o poder é exercido, como as decisões públicas são tomadas, como os cidadãos se envolvem e quem ganha legitimidade e influência (REED e BRUYNEEL, 2010). De forma geral, governança ambiental refere-se ao o exercício de poder no processo político relacionado à gestão do meio ambiente.As formas modernas de governança extrapolam o papel do estado: pressupõem a atuação  diferentes atores, com destaque para a sociedade civil, governos e empresas, em diferentes níveis territoriais – local, regional, nacional e transnacional – por meio de diferentes modos de ação e influência, como políticas, normas, declarações internacionais, redes, hierarquias e mercados (JORDAN et al., 2015, PATERSON et al., 2013, LEMOS e AGRAWAL, 2006). A presença e atuação do governo, nas diferentes esferas, é condição necessária, mas não suficiente para qualidade da governança ambiental.  A literatura sobre governança demonstra que essa depende também da atuação de uma sociedade forte e articulada (BÖRZEL e FAGAN, 2015).Se é indispensável para a qualidade da governança ambiental, é desejável que haja respaldo legal sobre a atuação da sociedade nos processos de política pública. O presente trabalho pretende verificar se o arcabouço jurídico brasileiro considera que a governança ambiental consiste na atuação integrada entre diferentes níveis de governo, sociedade civil e empresas. Para tal, são analisadas declarações internacionais de meio ambiente dos quais o Brasil é signatário, a Constituição Federal e diferentes leis e instrumentos legais brasileiros.  

2 – Declarações internacionais

A partir da década de 60, o Direito Internacional Ambiental começou a expandir e a se universalizar, interagindo com outros ramos do direito e outros campos do saber, com objetivo de aprimorar as instituições, alertando-as enquanto os perigos da degradação biosférica (NAZO e MUKAI, 2001, p. 96).

Entretanto, é em 1972 que ocorre a primeira Conferência da ONU sobre Meio ambiente. Segundo Costa et al. (2012), ela decorre de fatores como o aumento da preocupação da comunidade científica sobre o futuro do planeta – tendo como marco o Clube de Roma em 1968 com a publicação do estudo “Os limites do crescimento” –, a crescente exposição da mídia sobre desastres ambientais, o crescimento não planejado da economia, além de problemas ambientais como chuvas-ácidas, grandes quantidades de metais pesados e pesticidas.

Para os autores, a Primeira Conferência Mundial sobre o Homem e o Meio Ambiente da Organização das Nações Unidas (ONU), realizada em junho de 1972 em Estocolmo, visou amenizar a problemática homem versus natureza, criando uma nova forma de pensamento, tanto para os Estados, quanto para a sociedade: o de que o problema existe, e que é preciso agir.

Como resultado da Conferência, foi elaborada a Declaração de Estocolmo, que preconiza que para preservar e melhorar o meio ambiente humano:

“7. (…) será necessário que cidadãos e comunidades, empresas e instituições, em todos os planos, aceitem as responsabilidades que possuem e que todos eles participem eqüitativamente, nesse esforço comum. Homens de toda condição e organizações de diferentes tipos plasmarão o meio ambiente do futuro, integrando seus próprios valores e a soma de suas atividades. As administrações locais e nacionais, e suas respectivas jurisdições são as responsáveis pela maior parte do estabelecimento de normas e aplicações de medidas em grande escala sobre o meio ambiente”. (grifos meus)

Conforme apontado, a responsabilidade pela preservação e melhoria do meio ambiente compete a diferentes atores e diferentes jurisdições.

Vinte anos depois, sob o patrocínio da ONU, ocorre a Rio 92, na cidade do Rio de Janeiro nos dias 3 a 14 de junho de 1992. O encontro possui grande relevância considerando a representatividade institucional – com a participação de 114 chefes de Estado, cerca de 40 mil militantes de 3.200 ONGs – e os significados econômico, social e ecológico (MOTA et al, 2008).

Sobre este aspecto, o conceito de desenvolvimento sustentável – surgido no relatório “Nosso Futuro Comum” de 1987 elaborado pela Comissão de Brundtland no processo preparatório para a Rio 92 – é firmado na Agenda 21 desta conferência e incorporado em outras agendas mundiais de desenvolvimento e de direitos humanos (BARBOSA, 2008).

O documento Agenda 21 é um programa de ação global com 40 capítulos que, junto com a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, são os principais resultados da conferência e influíram no desenvolvimento de políticas públicas, visando implantar o paradigma do desenvolvimento sustentável (MOTA et al, 2008).

Já no capítulo 1 da Agenda 21, afirma-se que o desafio do desenvolvimento sustentável é de responsabilidade, em primeiro lugar, dos Governos, mas que é fundamental a participação de instâncias sub-nacionais e de atores não governamentais:

“1.3.A Agenda 21 está voltada para os problemas prementes de hoje e tem o objetivo, ainda, de preparar o mundo para os desafios do próximo século. Reflete um consenso mundial e um compromisso político no nível mais alto no que diz respeito a desenvolvimento e cooperação ambiental. O Êxito de sua execução é responsabilidade, antes de mais nada, dos Governos. Para concretizá-la, são cruciais as estratégias, os planos, as políticas e os processos nacionais. A Cooperação internacional deverá apoiar e complementar tais esforços nacionais. Nesse contexto, o sistema das Nações Unidas tem um papel fundamental a desempenhar. Outras Organizações internacionais, regionais e sub-regionais também são convidadas a contribuir para tal esforço. A mais ampla participação pública e o envolvimento ativo das organizações não-governamentais e de outros grupos também devem ser estimulados”. (grifos meus)

Na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, o compartilhamento de responsabilidades já aparece no primeiro parágrafo do documento, sendo a participação popular na governança ambiental objeto do princípio 10.

Primeiro parágrafo:

“A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, tendo se reunido no Rio de Janeiro, de 3 a 14 de junho de 1992, reafirmando a Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, adotada em Estocolmo em 16 de junho de 1972, e buscando avançar a partir dela, com o objetivo de estabelecer uma nova e justa parceria global  mediante a criação de novos níveis de cooperação entre os Estados, os setores-chaves da sociedade e os indivíduos”. (grifos meus)

Princípio 10:

“A melhor maneira de tratar as questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada indivíduo terá acesso adequado às informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações acerca de materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar dos processos decisórios. Os Estados irão facilitar e estimular a conscientização e a participação popular, colocando as informações à disposição de todos. Será proporcionado o acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que se refere  à compensação e reparação de danos”.

Finalmente, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, realizada de 13 a 22 de junho de 2012, na cidade do Rio de Janeiro,  20 anos após a Eco 92, buscou definir a agenda do desenvolvimento sustentável para as próximas décadas.

A Declaração Final da Rio + 20, intitulada “O futuro de queremos”, traz em diversos pontos a menção à participação de diferentes níveis de governo e diferentes atores na construção do desenvolvimento sustentável, conforme exemplificado nos excertos abaixo:

 “I. NOSSA VISÃO COMUM

13. Reconhecemos como fundamental para o desenvolvimento sustentável as oportunidades dos povos em serem atores de suas vidas e de seu futuro, de participarem das tomadas de decisões e de expressarem suas preocupações. Ressaltamos que o desenvolvimento sustentável exige ações concretas e urgentes. Ele só pode ser alcançado com uma ampla aliança de pessoas, governos, sociedade civil e setor privado, todos trabalhando juntos para garantir o futuro que queremos para as gerações presentes e futuras. (…)

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C. Aproximar-se dos grandes grupos e de outras partes interessadas.

42. Reafirmamos que os organismos públicos e legislativos, em todos os níveis, têm papel fundamental na promoção do desenvolvimento sustentável. Também reconhecemos os esforços e os progressos realizados  nos níveis locais e subnacionais, bem como reconhecemos o papel importante que as autoridades locais, subnacionais e as comunidades podem desempenhar na implementação do desenvolvimento sustentável, inclusive aproximando-se dos cidadãos e das partes interessadas, e fornecendo-lhes as informações pertinentes, conforme o caso,  às três dimensões do desenvolvimento sustentável. Reconhecemos ainda a importância de envolver, no planejamento e na operacionalização das políticas de desenvolvimento sustentável, todos os líderes implicados. (…)

44. Reconhecemos o papel da sociedade civil e a importância de permitir que todos os seus membros participem ativamente do desenvolvimento sustentável. Reconhecemos que uma maior participação da sociedade civil supõe, entre outros fatores, um melhor acesso à informação, a capacitação e um ambiente propício (…).

46. Reconhecemos que a implementação do desenvolvimento sustentável dependerá do envolvimento ativo dos setores público e privado. Reconhecemos que a participação ativa do setor privado, nomeadamente através da importante ferramenta de parcerias público-privadas, pode contribuir para a realização do desenvolvimento sustentável. Apoiamos a operacionalização de estruturas nacionais, especialmente na área regulamentar que permitam  ao  comércio e à indústria adotar iniciativas em matéria de desenvolvimento sustentável, tendo em conta a importância da responsabilidade social. Fazemos um apelo para que o setor privado se engaje em práticas empresariais responsáveis, tais como as promovidas pelo Pacto Global da ONU.

IV. QUADRO INSTITUCIONAL PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

E.  Ação nos níveis regional, nacional, subnacional e local.

97. Reconhecemos a importância da dimensão regional do desenvolvimento sustentável. Os quadros regionais podem complementar e facilitar a tradução efetiva de políticas de desenvolvimento sustentável em ações concretas a nível nacional.

98. Encorajamos as autoridades regionais, nacionais, subnacionais e locais, conforme o caso, a  desenvolver e utilizar estratégias de desenvolvimento sustentável como instrumentos-chave para orientar a tomada de decisões e implementação do desenvolvimento sustentável em todos os níveis, e, nesse sentido, reconhecemos que dados e informações integrados no âmbito social, econômico ambiental, bem como a análise e a avaliação eficazes são importantes para processos de decisão. 

99. Encorajamos ações nos níveis regional, nacional, subnacional e local para promover o acesso à informação, a participação pública no processo decisório e o acesso à justiça em questões ambientais, se necessário.

101. Destacamos a necessidade de um planejamento e de tomada de decisão mais coerentes e integrados, nos níveis nacional, subnacional e local, de forma adequada, e para este fim, apelamos aos países para fortalecer as instituições nacionais, subnacionais e locais ou os órgãos e processos multilaterais envolvidos, responsáveis pelo desenvolvimento sustentável, inclusive no que tange à coordenação das atividades relativas ao desenvolvimento sustentável e à integração eficaz das três dimensões do sustentável”.

Como exposto, a participação da sociedade e de diferentes esferas governamentais aparecem explicitamente na Declaração de Estocolmo de 1972, na Agenda 21 e na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992 e na Declaração Final da Rio + 20 de 2012.

3 – Marco legal Brasileiro

Uma vez demonstrado que o conceito integrado de governança está presente em documentos do direito internacional ao qual o Brasil está sujeito, a presente seção pretende investigar se o marco jurídico nacional também comporta tal conceito.A Constituição Federal, em seu art. 23, estabelece que o meio ambiente  é competência comum da União, dos estados e dos municípios:“Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;

VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;

VII – preservar as florestas, a fauna e a flora”

O parágrafo único do dispositivo prevê que lei complementar fixará normas para a cooperação entre os entes. No que tange à matéria ambiental, foi editada a Lei Complementar nº 140, de 8 de dezembro de 2011.

A CF/88, em seu Art. 170, considera a defesa do meio ambiente um dos princípios da atividade econômica:

“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação”.Ainda, o art. 225 afirma que a defesa do meio ambiente é dever não só do Poder Público, como da coletividade, portanto, da sociedade:“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. (grifos meus)

Desta forma, é possível inferir que, conforme a CF/88, não só os diferentes níveis de governo possuem responsabilidade na questão ambiental, como também a atividade empresarial e a sociedade possuem atribuições relacionadas ao tema.

A lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, que estabelece a Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, constitui o Sistema Nacional do Meio Ambiente – Sisnama e institui o Cadastro de Defesa Ambiental, também traz elementos que reforçam o conceito de governança ambiental com responsabilidades compartilhadas entre diferentes níveis de governo, sociedade e empresas.

Em seu Art. 5º, a lei menciona as responsabilidades dos diferentes níveis de governo e atividades empresariais destes atores na aplicação da PNMA:

“Art. 5º,  – As diretrizes da Política Nacional do Meio Ambiente serão formuladas em normas e planos, destinados a orientar a ação dos Governos da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios no que se relaciona com a preservação da qualidade ambiental e manutenção do equilíbrio ecológico, observados os princípios estabelecidos no art. 2º desta Lei.

Parágrafo único. As atividades empresariais públicas ou privadas serão exercidas em consonância com as diretrizes da Política Nacional do Meio Ambiente”.

No artigo 6º, ao instituir o SISNAMA, a lei menciona que este será composto por órgão de diferentes níveis. “Art. 6º Os órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, bem como as fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, constituirão o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA”.

No inciso II do Art. 6º, é instituído o CONAMA como órgão consultivo e deliberativo do SISNAMA:

“II – órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), com a finalidade de assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo, diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais e deliberar, no âmbito de sua competência, sobre normas e padrões compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida”.

Estão entre as atribuições do CONAMA, conforme o Art. 8º desta lei, o estabelecimento, mediante proposta do IBAMA, normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluídoras, a determinação da realização de estudos das alternativas e das possíveis consequências ambientais de projetos públicos ou privados, o estabelecimento de normas e padrões nacionais de controle da poluição por veículos automotores, aeronaves e embarcações de normas, critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente com vistas ao uso racional dos recursos ambientais, principalmente os hídricos.

Conforme o Art. 5º do Decreto No 99.274, de 6 de junho de 1990, o plenário do CONAMA é composto por representantes do Governo Federal, um representante de cada um dos Governos Estaduais e do Distrito Federal, oito representantes dos Governos Municipais, vinte e um representantes de entidades de trabalhadores e da sociedade civil, oito representantes de entidades empresariais e um membro honorário indicado pelo Plenário. Esta composição talvez seja o melhor exemplo de estrutura de governança compartilhada com representantes dos diferentes níveis do governo e de setores da sociedade.

Fazendo um apanhado das leis que instituem as principais políticas de meio ambiente no País, também é possível notar a presença destes atores na governança de diferentes temas ambientais.

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A lei Nº 12.651, de 25 de maio de 2012, conhecida como Código Florestal, que dispõe sobre a proteção da vegetação nativa, estabelece, no inciso IV do Art. 1o-A A:

“IV – responsabilidade comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, em colaboração com a sociedade civil, na criação de políticas para a preservação e restauração da vegetação nativa e de suas funções ecológicas e sociais nas áreas urbanas e rurais”.  

A lei Nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, traz como fundamento da política, já no inciso IV do Art. 1º

“VI – a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades”.

Paralelamente, a lei Nº 9.985, de 18 de julho de 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC, em seu Art. 5o põe que

“Art. 5o O SNUC será regido por diretrizes que:

IV – busquem o apoio e a cooperação de organizações não-governamentais, de organizações privadas e pessoas físicas para o desenvolvimento de estudos, pesquisas científicas, práticas de educação ambiental, atividades de lazer e de turismo ecológico, monitoramento, manutenção e outras atividades de gestão das unidades de conservação;

V – incentivem as populações locais e as organizações privadas a estabelecerem e administrarem unidades de conservação dentro do sistema nacional”.

Adicionalmente, o inciso I do Art. 6o estabelece que o SNUC terá o CONAMA como órgão consultivo e deliberativo, com atribuições de acompanhar a implementação deste Sistema. O Conselho, como já visto, possui representantes de diferentes níveis de governo e atores da sociedade.

Em relação à Política Nacional de Resíduos Sólidos, a lei Nº 12.305, de 2 de agosto de 2010, que o institui, traz em seu Art. 4o a gestão compartilhada entre governos e atores e, em seu Art. 6 o, inciso VI, a cooperação entre diferentes atores como um dos princípios desta política:

“Art. 4o  A Política Nacional de Resíduos Sólidos reúne o conjunto de princípios, objetivos, instrumentos, diretrizes, metas e ações adotados pelo Governo Federal, isoladamente ou em regime de cooperação com Estados, Distrito Federal, Municípios ou particulares, com vistas à gestão integrada e ao gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos. 

Art. 6o  São princípios da Política Nacional de Resíduos Sólidos: 

VI – a cooperação entre as diferentes esferas do poder público, o setor empresarial e demais segmentos da sociedade” 

Já a lei Nº 9.795, de 27 de abril de 1999, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, define incumbências a diferentes atores em seu art. 3o:

“Art. 3o Como parte do processo educativo mais amplo, todos têm direito à educação ambiental, incumbindo:

I – ao Poder Público, nos termos dos arts. 205 e 225 da Constituição Federal, definir políticas públicas que incorporem a dimensão ambiental, promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e o engajamento da sociedade na conservação, recuperação e melhoria do meio ambiente;

II – às instituições educativas, promover a educação ambiental de maneira integrada aos programas educacionais que desenvolvem;

III – aos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – Sisnama, promover ações de educação ambiental integradas aos programas de conservação, recuperação e melhoria do meio ambiente;

IV – aos meios de comunicação de massa, colaborar de maneira ativa e permanente na disseminação de informações e práticas educativas sobre meio ambiente e incorporar a dimensão ambiental em sua programação;

V – às empresas, entidades de classe, instituições públicas e privadas, promover programas destinados à capacitação dos trabalhadores, visando à melhoria e ao controle efetivo sobre o ambiente de trabalho, bem como sobre as repercussões do processo produtivo no meio ambiente;

VI – à sociedade como um todo, manter atenção permanente à formação de valores, atitudes e habilidades que propiciem a atuação individual e coletiva voltada para a prevenção, a identificação e a solução de problemas ambientais”.

A lei Nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, que estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico,  traz a possibilidade, em seu art. 47, de o controle social do saneamento ser feito por representantes de órgãos e representantes da sociedades e empresas prestadoras:

“Art. 47.  O controle social dos serviços públicos de saneamento básico poderá incluir a participação de órgãos colegiados de caráter consultivo, estaduais, do Distrito Federal e municipais, assegurada a representação:

I – dos titulares dos serviços;

II – de órgãos governamentais relacionados ao setor de saneamento básico;

III – dos prestadores de serviços públicos de saneamento básico;

IV – dos usuários de serviços de saneamento básico;

V – de entidades técnicas, organizações da sociedade civil e de defesa do consumidor relacionadas ao setor de saneamento básico”.

Por fim, o Estatuto da cidade, conforme lei No 10.257, de 10 de julho de 2001, ressalta mecanismos de governança compartilhada e cooperação entre as diretrizes gerais da política urbana:

“Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:

II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;

III – cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores da sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social”.

Em relação à sociedade civil organizada, o Marco regulatório de terceiro setor, a lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014, traz em seu Art. 5o  que o regime jurídico desta lei é fundamentado na gestão pública democrática, na participação social, no fortalecimento da sociedade civil, na transparência na aplicação dos recursos públicos, nos princípios da legalidade, da legitimidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da economicidade, da eficiência e da eficácia.

Desta forma, destina-se a assegurar, entre outros:

II – a promoção do desenvolvimento local, regional e nacional, inclusivo e sustentável;

VIII – a preservação, a conservação e a proteção dos recursos hídricos e do meio ambiente;

X – a preservação e a valorização do patrimônio cultural brasileiro, em suas dimensões material e imaterial (Art. 5o  ).

Adicionalmente, no inciso VI do Art. 84-C prevê benefícios às organizações da sociedade civil que apresentem entre seus objetivos sociais a “defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável”.

Como apresentado nesta seção, a participação da sociedade e de diferentes esferas de governo no tema ambiental está prevista na Constituição Federal, na Política Nacional de Meio Ambiente e em diversas políticas setoriais de meio ambiente.

4 – Conclusão

Conforme exposto, o conceito de governança ambiental que integra diferentes atores governamentais em seus diferentes níveis, sociedades e empresas possui amplo no arcabouço jurídico brasileiro. É possível encontrar menção e obrigações relacionadas à sociedade civil em às diferentes esferas governamentais em declarações internacionais ambientais dos quais o Brasil é signatário, na Constituição Federal de 1988, na Política Nacional do Meio Ambiente e nas principais políticas de meio ambiente.

Uma vez que a atuação de diferentes atores e governos é legalmente respaldada, é necessário incentivar a intensificação das relações entre estes e fortalecer o capital social e o engajamento da sociedade com o objetivo de aprimorar a qualidade da governança ambiental no Brasil. 

Referências
BARBOSA, Gisele Silva. O desafio do desenvolvimento sustentável. Revista Visões, v. 4, n. 1, p. 1-11, 2008.
BÖRZEL, Tanja; FAGAN, Adam. Environmental governance in South East Europe/Western Balkans: reassessing the transformative power of Europe.Environment and Planning C: Government and Policy, p. 0263774X15608985, 2015.
BRASIL. Lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014. Estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco, mediante a execução de atividades ou de projetos previamente estabelecidos em planos de trabalho inseridos em termos de colaboração, em termos de fomento ou em acordos de cooperação; define diretrizes para a política de fomento, de colaboração e de cooperação com organizações da sociedade civil; e altera as Leis nos 8.429, de 2 de junho de 1992, e 9.790, de 23 de março de 1999. Brasília, DF. Disponível em: < www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13019.htm> Acesso em: 03 nov 2017.
______. Lei Nº 12.651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis nos 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nos 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória no 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. Brasília, DF. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12651.htm> Acesso em: 03 nov 2017.
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______. Lei Nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências. Brasília, DF. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9985.htm> Acesso em: 03 nov 2017.
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Notas
[1] Este artigo é de exclusiva responsabilidade do autor não refletindo necessariamente a opinião do BNDES


Informações Sobre o Autor

Eduardo Bizzo de Pinho Borges

Economista do BNDES atualmente gerente na Área de Gestão Socioambiental do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES. É Mestre em Administração Pública e Especialista em Gestão Ambiental


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